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O Viajante - Capítulo IX - Wolfgang - Fevereiro de 1973

Eu estava bastante ansioso para a noite chegar. Não me importei com a encheção do Silva naquele dia, pois minha mente estava focada em ir para aquela rua com a qual Mikael e eu sonhávamos.

Cada minuto parecia demorar uma hora inteira. O maldito dia não passava de modo algum. Na minha percepção, foi como se eu estivesse há dias esperando o menor ponteiro do relógio tocar o 6.

Mas finalmente, junto com o céu pálido com nuances alaranjadas do entardecer, aquele tão esperado horário chegou.

— Silva! — Chamei o patrão, que ouvia rádio e fumava. Ele me olhou. — Tô indo embora.

— Nem fodendo. Você vai fechar o bar hoje, Grilo! — Disse com sua voz estrondosa. Caminhei em direção à porta do bar, sem dar muita atenção ao patrão. — Não tá me ouvindo, não?

— Hoje você fecha. — Disse conforme saía do estabelecimento. — Tchau!

— Vou te mandar pra rua, moleque! — Ouvi ele gritar de dentro do bar. Fui até a calçada e acendi um cigarro enquanto esperava o Mikael. Observei o tráfego da rua. Tantas luzes e barulhos me deixavam ligeiramente tonto.

Não demorou muito para Mikael aparecer dirigindo um carro azul. Eu andei de carro poucas vezes na minha vida. Roberto, o marido de Norma, tinha um. Nos raros momentos em que meu pai e eu interagimos o suficiente com ele para ir a algum lugar, eu fui passageiro no carro do Roberto.

Caminhei até o veículo. Mikael me cumprimentou com um aceno breve e acenou com a cabeça para a porta do lado do passageiro. Abri aquela porta e entrei no carro.

— Oi. — Cumprimentei.

— Oi. — O enfermeiro retribuiu. Eu não consegui sustentar o contato visual por muito tempo.

— Tá sabendo que eu peguei aquelas moedas pra mim, não é? — Falei de forma irônica. Na verdade, eu as depositara na caixa registradora do Silva.

— Você roubou seu patrão? — Também notei sarcasmo em sua voz. Ele deu partida no carro.

— O cliente que foi burro. A Coca era por conta da casa. — Mikael riu. Olhei a rua pela janela e encarei o céu que, aos poucos, anoitecia. As primeiras estrelas começavam a aparecer.

— Eu não ia sair sem pagar, Wolfgang. — Disse após sua risada cessar.

— É brincadeira. Eu guardei na caixa registradora. Você deu dinheiro pro Silva.

— Mas se fosse verdade, eu não me importaria. — Disse de maneira calma e um pouco distante, como se estivesse distraído.

— Você ia financiar o meu roubo?

— Não. É, esquece. Falei merda. — Foi como se ele voltasse a si naquele momento, saindo de sua divagação.

— Você é esquisito… — Verbalizei. Nós dois ficamos em silêncio. Meus olhos então voltaram a acompanhar o trajeto. As calçadas, ruas e árvores pareciam se mover ao serem vistas pela janela do carro. Por vezes, meus olhos iam até às estrelas. Os pontos cintilantes no céu aumentavam a cada instante. 

Eu estava distraído quando senti, aos poucos, o carro parando. Mikael o estacionou ao lado de uma calçada. Do outro lado da rua, estava a tal Alves Discos. A fachada era pintada de roxo escuro. Aquele disco de vinil com uma chave de Sol no meio era ostentado em uma pintura na parede roxa. Embaixo do desenho, estava escrito Alves Discos. A porta era de vidro e metal. O metal era tingido de preto. Ela estava trancada.

— É aqui.

Assim que levei meus olhos para aquela rua, um zunido baixo tomou conta de meus ouvidos. Meu coração bateu fortemente contra meu peito e senti minha respiração dolorosa. Também senti tristeza. Uma tristeza que inundou os meus olhos.

— Wolfgang? — Ouvi a voz de Mikael extremamente distante, por mais que ele estivesse ao meu lado. Minhas mãos suadas foram até a maçaneta da porta, inundando-as de suor.

Abri a porta do carro azul e saí dele. Eu não era capaz de sentir meus pés no chão. O som estridente ecoou, cada vez mais alto. Eu fui atraído pelo encontro da rua com a calçada. Era ali. Eu sentia que era ali. Eu sabia que era ali.

Caminhei até a placa que sinalizava a faixa de pedestre e vi o mesmo anúncio que havia visto em meus sonhos. Não era mais um sentimento, uma sensação, mas sim uma certeza. Era realmente aquele local. As lágrimas em meus olhos cederam e escorreram por minhas bochechas.

A luz verde começou a emanar, vi minha pele a refletir. Olhei para o céu e ele cintilava em verde. O brilho pulsava, variando entre em um verde brilhante e intenso que cobria todas as estrelas e um brilho mais apagado que as revelava.

O local começou a se tornar, lentamente, nebuloso. A névoa veio do horizonte, de todas as direções, e cobriu a rua, atrapalhando-me a enxergar ao meu redor. Olhei para trás e vi Mikael levemente coberto pela névoa esbranquiçada.

— Você tá vendo isso? — Perguntei. Minha voz ecoou bem alto, como se ela pudesse ressoar por todo o espaço.

— Sim… — A voz dele também ecoou e ele olhou para o céu, certamente tão atônito quanto eu.

Vi alguém se aproximando e atravessando a neblina. Era eu mesmo. Aquela minha versão mais jovem que vi na minha casa outro dia. Não senti medo ou me assustei. Mas a tristeza apertou o meu peito com mais intensidade ainda. Meu choro silencioso se transformou em soluços. Aquela dor era opressiva.

Senti um soco contra o meu rosto e cambaleei para trás. Minha versão mais nova tinha acabado de me bater.

— Que porra é essa? — Indaguei com a raiva queimando em meu peito. Eu ainda chorava.

— Ou você mata ou você morre. — Ele respondeu entre dentes.

— Fala com clareza, porra. — Talvez por ele ter o meu próprio rosto, ainda muito jovem, eu não era capaz de revidar o soco.

— Vai ser pior pra todo mundo. — As lágrimas escorreram dos olhos dele também.

— Wolfgang! — Mikael me chamou. Virei-me para o olhar. O enfermeiro acenou com a cabeça para o horizonte.

Vi ele mesmo surgindo pela neblina. Usava um uniforme de colégio e carregava uma mochila nas costas. Seu rosto estava menos angular do que o do Mikael de atualmente. Ele tinha as bochechas mais rechonchudas e um olhar infantil.

O Mikael - o enfermeiro adulto - aproximou-se daquela sua contraparte que usava um uniforme de um colégio.

— Esse era eu quando era adolescente. — O rapaz sussurrou ao meu lado. — O uniforme do colégio presbiteriano… Eu estudei lá…

Aquele Mikael adolescente apenas olhou para a sua versão adulta de relance e seguiu o caminho até sumir no horizonte.

Quando voltei a fitar a mim mesmo, percebi que o Wolfgang mais jovem me olhava com raiva.

— O que é isso? — Indaguei. — Explica essa merda.

Ele negou com a cabeça e se afastou correndo. Tentei correr atrás dele, mas após alguns passos, minhas pernas tremeram e eu caí no chão. Bati os joelhos, cobertos pela calça jeans, no asfalto duro. Mikael andou até mim e ergueu a mão para me ajudar a levantar. Usei sua mão como apoio e fiquei de pé, sentindo minhas pernas doerem.

E quando olhei para névoa, uma moça surgiu. Parecia ser uma adolescente. Também tinha bochechas infantis, como o Mikael da época do colégio. As feições de sua face eram delicadas. Tinha as maçãs do rosto proeminentes, olhos amendoados e lábios carnudos. Seus cabelos eram crespos e estavam presos, por uma presilha, atrás da cabeça. Aquilo parecia os deixar menos volumosos. Sua pele era negra. Ela usava óculos redondos de aros dourados. Vestia uma saia longa, até abaixo dos joelhos, em um padrão xadrez de vermelho e preto. Sua blusa tinha mangas compridas e gola alta e era marrom.

Em passos rápidos, a garota foi até a loja de discos. Ela olhou para Mikael e para mim de relance. Pude sentir os olhos da moça encarando os meus.

Num instante, o mundo voltou ao normal. Não havia neblina, nem a luz verde no céu ou o barulho estridente. A garota também sumiu. Alguns transeuntes, que pareciam ter aparecido do nada, andavam calmamente pelas calçadas.

— É uma das silhuetas… — Sussurrei.

— Sempre um mais novo e outro mais velho. Acho que são esses os pares.  — Mikael falou de maneira hesitante.

— Acho que você tá certo… — E, bruscamente, senti uma dor no meu peito. Eu não conseguia respirar. Comecei a arfar, buscando o ar.

— Wolfgang? — O enfermeiro me chamou, sobressaltado. Levei as unhas até o pescoço, tentando fazer o ar entrar de algum modo. Mas nada adiantava. Finquei as unhas na minha pele, agitado pela agonia de não conseguir aspirar o ar. — Merda. Vem…

O rapaz colocou o meu braço ao redor do meu ombro. Eu já não conseguia andar. A minha visão começou a se tornar turva.

— Eu… Tô morrendo… — Foi o que consegui dizer antes de desmaiar.

Eu estava de novo debaixo do céu cintilante em verde. O esplendor refletia na minha pele pálida. Fitei as minhas mãos. Tinha sangue debaixo das unhas. Que tristeza opressora. Doía mais do qualquer sofrimento que experienciei em toda a minha vida.

Aos poucos, meus olhos se abriram e eu despertei daquele sonho.

— Wolfgang. — A voz do Mikael me chamou. Respirei, naquele momento, todo o ar que consegui. O ar encheu os meus pulmões. Senti minhas costas contra uma superfície acolchoada. Estávamos no carro.

— Que… — Minha voz estava fraca. — Que porra…

— Que merda… — Ele respirou aliviado. — Você acordou. Que bom…

— Faz muito tempo que eu desmaiei?

— Não. Foram só alguns segundos…

— Eu não conseguia respirar. — Passei os dedos no meu pescoço e senti uma leve ardência. Minhas unhas tinham machucado a pele.

— Assim que você perdeu a consciência, sua respiração voltou ao normal.

— Essa merda foi muito doida…

— Eu ainda tô sem acreditar direito. — Os olhos foram até o horizonte, encarando-o pelo vidro do carro. Ainda estávamos na rua da loja de discos.

— A gente viu a mulher.

— Parecia uma adolescente.

— Talvez ela seja mais velha hoje em dia… Eu não sei qual das silhuetas que vi dela era a mais nova. Só sei que a moça que vimos é a da silhueta de cabelo menos volumoso.

— Ela tava indo pra loja de discos. Eu conheço o Alves. Faz tempo que não vou lá, mas posso tentar perguntar se ele conhece a menina.

— Acho difícil conseguir descobrir só com uma descrição física. — Meu peito ainda estava dolorido.

— Mas não custa tentar. É a única pista que a gente tem.

— É, você tá certo.

O Mikael girou a chave na ignição e deu partida no carro. O percurso foi silencioso. Eu ainda tentava respirar com calma para que meu peito parasse de doer.

No caminho, o enfermeiro parou em um posto de gasolina e abasteceu o carro. A noite já caía e era tarde.  Mikael se ofereceu para me deixar em casa, uma vez que eu não estava muito bem.

Minha casa era relativamente longe do centro. Passamos por algumas ruas vazias e escuras. Por quase todo o caminho, fiquei olhando o céu e suas estrelas, ainda incrédulo com a experiência que tivera. 

— Merda, merda, merda... — Ouvi Mikael praguejar. Olhei-o assustado e então vi a razão daquele desespero. Tinham duas viaturas paradas, bloqueando a passagem. Dois policiais sinalizavam para que parássemos.

— Você não tem  habilitação, não é? — Perguntei, olhando-o com o canto dos olhos.

— Não. — Aquilo era péssimo. Certamente, aquela movimentação estava acontecendo pelos atos de protesto que estavam convulsionando na cidade.

— Fodeu. — Meus olhos pesados foram até os policiais.

Não havia outra escolha a não ser parar e foi o que o Mikael fez. Um dos policiais pediu a habilitação dele.

— Eu esqueci em casa… — Mentiu. Ele mentia mal pra cacete.

— Sei. Sai do carro. Vocês dois. — Se eu pensava que meu pai tinha uma voz ríspida, é porque nunca escutei aquele homem falar. Obedecemos. O outro policial começou a revistar o carro.  Sem dizer nada, o primeiro policial - da voz ríspida - tateou meus bolsos e puxou minha carteira.

— Que porra de nome é esse? — Perguntou, olhando para mim após ler o nome em minha identidade. Eu não queria ter que falar da ancestralidade do meu pai. Para muitos, ser austríaco era sinônimo de ser ou ter sido nazista. Minha família era e havia sido avessa a essa ideologia nefasta.

— Meu pai não é brasileiro. — Disse sem o olhar nos olhos.

— E de onde ele é?

— Áustria. — O policial jogou a carteira com força em meu rosto. Senti uma dor aguda no nariz nesse momento. Segurei a carteira e a vi vacilar em minhas mãos, mas não a derrubei. Guardei-a no meu bolso e olhei com o canto dos olhos para Mikael. O policial não conseguiu devolver a carteira dele da mesma maneira que devolveu a minha, pois o enfermeiro a segurou a tempo.

Senti cheiro de sangue e algo escorreu do meu nariz. Ao limpar, vi o sangue escuro sobre meus dedos. O filho da puta machucou o meu nariz ao jogar a carteira.

— Dirigindo sem carteira a essa hora. Coisa boa não é. — Ele olhou para o outro policial que fechou a porta do carro azul com força. — Almeida, prende eles!

— Não! A gente não fez nada demais. Esse carro é do meu pai, eu só o peguei emprestado para sair com o meu amigo! — A voz de Mikael parecia desesperada. Era a primeira vez que eu o via daquele jeito. Pelas luzes da viatura, notei que tinham lágrimas nos olhos dele. O desespero transparecia em seu semblante.

— Vai ter que pedir pro seu papai ir te buscar na delegacia. — O policial, que deu a ordem para nos algemar, disse com escárnio. Eu senti meus pulsos envoltos naquele rígido metal gélido atrás do meu corpo e meu peito ardeu em raiva. Respirei lentamente, tentando me acalmar.

— Não faz isso, por favor. — Quanto mais Mikael pedia, mais desprezo transparecia no rosto daquele homem. Mikael estava alimentando o policial com o que ele mais desejava.

— Menezes, deixa os garotos. Isso só vai dar dor de cabeça para todo mundo. — O outro reclamou, enquanto terminava de algemar o Mikael. — Mais trabalho… Eles são só dois moleques se divertindo por aí. Não tinha nada no carro.

— São dois moleques sem juízo.

— Coisa de jovem, Menezes. — O tal Almeida retrucou.

— Tá bom, Almeida. Tá certo. Esse seu coração mole, hein… — Eu não consegui me lembrar o que aconteceu nesse intervalo de tempo, pois apenas senti uma forte pancada  contra meu rosto e caí sentado no chão.

— Por que você fez… — Era a voz de Mikael, mas logo ela foi calada por um soco também.

— Porra, Menezes. Qual a necessidade disso? — Almeida reclamou.

—  Pra eles ficarem espertos.

— Você só tá sendo cruel, cara. — O policial de sobrenome Almeida parecia ter sensatez, enquanto Menezes  era como um cão raivoso. Levantei meus olhos para esse animal, sentindo a fúria queimar em meu peito. Eu tentei, mais do que tudo, me controlar. Prometi isso ao meu pai.

Queria ter conseguido. Talvez pudesse ter conseguido…

Se Menezes não  tivesse me batido.

— Vai se foder! —  Cuspi aquelas palavras. Eu pude sentir que Mikael e Almeida me olharam incrédulos. Mas não vi o que aconteceu depois do chute que tomei na minha cabeça

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