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O Viajante - Capítulo XII - Wolfgang - Março de 1973


Estávamos sentados à mesa. Aquela cafeteria também era um lugar de gente fina, tal qual o Café Dinamarca. Senti-me deslocado mais uma vez. Isabelle combinava com cafeterias por ser altiva e bem vestida, assim como o Mikael.

Bebi mais um gole de água. A casa servia água gelada em uma elegante jarra de vidro. Minhas mãos ainda estavam frias do susto que levei com o tiro do revólver que a Isabelle estava carregando.

Mikael e eu olhávamos para os olhos da mulher após contarmos tudo o que aconteceu até chegarmos ali. Desde o incidente no ônibus, até o desmaio, os sonhos, os vultos e, finalmente, o dia que Mikael e eu visitamos aquela rua.

O enfermeiro me ajudou a contar a história. Quando eu falava muito, principalmente se fosse de forma agitada, minhas costelas doíam. Eu tinha fraturado duas delas do lado direito e sofrido uma tal concussão na cabeça, o que me rendia fortes dores na região acima dos meus olhos.

— Se eu não tivesse visto tudo aquilo, eu não iria acreditar em nada disso. — Por fim ela disse, olhando-nos por debaixo da lente de seus óculos.

— Mas você viu. — Rebati. Mikael encheu o copo dele com um pouco mais de água e encarou Isabelle em silêncio.

— É, eu vi… — Ela estava fumando, com o cigarro entre os dedos, assim como eu. Apenas Mikael não fumava naquela mesa. — Eu… Tô sem saber o que dizer.

— Eu também achei que tinha ficado louco. — Contei.

— Eu também… — O loiro disse após beber toda a água do seu copo.

Isabelle esfregou a ponta dos dedos na  própria têmpora.

— Porra… — Ela murmurou. — Tá, se eu entendi direito, você vê três pares de vultos, é isso, Wolfgang? — Os olhos dela foram até os meus. Assenti à pergunta. — Se cada par é uma só pessoa em idades diferentes, então falta achar mais um. Três pares, três pessoas. Quem tá faltando deve ser aquele moleque que esbarrou em mim.

— Sim. A gente não sabe quem ele é. — Mikael respondeu.

— Aquele rapaz que a gente viu tava usando o uniforme do internato Santa Maria. Isso pode ser uma pista. — Isabelle afundou a bituca do cigarro no cinzeiro.

— Nunca ouvi falar desse lugar… — Comentei.

— É um internato pra menores infratores. — O enfermeiro falou.

— Seu terceiro fantasma é um vândalo feito vocês dois. — Havia um escárnio na voz de Isabelle.

— Quem tá armada aqui é você. — Retruquei. Senti olhares de censura de Mikael e de Isabelle sobre mim.

— Fala baixo! — Ela disse entre dentes.

— Ninguém ouviu nada, Isabelle. — Mikael disse de antemão e me olhou com o canto dos olhos.

Ela suspirou.

— Olha, eu tenho meus motivos pra querer ser uma pessoa discreta. — A mulher apoiou o cotovelo na mesa e sua bochecha na palma da mão. — Acho que vocês precisam saber disso.

Houve silêncio. Senti alguma dificuldade em entender exatamente o peso daquelas palavras. Encarei o Mikael de soslaio, como se esperasse qualquer tipo de confirmação de que, de fato, havia algo terrivelmente perigoso no alerta dela. Mas tudo o que recebi foi um olhar tão confuso quanto o meu próprio.

— Você… — Meus lábios doeram. Eu estava os mordendo. — Fez alguma coisa errada? — Indaguei em um sussurro. Esforcei-me ao máximo para não acabar falando alto demais.

Isabelle não me respondeu de imediato.

— Errada não. Só… — Ela negou com a cabeça. — O que você fez mesmo pra levar uma senhora surra da polícia?

— Mandei um policial ir se foder. — Mikael soltou uma risada baixa e curta quando respondi, em seguida esfregou os olhos.

— Não gosto nem de me lembrar disso. — O rapaz comentou.

— É como se eu estivesse fazendo o que você fez… — Ela divagou. — A todo tempo.

— Você tá metida em alguma coisa subversiva? — Mikael indagou em um sussurro.

— Vou deixar vocês tirarem suas próprias conclusões.

Eu odiava esses enigmas. Na maior parte do tempo, não os entendia. O que Isabelle disse me deixou ainda mais confuso.

— Vocês tão dispostos a continuar essa história mesmo sabendo disso? — A mulher perguntou.

Mais uma vez, encarei o Mikael de soslaio. Eu sabia que iria aceitar sem um pingo de hesitação.

— Sim. — O enfermeiro respondeu, como pensei que ele responderia.

— E você, Wolfgang? — Isabelle perguntou, olhando para mim.

— Sim. — A resposta saiu antes do esperado. Senti medo de me arrepender daquele consentimento.

— Ótimo. Não quero que nossos encontros sejam em público. Da próxima vez, vai ser na minha casa. — Isabelle esboçou um sorriso. — Vocês já descobriram onde é. Foi muito difícil?

— Foi. — O enfermeiro disse. — Eu pensei que você nem morava mais naquele prédio.

— Por quê?

— Sempre que eu perguntava pra alguém, desse quarteirão, sobre você, diziam que não te viam há muito tempo. Achei que você tivesse se mudado.

— A gente nem tinha esperança de você responder a carta. — Comentei enquanto acendia outro cigarro.

— Isso é bom. — Isabelle verbalizou. Senti-me aflito pelo fato de que ela parecia querer dizer algo muito sério nas entrelinhas de suas palavras. Entretanto, eu não entendia o recado que ela estava tentando passar.

Encarei Mikael pela terceira vez em busca de qualquer sinal do que não foi dito. Ele continuava com a mesma expressão de seriedade que quase sempre carregava em seu semblante.

— Eu vou investigar sobre o moleque do Santa Maria. — A mulher falou após todos ficarmos em silêncio.

— Como você vai fazer isso? — Perguntei.

— Vou visitar o internato e tentar pegar algumas informações…

— Não é perigoso? — Mikael indagou.

— Nem tanto. — Ela deu de ombros.

Isabelle tinha uma postura muito enigmática. Falava pouco sobre si, dizia meias palavras, buscava nunca ser vista…

Aquela situação me assustou.

— Vocês sabem onde eu moro. Se eu descobrir alguma coisa, ligo pra um de vocês. — Ela se levantou. — Agora eu vou pra minha casa. Essa cafeteria tá me dando nos nervos. Tchau, rapazes.

Respondemos o “tchau” dela. Isabelle saiu da cafeteria em passos rápidos. Ela parecia ter pressa.

— Eu não entendi porra nenhuma. — Comentei para o Mikael.

— Do quê?

— Do que ela quis dizer. — Respondi após soltar a fumaça do cigarro.

— O que você não entendeu exatamente, Wolfgang?

— Dessa porra dela fazer coisas erradas. — Sussurrei.

— Ah, isso. — O loiro olhou ao redor. — Melhor a gente falar disso no caminho de casa.

Assenti, afundei o cigarro no cinzeiro e me levantei. Senti uma fincada em minhas costelas e meu corpo cambaleou para frente. Mikael foi rápido em me apoiar, segurando o meu ombro.

— Tá tudo bem? — Ele perguntou.

— Tá, é só essa merda de dor. — Coloquei uma das mãos sobre a região das costelas fraturadas.

— Quer apoio pra andar?

— Não! Que merda mais… — Meu rosto ardeu com aquela sugestão.

— O quê? — Em seguida, o enfermeiro desviou os olhos. Eu também não consegui o encarar. Minhas bochechas estavam queimando.

— Esquisito.

— É só… Eu faço isso sempre no hospital. — Eu nunca tinha ouvido o Mikael falar de maneira tão desconcertada. Ele era sempre tão eloquente que parecia impossível que aquele enfermeiro pudesse hesitar em algum momento.

— Isso… — Outra fisgada nas costelas. — Tá, me ajuda. — Eu não o olhei. Senti Mikael segurando o meu braço e passando ao redor do seu ombro. Meu rosto ainda queimava. Meus lábios doeram, pois eu os mordi nervosamente e o gosto de sangue invadiu a minha boca.

As pessoas ao redor estavam nos encarando. Olhei para os meus pés e fitei os meus sapatos. Eles eram de couro marrom. Estavam tão velhos que o couro estava desbotado e levemente ressecado.

Os sapatos eram o mais importante ali. Tentei me lembrar há quantos anos eu tinha aquele par de sapatos. Desde os 14 anos, lembrei-me abruptamente. Foi um presente de aniversário que meu pai me deu. Isso era tudo. Só os sapatos importavam.

— Tenta andar. — A voz do Mikael me chamou novamente para o presente. E o presente significava um rosto queimando e pessoas nos olhando. Continuei fitando os sapatos e movi um pé, depois o outro. Era mais fácil andar com o apoio do enfermeiro, pois eu não sentia dor.

— É mais fácil… — Minhas mãos começaram a suar. Os sapatos. Eu precisava olhar para eles.

Caminhamos até a saída na cafeteria e andamos pela calçada. Mantive o olhar nos meus pés por todo o tempo. Felizmente, Mikael não disse uma palavra.

Paramos na estação de ônibus. O enfermeiro me ajudou a me sentar no banco de concreto em que esperávamos o veículo.

Só quando me sentei, totalmente desvencilhado do rapaz, é que o encarei. Vi-o sentar ao meu lado.  Ele me olhou.  Por alguns segundos, apenas nos fitamos em silêncio. Percebi uma nuance no semblante dele que nunca tinha reparado. Mikael tinha um olhar triste. Muito triste.

Logo não pude sustentar o meu olhar e o desviei, encarando a rua.

O ônibus parou na estação após cerca de meia hora. Mikael correu até a porta ao lado do motorista.

— Tem um rapaz que tá com problema pra andar, espera aí! — Ouvi-o gritar ao motorista.

O enfermeiro andou até mim e ofereceu o braço para me apoiar. Novamente, ele me ajudou a caminhar. Nós entramos no ônibus e ele estava vazio. Sentamos-nos em dois assentos na parte da frente do veículo. Eu fiquei do lado da janela e Mikael no assento com saída para o corredor.

Tudo que restou foi silêncio. Encarei a cidade pela janela. As luzes estavam acesas e o movimento já tinha diminuído consideravelmente. Vez ou outra, eu via alguém vagando à noite e tentava imaginar o que aquelas pessoas estavam fazendo na rua naquele horário.

— Wolfgang. — O Mikael me chamou. Tirei os olhos da rua e o encarei com hesitação. — Acho que dá pra gente falar da Isabelle.

Eu até tinha me esquecido daquele assunto.

— Sim…

— Acho que ela quis dizer que tá metida com esses movimentos subversivos contra militares. — O enfermeiro sussurrou.

— Ah, era isso?

— É só um palpite.

— Porra, que loucura… — Franzi o cenho. — Essa merda é muito perigosa.

Ele me encarou em silêncio.

— O que foi? — Perguntei.

— Me diz o motivo dessas suas costelas fraturadas.

Uma risada me escapou e senti o meu tórax doer.

— Eu não posso rir, porra. — E acabei rindo ainda mais. No início, foi uma risada rápida, mas o fato de eu não poder rir potencializou o desejo de gargalhar.

Mikael também riu. Voltei a encarar a rua pela janela. Era bom rir com ele. Senti leveza no meu peito e, em seguida, tristeza. Eu nunca aprendia a evitar o meu próprio sofrimento.

Após algum tempo, o ônibus parou em uma estação no quarteirão do bar do Silva. Era onde o enfermeiro iria descer.

— Você acha que consegue ir sozinho pra sua casa? — Ouvi a voz dele e o olhei.

— Consigo. Tô fazendo isso todo dia.

— Tá. Toma cuidado. — Mikael se levantou. — Tchau, Wolfgang.

— Tchau. — O rapaz desceu do ônibus e vi, pelo vidro janela, ele se afastar da estação. O ônibus partiu. Eu ainda tinha um longo caminho até chegar na minha casa.

Desci naquela estação isolada que ficava perto de onde morava. Apenas um mísero poste iluminava o lugar e, portanto, havia pouca luz para um enorme breu.

Segui até em casa. Aqueles malditos ferimentos doíam e incomodavam com dores agudas e fisgadas a cada passo. Quando alcancei o pequeno muro cinzento da minha casa, senti como se tivesse terminado a via crucis.

Como sempre, meu pai estava ouvindo rádio na sala de estar. Ele me encarou quando abri a porta vermelha.

— Demorou. — Comentou e olhou para o seu relógio de pulso. — Já são 10 horas.

— Eu tava com o Mikael. — Contei enquanto caminhava até o sofá. Senti aquela dor maldita nas costelas e me apoiei no acolchoado.

— Tá com dor?

— Um pouco.

— Tem que descansar, rapaz. — Wilhelm se levantou, andou até mim e parou do meu lado. — Precisa de ajuda?

— Não… — A fisgada veio com tudo. — Porra…

Meu pai passou o meu braço ao redor do seu ombro.

— Em que problema você foi se meter, Wolfgang.

— Desculpa. — Ele me ajudou a caminhar até o meu quarto e a me sentar na cama. Meu pai se sentou ao meu lado.

— Eu tô preocupado com você. — Os olhos azuis me fitaram de relance.

— O médico disse que é normal sentir dor.

— Não é só isso. — Wilhelm suspirou. — O que aconteceu não pode se repetir. Você quase foi morto.

— Eu sei, pai.

— Você me prometeu várias vezes, Wolfgang. — Sua voz saiu cansada. — Mas você continua a se colocar em risco.

— Pai, desculpa. Eu fico com raiva e não consigo controlar. É uma merda. Mas eu tento. O senhor não sabe o quanto eu tento.

— Toda noite, quando você demora, eu penso que alguma coisa aconteceu com você…

Odiei a mim mesmo naquele momento. A aberração que eu era só trazia dor para todo mundo. As lágrimas encheram os meus olhos e não me senti digno de responder o que o meu pai disse.

— Eu só tenho você, meu filho. — Quando Wilhelm disse isso, as lágrimas cederam. — Isso tem que valer de alguma coisa.

Aquilo valia mais do que tudo e, por isso, eu tinha asco de mim. Eu era uma criaturinha descontrolada como um animal raivoso e estava machucando a pessoa que eu mais amava.

Senti a mão calejada do meu pai contra o meu ombro. Sequei as lágrimas com as costas da mão. Em seguida, o senhor Dietze bagunçou o meu cabelo, como ele fazia para demonstrar afeto. Meu pai não era bom com as palavras.

Eu só consegui ir até o banheiro para tomar um banho após a dor passar. Era próximo da meia noite. A culpa estava me atormentando, pois meu pai precisou até mesmo levar a janta para mim no quarto. Eu era um fardo que se tornava cada dia mais pesado para ele.

Enquanto tomava banho, ouvi aquele ruído maldito. Olhei pela pequena janela do banheiro e a luz esmeralda estava cintilando do lado de fora.

A espuma que escorria dos meus cabelos começou a ganhar nuances rosadas cada vez mais intensas.

Tateei o corte na sobrancelha e senti os pontos. A sutura continuava ali, o corte não estava aberto. Toquei o meu rosto e meus dedos deslizaram sobre algo quente debaixo do nariz. Fitei as minhas mãos e vi sangue. Senti aquele líquido quente e denso, com cheiro metálico, escorrendo em grande quantidade. Saía das narinas, passava pelos lábios e descia até o queixo, gotejando no chão molhado e se misturando à água límpida.

— Porra, o que é isso? — Falei em voz alta. Cogitei ser uma sequela dos ferimentos que sofri. Pensei em pedir ajuda para o meu pai, mas ele já tinha ido dormir. Como eu já havia dado muito trabalho para ele, resolvi poupá-lo da minha inutilidade. Eu não precisava me tornar um fardo ainda mais pesado.

O sangue continuou a escorrer junto da água e da espuma. O som estridente ficou ainda mais agudo e os meus ouvidos doeram.

Fui atingido por uma tristeza excruciante. As lágrimas se misturaram ao sangue enquanto desciam pelo meu queixo. Eu não sabia a razão daquele sofrimento, mas não pude parar de senti-lo.

Era tanta dor…

Como alguém poderia suportar tanta dor? O choro se tornou tão intenso e aquele sofrimento tão opressivo que eu gritei.

Eu estava chorando e gritando de maneira patética. Meu peito estava sendo apertado e eu só queria rasgar a minha pele, quebrar meus ossos e arrancar aquela dor lá de dentro. Eu preferia ter os ossos quebrados a sentir aquilo. Queria me rasgar, me destruir, fincar as unhas em minha pele e me esfolar. Eu só não queria continuar a sentir aquele sofrimento.

Cerrei os dentes para tentar o aliviar,  finquei as unhas nas palmas das mão e senti minhas pernas tremerem. Nada adiantou.

O sangue parou de escorrer do meu nariz e a água limpou o meu rosto. A espuma avermelhada voltou, aos poucos, a escorrer branca e a água se tornou transparente mais uma vez. Do lado de fora, a luz não cintilava mais e o barulho agudo e infernal cessou.

Entretanto, eu ainda estava chorando, consumido por um sofrimento sem razão.

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