
CAPÍTULO 15
Peter me buscou depois do trabalho. Era segunda-feira, e já fazia alguns dias desde que começamos um relacionamento. Não o vi durante sábado e domingo, então posso dizer que estava louca para beijá-lo.
Era engraçado como admitir meus sentimentos por Peter acabou me deixando mais leve, e um pouco ansiosa quando estava perto dele. Antes eu desejava distância de Peter, mas agora tudo o que mais quero é ele por perto.
— Quero que vá assistir meu jogo — ele falou quando já estávamos no campus caminhando até nosso bloco.
— Quando é?
A mão de Peter aquecia a minha, era reconfortante. Fica até difícil de pensar em qualquer outra coisa que não o contato de nossas peles.
— Depois das audições do festival. Combinei com meus amigos de irmos direto para o campo depois disso. Você poderia vir com a gente — propôs.
— Você e seus amigos? — não transmiti muita confiança em minha fala. Conhecer os amigos do Peter, aquilo me dava medo.
— Eles vão gostar de você, eu prometo — me tranquilizou. Ele parecia ter lido minha mente.
Entramos no Franz Hall e Peter me acompanhou até a porta da minha sala. Como ainda tínhamos alguns minutos, ficamos do lado de fora conversando.
— Mas... e a Darla? — eu não queria fazer aquela pergunta, mas precisava saber se aquela garota estaria lá também. Talvez eu não tivesse coragem de enfrentá-la, não ainda.
Peter riu de meu ciúmes e levou a mão até minha bochecha onde tinha a cicatriz, acariciando delicadamente. Eu não pude deixar de sorrir, embora aquilo fizesse cócegas. Peter me encarou tão intensamente, que quase desviei o olhar.
— Darla não tem o menor interesse em música, não nos acompanharia nas audições — falou ainda com os dedos sobre minha pele — Não se preocupe com ela, nem com meus amigos. Eu quero muito que você vá me ver jogar.
— Tudo bem — eu disse por fim, e o garoto sorriu como nunca antes. Parecia realmente feliz por eu ter aceito assisti-lo jogar futebol.
Algumas pessoas começaram a entrar na sala, indicando que logo o professor apareceria. Peter percebeu isso, pois começou a falar mais rápido.
— Podemos ir jantar juntos depois do jogo.
O olhei intrigada.
— Não vai ter uma festa no seu hall depois do jogo? — questionei em dúvida. Beny me falava dessa festa havia dias.
— Vai — ele admitiu — Mas queria fazer algo que só envolvesse eu e você. O que acha?
Ele estava me convidando para um encontro. Peter preferia passar a noite comigo em um restaurante qualquer do que ir na festa de seu time, aquilo me comoveu.
Sorri com os dentes balançando a cabeça em confirmação.
— Eu ia adorar.
— Ótimo — ele aproximou o rosto do meu e me deu um selinho demorado antes de se afastar — Você escolhe o restaurante. Até mais, gata.
Acenei com a mão ainda mantendo o sorriso bobo no rosto, e entrei na sala quando Peter já havia sumido do meu campo de visão. Bethany ainda não chegara, então passei o tempo arrumando meus materiais em cima da mesa.
— Eu ainda não estou acreditando que vocês dois é real!
Levantei a cabeça e me deparei com uma Bethany sorridente. Ela largou a bolsa na mesa e sentou ao meu lado.
— Pois é — respondi sem saber muito o que falar. Eu havia contado para minha melhor amiga por mensagem sobre meu atual relacionamento com Peter. Ela surtou, me mandando uma quantidade exagerada de gifs e emojis.
— Estou tão feliz por você, amiga — ela falou me envolvendo em um abraço, que retribuí.
— Obrigada — respondi com sinceridade.
Beny se afastou e começou a tirar seus materiais da bolsa, logo o professor chegaria.
— Mas então... Você bem que podia pedir para o Peter me apresentar para aquele amigo gato dele — a loira falou se virando mais uma vez em minha direção.
Franzi o cenho.
— Que amigo? — a verdade é que eu só conhecia Jackson, e nem fomos apresentados direito já que na época Peter ainda namorava Darla.
— Ryan — continuei a olhando confusa — Eles jogam futebol juntos. Peter está sempre andando com esse cara.
Eu realmente não sabia quem era Ryan, nunca o vi antes. Sempre que encontrava Peter, ele estava sozinho. Eu duvidava até de que os amigos dele soubessem quem eu era.
— Posso pedir sim — concordei, para deixar Beny contente. Não faria mal a ninguém eu pedir esse favor para Peter — Mas você sabe se ele é solteiro?
Beny me olhou como se eu estivesse fazendo uma pergunta idiota.
— Meu amor, eu estou preparada para tudo. Pesquisei nas redes sociais dele, o último relacionamento sério foi há um ano. Depois disso ele não postou fotos com mais nenhuma garota, e uma amiga minha que estuda biologia marinha me confirmou tudo.
Às vezes Beny me dava medo, mas só às vezes.
— Então ele estuda biologia marinha? — perguntei tentando deixar aquela conversa menos macabra, não funcionou como eu esperava.
— Sim, está quase na metade do curso. Ele morava na Califórnia, mas se mudou para cá com os pais faz quatro anos. Ryan tem várias fotos surfando no instagram, ele gosta de surf assim como eu! É praticamente destino.
Ri da fala entusiasmada de minha amiga. Aquela garota poderia tranquilamente trabalhar para o FBI ou algo do tipo.
— Mas eu nem te contei a melhor parte.
— E qual é? — perguntei com as sobrancelhas arqueadas. Ainda tinha mais coisa?
Bethany aproximou o rosto de mim e murmurou em tom baixo, para que nenhum enxerido escutasse nossa conversa.
— Ele é bi.
— Certo, mas porque essa seria a melhor parte? — Acabei ficando confusa.
— Eu poderia falar sobre garotos com ele. Seria perfeito — ela olhava para cima sonhadora.
— É só sobre o que você sabe falar mesmo — brinquei, levando um tapa no braço por parte de minha amiga. Nós duas rimos.
O professor não demorou a chegar e logo mais uma aula estava se iniciando. Tentei prestar atenção no conteúdo, mas logo minha mente vagou para Peter. Ele queria que eu conhecesse seus amigos, era um pouco aterrorizante, mas se ele disse que daria tudo certo, então eu confiaria em meu namorado.
Meu namorado, era até engraçado pensar nele assim. Até pouco tempo eu achava que o odiava. Nunca estive tão errada em toda minha vida.
Liguei para Doug pedindo que me buscasse no final da aula naquele dia, pois Peter dissera ter um compromisso importante. Ele não me deu maiores explicações, e eu também não perguntei. Não queria começar a bancar a namorada ciumenta logo na primeira semana de namoro.
Enquanto eu esperava por meu primo na frente do estacionamento, fiquei jogando no celular um novo jogo que baixara a alguns dias. Acabei nem percebendo quando alguém se aproximou.
— Nos encontramos de novo.
Levantei o rosto um pouco surpresa e sorri, eu já sabia quem era.
— Pelo menos dessa vez, em circunstâncias melhores.
Sang riu. Acabei fazendo o mesmo.
Ele estava de mochila e carregava alguns livros nos braços, provavelmente recém saíra da aula. Eu não estava muito diferente.
— Está gostando daqui? Digo, da Universidade de Portland.
— Ah, sim — falou dando uma olhada ao nosso redor — É um pouco diferente das universidades da Coréia, mas sinto que estou me adaptando bem. Quando troquei de curso, sabia que precisava de novos ares.
Às vezes eu esquecia que ele passou quase a última década inteira morando em seu país natal. Era normal que estranhasse um pouco voltar à realidade estadunidense.
— O que você estudava lá? — indaguei curiosa.
— Antes de inglês? — Concordei com a cabeça — ciências políticas — Ele riu da minha expressão de desgosto — Eu sei, não combina nada comigo.
Sang não era o tipo de pessoa que eu imaginava no ramo da política, e pelo visto ele também concordava com isso. Na verdade, inglês era o curso perfeito para ele, não pelo conteúdo, mas pela vocação que tinha para ser professor.
— E você estuda o que mesmo? Acho que comentou, mas acabei esquecendo.
— Economia.
— Vou precisar ficar de olho na televisão no futuro, quero poder dizer que conheci a economista mais famosa do país — disse em tom brincalhão, o que me fez rir enquanto negava com a cabeça.
— Quem dera, mas não acho que chegarei a esse nível — admiti.
Sang deu de ombros.
— Você pode ser o que quiser.
— Tudo tem limites — retruquei.
— Só se você os impor.
Eu não estava entendendo aonde ele queria chegar.
— Acha que Obama estava preocupado com limites quando se candidatou à presidência? Um país onde pretos são mortos simplesmente por serem pretos. E ainda assim, um presidente negro foi eleito — A fala dele parecia ecoar em minha cabeça — Então me diz, porque você não poderia ser uma grande economista?
Se eu pretendia responder alguma coisa, minha boca não permitiu, pois sequer consegui mover um músculo do rosto.
Sang falava com tanta autoridade, que parecia acreditar nisso. Mas para mim não era fácil. Até esse último mês, eu sequer sabia se conseguiria dinheiro para fazer faculdade. Como sonhar tão alto quando se está enterrado até o pescoço?
— Não sei — foi o que consegui dizer, com a voz estridente e estranha.
Ele sorriu, parecendo achar graça do jeito com que me deixou desconcertada.
— Não precisa ficar tão séria, minha lição de moral já acabou.
Revirei os olhos ao perceber que ele ainda sorria.
— Engraçadinho.
Me divertir com Sang trazia em minha mente memórias da escola, apenas as boas. Ele foi um grande amigo para mim, e foi complicado de aceitar que iria embora. Nunca pensei que depois de tantos anos voltaria a revê-lo. Aquilo me deixava feliz, imensamente feliz.
— Acabei de notar que não tenho seu número — ele disse pegando o celular e estendendo em minha direção.
— Vamos resolver isso.
Peguei o celular dele e criei um novo contato, colocando meu nome e número. Cliquei para fazer uma ligação e esperei alguns segundos, enquanto meu celular tocava na bolsa, antes de desligar.
Sang me observou intrigado.
— Agora tenho o seu também.
Ficamos alguns segundos sorrindo em silêncio. Não foi um momento constrangedor, eram apenas dois antigos amigos contentes um com a presença do outro.
— Quem era aquele garoto que estava com você na outra noite? Não me recordo o nome dele.
— Ah — Demorei um pouco para perceber que Sang voltou a falar — Peter. É meu amigo — Neguei com a cabeça, me contradizendo — Digo, meu namorado. Mas naquele dia não estávamos juntos, ainda.
Ele não teve muita reação com minha revelação, mas concordou com a cabeça. Depois da ajuda que me prestou naquele dia, o mínimo que eu podia fazer era responder verdadeiramente à sua pergunta, embora ainda me sentisse estranha por falar que tinha um namorado.
— Ele não parecia muito bem — Foi evidente que Sang tentou não usar as palavras exatas para descrever Peter.
— Pode dizer, ele estava bêbado e incrivelmente irritante — Nós dois rimos — Aquela noite acabou mal, não era para nada daquilo ter acontecido.
Senti a mão de Sang sobre meu ombro, um gesto reconfortante.
— Não precisa falar sobre isso.
— Ah, não — Dispensei sua preocupação com um balançar de mão — Não foi nada demais, sério. Além do mais, foi tudo culpa minha. Eu quis provocar a ex dele, era claro que não acabaria bem.
— Ela te agrediu?
Neguei.
— Disparou algumas ofensas que já estou acostumada a ouvir. O problema é que Peter surtou, e eu acabei fugindo de lá. Não esperava que ele fosse encher a cara depois disso.
— Bem... — Ele pareceu pensar com cuidado nas palavras que pretendia dizer — Deve ter sido mesmo uma noite e tanto.
— Nem me fale — ri de nervosismo.
— E onde seu namorado está agora?
— Ele tinha um compromisso. Na verdade, estou esperando meu primo chegar. Ele prometeu vir me buscar, mas aquele ruivo maldito está demorando demais.
Doug estava dirigindo até a universidade ou atravessando Portland de uma ponta à outra?
— Se quiser, posso te levar — Sang propôs, mas eu recusei.
— Doug vai me matar se eu avisar ele na metade do caminho que não precisa mais vir. Aquele garoto tem os nervos literalmente à flor da pele.
— Quantos anos ele tem?
— Dezessete. Está no último ano do colégio.
— Adolescentes — ele riu — Eu também era assim. Não tem pessoa que coloque um garoto dessa idade nos eixos.
— Nisso eu posso concordar — também ri.
Como se falar o nome dele tivesse, de alguma forma, o convocado, o carro de Douglas apareceu na entrada do estacionamento.
— Falando no diabo.
Me virei para Sang.
— Foi bom te ver — falei na intenção de me despedir.
Sang sorriu concordando com a cabeça.
— Se quiser falar comigo, é só me mandar mensagem. Se ficarmos dependendo de nos esbarrarmos por aí, pode vir a demorar um pouco.
Poderia mesmo.
— Mandarei. Até mais.
Acenei com a mão e fui em uma quase corrida até onde Doug havia parado. Antes de entrar no carro, dei uma última olhada para o lugar que estava com Sang, ele já se deslocava para longe.
— Quem era? — meu primo perguntou curioso enquanto eu me ajeitava no banco da frente.
— Um amigo da época da escola — me limitei a responder.
— Você tinha amigos? — O olhar que lancei em sua direção o fez engolir em seco e disparar com o carro para fora do estacionamento.
Sim, eu tinha amigos. Um.
Doug não precisava saber sobre como foi difícil os últimos anos do colégio sem Sang. Ele era a única pessoa que realmente conversava comigo, e me defendia das outras crianças. Quando voltou para a Coréia do Sul, fiquei sozinha.
Não, definitivamente eu não contaria aquilo para Douglas, e para ninguém.
Oi KK
Por favor não me matem
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