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Argumentos de um menino

Davi foi chamado por um guarda que amarrou suas mãos e o colocou no lombo de uma mula sem maiores explicações. Setenta dias depois de ser preso, finalmente seria julgado.

Havia um grupo em frente ao conselho que ficou agitado ao vê-lo se aproximar. Davi desceu da montaria, dirigindo-lhes um aceno como se cumprimentasse velhos conhecidos. Entrou e se deparou com Cleonice, cujo aspecto estava lamentável, cabelo descuidado e olhos abatidos. Nada comparado a Davi, que de tão sujo e magro, lembrava um cão surrado, mal-alimentado e abandonado a própria sorte.

Alguém o atingiu com força, quase o derrubando. O ataque veio de surpresa, por baixo, o agarrando pela cintura.

— Matheus!

Olívia apareceu em seguida, com Melissa no colo, correu para eles e os envolveu no seu abraço. Era para ser um reencontro comovente, com risinhos, provocações e, talvez, choro de saudade. Não sorriram. Mal conseguiram derramar lágrimas, pois pouquíssimas haviam restado.

— Fiquem longe do réu! — ordenou o guarda, que fez um gesto para reprimi-los, mas foi ignorado.

— Deixe que fiquem juntos — disse Cleonice colocando a mão no braço dele.

Depois se dirigiu a família:

— Meus sentimentos pelo que passaram. — Esticou a mão, indicando que entrassem na sala do julgamento. — Darei a vocês alguns minutos antes de começarmos.

Na sala em que costumava haver reuniões entusiasmadas, encerradas com bolinho de polvilho e clima festivo, desta vez se reunia um grupo silencioso que assistiu Davi caminhando até o centro, com olhar fúnebre. Estavam presentes os sete conselheiros, além de Laura, Mariana e Aluízio.

Olívia falou sobre os contratempos que fizeram o julgamento perder a prioridade: tropeiros saqueados por motociclistas; chuvas destruindo plantações; e as complicações que levaram o pai de Cleonice a adoecer, permanecendo em estado grave desde então.

Cleonice ficou em pé e os burburinhos cessaram.

— Quero começar pedindo desculpas. — Ela não conseguiu sustentar o olhar em Davi por mais que um segundo. — Esse julgamento deveria ter acontecido há muitos dias. Não quero me justificar, mas o acaso não tem sido gentil com nenhum de nós.

A governadora fez um gesto para a filha ficar em pé:

— Querida, pode repetir o que nos disse outro dia?

Mariana fez que sim. Com as mãos atrás do corpo e os olhos para o chão, começou:

— Antes de nossa casa pegar fogo, Antônio, Dona Nair e eu fomos para lá anotar as matérias da semana. Depois eu fechei a biblioteca, como sempre faço, mas meu avô pediu que eu destrancasse para ele ler. Eu disse que não, geralmente não o deixávamos sozinho e ele não costumava insistir. Vocês sabem que meu avô passa semanas sem completar uma palavra, mas aquele dia me falou uma frase inteira: "buscamos o saber, mas quando o saber nos busca, ignoramos".

— O que isso tem a ver? — interrompeu Daniel, que não tirava a mão do coldre, como se precisasse estar preparado para o caso de Davi tentar fugir ou agredir alguém. — Você deixou a biblioteca aberta e seu avô resolveu incendiá-la?

— Não, eu fechei. — Mariana apertou os olhos se segurando para não chorar. — No dia em que Davi foi acusado, eu perguntei pro vô se ele viu mesmo se foi Davi quem incendiou a nossa casa. Muito aflito ele fez que não e... apontou pra ele mesmo... aí começou a passar mal e...

— Tudo bem, querida. Já é o suficiente. — Cleonice se dirigiu a Daniel em seguida: — Segundo as investigações, o fogo começou do lado de fora, não é? Não sei por que o meu pai faria isso, mas tendo em vista sua instabilidade, a acusação contra Davi não é bem fundamentada. Vamos dar continuidade, temos outras pessoas para ouvir. Dona Nair?

A professora se colocou em pé e explicou que fora ela quem mencionara a Davi sobre a biblioteca na antiga capital. Ela disse não acreditar que havia algum plano em andamento ou que qualquer conspiração fosse provável, o que foi corroborado pelo testemunho de Laura, que entre elogios a Davi, disse não acreditar que ele estivesse agindo contra as pessoas do vilarejo. Ela se recusou a usar a palavra carpincho, mas mencionou como ele costumava ser gentil sem distinguir ninguém em razão de sua origem.

A governadora retomou a palavra:

— Obrigado pelos relatos. Vamos prosseguir com as perguntas dos conselheiros e depois com a votação. Por favor, senhores, sintam-se livres para questionar o réu e que a justiça seja decidida.

O chefe dos guardas foi o primeiro:

— Você pode provar que não causou o incêndio, não arquitetou um plano com seus amigos carpinchos para tomar o vilarejo, não causou a cegueira do filho da conselheira Larissa e não tentou induzir esse conselho a criar leis que favorecem o seu povo?

As provocações causaram revolta em Olívia, que precisou ser contida para não ter que sair da sala.

Davi se lembrou dos ensaios que fizera com Sebastião. Nas simulações, o poeta havia feito perguntas acusativas exigindo que Davi provasse ser inocente. Depois de não conseguir, Sebastião o ensinou que esperar do outro uma prova de você que está errado, em vez de você mesmo provar que está certo, é uma estratégia ilógica de acusação.

— Senhor, eu não posso provar, mas isso não quer dizer que fiz essas coisas.

— Não pretendo tolerar a sua falta de respeito, menino. Um pobre analfabeto como você acha que entende alguma coisa sobre acusações e julgamentos? Se não pode provar, está nos dizendo exatamente que é o responsável por tudo isso!

— Senhor, me perdoe se pareceu desrespeito. Isso apenas não parece correto. Se alguém acusá-lo de usar, para fins pessoais, verbas que deveriam se destinar à alimentação de presidiários, mas sem provas, o senhor levaria essa acusação a sério?

O chefe dos guardas ficou vermelho como se fosse estourar. Antes que agredisse Davi, outro conselheiro tomou a palavra.

— Se o conselheiro Daniel me permite interrompê-lo — começou Dito Silveira —, gostaria de saber, Davi, por que duvidou de nossa inteligência ao sugerir que o dinheiro de pessoas trabalhadoras fosse distribuído entre os que não produzem nada? E por que escolheu se relacionar com carpinchos, que nos invejam e só querem ameaçar este vilarejo a regredir?

— Senhor, as suas perguntas já pressupõem que sou culpado. Não tenho uma resposta para elas porque não fiz o que elas presumem.

A surpresa com que Cleonice, Olívia e os demais presentes encararam Davi deu-lhe confiança. Dito continuou:

— Vejo que andou praticando palavras difíceis, surpreendente. Não quer dizer que entende o significado delas. Pressupor que é culpado faz parte da minha obrigação ao julgá-lo, rapaz. Ou achou que eu tomaria uma decisão simplesmente perguntando: Davi, você é culpado ou inocente? — Ele fez cara de quem move a última peça antes do xeque-mate. — Sem mais perguntas, Cleo.

O próximo conselheiro a se levantar foi Francisco Bajo.

— Garoto, por nossa experiência de vida, coisa que você não tem, sabemos o que carpinchos representam: caos, barbáries, indecências e obscenidades. Penso que trazer alguém com essa origem para o conselho foi um erro que precisa ser remediado agora.

Depois de dizer isso ele voltou a se sentar e Davi levou um instante para entender que Bajo não faria perguntas, apenas queria manifestar o que pensava. Em seguida, a enfermeira Rose foi quem falou.

— Ele é meio carpincho, talvez esteja só meio errado. Fez escolhas ruins e acabou aqui. Davi, você deixaria o seu lado carpincho de lado para podermos perdoá-lo?

Davi precisou refletir por um momento. A pergunta não era clara e parecia que qualquer movimento precipitado acabaria por agravar sua situação. Olhou para a mãe e a viu aflita, com as bochechas molhadas, tão humilhada quanto ele.

— Não tenho a mesma experiência de vida que vocês, mas posso falar sobre o que já vi. A minha mãe, talvez com exceção de Laura, trabalha mais que qualquer um de nós. Demorei a entender de onde vem tanta força. O que estão dizendo sobre ela, e sobre mim, não revela o que somos, mas o que vocês são: pessoas que perderam a capacidade de enxergar o outro com um pouco gentileza.

Ninguém reagiu imediatamente, permaneceram em silêncio, confusos. Davi não sabia se conseguiria se defender, mas achou que precisava continuar:

— Quando fui à antiga capital, vi algo terrível. Não sabia que pessoas eram capazes de fazer mal a outras daquela maneira. Mas também vi famílias, como a minha, lutando para sobreviver. Fui enganado e perdi meu chapéu. Mas também fui acolhido, mesmo sem poder retribuir. Acho que sempre haverá pessoas diferentes, só que deveríamos dar importância ao que temos em comum.

Cleonice convidou Larissa a falar, mas ela não quis dizer nada. Jorge foi o último a se pronunciar:

— Eu acredito em você, Davi. Não me parece o tipo que faria planos para instaurar o caos. Economicamente o que você propôs poderia funcionar, se o mundo fosse perfeito, mas não é. Digo de boa vontade, estou disposto a votar em seu favor. Mas gostaria de saber uma coisa: para provar que não existe conspiração, estaria disposto a convencer os donos da biblioteca que visitou a cederem seus livros para a reconstrução de nosso acervo? Digo, podemos recompensá-los, de algum modo. Pelo visto confiaram em você, podemos confiar também?

Davi procurou em Olívia um refúgio, talvez um sinal que o ajudasse a entender o que ela pensava. Se ele recusasse, poderia ser condenado a viver em Lacerda Braga por anos, talvez a vida inteira. Mas dizer que concordava seria desonrar a memória do pai e de Paulo, além de uma traição a Sebastião e a pessoa que desejava se tornar.

— Não. Livros devem ser livres. Com todo o respeito, não deveríamos reconstruir o acervo. Impedir que as pessoas leiam, e que possuam livros, condenou os milhares de exemplares que pensávamos estar protegendo.

A afirmação gerou revolta em metade dos conselheiros, como se tivessem sofrido um golpe direto. Mas a principal pessoa afetada não esboçou reação.

— Cleo — chamou o conselheiro Dito —, podemos partir para a votação? Antes que isso descambe para algo que ninguém deseja.

A governadora pediu para que levantassem a mão os conselheiros a favor de sentenciar Davi.

Olívia e Matheus se abraçaram, desistindo de controlar os soluços. Davi sentiu o sangue fugir de seus lábios e de seu estômago, se concentrado nos músculos das pernas e dos braços, como se tivesse que fugir para se salvar. Nenhuma sentença havia sido declarada, de modo que não sabia o que esperar caso o número de conselheiros a seu favor não fosse superior.

Levantaram as mãos Dito Silveira, Francisco Bajo e Daniel Gemin.

— Cleo!? — clamou Dito, indignado por não ver a mão da governadora levantada. Ela não o atendeu. — Jorge? — O mestre das moedas seguiu firme, a favor de Davi.

— Então farei o que acho certo — disse a enfermeira Rose, levantando a última mão, virando as votações contra Davi.

Depois de um momento sem que ninguém mudasse o seu voto, Cleonice declarou:

— Davi, por mais que eu esteja disposta a perdoá-lo, não seria uma liderança justa se governasse apenas com base em minhas opiniões. Antes de perguntar se algum conselheiro deseja mudar seu voto, concedo a você uma última fala.

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