02. Ilha Paradisíaca
O avião aterrissou na bela Ilha dos Montes Altos por volta das onze e meia da manhã. A viagem foi tranquila, não havia muito o que comentar sobre isso, apenas que fui o caminho todo conversando com uma idosa muito simpática que sentou ao meu lado.
Em geral, não sou muito comunicativo com estranhos, isso evita que eles puxem assuntos inconvenientes e deem opiniões que não estou interessado em ouvir, mas essa senhora era tão fofa que não resisti. Trocamos até o número de telefone, pois dona Graça — esse era o nome dela — disse que queria tricotar um suéter para mim.
— Não entendo como você, mesmo com essa cara de antipático, consegue atrair tantas pessoas legais — comentou Amélia, claramente precisando de ajuda com as malas.
— É que, como eu disse, eu nasci para brilhar — respondi com uma risada. — Vem, deixa eu te ajudar. Vai que algum olheiro vê meus músculos definidos enquanto carrego sua bagagem e me convida para ser modelo.
Ela riu.
— Obrigada, pensei que não fosse oferecer ajuda — disse ela, me entregando uma das mochilas com um suspiro exagerado. — Três homens ao meu lado e nenhum se oferecer para me ajudar com as malas é sacanagem.
Dessa vez fomos eu e os meninos que rimos.
— Para de ser implicante, é óbvio que íamos te ajudar — disse Jorge, tirando um chiclete no bolso da camisa. — Servidos?
— O que é isso? — perguntou a garota.
— Almoço.
***
Havia táxis em frente ao aeroporto, contratados por Solene Vasquez, à espera dos convidados. Tive de admitir, essa tal contratante tinha se mostrado ser a melhor disparada. Não só estava nos dando a oportunidade de crescer enquanto banda como também pagou nossas passagens e hospedagem. Não sabia que realities shows davam tanto dinheiro, quem sabe eu não me inscrevo em um qualquer dia desses?
Assim que entramos no carro, o motorista, que aparentemente tinha recebido um roteiro da sua contratante, informou que iria nos levar ao nosso hotel e, que quando estivéssemos lá, receberíamos novas informações acerca do local da festa, dos horários etc. Agradecemos pela hospitalidade e seguimos pelas ruas cobertas pelo verde da ilha.
— Há muito verde aqui na ilha, então os mosquitos estão por todo lado — informou o motorista, cujo nome descobri depois que era Sérgio. — Sugiro que comprem repelentes nas lojinhas do hotel, eles sempre vendem.
— E quanto as praias, irmão? São tão boas quanto dizem os panfletos? — perguntou Tom, sentado ao banco do carona.
— As praias são uma belezura, são nossos pontos turísticos. Tenho certeza que vocês vão adorar.
Tentei acompanhar a empolgação do pessoal com o verde e as praias, juro que tentei, mas eu não estava no clima para aproveitar a natureza. Acho que porque eu tinha passado a última semana na casa do meu avô, Edgar. Ele tinha uma casa enorme e um jardim imenso com verde para dar e vender.
E como ele não podia sair de casa por estar em prisão domiciliar depois de ter matado baleias para usar seu óleo em sua empresa de medicamentos falida e modificar o ecossistema marinho da cidade de Mavetorã, cabia a mim a missão de visitá-lo uma vez ao mês.
Era uma relação confusa. Meus pais não gostavam dele, e ele não gostava dos meus pais. Mas de mim ele parecia gostar, me chamava de Lelê e sempre tentava me agradar. Tudo bem que eu só descobri sobre a existência dele quando tinha uns oito anos de idade e foi um pouco demais ficar sabendo de todos os erros dele, mas ainda assim eu não conseguia ignorá-lo.
— Chegamos ao Hotel Madeira — anunciou o simpático Sérgio.
Agradecemos pela viagem e pela ajuda com a mala. Entramos no hotel e demos início ao check-in.
A recepcionista que nos atendeu era ruiva e parecia mal humorada, então rapidamente me policiei para não levar qualquer possível grosseria dela em consideração quando for decidir se gostei ou não da ilha.
— Bom, como agendado no sistema, vocês, integrantes da banda Flamingos Vigaristas, têm direito a dois quartos. Por favor, preciso dos documentos de identificação.
Entregamos.
Ela os analisou e digitou alguma coisa no computador. O barulho do teclado atrelado ao mascar de chiclete desleixado dela era... algo!
— Ok, então temos Amélia Cristina Santos, Levi Fleur Cadente, Jorge Amaral de Oliveira e Tomás Santos Sousa.
Assentimos meio intimidados. Ela pronunciava nossos nomes como se quisesse testar nossa familiaridade com eles, me senti naqueles documentários policiais quando os agentes analisavam se os documentos eram falsos ou não.
— Aqui estão as chaves do 519 e do 520. Tenham uma boa estada aqui em nosso hotel.
Subimos de elevador, carregando todas aquelas bagagens, inclusive os instrumentos pesados. Não resisti a me jogar na primeira cama que vi pela frente. Nem mesmo olhei para trás, abri a porta do 520 e me joguei no macio das cobertas brancas e dos travesseiros arredondados.
— Nós nem decidimos quem vai ficar em qual quarto e você já escolheu sua cama — comentou Jorge, cruzando os braços enquanto simulava uma feição de reprovação.
— É só você fazer o mesmo — respondi, rolando de um lado para o outro da cama. — Ai, que sonho. É como se eu estivesse no paraíso.
Todos riram. Eu me sentia o palhaço do grupo às vezes. O bobo da corte... ou o coringa.
— Eu vou ficar com o Levi aqui no 520 e vocês podem ficar no 519 — disse Amélia rapidamente. — Não é como se não fôssemos nos ver todos os dias.
Jorge pareceu disposto a contrariá-la, seu rosto tinha sido tomado por uma feição de implicância, mas ele não o fez.
E assim ficou decidido.
— Quanto tempo será que temos até a hora da festa? — perguntou Amélia caminhando pelo quarto. — E será que a festa é hoje mesmo? Ela só disse que deveríamos chegar a ilha hoje, mas não disse nada sobre a comemoração ser hoje.
— Você vai ficar aí fazendo esse monte de perguntas ou vai aproveitar essa maravilha de quarto? — falei, correndo até o frigobar. — Olha, está lotado de refrigerantes e cervejas.
Ela me encarou com uma feição brava.
— A gente nem sabe o que essa mulher está comemorando, Levi.
— Ué? Não é óbvio?
— Não?
— Ela está comemorando a vitória dela no reality show lá, o PARALELO.
Amélia tornou-se pensativa.
— É... Faz certo sentido. Mas, puts, que bobeira gastar um dinheirão desses assim, com uma festa.
— Não é porque você não gastaria com uma festa que é bobeira.
Ela revirou os olhos.
— É, pode ser. Talvez eu seja antiquada.
— Eu garanto que você é — falei.
Agi rápido e, antes que ela retrucasse, levantei os braços em sinal de trégua. Eu, de fato, não estava interessado em discutir quaisquer tópicos. Tudo que eu queria era beber um pouco de água.
Enquanto eu revirava o frigobar, Jorge e Tom entraram no quarto com uma proposta meio nhe.
— O que vocês acham de irmos tomar um banho de praia?
— Eu topo — disse Amélia. — Água salgada é tudo que eu preciso agora.
Fiz uma careta de quem não gostou muito da ideia, mas eu era voto vencido. Três contra um. Zero eram as minhas chances de convencê-los a não ir.
O hotel oferecia um serviço de aluguel de jipes, era meio carinho, nada que o pessoal pudesse pagar, mas confesso que me senti mais animado com a ideia de irmos à praia no momento em que coloquei os pés para fora do quarto. Paguei o aluguel do veículos e assim pudemos ir à praia mais próxima para aproveitar o nosso tempo livre.
Fiquei feliz que o pessoal aceitou que eu pagasse o carro. Era bem raro que eles aceitassem quantias altas vindas de mim, por mais que eu insistisse. O fato dos meus pais e, consequentemente, eu sermos endinheirados, era um tópico delicado.
***
Chegamos a uma praia chamada de "Praia do Paraíso". Estava bem tranquila, pouca movimentação, nenhuma sujeira, areia branca. Apanhamos um guarda-sol, vestimos nossas roupas de praia, passamos protetor solar e fomos para água, quer dizer, eles foram para a água. Eu fiquei na cadeira, assistindo à corrida deles até a água.
Somente depois de alguns minutos foi que eu decidi levar meu calção de banho para água salgada.
— Vem, Levi, a água está uma delícia — gritou Amélia ao longe, brincando de pular nas ondas junto com os meninos.
Loucos!
Nem sabiam se a praia era segura e já se arriscavam indo para tão longe. Incidentes com tubarões não existem mais?
Ou talvez eu que fosse muito paranoico... Ou eu só tinha assistido a muitos filmes de tubarões... Ah, dane-se! Decidi ir até eles.
Porém, algo aconteceu.
Enquanto eu caminhava pela água salgada, uma luz azul apareceu embaixo de mim. E foi nesse momento que eu ouvi ela sussurrar em meu ouvido.
"Olá, meu neto"
Não me assustei. Abri meu melhor sorriso e respondi:
— Olá, vovó. Senti saudade.
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