5 - Calidez
A cabeça de Layla ainda estava girando quando seus pés encontraram o chão firme; quase se desequilibrou, mas o braço forte e ágil de Ciarán a envolveu, mantendo-a junto dele.
— Cuidado, princesa — ele sussurrou, os lábios próximos da orelha dela. — É normal ficar desorientada quando se viaja assim pela primeira vez. Você está bem?
— Sim, senhor... Ciáran. Obrigada. Acho que posso me acostumar com isso. — Layla tentou sorrir ou gracejar, mas o frio na barriga provocava uma rouquidão falha em sua voz. — É mais prático do que carruagens.
Ajeitando os cabelos e se soltando delicadamente dos braços dele, Layla olhou em volta. Ciarán os transportara para um grande e elegante salão, onde uma mesa polida brilhava sob um lustre de velas e cristal. Lareiras ardiam nas paredes de pedra, aquecendo o ambiente.
— Este é seu castelo? — ela perguntou, juntando as mãos em frente ao corpo, batalhando para disfarçar o leve tremor dos dedos.
— Agora é seu castelo também. Venha comigo.
Anuindo, Layla o seguiu em direção a uma escadaria encaracolada, os passos um pouco mais lentos atrás do feiticeiro. Tentou guardar os caminhos, os corredores iluminados por velas flutuantes, as janelas arcadas que se abriam para a noite enluarada, as infinitas portas fechadas, se perguntando qual seria o tamanho daquele castelo.
— Há criados aqui?
— Sim, mas você só os verá pela manhã. — Ciáran continuou subindo pelos lances de escada, as chamas das velas contornando seu maxilar forte; uma visão que fazia o coração dela disparar de um jeito estranho. — Durante a noite, gosto de ter o castelo apenas para mim.
— Entendi. — Layla mordeu o lábio inferior, inquieta.
O silêncio caiu sobre eles outra vez.
Havia uma vontade trepidante de chorar no fundo da alma, mas ela não iria se irromper em lágrimas. Aquela tinha sido sua escolha. Para proteger seu povo. Para descobrir o que estava causando aquelas mortes brutais.
— Quando... Quando começaremos a trabalhar para proteger meu povo? A cada anoitecer, mais vidas são ceifadas de Rovina.
— Amanhã, princesa. Você já teve um longo dia.
Sim, era verdade. E aquela pergunta havia sido tola e ingênua. Afinal, era a noite de núpcias dele.
Ciáran abriu uma das portas, gesticulando para que ela entrasse no aposento primeiro. Mantendo o queixo erguido e os braços caídos ao lado do corpo, Layla o obedeceu, ciente do calor da presença dele.
— Estes serão os seus quartos, princesa.
Os aposentos dela. Layla sabia que muitos casais forjados em casamentos arranjados mantinham quartos separados, mas não estava esperando aquilo por parte do feiticeiro, já que ela era o preço de um acordo.
Havia fogo crepitante na lareira na sala de estar. A luz alaranjada iluminava as cadeiras confortáveis, e duas grandes janelas de vidros límpidos se abriam para uma vista do jardim e dos bosques distantes. Fios de névoa dançavam acima das copas das árvores.
No lado esquerdo da sala, localizou uma porta entreaberta, e imaginou que ali ficavam o quarto e o quarto de banho.
— Muito obrigada.
Ciarán meneou a cabeça, e Layla se virou, as mãos segurando o tecido do vestido. O que aconteceria agora? Ele ficaria ali ou voltaria mais tarde, quando as sombras estivessem mais densas?
— Se desejar uma nova decoração ou outros objetos, basta avisar.
— Certo. — Seus lábios se curvaram, tentado sorrir, em vão. — Eu... Como sai às pressas do castelo do meu pai, não trouxe nada comigo. Não tenho roupas para usar durante dia ou para dormir.
— Há algumas roupas nos armários. Fique à vontade. Se nada for do seu agrado, basta me avisar.
Layla assentiu novamente. O coração galopava mais feroz do que se estivesse em uma cavalgada pelos campos floridos de Rovina.
— Muito obrigada. Eu... — Olhou em volta outra vez. — Eu adorei os aposentos. É tudo muito bonito.
— Vou te deixar explorando o resto do quarto — Ciáran disse, por fim. — Enviarei o jantar para você.
— Obrigada. — Aquilo parecia ser tudo o que conseguia dizer.
Layla queria questionar sobre os ataques, perguntar o que ele sabia e como iria ajudá-la a ensinar o povo a se proteger, exigir que o feiticeiro cumprisse sua parte do acordo, já que cumprira a dela, mas segurou a língua e o observou em silêncio, estudando cada traço do rosto de Ciarán. Não era sua intenção se demorar, quase contemplativa, mas algo no feiticeiro vibrava de uma forma magnética sobre seus olhos.
Será algum tipo de feitiço?
Seu silêncio e seu olhar pareceram incomodá-lo. Layla quase franziu a testa. Após uma brevidade que não pode calcular, Ciáran acenou com a cabeça e deu um passo em direção à porta.
— Mandarei o jantar daqui a pouco — repetiu, a voz ligeiramente baixa e rouca. — Imagino que você deva estar com fome.
E assim, ele se virou e saiu, fechando a porta e a deixando sozinha.
Quando a solidão se revelou sua única companheira, Layla se sentou no tapete diante da lareira e chorou por vários minutos seguidos.
Por ter fugido na calada da noite. Por estar presa a um acordo em um casamento sem amor. Por não ter recebido a benção do pai. Por ter perdido Talia. Por não ter uma mãe.
Quando a pressão no peito aliviou, Layla segurou o pingente de lua crescente com força. Tinha poucas lembranças de sua mãe. A maior parte da corte dizia que a rainha era uma mulher bela e corajosa. Ela só esperava ter a mesma força da mãe.
Enxugando o último rastro de lágrimas, Layla encheu os pulmões de ar e se levantou, decidida a explorar o quarto.
A sala de estar era adorável, e só agora havia reparado na estante de madeira cheia de livros. Seus olhos reluziram. Eram inúmeros títulos literários e obras de poesia. Pelo menos, já tinha como se distrair ali.
Viu só, Layla? Nem tudo será tão ruim assim.
A porta à esquerda a levou ao quarto. A cama de dossel era grande e decorada com cortinas de seda. Velas perfumadas pendiam das paredes, esperando para serem acesas. Layla checou os armários. Como Ciáran dissera, havia várias peças de roupas para desde, desde vestidos simples e sofisticados a camisolas finas para dormir.
Havia outra porta, que a levou ao quarto de banho. Uma grande banheira de bronze reluzia no centro do aposento. Layla caminhou até o espelho sobre o lavatório, checando a aparência.
— O quê...?
Tocou o rosto no lugar onde seu pai a esbofeteara. Por mais que Pauline tivesse usado pó, a marca vermelha tinha continuado ali. Mas... Layla deslizou o dedo pela pele imaculado. O machucado havia desaparecido.
Como...?
Ela se lembrou do momento na ponte em que Ciarán a tocara, do olhar dele, do formigamento cálido sobre o ferimento.
Um arrepio correu por toda sua pele.
Olhando-se uma última vez no espelho, incapaz de formular qualquer pensamento, Layla retornou para o quarto. Uma bandeja com comida quente e fresca esperava por ela.
Ao terminar o jantar, soltou os cabelos, se despiu e vestiu uma camisola de seda azul, ciente do passar das horas.
Ciarán poderia entrar ali a qualquer momento.
A ideia a fez estremecer, mas ela se forçou a se manter firme.
Um acordo é um acordo. É o preço da segurança do seu povo.
E também da segurança do seu pai.
Aquelas eram as únicas palavras que lhe imprimiam um pouco de coragem, que lhe faziam desviar dos liames do arrependimento.
Layla olhou para a cadeira próxima ao fogo; o calor e o conforto reluziam como um chamado convidativo. Decidiu se sentar com um livro no colo e esperar, repassando mentalmente tudo o que Pauline lhe contara sobre a noite de núpcias.
E ela esperou.
Aos poucos, o cansaço se enroscou por suas pernas, o fogo aqueceu o corpo exausto, e seus olhos foram ficando cada vez mais pesados.
Layla adormeceu; e nos sonhos marcados por nuvens iluminadas pelo brilho do luar, recebeu uma carícia gentil em seus cabelos, um roçar suave e cálido, que permaneceu até as primeiras horas do amanhecer.
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