Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

17. It won't be whiskey it won't be meth it'll be your name on my last breath


A água ainda estava correndo dentro do banheiro enquanto eu jogava tudo o que era meu dentro da minha mochila. Acabei achando seu canivete em um dos bolsos e encontrei também sua carteira. Peguei algumas notas, deixando outras. Eu só não peguei tudo porque ainda queria que ele pagasse Albert e Ruth, e eu esperava que ele fizesse isso, pelo menos para manter a simpatia falsa. Foi um dilema deixar ou não aquelas notas, mas o fiz. Eu ainda tinha um pouco de dinheiro da stripper do Kentucky.

A água continuava correndo e eu esperava que ela não parasse. Meu coração estava batendo tão forte que eu mal conseguia respirar. Eu queria encontrar sua arma, mas não achei. Ele a levou consigo pro banho? Faz sentido. Ele sempre esteve com sua arma, eu que fui burra o suficiente para me afastar da minha em alguns momentos. Saí do quarto sem fazer barulho. Por sorte, minha Chevy e sua caminhonete não estavam mais guinchadas, já que hoje ele ajudara Albert a colher as laranjas com a sua. Eu queria atirar em cada um de seus pneus, mas isso faria barulho e eu não sabia se a água do chuveiro continuava ligada lá dentro. Também, eu não podia gastar minhas balas com isso. Então peguei seu canivete e rasguei três dos seus pneus, para que ele não conseguisse somente trocar um pelo step. Eu queria rasgar os bancos, mas não daria tempo. E a caminhonete era bonita demais para isso, ela não merecia o dono que tinha. Então eu só chutei a porta com força e corri até minha Chevy, torcendo para que ela pegasse. Girei a chave uma vez e nada. Tirei a arma de dentro de minha bota e preparei minha mão para apertar o gatilho. Girei a chave de novo. Nada. Respirei fundo.
- Eu sei que você está brava comigo por ter te trocado por um tempo, mas vamos lá querida. Me ajuda! - sim, eu às vezes falava com a minha Chevy
Girei a chave de novo e ela pegou. Eu respirei aliviada.
- Boa menina! E agora seja ainda melhor e continue rodando até o primeiro posto de combustível que a gente encontrar, por favor.
Eu girei o volante com a arma entre meus dedos. Não acelerei no começo, eu sabia o quão barulhento podia ser meu motor. Olhei para o retrovisor e não vi nada. Melhor assim. Melhor ele só perceber que eu fugi quando eu estiver longe dali. Eu acelerei pela estrada de terra e nem me deu tempo de gostar, eu estava coberta de raiva. Cheguei ao portão e desci da Chevy para abri-lo com pressa. Acelerei, encontrando a estrada de asfalto, sem me importar em fechar o portão. Eu não sabia para qual lado ir. Eu não lembrava nem em qual estado eu estava! Mas eu não tinha tempo, então virei o volante para a direita e dirigi torcendo para encontrar um posto próximo. Eu não sabia o quanto ainda tinha no meu tanque e eu nunca fui de confiar no ponteiro do painel.

Dirigi procurando por uma placa, o que demorou para aparecer. Quando apareceu, vi que eu estava em Louisiana. Eu mal lembrava de passar na fronteira entre Illinois e Arkansas, quanto mais ter cruzado a fronteira do Arkansas com Louisiana! Será que ele planejava me levar para o Texas e depois para o México? Mas não faria sentido. Ele teria que dirigir até o Tennessee de novo para receber sua recompensa. Ugh! Que ódio! Continuei dirigindo por alguns minutos, tentando achar a entrada para Bastrop que a placa indicara, torcendo para minha Chevy não parar. Mas ela parou assim que eu avistei a entrada. Ela soluçou uma vez, na segunda vez eu já encostei no pseudo-acostamento da estrada e desci. Eu ia ter que buscar gasolina com algum galão, pelo visto. E primeiro comprar um galão, porque eu não tinha um. Que raiva! Bati a porta com mais força do que deveria ao descer. Eu quis chutar tudo à minha frente, mas não o fiz. "Tudo à minha frente" era minha Chevy, e eu era sou maluca de chutá-la. Então eu fui chutando o asfalto até a entrada de Bastrop. Uma cidade pequena que eu torcia que no mínimo tivesse um posto de gasolina. Andei chutando o chão com o bico de minhas botas por uns cinco minutos até perceber que continuava com a arma em meus dedos. Eu imediatamente a guardei dentro de minha bota. Eu sei bem como uma garota como eu andando por aí com uma arma na mão pode ser assustador em cidades pequenas, ainda mais ao anoitecer. E eu estava com tanta raiva que era perigoso eu dar um tiro no meu próprio pé. Literalmente, porque metaforicamente eu tinha descarregado toda minha munição nos meus próprios pés. Como eu consegui ser tão estúpida assim!?

Avistei a placa "Bem Vindo a Bastrop". Parecia uma cidade no estilo de Sweetwater: pacata, sem muito o que fazer, onde todo mundo se conhecia. A única coisa que faltava para ser igual Sweetwater era o pó de barro vermelho cobrindo as calçadas e os chapéus de cowboy. Andei mais um pouco, mas não consegui avistar nem sinal de um posto de gasolina. Estava tudo escuro, mal iluminado. Encontrei um homem andando pela rua, carregando uma vara de pescar. Respirei fundo e abri um sorriso, tentei me fazer o mais simpática possível e perguntei a ele onde havia um posto de combustível, tentando não assustá-lo. Ele me respondeu que tinha um virando à direita. Ele sorriu, eu me afastei depois de agradecer e antes que ele me perguntasse se eu era nova na cidade. Eu não queria que ninguém me visse, o que é complicado. Eu deveria ser invisível, mas tudo em mim causa estranheza aos outros. Tudo.

Ao chegar no posto, vi que não havia nem loja de conveniência. Havia duas bombas: uma de gasolina, outra de diesel. E havia um homem quase dormindo sentado em uma cadeira, com o boné caindo sobre seus olhos. Eu o chamei, disse "olá" umas três vezes. Ele só pulou da cadeira quando eu estalei os dedos à sua frente. Ele me olhou como quem viu um fantasma. Era um senhor, devia ter mais de 60 anos. Era escuro, da cor de chocolate mal amargo. Seus olhos arregalados eram amarelados e se destacavam em seu rosto.
- Olá, o senhor não teria um galão para me vender? Minha caminhonete parou de rodar bem na entrada da cidade - tentei ser simpática
Ele demorou um tempo para me responder, talvez ainda estava sonolento. Talvez estava me analisando.
- Olha, eu não sei se tenho não, mas eu posso ver... - ele levantou - Eu diria para você ir ali no Jimmy's, eles devem ter, mas acho que já estão fechados essa hora viu.
Depois de falar com um sotaque mais sulista que o meu, ele abriu uma porta, provavelmente um almoxarifado. A outra deveria ser um banheiro. Não havia loja de conveniência, não havia nem um cômodo com uma TV. Ele ficava no lado de fora. Não é de se assustar que ele estivesse dormindo.
- Sabia que deveria ter um, não está nas melhores condições, mas acho que funciona, né? - ele me mostrou um galão desbotado e velho
- Funciona sim! Quanto te devo?
- Somente a gasolina que você colocar nele, ué - e então ele riu - Eu não te cobraria por um galão velho desses não.
Eu agradeci e fui à bomba de diesel e comecei a encher o galão. Ele tentou puxar papo. Eu não dei nenhuma informação. Falei que estava de passagem, só isso. Meu lema agora era: não confie em ninguém. Ninguém. Eu errei uma vez, eu não ia errar de novo. Insisti e ele ficou com o troco, que deixei com ele para pagar o galão. Depois voltei a trilhar meu caminho de volta à estrada. Eu ainda estava com tanta raiva que meus dedos apertavam a alça do galão de plástico com força. Eu mal acreditava no papel de trouxa que eu tinha feito essas últimas semanas, ou esse último mês, eu mal lembro mais a conta dos dias. Meu rosto devia estar vermelho de raiva.

Alcancei minha Chevy ainda parada na beira da estrada e comecei a encher o tanque. Não era lá muito combustível, mas acho que serviria para alcançar o próximo posto. Um decente, onde eu pudesse comprar cigarro sem mostrar minha identidade. Senti cheiro forte de diesel depois de fechar o tanque e olhei para o asfalto. Eu havia feito um caminho de combustível enquanto eu andava, tudo isso porque o galão havia rachado e tinha sido "concertado" com fita adesiva. Então era por isso que ele não quis me cobrar nada por esse lixo. Liguei o farol de minha Chevy, vendo o rastro de diesel no asfalto. Busquei meu isqueiro dentro da mochila e coloquei a chama dele no papel da caixa vazia de cigarros. Eu podia ter queimado minha mão, já que um pouco de diesel estava na minha pele, mas eu não estava pensando direito. Com a ponta da minha bota, uni o caminho no chão, fazendo este ser contínuo. E depois simplesmente joguei o papel em chamas no asfalto. Não demorou para o fogo lamber todo os combustível. Uma fumaça escura se soltou no ar.

Desliguei o farol e fiquei observando o fogo, quase sem piscar. A estrada estava silenciosa, não havia passado um único carro ali desde que eu havia voltado do posto. O fogo deixava faíscas pelo ar. Enquanto meus olhos viam as chamas, meu cérebro trabalhava incessantemente. Eu queria queimar daquele jeito, talvez o fogo purificasse um pouco toda essa raiva dentro de mim, talvez eu explodisse. Puta que o pariu, eu mesma me avisava o tempo todo que eu estava sendo descuidada demais, eu mesma sabia que era tolice, mas eu o fiz mesmo assim. Eu deixei ele me tocar, eu deixei ele me ver sorrir, eu chorei na frente dele. Eu nunca soube que podia ser tão idiota. Ele conseguiu o que provavelmente queria de mim sem ao menos me forçar a nada. Eu me perguntava quando ele pretendia pegar sua recompensa, quando ele pretendia me entregar. Talvez os Amishes fossem seus cúmplices, talvez eles sabiam de tudo. Eles nem pareciam Amishes mesmo. Ugh. Como eu queria voltar no tempo e não ter parado naquele hotel para ajudá-lo. Eu deveria ter deixado aquela bala o matar.

E então eu decidi que estava cansada de me esconder. Cansada de interpretar outros papéis, cansada de ser covarde. O fogo estava mais contido, mas ainda estava ali quando eu arranquei com a Chevy, dando meia volta, indo a para o norte, de volta para o Arkansas, de volta para a fronteira com Mississipi, e seguindo para a fronteira com o Tennessee. Eu não ia mais fugir. Eu não ia deixar ninguém me capturar, eu mesma iria pegar essa recompensa.

A noite passou sem eu notar as horas direito, parando em postos de combustíveis, comprando cigarro e dando pequenos goles no resto do meu Jack enquanto pisava fundo no acelerador. Minha insônia rotineira transformou o sono em algo desnecessário aquela noite. E eu estava indo cada vez mais a norte, seguindo o rio. "100 milhas até Memphis, Tennessee", era o que dizia uma placa que avistei logo ao amanhecer. Eu nunca pensei em visitar Memphis, apesar de ser no meu estado. A ideia soou interessante, mas eu sabia que Memphis era grande, eu sabia que ia ter muita gente em todo lugar. É o lugar onde o Elvis morava, onde Jerry Lewis, Johnny Cash e Aretha Franklin começaram a carreira. É óbvio que era uma cidade grande. Eu sabia qual era o pensamento que estava me incomodando. "E se eu travar? E se eu ficar completamente perturbada e sem ação no meio de tanta gente?". Eu mal sabia que tinha isso semanas atrás. Quer saber? Isso é estupido. Eu não tenho nada disso, é coisa que ele colocou na minha cabeça. Eu não tenho "ataque de pânico", "ansiedade social", eu não vou ser cobaia de nenhum pseudo-psicólogo, eu não vou deixar um psicopata me rotular. Eu vou pra Memphis e acabou.

Mais ou menos uma hora e meia depois, lá estava eu, avistando a entrada pra Memphis. Eu não hesitei ao dar minha seta para entrar. Eu sentia que havia algo diferente ali, um lugar singular, diferente de todos os outros. Eu via isso pelas pessoas que comecei a ver, pelos carros, pelas placas. Era cedo, mas havia bastante movimento. Eu comecei a ver as casas se transformando em lojas, que se transformavam em prédios de vários andares, que por sua vez se transformavam em prédios gigantescos. Havia neons. Muitos neons ainda apagados. Eu respirei fundo, sem querer imaginar aquela cidade de noite. Também havia uma ponte gigantesca cruzando o rio. Era tudo grande. Era muita gente. Como é que alguém consegue não se perder em um lugar tão grande? Eu me perguntei se devia ou não voltar para estrada quando parada em um sinal vermelho. Mas não, meu orgulho era maior. Eu ia conseguir sobreviver pelo menos uma noite em uma cidade grande.

Foi difícil conseguir achar uma vaga. Rodei e rodei e rodei até ter a sorte de achar um cara saindo. A vaga não era lá muito grande, mas eu era boa de volante. Eu andei e me deparei com a rua Beale. Era minha sorte ainda estar de dia pois os letreiros neon ligados iam com certeza me cegar. Eram muitos, a maioria pertenciam a lojas de discos e bares de blues. Fui andando reparando nas vitrines, sem pressa. "Memphis, o berço do rock & roll", dizia uma placa dentro de uma loja de disco. Resolvi entrar, não era como se eu tivesse alguma coisa mesmo pra fazer. E eu estava cansada de dirigir.
- Olá, em que posso te ajudar? - um senhor com um óculos grande e quadrado me perguntou
Ele tinha uma argola na orelha e uma barba meticulosamente aparada e desenhada.
- Ah, eu só estou olhando mesmo - eu falei meio baixo
- Qualquer coisa me avise - ele falou sem sorrir, me encarando
Eu olhei para o lado, tentando disfarçar meu incômodo procurando por algum vinil. Não, Freedom. Acho que ele não tem cara de ser um trapaceiro em busca de dinheiro. Ele não pode ter te reconhecido. Ele talvez mal saiba quem você é... Bom, mas eu estou no Tennessee de novo. Qualquer cuidado é pouco. Comecei a prestar atenção nos vinis que eu estava em mãos e fiquei confusa. De onde saíram esses artistas? Eu vivi sobre uma pedra esse tempo todo? Olhei para as capas penduradas pela loja e a única coisa que me foi familiar foi o vinil do Johnny Cash. O que tinha "A Boy Named Sue", aquele que estava agarrando. Eu até podia levar um novo, mas eu não tenho nem mais minha casa, quanto mais um tocador de discos. Então eu suspirei, saindo da loja. O senhor me disse tchau. Viu? Era tudo coisa da minha cabeça. Aqui é Memphis, acho que eles têm mais com o que se preocupar do que com uma garota supostamente desaparecida no jornal.

Continuei andando pela Beale St, tentando não ser notada. E pelo visto consegui, a rua estava começando a ficar mais cheia, mas todo mundo parecia ocupado demais para me notar. Talvez estavam acostumados com turistas. Dentro do estabelecimento, que eu acho que era um bar, vi um pôster em homenagem a Martin Luther King. E dizia que ele tinha morrido ali, em Memphis, mas seus sonhos iam permanecer pra sempre. Eu encarei o poster, eu já tinha ouvido falar desse nome, mas nunca soube quem era. Talvez fosse porque nasci em Sweetwater, onde a população é quase toda branca. Talvez porque eu larguei a escola na quarta série. E foi aí que eu vi que aquele lugar tinha história para cacete pra contar, ninguém sequer se interessaria pela minha. Essa sensação de ser desimportante acalmou um pouco meu pânico.

Andei calmamente até mais ou menos a hora do almoço. Eu estava ficando cada vez mais nervosa ao ver cada vez mais gente ao meu lado. Qual é, Freedom? Você não vai provar que ele estava certo sobre você. Respira fundo. Acabei entrando em uma lanchonete e pedindo um hot dog e um refrigerante para viagem. Avistei uma praça em uma esquina da Beale St e me sentei debaixo de uma árvore. Eu não estava sozinha, algumas pessoas também estavam na grama, deitadas, jogando conversa fora. O hot dog era gigantesco e eu já não estava com tanto apetite assim. Olhei para o lado para ver se eu avistava um cachorro para o qual eu pudesse doar o resto do meu almoço e acabei achando um no colo de um morador de rua encostado em uma outra árvore da praça.  

Aproximei-me dele devagar e sentei debaixo da mesma árvore, mas ainda mantendo um pouco de distância. Eu estendi meu braço na altura de seu rosto, oferencendo o hot dog. Ele me olhou com os olhos arregalados, até afastou seu corpo.
- Isso caiu no chão, né?
Ele disse com uma voz alta, descoordenada. Parecia que tinha se desacostumado a falar com outro ser humano e não sabia mais que volume usar. Seu tom também era agressivo, mas eu não o culpava. Eu dei uma mordida a mais no hot dog, mostrando que não tinha caído do chão nem estava envenenado nem nada do tipo. Ele então, ainda desconfiado, o pegou de minhas mãos. Dividiu a metade que eu lhe havia oferecido em mais dois pedaços e deu um para o cachorro em seu colo, que devorou sua parte em segundos. Eu achei um ato bonito, mas não disse nada. O homem tinha o rosto sujo, as unhas pretas, os dentes tortos. Eu não sei o que eu estava sentindo. Não era pena, era mais curiosidade. Curiosidade em saber como ele chegou a esse ponto. Mas eu apenas fiquei olhando-o, sem dizer nada.

- O que foi? - ele falou agressivo, cuspindo um pouco do hotdog - Por que tá me olhando?
- Nada - resolvi não matar minha curiosidade - Qual o nome dele? - me referi ao cachorro
- Dela! O nome dela é Zizzy!
- Bonito nome - eu apenas sorri
Ele estava confuso. Por que é que tinha uma pessoa falando com ele? Sentando ao lado dele? Ainda mais uma menina com cabelo estranho. O que é que eu estava querendo!? Nem eu mesma sabia. Talvez eu o achei parecido comigo. Acho que nós éramos os únicos que parecíamos que não pertencíamos naquele lugar, naquele mundo.
- Ela é a única mulher que me ama! A única! - ele falou ainda alto demais e abraçou a cadela em seu colo
Acho que isso respondeu minha curiosidade. Tinha alguma mulher no meio.
- Aquela outra! Ela nunca nos mereceu, Zizzy! Nunca! - ele continuava abraçado, a cadela estava parada
- Ela quem? - ousei perguntar
- Minha ex-mulher! - ele falou alto mais uma vez - Ela me traiu, ficou com meu carro, minha casa, quase todo meu dinheiro, meus filhos, mas pelo menos eu fiquei com a Zizzy, não é, Zizzy? - ele abraçou a cadela ainda mais forte
Eu não sabia o que dizer por um momento. Eu não tinha intimidade nenhuma - obviamente - para dizer a ele que sua ex-mulher era uma completa vagabunda.
- Bom, mas você tinha um emprego, certo? Te mandaram embora?
Ele levantou uma de suas sobrancelhas.
- Eles disseram que eu estava sem condições de trabalhar - ele falou desconfiado - Quem é você? Você é algum neto meu? - ele voltou a falar alto, agressivamente
Ele estava cego ou eu realmente estava parecendo um moleque? Não era muito difícil eu me parecer masculina por causa do meu jeito, mas ninguém nunca tinha me chamado de homem.
- Não, eu não te conheço, não sou seu parente, nem nada - falei amigável
- Então por que está falando comigo? O que você quer? Eu não tenho nada!
- Porque, se você olhar em volta, nós dois somos aqueles que não se encaixam nesse lugar.

Enquanto ele pensava, eu pensei também comigo mesma. Ele perdeu tudo por causa de alguém, por ter se relacionado e confiado em alguém que não sentia o mesmo, alguém que o traiu e arrancou tudo dele. E ele foi fraco e deixou ser derrotado. Eu quase me deixei ser derrotada também, eu confiei em quem não devia, eu quase perdi tudo. Mas o que me confortava é não ter deixado minha mãe seguir o mesmo caminho.
- Você lembra do nome dos seus filhos? Eles sabem que você está assim?
- Eu... Lembro. Mas eles nem devem querer saber de mim.
Eu imaginei milhares de coisas. Talvez os filhos fossem pequenos, talvez a vaca da mãe tenha contado uma outra versão dos fatos, talvez tenha contado que ele morreu.
- Você sabe onde encontrá-los? Se sim, procure-os. Você não perdeu tudo.
Ele não falou nada e eu me perguntei por que é que eu estava dando conselhos para um mendigo? Ficamos calados, ouvindo as pessoas rindo do outro lado da praça. Algum tempo se passou e eu percebi que ele estava querendo me dizer alguma coisa, mas não encontrava as palavras. Eu então olhei para ele, tentando mostrar que ele podia falar o que quisesse.
- Você acha mesmo que eles vão querer me ver? - ele disse, sem o tom agressivo, sem embolar muito as palavras, sem falar alto demais
- Acho. Mas tome um banho e escove os dentes primeiro, só para garantir. Ah, e leve a Zizzy. Cachorros ajudam as pessoas a se comunicarem melhor.
Ele não sorriu. Apenas acenou a cabeça. Eu podia ver todas as minhas palavras passando pela sua mente. Passou-se mais um tempo, já estávamos no meio da tarde e eu só observava o trânsito passando pela rua. Memphis me chamava de turista, de intrusa, sem nem mesmo falar uma palavra. E então ele se levantou, levando Zizzy consigo. Não disse tchau, nem nada. Apenas acenou com a cabeça. Eu não merecia nenhum agradecimento, afinal de contas. Eu era apenas uma maluca que tinha parado para saber um pouco da vida de um estranho e ainda dizer o que ele deveria ou não fazer.

Eu não gosto muito do verão. Não é por causa do calor insuportável do Tennessee, ou por causa dos insetos, ou por causa da obrigação de sair de casa e ser feliz que as pessoas têm quando Julho começa. Era principalmente porque demorava muito para anoitecer. Minha insônia ficava ainda mais forte porque o sol só se punha lá para as nove da noite e a cada dia ele só se punha mais e mais tarde. Então eu não sabia que horas eram, mas os neons da Beale Street já estavam todos ligados e rua já estava bem mais cheia do que antes. Eu então me levantei da grama, desencostando minhas costas já cansadas do tronco da árvore. Minhas pernas estavam marcadas de tanto ficar sentada. Eu tinha ignorado a minha fome, mas meu estômago parecia estar querendo me matar de dentro pra fora.

Fui andando em direção ao caminho que fiz quando cheguei aqui. Talvez eu podia repetir o hot dog do almoço no jantar. E eu tentava não me incomodar com as pessoas ao meu lado, eu tentava ignorá-las, estava tentando me focar em achar a droga da lanchonete. E então eu reparei nos neons e eles brilhavam tão forte e de repente eu não conseguia mais ver o que estava escrito deles, tudo ficou borrado em tons fortes de amarelo, azul, vermelho, verde e roxo. E alguém esbarrou no meu ombro e eu olhei em volta. Um carro tentava passar, as pessoas iam e voltavam pela rua, cada uma em uma direção. E eu estava parada. E minhas mãos se fecharam em um punho. Não, Freedom, não. Ele não estava certo sobre nada, muito menos sobre isso. Continua andando, continua tentando achar a lanchonete. Mas tudo o que eu via ao meu redor eram rostos, rostos com diferentes expressões, uns me encarando por estar parada. E outra pessoa esbarrou no meu outro ombro. E meu coração batia forte, e eu não sabia mais respirar. E eu não sabia mais se continuava andando, se dava meia volta, mas havia pessoas em todos os lugares e havia música e havia vozes e havia buzinas e havia eu, perdida, no meio da calçada, sem me lembrar de como andar, de como pensar. 

- Anda, garota! - um idiota foi grosso comigo e eu não consegui pensar em nada para responder

Dei um passo estranho ali, outro acolá. Deixei as pessoas me guiarem, sem saber para onde eu estava indo. Eu só queria sair daquela rua, mas onde eu estacionei minha Chevy? Em qual esquina? Eu não lembrava. E, de ficar parada, eu passei a correr e realmente esbarrar em todo mundo. Eu estava ofegante quando virei uma esquina e virei outra e achei o vermelho desbotado da minha Chevy. Eu me tranquei dentro dela, encostei minha testa com cuidado no volante e deixei todas as lágrimas saírem de dentro de mim, deixei o aperto sair do meu coração. Ele não estava certo, ele não estava certo, eu não tenho problemas, eu não tenho problemas. A quem eu estou tentando enganar? Ninguém reage assim. Eu era a única ali apavorada, para todas aquelas outras pessoas era apenas uma noite normal. Eu olhei para a frente, vendo o céu ficar cada vez mais rosa com o pôr do sol de verão, mas eu via borrões pois meus olhos estavam transbordando de lágrimas. Como eu posso ser tão forte para algumas coisas e tão fraca para coisas tão banais?

Minha testa já devia estar marcada com a textura do volante, meu nariz estava entupido e eu tinha que respirar com a boca, eu sentia meus olhos pesados. Mas eu não queria levantar a cabeça, eu só queria ficar parada e não pensar em nada por um tempo. Porém, como as coisas não estão acontecendo como eu desejaria, ouvi um barulho na janela do passageiro. Alguém batendo algo contra ela. Não levantei o rosto para ver o que era.
- Abre a janela e passa tudo o que tiver! - ouvi uma voz abafada falar, do outro lado do vidro
Eu tive vontade de rir. Passar tudo o que eu tiver? Esse ladrão escolheu a pessoa errada por dois simples motivos: eu não tinha quase nada e, uma das poucas coisas que eu realmente tinha era uma arma. Arma que eu alcancei devagar, tirando-a de dentro do cano da minha bota, ainda sem levantar o rosto. Eu não queria olhar pra cara de ninguém. 

O ladrãozinho tentou abrir a porta. Eu quase ri de novo. Ele tentou abrir a porta que eu raramente uso e que, consequentemente, está emperrada. Eu sei o jeito certo de abrir e não era nada parecido com o que ele estava tentando fazer.
Então, com meu rosto ainda afundado no volante, tirei a arma da bota e apontei para a direita, para a janela do passageiro.
- Dá o fora! - eu falei, grosso e alto
Eu não ouvi mais nenhum barulho depois daquilo. Uns cinco minutos depois, olhei e vi que não havia mais ninguém ao redor. Eu limpei meus olhos, coloquei a arma de volta à minha bota e resgatei meus óculos escuros. Era noite, mas não queria que ninguém visse meus olhos vermelhos e inchados. Peguei algumas moedas que eu havia recebido de troco no almoço e abri o porta luvas, procurando por um papel amassado de semanas atrás. Achei. Não me impressionei quando vi que o número de telefone estampado no papel era o número da minha antiga casa. Fazia sentido, afinal de contas.

Saí da Chevy, evitando passar pela Beale Street e parei no primeiro telefone público que achei. Coloquei uma moeda e disquei o número. A voz que narrava meus piores pesadelos atendeu. Eu tinha planejado o exatamente o que falar, mas, mesmo assim, fiquei quieta por uns segundos, tentando não me exaltar, tentando não dizer tudo o que eu tinha entalado na garganta.
- Estou com a garota - eu falei, fazendo minha voz ficar grave
O fato de eu estar rouca de tanto chorar ajudou a disfarçar minha voz.
- Prove - ele respondeu, ele sabia do que eu estava falando
E então eu respirei fundo e fiz alguns gemidos, como se eu estivesse com a boca amarrada. Depois eu soltei alguns palavrões e voltei a fazer os gemidos. Era como se alguém estivesse me amordaçado e soltado apenas para que eu pudesse falar alguma coisa e depois tivesse tampado minha boça de novo. Era crível. E, afinal de contas, era minha voz, era o tipo de palavrão que eu diria a qualquer um que tentasse me prender.
- Amanhã. Traga ela até a Old Highway, um pouco antes da Craighead Rd. É bom que ela esteja inteira. Sete em ponto.
Eu quis vomitar. O que eu era? Um pedaço de carne que ninguém poderia cortar e assar senão ele? Pensei bem no horário, eu teria que pegar a estrada agora. E eu não estava lá muito afim. Talvez eu não quisesse ver sua cara assim tão cedo.
- Quatro. Da tarde.
Silêncio na outra linha.
- Seja discreto. Seu pagamento só vai ser acertado depois.
- Cinco mil. Em dinheiro. Eu dou a garota com uma mão, pego o dinheiro com a outra.
Mais silêncio. Eu tentava não respirar muito forte.
- Amanhã às quatro.
E então ele desligou. Eu soltei a respiração que estava prendendo. Foi como ter acabado de sair de um desabamento de terra e ter ficado sem ar por minutos. Eu sentia meu corpo tenso. Sentia tudo doer. Mais estressante que isso só o que vier a acontecer amanhã. E eu pago para ver ele arranjar cinco mil de recompensa para entregar à própria procurada.

Música do Capítulo 17: Better Dig Two - The Band Perry

Playlist completa de FLB no Spotify: Clique em Link Externo/External Link aqui embaixo!

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro