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Sonhos e desilusões

A acolhida de Laura fez Davi sentir que se ajustaria facilmente à nova rotina. Percebeu que estava errado assim que acordou e, ao lado, não encontrou Antônio prestes a perder a hora. No café da manhã, não teve sua fatia de queijo, nem a difícil escolha entre geleia ou doce de leite, ainda cedo. Não precisou acompanhar Larissa, com seus passos ligeiros, no caminho até o conselho, nem achar graça de sua mania em optar pelo percurso mais longo só para evitar as ruas menos bonitas.

Pior do que isso foi a maneira como ela o tratou durante o dia, sem lhe dirigir palavra ou olhar, frustrando cada tentativa de aproximação. Sabia tolerar um castigo, ainda mais quando o merecia, mas ser rejeitado é algo que dói de verdade.

Seguiu com o seu trabalho.

E com a chegada do verão, as chuvas de fim de tarde o obrigavam a encerrar o dia mais cedo, permitindo que tivesse mais tempo para ficar em seu quarto solitário. Nunca tivera um lugar só seu, pelo menos desde que podia se lembrar. Paz e silêncio não era tão agradável como imaginava. As perguntas do irmão, e os monólogos de Antônio, faziam mais falta do que a sinfonia de cigarras, que a essa época do ano preenchem de aconchego as noites da colina.

Dispor de mais tempo livre deveria ser prazeroso. Deveria. Mas para ele foi sinônimo de culpa e autocobrança. Precisava estudar. Sem treino, nunca deixaria de se entediar na primeira meia dúzia de palavras, insistira Antônio outro dia. O problema é que não havia material com o que praticar. As anotações produzidas pelo amigo e por Fernanda eram textos complexos para um iniciante como ele. Seus vocabulários não se equiparavam.

Para piorar, a governadora o incumbira de apresentar essas ideias na reunião entre conselheiros, em uma semana. Precisava de ajuda. Precisava de Antônio. Por isso adiantou as mensagens da manhã seguinte e correu para a saída da aula. Esperou até ver o amigo entre os outros alunos, mas isso não aconteceu. Entrou na sala e encontrou Dona Nair sozinha, apagando a lousa.

— Ele não veio de novo — disse ela ao percebê-lo parado na porta. Tinha aflição em seu tom de voz. — Já é o terceiro dia.

Algo estava errado. De tarde foi até a sala de Larissa decidido a confrontá-la, mas não a encontrou. Resolveu ir até a casa dela e pedir para ver Antônio. Pensou conhecê-la o suficiente para saber que, caso o filho não estivesse bem, a visita de um amigo não lhe seria recusada.

No meio do caminho um aguaceiro caiu com força. Correu pela calçada, desviando das poças e saídas de calha, como se tivesse a opção de não ficar encharcado de qualquer maneira. Chegando lá, encontrou o portão fechado a cadeado, e nenhum sinal de que estivessem em casa. Não saber o que tinha acontecido era angustiante. Não tinha mais onde procurar e não queria sair perguntando para que as pessoas não soubessem que fora expulso da casa deles.

A aflição seguiu pelo resto da semana. Voltava e verificava se já tinham chegado, de onde quer que tivessem ido, pelo menos duas vezes por dia. Sabia que em algum momento regressariam. Afirmava para si, em moderado tom de desespero, que não havia com o que se preocupar. Se partiram era porque algum motivo perfeitamente razoável os levara a isso. Talvez precisassem dar um tempo do vilarejo, ou visitar parentes distantes, ou resolver assuntos em nome da governadora. Quando isso acabasse, certamente voltariam. Tinham que voltar.

Sozinho em seu aposento, precisava se distrair com os próprios pensamentos. Exercício que rapidamente se transforma em agonia, caso aflições, medos e preocupações sejam os únicos assuntos com que a mente insiste em se ocupar. Para evitar essa sensação, ficava perambulando pelo vilarejo, aos arredores da casa de Antônio, ou sentado na cantina, observando Laura trabalhar.

Laura trabalhava mais do que a maioria das pessoas. Mais do que os outros donos de cantinas, que empregavam pelo menos um par de filhos. Mais do que Samuel e Antônio, que folgavam sábados e domingos. Com certeza mais do que a governadora, ou qualquer conselheiro, que cancelavam seus compromissos ao primeiro sinal de... bem, qualquer coisa.

Laura trabalhava mais do que Davi e seus pais em período de pouca chuva. Ainda que nesse caso fizessem centenas de viagens por dia até o poço, sempre paravam ao anoitecer. O trabalho na cantina era como a seca, mas sem as noites como horário do dia pelo qual ansiar.

O volume de clientes variava. Havia um pico ao meio-dia, outro por volta das seis. Mesmo nos intervalos entre um e outro, Laura assumia sozinha o trabalho equivalente ao de uma família com três filhos. Sabendo que ela jamais se recolheria enquanto houvesse louça suja, ou restos de comida para guardar, Davi não conseguia se aquietar em seu quarto, ou sair para explorar o que acontecia no vilarejo depois que o sol se punha. Só de pensar, era tomado de compaixão.

Sexta-feira à noite fazia um calor agradável e cheirava a boas novas. Davi a encontrou perdida entre panelões, pratos e talheres sujos, que se acumularam ao longo do dia atipicamente movimentado.

— Me arrume uma escova que vou dar um jeito nessas panelas — disse ele, já meio arrependido.

Laura não costumava pedir ajuda, mas também não recusava se lhe oferecessem. Seus dedos enrugados de umidade esticaram a ele uma escova, e sua face exausta, sorriu. Davi notou suas rugas, que marcavam o tempo, na maior parte dedicado ao trabalho. Pensou que já passava dos quarenta anos, não casara, nem tivera filhos. Percebeu-se interessado em saber a história dela, mas não quis perguntar. Poderia soar intrometido. Seu pai também lhe ensinara a não bater papo enquanto há serviço. Ela foi quem falou:

— Como é ter um pedacinho de terra para plantar e colher? — perguntou com olhar distante, como se estivesse se imaginando em outra vida.

— Não deve ser diferente de comandar a própria cantina — respondeu, querendo elevar-lhe a estima. Então considerou que provavelmente não estava errado. — Vejo você animada quando deixa um cliente feliz. A mesma coisa quando está revirando a dispensa, planejando o cardápio do dia seguinte. Mas também vejo você triste, às vezes, ou exausta, ou com cara de quem vai sair correndo, não sei para onde.

— É verdade — admitiu ela, um pouco envergonhada. — Deve ser a necessidade de férias.

— O lugar de onde eu vim é... — Ele parou, pensando em algum adjetivo à altura. — É uma maravilha. Adoro quando sai um solzinho de manhã pra espertar a gente, mas daí, de tarde, ele vem com tudo e torra o nosso coro. Pro cair da noite chega um arzinho gelado, refresca de novo e ajuda a dormir. Isso quando não chove, que é a melhor coisa pra tratar da pele ardida.

Parou, nostálgico por um momento, e prosseguiu:

— E a nossa casa... é também uma maravilha. Foi a mãe que deu a ideia de usar materiais antigos, e o pai que construiu, acredita? Viga de torre, folha de galpão, caçamba de carreta. Tiveram que chamar vinte vizinhos para subir a arrumação.

— Isso eu queria ver — disse ela sorrindo, tanto com os olhos quanto com os lábios.

— E trabalhar na plantação é... — Procurou uma boa forma de descrever o que sentia. Cerrou os lábios, frustrado. Não era bom em dar nomes, o que também valia para sensações. — Uma coisa que eu amava fazer e não sabia. Se meus pais também amam, não posso dizer, nunca ouvi falarem isso. Para o meu pai "nada é mais importante do que o trabalho", o que deve ser a mesma coisa que amor. Mas, pensando bem, acho que não era fácil para eles. Antes eu não percebia que às vezes a chuva não caía, ou lagartas destruíam metade da roça, ou o milho simplesmente não crescia. Ou, apesar de tudo isso, não conseguíamos trocar a colheita por mantimentos suficientes. Meu pai, que costuma ter ânimo forte, de repente ficava quieto e irritado. Ele me mandava pro mato caçar jacu, e eu achava normal, coisa de adulto ranzinza querendo um pouco de paz.

Laura o olhou com a expressão de quem, do fundo do coração, deseja o melhor a alguém.

— Posso entender por que está aqui — começou ela, enxugando as mãos após limpar a pia. — Quero dizer, entendo o que a governadora viu em você. Não é um menino comum, Davi, você é especial.

Aquilo o acendeu por dentro. Suas costas se endireitaram e os olhos se encheram de confiança, como quando se veste uma roupa nova e os desafios da vida, por alguns instantes, parecem menos impossíveis.

— Muitas vezes eu mesmo não sei o que faço aqui — disse, oferecendo seu melhor sorriso de modéstia. — Mas agora Laura, tenho a chance de fazer alguma diferença. Não apenas entregando mensagens e enviando dinheiro a meus pais, mas uma diferença de verdade.

— Uau. — Ela ergueu as sobrancelhas. — E como vai fazer isso?

— Semana que vem vou falar em uma reunião do conselho... meu Deus... dizer isso em voz alta me deixou nervoso. Mas é isso, falarei das coisas que descobrimos na antiga capital. Espero que me ouçam, pois isso pode mudar a vida de diversas famílias como a minha.

— Você é empenhado, Davi, não parece ter a idade que tem. Fará grandes coisas por essa gente. Seus pais devem estar orgulhosos.

Depois que terminaram o trabalho, Laura foi descansar e ele decidiu dar uma volta. Sabia que às sextas, na praça do vilarejo, havia música, dança e, com sorte, distração gratuita. De fato, encontrou lá uma roda de pessoas. No centro, um violeiro e um sanfoneiro animavam a noite. Embora não levasse jeito para dançar, sentiu vontade de se juntar a eles. Encabulado, permaneceu de longe, assistindo.

Adiante na praça, encontrou dois grupos de jovens da sua idade. Um de meninos, outro de meninas. Eram amigos de Mariana e de Joaquim, mas os dois não estavam entre eles. Desejou se aproximar, unir-se a eles, dar risadas, trocar provocações com o outro grupo e falar sobre o que quer que estivessem falando. Mas aqueles não eram seus amigos, nem demonstravam ter a intenção de se tornar.

— Hei — disse alguém atrás dele.

Davi se virou e encontrou Aluízio o encarando. O rapaz de olhos esbugalhados abriu sua bolsa de mensagens com a face constrangida e pegou um envelope.

— É pra você — disse irritado e o entregou a Davi.

— Para mim? De quem é?

Aluízio revirou os olhos.

— Quer que eu leia?

— Não — respondeu Davi pegando a carta. — Escute... — disse enquanto o outro se afastava. — Eu não queria... pegar o seu trabalho.

— Mesmo assim pegou, não foi? — Ele arregalou os olhos mais ainda. Depois deu de ombros. — Como tem sido depois que foi expulso da casa dos Delponte?

Davi ficou pálido e desviou os olhos para o chão.

— Ah, então é verdade — terminou Aluízio. — Boa sorte, preciso ir.

Davi o observou até que sumisse entre os outros na praça, lamentando o fato de que em breve todos saberiam de sua situação. Mesmo assim, sentiu pena. Ouviu dizer que o rapaz andou passando por dificuldades, tendo que se arriscar em viagens longas para encontrar clientes. Tentou se livrar da culpa. Pensou que não fora sua escolha. Além do mais, o conselho já andava insatisfeito com os serviços dele de qualquer maneira. De todo modo, saber que sua vinda tornara a vida de alguém pior não era agradável.

Sentou-se em um banco afastado e olhou para o seu nome no envelope. Abriu-o. Estava assinado por Luiz e Tereza. Por sorte, a linguagem dos tropeiros era simples como a sua. Apesar do receio em não compreender alguma parte, decifrou cada frase como se devorasse um prato de arroz com feijão depois de trabalhar por horas.

Olá, Davi, temos notícias pra você. Nos encontramos com sua família, estão bem, apesar das saudades e tudo mais. Nos pediram para te escrever e agradecer a ajuda. Suas moedas chegam todo mês e fazem muita diferença (eles até se emocionaram dizendo isso). O seu pai está igual... sabe, um pouco fraco e com a visão ruim. Sua mãe está dando conta da roça e do resto. Seu irmão disse que, dia desses, pegou um abotoado sozinho. A Melissa aprendeu a falar "dá-dá", e seu irmão acredita que ela tenta chamar você dizendo isso.

Agora outro assunto. A tropa do primo Camargo chega aí segunda que vem, e na sexta eles partem para a fazenda do Silveira. Se quiser uma carona, deixei avisado que cê vai procurar por ele. Na volta, domingo à tarde, o tio Pedro vai sair de lá, e pode te trazer pro vilarejo. Se ele levar um saco a menos na carroça vai dar pra você ir com ele sossegado. Viajar sem tropa é perigoso, mas o caboclo é cabra esperto, ninguém se mete com ele na estrada. Só que vai te custar duas pratas, por causa do saco a menos. É só uma ideia pra você pensar, caso queira ver os pais no fim de semana.

Abraços, Tereza e Luiz

Lágrimas escorreram enquanto lia. A dor da saudade é como um aperto na alma. Dói constantemente. Mesmo em momentos bons, mesmo quando não se pensa a respeito, e mesmo em dias cheios de outras preocupações. Ela se acomoda num canto da mente, caminha ao lado de cada pensamento e não perde a oportunidade de sussurrar aquilo que já sabemos: algo está fora do seu lugar.

A notícia chegou em hora boa. Na quinta-feira apresentaria ao conselho o resultado de sua excursão até a antiga capital. Na sexta, partiria ao reencontro da família. Com sorte as ideias seriam bem recebidas e ele levaria a notícia pessoalmente.

Ele e Antônio seriam como heróis.

O devaneio foi soprado para longe ao pensar que precisaria de mais do que sorte. Dobrou sua carta e voltou para a cantina. Se acomodou em seu quarto e colocou as anotações sobre a cama. Tinha trabalho a ser feito.

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