A Mulher Que Atraía Abelhas
CENA 1 – DOCE
— Bom dia, amor.
— Bom dia, querida. O café parece ótimo.
— Não vou colocar mais açúcar, Alex. Nem tente.
— Vamos, uma colher a mais não vai fazer mal.
— O doutor disse para controlar você.
— Certo, certo; Clara, a controladora.
— Você ainda não me beijou.
— Eu posso resolver isso.
•
— Droga, Clara.
— O que foi?
— Uma abelha entrou na cozinha, já falei para deixar a janela fechada.
— Eu gosto de abelhas.
— Eu sei, querida, mas você é alérgica.
— Não acredito, você a matou mesmo.
— Sabe que faço isso para o seu bem.
— Sei disso. Você já está indo trabalhar?
— Preciso achar minhas chaves.
— Olhe no balcão.
— Os vizinhos estão brigando de novo.
— Acha que um dia a gente vai acabar assim?
— É claro que não, querida, seremos o casal mais romântico e... Achei as chaves.
— No balcão?
— Na gaveta de contas. Foi você que colocou lá? Tenho certeza de que ontem deixei no balcão.
— Sim. Fui eu.
—
— Sinto muito.
—
— Alex, por favor, eu...
— Ei, está tudo bem. São apenas chaves.
— Eu amo você.
— Eu também te amo, querida.
— Tenha um bom dia no trabalho.
— Você também. Boa sorte com o grupo. Tchau, até mais tarde.
— Até mais... E ele já saiu.
CENA 2 – SANDUÍCHES
— Meu nome é Clara.
— Oi, Clara.
— Olá, sim, essa sou eu, Clara.
— Por que está aqui, Clara?
— Aqui?
— Sim, em um grupo de autoajuda, com certeza não é por causa dos sanduíches.
— Não, não é sobre os sanduíches, apesar de estarem deliciosos. Eu estou aqui porque sou uma vítima do fogo, como vocês.
— E como você chegou aqui?
— Meu marido, Alex, ele é um amor... Ele... Ele achou que seria uma boa ideia eu falar com pessoas como... Eu. Alex acha que... Alex acha que preciso de ajuda e... Geralmente eu passo o dia limpando a casa, mas os produtos fazem mal para a minha pele... Me desculpem, do que eu estava falando mesmo?
— Admitir que precisa de ajuda é o primeiro passo, você concorda com Alex?
—
— Você quer compartilhar sua história, Clara?
— Eu acho que sim. Uma parte dela pelo menos...
— Quando se sentir pronta.
— Meu ex-marido!
—
— Desculpe, essa foi uma explosão repentina.
— Está tudo bem. Esse é um ambiente seguro.
— Certo, obrigada, eu... Meu ex-marido chegou em casa e havia uma panela de água fervente e... Bom, houve um acidente com essa panela e eu fiquei com queimaduras de terceiro grau por todo o lado direito do meu corpo. Foi um milagre não ter perdido a visão ou algo do tipo, eu... Eu quero um desses sanduíches, eu posso?
— É claro, são para todos.
— Obrigada, eu vou... Vou me sentar agora.
— Obrigada por compartilhar sua história conosco, Clara. Quem é o próximo?
CENA 3 – AGRIDOCE
— Amor! Você chegou.
— Que bom ver você sorrindo, querida.
— Como foi no trabalho? Quer ajuda com o casaco?
— Sim, por favor. Foi um dia difícil, fechamento de bimestre, as crianças sempre ficam agitadas.
— São adolescentes.
— Adolescentes são crianças que podem votar, não tem muita diferença. Você fez aquele molho de carne para o jantar? O cheiro está maravilhoso.
— Sim. Venha, vamos comer.
•
— Clara? Você não disse uma palavra desde que começamos a comer.
— Como está o molho?
— Está ótimo, bebê. Agora me conte sobre aquela reunião.
— Eles fazem alguns sanduíches realmente bons.
— Clara...
— Eu não gostei de lá. Alex... Aquela “psicóloga” continuou dizendo que a culpa “disso” não foi minha.
— A culpa não foi sua. Foi culpa do verme do seu ex-marido.
— Não o chame assim.
— Clara, pare de se fazer de boba, nós dois sabemos que a culpa foi toda dele.
— Se eu tivesse colocado o macarrão no fogo mais ce...
— CLARA!
—
— Desculpe, querida, eu não quis gritar.
— Tudo bem.
— Não, não está. Eu não deveria gritar.
—
— Fazem três anos desde o acidente, estamos casados há seis meses, eu... Por que ainda brigamos tanto por causa dele?
— Ele me quebrou, eu acho, ainda estamos tentando juntar os pedaços.
— Não fale que está quebrada.
— Vamos ficar bem. Eu que... Sei que o que ele fez não foi certo.
— Então por que continua o defendendo? Clara, você poderia ter morrido.
— Não o defendo.
— Admite que a culpa foi dele?
—
— Clara, quero que me diga o que combinamos... De novo.
— A culpa foi dele, não minha.
— Muito be... Droga, entrou outra abelha.
— Desculpa, eu deixei a janela aberta.
— A culpa não é sua, querida. Por que não sobe e toma um banho? Subo assim que limpar essa bagunça.
— Claro. Eu amo você.
— Eu também te... Abelha desgraçada! Você está vendo isso? Ela está debochando de mim.
— Não fique acordado até tarde brincando com as abelhas.
— Tá. E não deixe o chuveiro no frio.
CENA 4 – CHÁ DE ERVAS
— As brigas pararam?
— Mãe, não são realmente brigas, Alex e eu nos amamos.
— Você me contou que andam tendo algumas conversas bem acaloradas.
— Bem, sim, mas não podem ser chamadas de brigas.
— Por que andavam brigando?
— Mãe!
— O que foi? Conte-me.
— Alex não gosta quando digo que a culpa do acidente não foi de... Dele.
— É claro que não foi culpa do Cláudio, foi sua. De quem mais seria? Você é tão desastrada, sempre teve as mãos frágeis e a panela acidentalmente entornou em você. Alex que não quer enxergar que se casou com uma desengonçada.
— É o que eu digo.
— Cláudio era um homem tão bom, nunca vi aquele rapaz fazer nada de ruim para você e agora, minha filha, olhe com quem você se casou, esse professorzinho...
— Eu sempre disse que ele me batia.
— O que tem? Seu pai me bateu a vida inteira. Homens são assim mesmo, não sabem controlar as emoções e descontam no primeiro que veem pela frente, é normal, e nossa família sempre teve mulheres fortes que aguentaram tudo pelo bem da família.
— Alex nunca tocou em mim assim...
— Eu disse que os homens fazem isso. Alex é um homem?
— Ele é. Pare de rir, não é engraçado.
— Clara, pare de roer as unhas. Já não basta estar com o rosto todo destruído, você ainda tem esse costume infantil.
— Desculpe.
— E digo mais, se Alex continuar te desmentindo, diga a ele que Cláudio sim era um homem de verdade.
— Alex disse que a culpa não foi minha.
— Só havia duas pessoas no dia do acidente, você e Cláudio, dos dois você é a única que continua viva, acho que isso diz muito sobre de quem foi a culpa.
— A panela escorregou, eu não queria matá-lo.
— Claro, docinho. Céus, o que tem nesse chá? Isso tem gosto de terra.
—
— Clara? Está me ouvindo? Pegue mais açúcar para a mamãe.
CENA 5 – AZEDO
— Eu sinto muito!
— O que você fez?
— O espelho quebrou e o sabonete líquido caiu e manchou as toalhas e eu não consegui limpar tudo antes de você chegar e agora tudo está uma bagunça tão grande e eu escorreguei e toda penteadeira está no chão fiz tudo errado tudo uma bagunça...
— Clara, Clara, Clara.
— Oi?
— Você está bem?
— O quê?
— Disse que o espelho quebrou. Você se machucou? Está tudo bem?
— Não está bravo?
— Bravo? Não! Eu posso fazer a barba olhando o retrovisor do carro.
—
— Vamos lá, foi uma piada. Fique calma, querida; vou lhe comprar o maior espelho que tiverem na loja.
— Eu te amo.
— Eu também amo você. E o seu jantar. A comida está pronta?
— Só preciso esquentar tudo e finalizar a salada.
— Tudo bem, enquanto isso estou no banheiro limpando a bagunça, ok?
•
— O jantar está... Com quem está conversando?
— Não é ninguém.
— Você desligou o celular rápido demais.
— É que estou com fome! A comida da escola não fica tão atrativa depois de quinze anos comendo ela todos os dias.
— Amor...
— Querida?
— Quem era no telefone? Oh não, não, não! Eu deixei a janela aberta de novo, as abelhas, as abelhas!
— Você precisa ver o veneno que comprei, não vai sobrar mais uma única abelha nessa casa.
CENA 6 – MAIONESE
— Você não precisa ir...
— Mas...?
— Mas eu gostaria que você fosse.
— Por quê? Ninguém quer ver minha cara feia enquanto estão comendo.
— Não fale assim de si mesma, eu te amo, você é linda, todos gostamos de você. Deveria ser o suficiente.
— Isso é algo muito insensível de se cobrar de mim...
—
— Desculpe, minha terapeuta, ela... Eu...
— Está tudo bem, você está certa. Eu sei que não é uma questão de ser ou não o suficiente, você sabe que eu te amo e eu não quero que se sinta pressionada a ir a lugar nenhum.
—
— Estou orgulhoso de você, a terapia está te fazendo bem.
— Por que você nunca fica bravo?
— Porque você nunca fica brava.
—
— Se decidir ir eu vou te dar todo o meu apoio, se não, tudo bem também.
— Alex, as crianças ficam perguntando e aquele casal do final da rua sempre fica cochichando como se eu tivesse uma doença contagiosa.
— São ignorantes. O que importa é que os donos da casa te adoram e estão esperando por nós.
— Amor...
— Não choramingue, Clara. Você precisa sair, vai te fazer bem.
— Eu estou saindo! Estou indo ao seu grupo de autoajuda.
— Passar uma hora por semana fora de casa não conta exatamente como sair, querida.
— Você que é exigente.
— Por favor, Clara, eu não quero te pressionar, mas você fez essa maionese com tanto carinho. Vamos apenas cumprimentar os vizinhos e, caso você se sinta mal, podemos voltar para casa e passar o resto do dia no sofá.
— Promete?
— Prometo. Não vou deixar nada de ruim acontecer.
— Eu... Tudo bem! Mas eu não vou tirar fotos.
— Perfeito.
— E se você me deixar sozinha eu volto pra casa.
— Tudo bem, tudo bem. Vá fechar as janelas da cozinha, eu pego a maionese.
•
— Foi legal, não foi?
— Sim, foi muito legal. Quanto tempo faz que eu não fazia isso? Sabe, sair e conversar com as pessoas e... Não me olhe assim, seu convencido.
— Assim como? Estou apenas apreciando o quanto eu estava certo.
— Sim, você estava certo. Alex, foi... Foi um dia incrível.
•
— Eu te amo.
— Eu te amo.
CENA 7 – ÁCIDO
— De quem é a mensagem?
— Que mensagem?
— Você saiu correndo para responder alguém, eu quero saber quem era.
— Ah. Não era ninguém. Clara, você poderia manter a janela fechada? Não sou eu quem posso morrer com uma picada desses bichos.
— Me responde.
— É incrível como só aparecem quando você está presente, quando fico sozinho aqui elas nem chegam perto.
— Quem era no telefone, Alex?
— Isso importa?
— Sim, importa. Você sempre me deixou ver suas coisas, nunca escondeu nada de mim. Quem era no telefone?
— Clara, querida, meu amor, você confia em mim?
— Confio.
— Acho que isso encerra nossa discussão.
— O quê? Alex, volte aqui.
— Confie em mim, babe. Estou indo pegar o veneno.
CENA 8 – LEITE
— Não. Não. Não. Não. Não.
— Clara? Está tudo bem?
— Es... Está... Está tudo bem.
— O que está acontecendo?
— Eu sinto muito. Sinto muito. Sinto muito.
— Querida... Não precisa ter medo, sabe que não vou machucá-la.
— Eu...
— Tudo bem, venha aqui, deixe-me ver suas mãos.
— Sinto muito Alex eu só queria pegar um pouco de leite e quebrei o copo sinto muito eu posso pagar vou limpar essa bagunça e comprar um novo assim que limpar preciso achar os panos e os produtos...
— Querida, as mãos, por favor. Ótimo, não estão machucadas. Você pisou em algum caco de vidro?
— Não.
— Bom. Venha aqui, um abraço deixa tudo melhor, certo?
— Eu sou tão estúpida.
— Quantos beijinhos eu preciso te dar para provar que você é a mulher mais incrível... Mais inteligente... Mais sensacional... Do... Mundo?
— Isso faz cócegas.
— É bom ver você sorrindo.
— Sinto muito pelo copo.
— Era só vidro, a única coisa preciosa dessa cozinha está segura nos meus braços, sentada em cima de uma poça de leite.
— Tão romântico...
— Está mais calma?
—
— Clara?
— Odeio como pareço fraca em momentos assim. Eu simplesmente entro em pânico e eu não pareço mais... Eu.
— Ninguém espera que você supere tudo o que viveu com aquele homem de um dia para o outro, foi sua realidade por anos.
— Minha mãe...
— Sua mãe fala demais, Clara.
— Não se cala por um minuto.
— Sua risada chorosa é a melhor.
— Bobo.
— Querida?
— Sim?
— Você acha que sou igual a ele?
— Não! Não, não. Nem um pouco igual. Por que você diria algo assim?
— Você... N esses momentos você sempre parece ter medo de mim.
— O problema não é você.
— O que é então?
— Minha cabeça fica nublada, eu só... Sinto medo. É difícil lembrar do lugar onde estou ou com quem eu estou. Que estou com você. Segura.
— Eu te amo, Clara.
— Nunca pare de dizer isso, por favor.
— Eu não vou.
CENA 9 – AMARGO
— Você está atrasado.
— Querida, achei que fosse para a casa da sua mãe hoje.
— Eu decidi ficar, queria jantar com você.
— Isso é maravilhoso, vamos jantar então.
— Já são nove da noite, Alex; onde você estava? Você nunca se atrasa.
— Muito trânsito, acabei...
— Você foi para o trabalho de ônibus hoje.
— Hum... Sim, eu fui, mas ônibus também pegam trânsito, certo?
— Você vai me contar a verdade ou não?
— Estou contando. Não confia em mim, querida?
— Confio, mas...
— Ótimo, fico feliz por confiar. Na verdade, não estou com tanta fome assim, se importa se eu já for dormir?
— Alex!
—
— Eu te amo.
— Eu também.
CENA 10 – BALAS
— Querida, querida, prove uma dessas balas que uma aluna me deu.
— Eca, isso é azedo.
— Fantástico, não é? A cara que você fez... Devia ter tirado uma foto.
— É? Para rir de mim depois?
—
— Desculpe, isso foi grosseiro.
— Tudo bem, Clara, eu só estava brincando. Me desculpe.
— Eu tinha escovado os dentes, me desculpa, fiquei irritada.
—
— Alex! Não pode ficar bravo comigo por isso.
—
— Não pode sair enfiando as coisas na minha boca assim.
— De que coisas estamos falando exatamente?
— Vá dormir, Alex. Seu palhaço...
— Certo, estou indo. Adorei essa colcha nova que você comprou, gosto do material.
— Achei que combinaria com o tapete.
— Combinou.
— Amor, posso segurar sua mão?
— Clara... Você sabe que não precisa perguntar.
— Eu te deixei irritado.
— Não, eu só estava sendo dramático, venha aqui, meu bebê.
— Obrigada.
— Está calor demais para abraçar?
— Um pouco...
— Querida, sempre quis te perguntar uma coisa.
— Você já me pediu em casamento.
— Sim, e foi a melhor decisão que já tomei.
— Amor...
— Eu queria saber, por que você só dorme quando tem certeza de que está tocando alguma parte do meu corpo?
— Isso te incomoda?
— Não! Claro que não. Só curiosidade... Às vezes você me abraça ou apenas encosta um dos pés em mim... Por quê?
— Eu não sei.
—
—
— Acho que é uma forma de saber que você não vai embora sem que eu veja.
—
—
— Eu nunca vou te abandonar.
— Eu acredito em você.
CENA 11 – SALGADO
— O que é isso, Alex?
— Um livro?
— Sim, claro que é um livro, amor; eu quero saber quem te deu.
— Uma aluna.
— Que aluna?
— Uh... Por que quer saber?
— Porque eu quero sabe que tipo de aluna dá Cinquenta Tons de Cinza para o professor de História.
— Foi uma piada... Eu acho...
— Você dá aula para adolescentes, Alexandre! Quem foi que te deu esse livro?
— Uma aluna, amor. Não acredita em mim? Droga, Clara... Por que isso é tão importante?
— Você sabe do que esse livro fala?
— Não é sobre ternos?
—
— Tem uma gravata na capa!
—
— Vamos, Clara, você sabe como essas crianças às vezes desenvolvem alguma paixonite pelo professor.
— São adolescentes! Pare de chamá-las de crianças.
— Sim, claro, querida, adolescentes.
— Tem uma declaração! Uma declaração! "Para o sr. Nicácio, com amor, pense em mim enquanto ler".
—
— Alex!
— Oook... Então, talvez ela seja uma garota estranha, não se preocupe, querida, irei falar com ela que prefiro Crepúsculo... Ou levar isso para a direção, agora eu estou seriamente preocupado.
—
— Clara, vamos lá, não pode estar brava por causa disso.
— Diga a essa "aluna" que você é casado.
— Eu digo! Eu literalmente uso uma aliança todos os dias.
—
— Clara, esse nem é o presente mais estranho que já ganhei.
—
— Acredite em mim.
—
— Eu te amo, você sabe di... Droga, malditas abelhas. Falei para fechar a janela, Clara.
CENA 12 – PURÊ DE BATATA
— Clarinha, sua voz está distante, o que está fazendo enquanto fala comigo?
— Descascando batatas.
— Vai fazê-las fritas?
— Purê, na verdade.
— Típico da Clarinha, nunca faz nada ousado.
— Purê não é ousado o suficiente para você, tia?
— Que tom é esse, moça? Desde quando você me responde assim?
—
— Então, sua mãe me contou sobre você e Alex.
— Por que você anda falando com a minha mãe sobre meu casamento?
— Clarinha, estamos preocupadas, Alex nunca nos pareceu uma pessoa confiável.
—
— Não vou tão longe quanto a sua mãe dizendo que Cláudio era um marido ideal, mas não acho que Alex seja muito melhor que ele.
—
— Você está muito calada e não é por causa dessas batatas, é?
— Acho que Alex pode estar me traindo.
— Mentira!
— Ele anda chegando atrasado do trabalho e às vezes o vejo trocando mensagens com essa tal de Ágata.
— Ele com certeza está te traindo!
— E teve aquele presente estranho que ele diz ser de uma aluna.
— Verifique as cuecas, veja se acha cabelos que não são da sua cor.
— O que eu faço?
— Clarinha, Clarinha, não seja bobinha, termine com esse cafajeste.
— Eu... Eu não consi... Eu não quero, conseguir eu consigo, mas eu não quero fazer isso. Além disso, eu nem tenho certeza de nada.
— Para mim está mais que claro que ele tem outra, o que, convenhamos, não é tão difícil.
— O que quer dizer?
— Clarinha, Alex não é nenhum modelo, mas dá pro gasto, não deve ser tão difícil para ele achar uma amante.
— Uma amante?
— Além disso, os gostos dele não são muito exigentes, considerando que ele está casado com você.
— Olha...
— Sem ofensas, meu bem, mas as cicatrizes destruíram seu corpo, você sabe.
— O grupo de autoajuda que eu frequento disse que isso é uma construção social.
— E as pessoas lá são atraentes?
— Por que eu estou falando com você?
— Não sei se gostei do seu tom, Clarinha.
— Des... Quer dizer, eu não quis dizer isso, apenas pensei alto, as coisas estão confusas e eu...
— Ouça, se for matar o Alex também, use algo diferente de água quente! É péssimo tirar pele derretida do carpete.
— Eu não matei o Cláudio.
— É claro que matou, você sempre disse que a culpa foi sua.
— Algumas pessoas me ajudaram a ver que não sou a culpada por tudo o que aconteceu, Cláudio provocou aquilo.
— Que pessoas?
— Os “feios” do meu grupo de autoajuda.
— Você ficou chateada como isso? Clarinha, você tem que ser menos sensível, sua mãe e eu vivemos falando isso.
—
— E então?
— Então...
— Vai terminar com Alex? Sua mãe diria que todo homem trai e que você deveria aguentar tudo calada, mas eu quero o melhor para você, acho que deveria pedir o divórcio.
— Eu não quero.
— O quê? Por quê?
— Eu amo o Alex, ele é a melhor coisa que já me aconteceu e me trata tão bem... Não posso abrir mão disso.
— O que pretende fazer? Dormir ao lado dele todas as noites sabendo que ele tem outras?
— É apenas uma.
— Queridinha, nunca é só uma, você acha que ele não vai trair a amante também?
— Talvez... Ouça, não vou terminar.
— Isso já está me dando dor de cabeça, quando a sua mãe souber...
— Sei como estou soando, mas eu prefiro continuar o tendo na minha vida não sendo a única do que simplesmente não o ter de jeito nenhum.
— Você é estúpida, Clara.
— Eu sei.
CENA 13 – PICANTE
— Certo, eu passo aí amanhã. No mesmo horário, não vou faltar dessa vez. Sim, sim. Vou levar o que me pediu. Não, Clara não sabe ainda. Entendi. Tchau, beijo.
•
— Quem era no telefone, amor?
— Da escola.
— O que queriam?
— Nada. Coisas do trabalho.
— Trabalho? Mas você disse que era da escola.
— Sim, por que eu trabalho em uma escola, lembra?
— Oh!
— Sim, "oh". O que está acontecendo, Clara?
— Com quem você estava falando, Alex?
— Uh... Sílvia?
— Isso é uma pergunta?
— Não tenho certeza se o nome dela é esse mesmo.
— Você não lembra o nome das pessoas com quem conversa?
— Clara, estou cansado. Falamos da Sílvia amanhã, sim?
— Não tem nenhuma Sílvia no seu trabalho, Alex; quem era no telefone?
— Como assim? Não se lembra da Sílvia?
— Responda, Alex.
— Sílvia é a secretária.
— E Ágata?
— Ágata é a... Espere, como sabe desse nome?
— Por que você não para de conversar com essa Ágata! E agora tem a Sílvia! Minha tia estava certa, são mais de uma.
— Sua tia Anitta? Por favor, você ainda conversa com essa mulher? Você sabe que ela me odeia, não é?
— Isso não é sobre ela.
— Não, vamos falar sobre as pessoas com quem você conversa também, como o fato de que nenhuma delas jamais aprovou nosso relacionamento e você nunca fez nada para defender a gente.
— Como assim as “pessoas com quem eu converso”? Então você admiti que conversa com Ágata e Sílvia?
— E se eu conversar? Seria tão ruim assim? Pelo menos elas não ficam fazendo minha cabeça para me divorciar de você.
— Não fazem? Elas sequer sabem sobre mim?
— Chega, não dá pra conversar com você assim.
— Alex, volte aqui!
— Não, eu vou sair dessa casa, estou cansado.
— Alex!
— Solta meu pulso, Clara.
— OU O QUÊ? VOCÊ VAI ME BATER COMO ELE FAZIA?
—
—
—
— Eu sinto muito, Alex, eu não quis...
— Você sabe que odeio quando me compara com ele.
— Eu sei... Sinto muito.
— Está tudo bem.
— Não está. Você é a única pessoa que sei que não me machucaria, não é justo eu descontar minhas inseguranças em você.
— Vem cá. Eu te amo, ok?
— Eu também amo você. Você ainda vai embora?
— Não, eu... Eu jamais te deixaria... Não para sempre., eu só ia tomar um ar...
—
— Pelos céus, Clara, você sabe que eu voltaria, certo?
—
— Meu amor...
— Podemos...
— O quê? Qualquer coisa que você quiser, querida.
— Podemos ficar vendo filmes ruins até dormimos? No sofá... Como no começo.
— Claro, querida. Vou pegar os cobertores, tudo bem?
— Tudo bem.
CENA 14 – MEL
— Eu sei que você está me traindo.
— O quê?
— Não precisa fingir, Alex; eu já sei.
— Mas eu não fiz nada.
— Alex...
— Não, sério, não faço ideia do que você está falando. E amorzinho, está no final do jogo, tem certeza de que é a melhor hora para isso?
— Sim.
— Clara...
— Eu não vou me desculpar por atrapalhar você de ver o seu jogo, eu não preciso me desculpar... Por isso.
— Sim, não precisa. Estou orgulhoso de você, as reuniões em grupo estão realmente ajudando, mas amor, o jogo...
— Alex!
— O que foi?
— Eu sei que você está me traindo e... Está tudo bem.
— Não estou traindo você. De onde tirou isso?
— De onde? Das... Das ligações, as mensagens, seus atrasos! Eu não sou tão estúpida quanto pareço.
— Você não é estúpida.
— Eu quero resolver isso.
— Querida, fale devagar. Venha, sente aqui no sofá e vamos conversar.
—
— Sério? Você está com medo de mim?
— Não estou, eu só não quero sentar.
— Tudo bem.
—
—
— Eu vou sentar porque eu quero!
— Ok. Confortável?
— Sim, estou confortável.
— Ótimo. Agora vou desligar a tv... Que está passando o jogo mais importante do campeonato...
— Alex.
— Certo, desligando a tv.
— Você não precisa narrar todos os seus movimentos.
— Eu não quero que você pense que vou fazer algum movimento inusitado e corra para longe.
— Eu não faço mais isso.
— Conte-me sobre a minha traição.
— Você não está levando isso a sério.
— Estou. Eu estou...
— Pare de rir, Alex.
— Certo, tudo bem.
— Eu sei que você está me traindo.
— Não estou.
— Alex, eu quero sabe como podemos resolver essa situação.
— A da traição?
— Então você admite que está me traindo?
— Não! Não estou. Clara, onde quer chegar com isso?
— Eu... Eu quero... Quero saber o que posso fazer para ser a única?
—
— Quer dizer, tem de haver alguma coisa. Algo que está te incomodando o suficiente para você ter uma amante e talvez... Talvez eu possa consertar? Não... Não posso dar um jeito na minha aparência, mas... Sabe como dizem, um saco de papel na minha cabeça pode...
— Pare.
—
— Você sabe o quanto me deixa triste quando você fala essas coisas?
— Eu...
— Clara, não estou te traindo.
— Não mente pra mim!
— Não, por favor, querida, escute. Não estou te traindo, mas se estivesse... Caso um dia eu cometa a decisão estúpida de te trair, quero que me mande embora dessa casa imediatamente. Você entendeu?
— Eu não faria isso com você.
— Clara, o amor não machuca. Está me dizendo que me ama tanto que estaria disposta a se submeter a isso apenas para continuar comigo? Isso é doentio, Clara, você não pode continuar fazendo essas coisas. Quantas coisas eu faço que você não gosta, mas você não me diz? Quantas vezes eu já te machuquei, mas você não disse nada porque não quer...
— Eu não quero te perder!
— Oh, querida, não chore, não chore. Aqui, deixe-me enxugar isso.
—
—
—
—
— Eu estou doente, não estou? Isso não é normal, eu não deveria me colocar tão pra baixo assim.
— Não, não é saudável, mas não é culpa sua. Eu também não ajudei, não sabia que você começaria a criar uma história assim na sua cabeça. Eu te amo, Clara. Não existem outras, só você.
— Quem é Ágata?
—
— Alex.
— Minha terapeuta...
— Você faz terapia? Desde quando?
— Eu...
— Alex...
— Você não é a única com inseguranças, querida. Estou tentando ser forte, por você, mas às vezes eu preciso de alguém para me ajudar... Alguém profissional.
— Por que não me contou? Eu poderia...
— Você já tem tantos problemas, eu não queria ser um deles.
— Sinto muito, Alex.
— Tudo bem, eu deveria ter contado. Só... Eu deveria ser a pessoa estável da relação.
— Está dizendo que eu sou instável?
— Não! É que... Você tem tantos problemas, e eu... Eu sinto que deveria ser a sua rocha, certo? Um... Um suporte.
— Você já é.
— Eu queria ser melhor, por você... E também por mim, eu... Acho que tenho mais problemas com meu pai do que queria admitir.
— Sempre falei isso.
— Eu sei...
— Sinto muito por ter duvidado de você. Sinto muito, eu também quero ser a sua base quando você precisar, não tem que ficar tudo nas suas costas, eu não sabia que eu estava te sobrecarregando tanto.
— Você não está, nunca, você me apoia tanto, Clara; você não imagina o quanto. Mas eu... Eu também preciso cuidar de mim.
—
—
— E quem é Sílvia?
— Eu falei, é a secretária... Da minha terapeuta.
— E o livro pornográfico?
— Não é sobre gravatas?
— Alex!
— Eu ganhei de uma colega, ok? Eu falei para ela parar, que os comentários que ela faz são estranhos, mas ela foi e me deu esse livro e estávamos em grupo e eu não soube como recusar e... Eu sinto muito, Clara; sinto muito mesmo.
—
—
— Amor... Acho que você está sendo assediado.
— É, acho que sim.
— Como você se sente com isso?
— Pequeno.
—
—
— Eu já a denunciei.
— Bom, isso é bom. Obrigada por me contar.
— Desculpa por demorar, eu só... Fiquei constrangido.
— Tudo bem. Posso te tocar?
— Claro, amor.
— Estou orgulhoso de você.
•
— Amor, acho que preciso parar de falar com a minha família.
— É sério? Querida, se isso for por conta do que eu disse, eu...
— Não é, mas... Você está certo, o que eu fiz... O que eu ia fazer era loucura. E elas deviam ter me dito isso, deviam ter ficado do meu lado.
— Nunca mais me deixe magoar você e fique em silêncio.
— Só se você não me esconder mais as coisas.
— É uma promessa, querida.
•
— Olhe, olhe, Clara! Uma borboleta!
— Vai matar ela também?
— Gosto de borboletas.
— Eu também.
— As abelhas sumiram, não é?
— Eu comecei a fechar as janelas.
— É mesmo? Achei que gostasse de abelhas.
— Elas me fazem mal.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro