Otouto
Abriu os olhos e sentiu que bem poderia estar morto. Quantos dias haviam se passado? Não sabia. Acordou quando sentiu algo quente em seu rosto, e um alívio tomou seu corpo depois de um leve desconforto em seu pescoço, uma picada fina.
– Anestésico. Vai te fazer se sentir melhor, três me deu.
A voz o pegou de surpresa e abriu mais os olhos. Focou nos azuis na sua frente. Era o garoto, a criança que seu irmão protegia com tanto afinco. Confuso pensou no que ele poderia estar fazendo ali, na sala de punição. Mas não teve tempo para pensar nisso.
Sentiu que ele o sentava recostado na parede. Estava um pouco escuro, mas conseguia ver o rosto pequeno, cabelo loiro bagunçado e os olhos daquela cor estranha e viva. E como ele se parecia com ele mesmo quando era criança as vezes. Seria por isso que Gaara se apegara a ele? Queria acreditar.
–O que faz aqui? – perguntou rouco.
– Quero saber por que assumiu a culpa por mim. Eu explodi a remessa da droga. Você sabia disso.
–Não foi por você. – respondeu sem emoção.
O garoto o olhou intrigado, então suspirou e sentou ao seu lado.
– Pensei que não. O que você é do Gaara?
A pergunta o pegou de surpresa, o que era raro. Encarou o outro que o olhava sem pestanejar. Era um ser estranho, pequeno demais, ainda um tanto magro para a idade. E sempre como uma expressão estranha, convicta? Talvez. O fazia ser estranhamente maior, ser intimidador.
E o fazia confiar nele. O tranquilizar. Era algo estranho. Ele mudava as pessoas. Os outros não percebiam, mas ele sim. Ainda sentia coisas humanas, e podia perceber que aquele ser pequeno, ainda iria ser a desgraça de Madara. Ele poderia fazer qualquer um ficar do seu lado, e confiar nele.
-Gaara?
-É como chama o um. O que é dele?
–O que...
– Não foi a primeira vez que assumiu algo para ele não ser punido. Eu percebi o jeito que o olha. Pode enganar todos, mas eu não. Assumiu meu erro, por que sabia que Gaara iria ser punido, já que cuida do que faço aqui dentro. Por que protege Gaara?
– Não pode contar a ele, a ninguém.
– Eu... - o loiro o olhou intrigado. O ruivo desmoronara sua face fria e mostrava quem era de fato.
– Prometa!
O menino assentiu, e estranhamente confiou. Encarou o menino e então suspirou: - Um...Gaara é meu irmão . Vou lhe contar tudo.
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Foram segundos apenas, os olhos dos dois se encontraram e sabia que ele não erraria. Fechou os olhos no último instante, esperando o golpe.
A dor não veio.
Abriu os olhos em choque, e foi quando percebeu que ela não havia atingido a si.
Haviam se movido para sua frente para o proteger. Braços o envolveram de forma protetora.
– Temari... - murmurou confuso. A loira lhe sorriu, o corpo tremia. A katana havia atravessado o corpo da garota. – O quê...
Não teve tempo de falar, nesse momento Sasori arrancou a espada e ambos caíram de joelhos, ela ainda abraçada a ele que estava fraco demais para sustentar o peso dos dois. Seu ferimento anterior ainda não havia curado e o ruivo investia novamente. Tentou empurrar a garota do caminho da lamina, foi tudo muito rápido. Ela agarrou-se mais a ele, pronta para receber o próximo golpe, e nem toda droga do mundo a salvaria, mas o golpe não veio.
Sasori foi interceptado no caminho por um impacto que o jogou longe. O loiro viu uma mistura de cabelos ruivos através da névoa que tomava seus olhos.
Gaara chegara.
– Tire-o daqui! – ouviu a voz do outro gritar em um tom urgente, raro nele. Demorou para perceber que ele falava com Temari. Apesar do golpe profundo, a garota levantou, a droga a curava. A situação do garoto era diferente.
Sem a adrenalina todos os ferimentos pareceram finalmente o pegar de uma vez, e os efeitos da droga haviam piorado sem que se desse conta. Ele sangrava de forma preocupante e percebia a consciência ser sugada aos poucos. Tentou falar ao outro quem Sasori era, mas sentia-se preso na breve inconsciência, sentindo um gosto de ferro na boca.
– Não durma! – ouviu a voz rápida em seu ouvido e sentiu-se erguido do chão. – Abra os olhos... Fale...Fique comigo...
Tentou falar algo. Gaara não podia lutar com Sasori.
Mas caiu de vez no escuro e não sentiu mais nada.
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Gaara olhou rapidamente para a direção do corredor em ruínas para onde 445 era levado por Temari. Não sabia por quanto tempo ela conseguiria levá-lo, o golpe parecia ter sido grave. Ao chegar, vira apenas o breve instante em que a katana fora removida e redirecionada para o peito de ambos. Agira com rapidez.
Olhou o outro ruivo na sua frente, que se erguia depois do forte golpe com que o jogara do outro lado da sala, limpando a poeira como se não fosse nada.
Havia algo de muito diferente. Mesmo no breve instante em que o via, reparou que estava mais rápido, forte, ágil. Mas havia algo mais evidente ainda: O olhar parecia morto. Não frio, como o deles, de todos eram. Mas morto realmente.
–Sasori. – murmurou calmo o nome de 445 havia dado para o outro ruivo anos atrás, um nome que para ele mesmo parecia estranhamente familiar desde o primeiro momento. – Quer continuar com isso?
O outro não respondeu. Apenas puxou a espada e atacou.
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Acordou tonto quando caiu no chão e abriu os olhos. Estava no chão frio de alguma sala do longo corredor. A seu lado alguém arfava. Se acostumou com a penumbra e viu que era Temari, que caíra e o derrubara junto. Sentiu os braços o recostando na parede enquanto ela fazia o mesmo, sentia o corpo mole. Era uma consciência breve, sons, flashes. Notou o barulho de um pano se resgando e sentiu que seu peito era pressionado. Ela estava tentando estancar o sangue que fluía rapidamente do corpo dele para o chão.
Então sentiu que ela aplicava algo em seu braço, e a tontura foi passando aos poucos, abriu os olhos menos turvos. E a viu bem perto de si, o rosto pálido e preocupado.
– Consegue andar? – ela perguntou com urgência. Tentou se mover e gemeu tossindo sangue de forma alarmante. Ela xingou algo sobre ele ser estúpido por se deixar ser ferido daquela forma.
– Mandei você pegar as cobaias e sair! – murmurou em resposta fraco. – Falei para Gaara não vir aqui depois que explodisse. Ninguém segue planos?
– Acabei de salvar sua vida, idiota. – ela se recostou na parede a seu lado, arfando. Não conseguia ver a extensão de seu ferimento, mas devia ser muito grave para ela estar daquela forma, mesmo com a droga nas veias.
– O que aplicou em mim? – perguntou, sentindo que a sala parava de girar.
– Um medicamento para estancar o ferimento. Vai fazer você se sentir melhor por algum tempo, mas não substitui a perda do sangue. Vou levar você comigo daqui.
– Não. – cortou com raiva. – Saia daqui, eu tenho que terminar com isso. Tentou se erguer mas ela o puxou de volta, caindo sobre ele. Não sabia de onde ela tirava tanta força, ou ele que estava muito fraco.
– Não! Vamos sair agora desse lugar! Vou tirar você daqui.
– Por que diabos...
– Eu te amo!
Ela gritou o assustando. Os olhos cheios de raiva, instáveis, contrastavam com a frase gritada perto do seu rosto. Olhos nos olhos, como se fosse beijá-lo. Ele não mudou a expressão, continuou a encarando. Podia dizer muitas coisas, e talvez ela esperasse que ele falasse.
– Você é uma idiota. – murmurou, mas demonstrou uma tristeza na voz que poucas vezes fazia.
– Eu sei. – ela suspirou encostando a testa na dele. Ele estava exausto, ferido, a ponto de apagar. Deixou que ela fizesse o contato, mesmo que a situação fosse totalmente errada.
Não tiveram tempo de falar mais nada. Ouviram um rosnado raivoso e humano, forte que vinha pelo corredor, aumentando de volume e seguido por outro e passos arrastados. Logo depois, gritos dos guardas e médicos que ainda haviam na base. Fez um som de silêncio para a garota. Podiam sentir as intenções assassinas se aproximando.
Os gritos aumentaram. Nunca haviam sentindo aquela sensação antes, era como se o apelo por sangue fosse sufocante. Fosse o que fosse que estava vindo, eles não podiam lutar contra, não como estavam.
Fechou os olhos com força. A situação saíra completamente do controle.
A única saída era soltar o gás, e acabar com tudo aquilo. Foi quando percebeu que não estava com a mochila. Olhou para Temari que olhava a porta da sala com um ar assustado, e olhou para o lado de onde vieram, onde estava Sasori e Gaara.
Onde provavelmente estava a mochila.
Onde os dois irmãos lutavam.
Teria que retornar.
–Temari, eu... - percebeu que o corpo da outra relaxara sobre ele. Correu a checar o pulso carotídeo. Estava viva, mas fraca. Ele devia estar mais ferida que ele, o ferimento em seu estômago era mais grave do que aparentava, diferente do dele, devia ter atingindo órgãos pelo caminho. E ainda assim havia arrastado os dois até ali e cuidado dele. Se não fosse a droga, estaria morta.
Respirou com dificuldade, ouvindo os sons que se aproximavam, os sons vindo pelos ductos de ar. Apesar de guturais, as vozes eram humanas. O que Madara havia feito?
Arrepiou-se ao entender o que falavam.
Era seu nome.
Estavam o caçando
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Era a luta mais difícil que já tivera. Nunca imaginou que Sasori fosse tão forte, aquele ponto. Talvez aquela total ausência de empatia que se instalara nele o transformara naquilo.
Uma arma perfeita, que só seguia ordens, que só sabia matar. Mas ao que parecia, o alvo do ruivo era 445, ele tentava alcançar o corredor por onde o outro fora levado a cada instante.
Estava ficando exausto, e haviam se passado minutos apenas. Tinham que acabar com aquilo o mais rápido possível.
E foi em um breve momento de distração que conseguiu dominar o inimigo. Golpeou o outro ruivo e a arma do mesmo foi arremessada longe. O prendeu no chão, sentando em seu tórax e puxou a proaria katana mirando no peito. Seria o único jeito de pará-lo, e era o matando.
A lamina parou na pele de Sasori que o olhava de forma vazia. E por algum motivo, ao olhar nos olhos do outro, hesitou.
Foi a deixa do mais velho para inverter a situação, e rapidamente chutá-lo longe. Se xingou sem entender a hesitação anterior. Mas não teve tempo para arrependimentos. Foi só o breve instante para perceber que a arma que estava no coldre em sua cintura havia sido removida. Virou e viu que o outro a apontava para seu peito.
Os dois se encararam por um tempo, e por um breve instante, estranhou os olhos de Sasori, que mudavam de expressão, para uma face de desespero enquanto a arma tremia em sua mão.
– E.eu... - murmurava. – Não quero...
Tentou se aproveitar do momento de fraqueza do outro, mas este foi mais rápido e disparou, desviando em um último instante de seu peito e atingido a lateral de seu corpo. Gaara recuou com a mão no ferimento, mas logo notou que o tiro fora de raspão e já estava curando. O mais velho hesitava em machucá–lo, por algum motivo, e parecia lutar com isso.
O viu gritar com a mão na cabeça, largar a arma totalmente no chão e cair de joelhos, se encolhendo.
– Me mate! – gritou de olhos fechados ainda na pose desesperada. – Me mate agora!
Gaara não entendia nada. Seu corpo agiu automaticamente e pegou a arma que o outro largara no chão com a mão livre. Caminhou devagar onde o outro estava de joelhos e apontou a arma para a cabeça do mais velho. Nesse momento, ele ergueu os olhos perturbados, e para o completo desespero de Gaara, lhe sorriu.
E aquele sorriso... era o mesmo que chamara tanta atenção a si em 445 anos atras.
Sua mão, pela primeira vez, tremia.
– Atire. – o outro pediu. – Eu vou matá-lo, se não me matar.
Não queria atirar.
O outro tremia, parecendo buscar um controle imenso para se manter quieto.
–ATIRE!
Engatilhou a arma.
–Não faça isso. – a voz calma o fez olhar para trás.
Viu o loiro parado atrás de si, a alguns metros. Estava pálido, as roupas cobertas de sangue. Pegava a mochila do chão e o olhava com tristeza.
Seu momento de distração foi o suficiente para a situação mudar. Tudo aconteceu muito rápido.
Em um instante, estava com a mira do cano em Sasori, no outro, este havia o jogado no chão e pegara a arma apontando para si. Viu a mancha loira por cima e o ouviu o barulho do tiro sendo desviado. 445 havia se jogado no outro o fazendo errar a mira. Mesmo ferido ele conseguia ser muito rápido, e a hesitação de Sasori parecia o ajudar.
Logo, os dois assassinos estavam se embolando no chão, lutando pela arma. O cansaço, os ferimentos, tudo isso fazia com que a luta fosse um emaranhado de corpos sem coordenação nenhuma.
O loiro podia ouvir que os gritos que ouvira no corredor se aproximavam cada vez mais do local, logo estariam aqui. Era como se seguíssem seu cheiro, vindo diretamente para ele.
Sentiu o metal entre suas mãos enquanto pegava a arma, mas um forte chute recebido no ferimento em seu peito o fez largá–la.
Viu de relance que Gaara se recuperava da surpresa e corria atá eles.
E no meio da confusão, um dos três pegou a arma e disparou.
E nesse momento ele sentiu o sangue se espalhando no chão.
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Temari acordou em um lugar escuro. Estava deitada no chão da sala onde estivera com 445. Podia sentir ainda seu cheiro no local. Ele a escondera. O maldito a escondera e fora lutar sozinho, fazer qualquer das loucuras que havia planejado. No escuro apalpou as paredes e sentiu algo frio nas mãos. Vidro. Ele a colocara em uma das câmaras hiperbáricas que tinham em alguns quartos ali. Socou o vidro. Por que ele fizera aquilo?
Para ela não segui-lo?
Foi por um breve instante, o pensamento. Lembrou do conteúdo da bolsa. As bombas de gás. O que seriam elas?
Ele a colocara na câmara hiperbárica, onde nenhum gás externo a atingiria.
O que queria dizer, que o que fosse o gás, deveria ser perigoso, ou mortal. E ele iria soltá-lo.
– Aquele maldito vai se matar junto... - socou com mais desespero.
Tinha que sair dali.
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– Havia um carpinteiro, que queria muito ter um filho...
Gaara olhou sem entender 445. Foi tudo rápido demais. Se jogara entre os dois e tomara a arma, mas no momento em que atiraria em Sasori o loiro havia se metido no meio e recebido o tiro de raspão. Não sabia por que 445 estava protegendo o outro daquela forma. Ele tentava matá-los!
E muito menos por que agora recitava Pinóquio para o mesmo que estava lutando enquanto o loiro tentava imobilizado. Correu até eles, mas 445 o impediu de se aproximar com um olhar mortal. Sabia que Sasori não queria ser liberto de todo, pois ferido como ele estava, não estaria conseguindo imobiliza-lo sem que ele permitisse.
– Ele construiu um boneco de madeira, com todo o amor que possuía
O ruivo mais velho parara de lutar e escutava, arfante.
– Ele o chamou de Pinóquio.- Sasori murmurou, para a surpresa de Gaara.
445 assentiu, e o soltou, caindo no chão em seguida. Gaara correu a ampará-lo. Sasori permanecia estático no chão, arfante e olhando para o teto. Então o encarou com um sorriso leve. E falou a ultima coisa que esperava.
– Otouto.
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Tentava se manter consciente enquanto ouvia as vozes de Gaara e Sasori ao longe, mesmo sentindo que estavam bem perto de si. Não sabia quanto tempo havia se passado desde o seu desmaio, mas sentia que caminhavam. Era carregado por um dos dois e via por entre as pálpebras fechadas a incidência da luz, estavam em algum corredor.
– Ouviu isso, otouto?
Então ele havia contado a Gaara? Não ouviu a resposta do outro.
Abriu os olhos devagar ao sentir o corpo que o segurava tenso. Acordou do torpor de imediato ao ouvir os murmúrios, sentir a intenção por sangue. Os passos vindos rápidos.
Haviam o encontrado.
Os olhos azuis se focaram aos poucos, e então se deparou com olhares mortos os fitando. Então aqueles eram os monstros aos quais Madara se referira.
Que enviara para pegá-lo.
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