10. wish you were here
Luka teve um pesadelo muito real. Talvez porque não tenha sido um sonho. Foi mais uma lembrança.
Enquanto caminhava até a escola ao lado da irmã, ele só conseguia visualizar a cena rodando em sua cabeça:
8 anos atrás
Ele devia ter dez anos. A irmã tinha nove. Os dois estavam trancados no quarto da outra casa em que viviam lá na Escócia. Havia sido uma daquelas noites onde ambos não conseguiam dormir e apenas conversavam. O assunto geralmente era o pai.
— Você acha que a mamãe aceita a gente de verdade? — Juleka perguntou. Ela estava deitada na cama e o irmão sentado ao seu lado tentando fazer um acorde no violão. Devido a pouca luz era complicado.
— Ela é a pessoa mais compreensiva que eu conheço. Você sabe como a mamãe é, toda cheia de espírito livre, diversão, amor — ele deu de ombros. — Diferente do papai.
— Ele me chamou de aberração — resmungou ela. Os olhos da morena iam começar a marejar.
— Melhor não falarmos dele. A situação já está ruim — Luka tocou mais um acorde. A mãe de ambos já devia estar dormindo. Tinham passado tantas noites escutando os pais brigando até tarde, muitas vezes até acordando a mais nova, que começava a chorar sem entender o que acontecia. Luka teve que aprender cedo a cuidar da menina.
— Mas sério, você é incrível. É menina mais corajosa, inteligente e linda que eu conheço!
— Não fala besteira — ela bateu nele com o travesseiro. — Acha que um dia ele vai voltar, Luka?
O menino assumiu um semblante sério e de raiva. Depois de ser um péssimo pai, marido e pessoa, além de deixar a família sem se importar com ninguém, quanto mais aquele homem estivesse longe, melhor.
— Não.
— Mas nós também vamos embora.
— É um novo começo. Conhecer pessoas novas, ein? A França vai fazer bem pra mamãe e pra nós — era verdade. Os três não tinham mais nada os ligando ali. Luka ouviu a irmã fungar e apertou os olhos para enxergá-la melhor. — Ju, você tá chorando?
Ela estava. Lágrimas quentes não paravam de rolar seu rosto. Ela era tão nova e pequena, não entendia tudo o que estava acontecendo.
Luka apertou os lábios e começou a tocar a música que treinava há meses, ainda meio fraco e desajeitado.
— Então, então você acha que consegue distinguir o paraíso do inferno? Céus azuis da dor? — ele cantou lentamente, tentando acompanhar os dedos. A irmã sabia aquela canção. O pai costumava cantar.
— Um sorriso de uma máscara? Você acha que consegue distinguir? — ela cantarolou sem saber se ria da letra ou chorava por saber que nunca mais veria o pai que mal a conhecia.
Hoje
Foi uma noite importante, Luka pensou, voltando para a realidade. Talvez Ju tenha crescido um pouco mais ali no pequeno quartinho frio. Aprendeu que o pai deles nunca foi um bom homem e pai e não devia ligar para o que pensavam dela. O jeito de se vestir e falar eram características únicas da Couffaine. Luka sempre a dizia "você é linda e eu te amo muito".
O sinal da primeira aula tocou e todos os alunos iam para suas devidas classes.
Ele deu um tchau para a irmã e andou para o corredor até a aula de física. No caminho viu um pequeno vulto loiro passar quase despercebido na multidão que se dissipou.
— Ei! — Luka chamou. Adrien fez uma cara engraçada quando bateu os olhos nele e sorriu. O loiro indicou o caminho com a cabeça. Luka o seguiu pelos corredores.
Adrien e Luka foram até os fundos da escola onde havia apenas o estacionamento. Estavam sozinhos e não ligavam se a aula tinha começado.
— Oi. Como foi o evento ontem? — Luka mordeu o lábio e segurou a mão dele.
— Foi legal no começo, mas eu queria ter ficado em casa. Acabou sendo chato.
Luka deu um sorriso de canto e analisou o rosto de Adrien mais uma vez, vendo os olhos verdes brilhavam de ansiedade. Adrien se encostou na parede e o moreno o beijou, no início foi tímido, mas o loiro deixou-se levar até querer beijá-lo de novo.
Adrien sentiu um arrepio quando Luka encostou os lábios por todo o seu rosto, tentando tirar os cachos loiros e abrindo espaço para um beijo macio no lóbulo da orelha.
— Luka, ninguém pode saber — ele interrompeu, falando sem fôlego, apesar do sorrisinho no rosto. Ele gostava de sentir o cheiro do cabelo escuro dele enquanto os fios faziam pequenas cócegas no nariz.
Mas Adrien estava preocupado com isso, até porque Luka não tinha medo de falar sobre a sexualidade e se esconder era algo terrível. Luka queria tanto segurar sua mão e andar por aí, mostrar para todos que realmente gostava dele.
O moreno olhou para baixo por alguns segundos com um bico, que seria até engraçado se lá no fundo não estivesse com o coração meio partido. Ele voltou-se para Adrien.
— Ok. Por você eu faço — e apertou o nariz dele e viu seus lábios inchados pelo beijo. Adrien tinha algumas marquinhas escuras espalhadas pelo pescoço e ele amava aqueles simples detalhes.
— Por que você gosta de mim, Lu? — Adrien perguntou e o moreno riu sarcástico.
— Você faz muitas perguntas, Agreste — Luka acariciou os fios dele e se aproximou mais ainda, perto o suficiente para sentir seu perfume deliciosamente caro. — Gosto de falar com você, de te beijar, rir das suas piadas sem graça e simplesmente ficar do teu lado. Precisa de mais motivos? Se não se importa, eu quero muito beijar você agora. Podemos conversar depois.
Adrien virou o rosto para o lado sentindo as bochechas ficarem vermelhas e riu. De vez em quando fazia piadas tão sem graça que acabavam cômicas, mas só fazia isso com pessoas próximas e Marinette e Nino conseguiam provar aquilo depois de anos convivendo com o mesmo.
— Eu vou me atrasar pra aula.
— Você já está atrasado — Luka rebateu e revirou os olhos. Mas o garoto estava mesmo ansioso. Ele arrumou a mochila nas costas e arregalou os olhos como os do gato de botas, sendo irresistível é fofo demais para Luka recusar. Couffaine tentou não dar atenção e soltou um suspiro frustrado. — Tá, mas você está com o carro hoje?
— Sim. Por quê? — o sorriso vitorioso escapou dos lábios quando viu a expressão triste do outro.
— Minha mãe vai ficar fora trabalhando a tarde e a Ju está um pouco mal hoje — o guitarrista pegou a mochila do chão e umedeceu os lábios. — É problema com o meu pai. Ele deixou a gente mais ou menos nessa data há uns anos. Elas não gostam de falar disso.
— Não vou forçar vocês a me contar. É bem pessoal e entendo.
Luka respirou fundo e acenou com a cabeça, agradecido.
—Eu deixo vocês em casa, não se preocupe — ele acariciou a bochecha dele, que agradeceu repousando a cabeça em seu peito e fechando os olhos. — Vou ficar de olho na Juleka caso ela fique triste ou precise de alguma coisa, que tal? E se quiser conversar...
— ... Eu te ligo. Já sei — completou a frase com um sorriso e beijou a bochecha de Adrien. — Merci. Precisamos ir para a sala senão podem ligar pro seu pai ou pior.
O loiro assentiu ainda vendo os olhos azuis e tristes de Luka. Ele sabia que o pai era um assunto delicado, então se o mesmo quisesse conversar diria algo.
Antes de irem para caminhos diferentes, Luka deu uma piscadela para ele e dobrou à direita no corredor. A última coisa que Adrien viu fora seus fios roxos se distanciando cada vez mais.
. . .
Marinette queria chegar rápido em casa para terminar um trabalho de literatura. Estava cheia de coisas para fazer, além de se preocupar com o comitê de decoração do baile também seria babá no dia seguinte e, sinceramente, não estava com cabeça para isso.
A chinesa dobrou a rua vendo o estacionamento da escola. Alguns vultos percorriam o local e ela ouviu gritos com mais zombaria e risos, chamando-lhe atenção. Marinette tirou os fones de ouvido e apertou o fichário contra o peito observando a cena: jovens talvez mais velhos ou de outras turmas cobrindo alguém deitado no chão de costas para a parede. Ela não conseguiu ver bem quem era de início ou o que faziam, mas certeza que não era bom.
Alguns alunos da escola eram mesmo rebeldes, até mesmo criminosos e filhinhos ricos que adoram se aproveitar dos outros. Aqueles em particular andavam em grupo como sempre, cheios de piercings, tatuagens e possivelmente fumando.
Marinette chegou mais perto da grade que a separava do estacionamento, estreitou os olhos para ver quem aqueles embustes perturbavam dessa vez.
Quando viu a menina magra em roupas pretas, longos cabelos pretos de mechas roxas soube no exato momento que era Juleka, a mesma que vira sair da sala dez minutos atrás.
Marinette sabia que era um dia ruim para ela. Ju sempre foi meio quieta e cabisbaixa na escola, mas aquele dia estava pior como nunca. Adrien, Rose, Alya, até mesmo Chloé tentaram animá-la um pouco. Pelo visto o dia estava para piorar muito mais.
Ela correu para o outro lado de volta à escola. Não podia impedir que fizessem algo com a amiga, não sozinha. Eles tiravam sarro de Juleka e a prenderam contra a parede. Ela viu como a menina tremia e escondia o rosto entre as mãos em choro.
Buscando ajuda, a chinesa tentava não escorregar os tênis no corredor liso da escola. Ela entrou no vestiário feminino e não viu ninguém. Correu para o masculino, foi na direção da sala de música até finalmente achar alguém.
— Luka! — disse ofegante, abrindo a porta de madeira. O moreno já tinha tentado ligar desesperado para a irmã por vários minutos, e, quando viu a amiga com o semblante nervoso já soube que algo estava ruim. Marinette falava gaguejando e sem fôlego. — A sua irmã tá lá atrás... Eles estão... Nós precisamos.
— Merda. Vamos!
Ambos correram no rumo do estacionamento pelos corredores vazios. No meio do caminho Adrien apareceu com a expressão confusa.
— O que aconteceu?
— A Juleka!
O loiro arregalou os olhos e os seguiu no rumo do local. O três pararam, pisando a sola do tênis no asfalto não tão quente. Luka percorreu os olhos por entre os carros lá até ouvir um choro baixinho ali perto.
Foram até o centro da confusão vendo cinco alunos rindo da irmã encostada na parede em prantos.
— Saiam de perto dela. Agora! — Luka disse alto o suficiente para desviarem a atenção dela para ele. O menino cerrou os punhos com força e fúria nos olhos azuis quase escuros de tanta raiva acumulada.
— Olha só, chegaram as outras bichinhas — um deles disse com desgosto, fazendo os amigos rirem. — Não basta a irmã ser uma sapata e andar por aí como você também sair se achando O cara da banda! — desviou os olhos dele para Adrien e Marinette furiosos. — E esse seu exército, ein? Aquele ali é seu namoradinho? Ah, esqueci que você é um indeciso. Ou seria a japinha sua nova boneca?
— Cala a boca — Marinette se pôs na frente de Luka que estava vermelho de raiva. Eles viram o rosto de Ju com hematomas roxos. — Sua boca sempre foi uma metralhadora de merda, Nooroo.
— Não tô nem aí, garotinha — ele disse cuspindo as palavras. Juleka se levantou com dificuldade e se apoiou nos braços da menina. — Deve ser coisa de família. Seu pai te ensinou a ser bicha, Luka, e depois foi embora para bem longe, não é?
— Fala mal da minha família de novo e você morre, Nooroo! — ele chegou perto do moreno, trincando o maxilar e bufando.
Adrien segurou Juleka. Não sabia o que fazer em situações como aquela, pois nunca esteve em uma. Odiou como aquele garoto dizia tudo sem o menor esforço ou ressentimento. Quis muito bater nele aquele momento.
— Vão embora— Luka disse para os outros em um sussurro. Ele segurou a camisa do garoto com força, o impossibilitando de respirar. — Já fiz da sua vida um inferno uma vez, Noo, e não vai querer isso de novo. O trato foi de você me deixar em paz e a minha irmãzinha também. Ou quer levar mais um soco, ahn? Agora não diz nada e se acha o valentão! Depois eu sou a bicha.
Couffaine o largou no chão e lançou um olhar de raiva para os outros atrás.
— Vamos.
E assim saíram caminhando na direção do carro de Adrien. Nooroo estava todo roxo por não respirar direito e com dor nas costas, mas mesmo assim mostrou o dedo do meio à medida que se afastaram.
Adrien deu partida no carro e tremeu de medo. Marinette sentou no banco da frente vendo os irmãos atrás se abraçando.
— Eles chegaram e começaram a me xingar e não me deixaram sair — Juleka disse entre soluços. Luka tirou seu cabelo da frente do rosto para ver os hematomas e a beijou, também quase prestes a chorar. — Sinto muito. Vocês não precisavam ter feito aquilo.
— Não fez nada de errado, Ju — Mari disse olhando pelo espelho. — Eles que são uns babacas. Mas somos seus amigos e vamos te ajudar. Vou dar um jeito!
— Eles me chamavam de aberração — a menina murmurou. O coração do irmão se partiu.
— Mas estamos aqui — Adrien conseguiu dizer depois de minutos em silêncio. — Vamos superar tudo juntos, ok?
Luka encontrou os olhos verdes do loiro pelo espelho em agradecimento. Ambos sabiam que um dia tudo viria à tona e mesmo com todo o preconceito e medo, estariam juntos. Couffaine não soube o que dizer, mas o amou mais naquele dia.
— Preciso falar com a Rose depois — disse ela e encostou a cabeça no ombro do irmão, que apertou forte sua mão. — E com a mamãe.
Minutos de silêncio nunca pareceram tão confortantes naquele momento, mas Luka começou a cantar lentamente a música que eles conheciam desde pequenos.
— Como eu queria que você estivesse aqui. Nós somos apenas duas almas perdidas, nadando num aquário, ano após ano — ele cantou lentamente, como uma canção de ninar e acariciou o cabelo de Ju. Ele a amava tanto.
. . .
E aí gente? Consegui postar no dia certo dessa vez.
O que acharam desse capítulo? Eu quis mesmo fazer algo assim, porque nem tudo é um mar de rosas né :(
Infelizmente acontecem coisas piores com muita gente no mundo, então vamos espalhar amor, aceitar as diferenças e sermos gentis acima de tudo!
Foi bem focado na Ju e no Luka, mas vou mostrar um pouco mais dele nos próximos capítulos (e vai ter uma participação especial hehe).
Ah, cês acreditam que eu já terminei de escrever a fic? Ta tudo pronto já e olha... Digo nada kkk aguardem. Ficaram 19 capítulos no total.
A música que eles cantam é Wish You were here do Pink Floyd. No começo é só o violão e o final eu só sei chorar mesmo kkkkkk gente essa música acaba comigo pq só lembro do Luka.
Um beijo e até semana que vem! <3
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