5 - AGOSTO DE 1864 - parte 2
Quanto tempo mais teria que ficar aqui? Eu sabia que minhas escolhas eram escassas, principalmente depois da demonstração de Saito, eu não tinha chance contra eles.
Meu otimismo inicial, aquele que eu tentei manter desesperadamente, pouco a pouco ia desabando. Meus pensamentos ultimamente eram obscuros sem o menor sinal de esperança.
Os dias se passaram cada vez mais nublados em minha mente. Eu não odiava nenhum dos rapazes apesar do ocorrido inicialmente e para o meu desespero estava me apegando a eles pouco a pouco. Eram pessoas incríveis, que apesar da pose que colocavam em tudo, eram gentis e ajudavam todos na cidade.
Fui algumas vezes em rondas com eles, mas passei a recusar a maior parte. Eu não podia me apegar a eles, eu iria embora e isso me frustrava, me deprimia.
Eu tinha sido empurrada para esse mundo, estava assustada com o rumo que as coisas estavam tomando e não podia controlar esse sentimento de culpa ou de medo de deixá-los, mas também queria voltar para casa.
Peguei o desenho que eu havia começado. Era uma imagem onde estavam os 7 capitães treinando, de acordo com o que eu havia visto: Yukio, Tashiro, Saito, Isao, Satoru, Natsu e Tatsuo. Eles treinavam com frequência no pátio próximo ao meu quarto.
Desenhar era um bom passatempo e eu cada dia que passava estava ficando melhor. Terminei o desenho e fiquei olhando para minha obra em um papel pouco maior que um A3.
– Eles são bons homens no fim das contas... – falei baixinho olhando para cada um deles.
– Woooow.... que lindo! – Mikah disse atrás de mim me dando um susto. Tentei pegar o papel e escondê-lo, mas foi tarde demais, ele o pegou antes e correu pelo corredor.
Fui atrás dele desesperada.
– Mikah, volta aqui com isso! Agora! – eu gritava o nome de Mikah, que corria para o refeitório.
– Mikah, não ouse fazer isso! – eu gritei ainda mais alto enquanto tentava alcançá-lo. Eu sabia que todos estariam no refeitório àquela hora.
Tarde demais. Mikah entrou chamando atenção de todos que estavam ali com o desenho aberto.
– Ela disse que vocês são bons homens! – ele gritou enquanto mostrava o papel para todos.
Fiquei paralisada na porta, sentindo o rosto queimar.
– Sabia que você é um tanto ingênua? – Tashiro disse sobre meus ombros me fazendo novamente pular com um novo susto – Além de ser ingênua, você está na passagem.
– Desculpa – sussurrei liberando o caminho e recomeçando a voltar para o meu quarto.
– Oh, não... fica aqui um pouquinho – ele segurou meu braço me forçando a voltar – Estou louco para ver a reação de todos.
– É... é só um desenho, eu tenho muitos outros – disse tentando me desculpar novamente.
Mikah gargalhava, até que me devolveu o desenho enquanto ainda ria.
– Eu vou te matar, Mikah – eu disse baixinho entredentes para ele, o que o fez rir mais.
– Vai se você for capaz de me pegar – ele disse mostrando a língua e correndo para fora.
Olhei para Tashiro que seguia me segurando com uma das mãos enquanto pegava o desenho sorrindo. Tentei me soltar e voltar, mas na mesma hora Saito apareceu perto da porta, chegando de algum lugar. O primeiro que viu, obviamente foi o desenho.
– Faz quanto tempo que você está aqui? – perguntei gaguejando, torcendo para que ele não tivesse ouvido o que Mikah tinha gritado.
– Acabei de chegar – ele respondeu sem alterar suas feições.
Soltei o ar, tentando acalmar o coração que estava muito mais acelerado do que o normal.
– De qualquer jeito – Saito continuou – não é como se o que Mikah falou fosse te causar problemas.
Senti meu rosto queimar mais uma vez. Saito olhou para mim, depois para Tashiro e juntou as sobrancelhas de uma maneira quase imperceptível.
– Tinha ido te chamar para o jantar, mas... Estou interrompendo algo? – ele perguntou com uma leve irritação na voz.
– Não! – respondi na mesma hora em que ouvia Tashiro dizer "sim".
Lancei a ele um olhar furioso.
– Ei, vocês dois estão deixando-a sem graça – Tatsuo disse levantando-se e indo em nossa direção. Empurrou primeiro Tashiro e na hora de empurrar Saito, repensou e apenas disse – Está na hora de jantar, estamos todos com fome.
– Minhas desculpas, Tatsuo – Saito disse cordialmente enquanto finalmente passava por nós.
– Venha Ambar, se não, não vai sobrar para você! – Tatsuo disse me chamando animado.
– Desculpa Tatsuo, eu estava pensando em comer no meu quarto – me desculpei novamente tentando voltar.
– Não, não mocinha – ele disse sorrindo largamente – Hoje você come com a gente.
Me sentei próxima a Satoru e Natsu me sentindo um pouco envergonhada com o ocorrido, mas eles nem pareciam perceber. Eles começaram a falar alto e rir. Notei que Yukio, Isao, Tanizake, a senhora Tanizake e Takashi não estavam. Mikah também não havia voltado para comer.
Natsu começou a roubar a comida dos pratos vizinhos, dizendo que seguia com fome, enquanto eu podia ouvir a reclamação de quem tinha sua comida roubada.
– Sobrevive só o mais forte – ele dizia frente as reclamações e ameaças.
– Sai, seu brutamontes. Saco sem fundo – Tatsuo gritou na vez em que teve a dele roubada.
– Que constrangedor, devo pedir desculpas a você por isso – Satoru disse baixinho para mim.
Eu os olhei brigando e lembrei de casa, das brincadeiras, das provocações. Lembrei de Ari e Lucca. Lembrei de mamãe dizendo para não jogarmos comida um no outro, que aquilo era errado e sorri, sorri de verdade. Sorri porque aquilo era familiar, sorri porque me senti entre amigos. Sorri porque esqueci da minha verdadeira situação. Sorri porque eram boas companhias e sorri acima de tudo, porque éramos mais parecidos do que eu poderia imaginar e ainda sorrindo eu respondi.
– Tudo bem, eu gosto disso.
– Gostar de tal insanidade não deve ser saudável... – Saito disse – Hey. Essa comida é minha!
– Sabe, você deveria sorrir mais vezes assim – Satoru disse baixinho – Você fica realmente linda quando sorri, talvez tivesse derretido o coração de todos desde o primeiro momento.
– Ei, ei, que tal tomarmos algo? – Natsu sugeriu.
– Ótima ideia – Tashiro disse – Que tal um pouco de saquê para comemorar, finalmente, a companhia da dama? – ele se virou para mim sorrindo laconicamente.
– Acho que beberei um pouco de saquê também nesse caso – Satoru disse ao meu lado.
Eu os olhei e de repente senti a tristeza me invadindo novamente, eu teria que ir embora algum dia.
– Me escuta – Saito disse diretamente para mim – Se você deixar tudo isso te afetar, você vai perder. Você tem algo importante para proteger, não? Então não perca.
Ele disse sério, e então eu notei que todos ali estavam tentando me animar. Todos haviam feito isso para que eu pudesse realmente me sentir melhor e me perguntei se isso estava acontecendo desde a hora em que Mikah havia ido ao meu quarto, ou... desde quando eles estavam se esforçando para que eu me sentisse em casa?
Era estranhamente reconfortante comer ao lado de mais pessoas novamente, e pouco a pouco eu relaxei a ponto de esquecer o como havia chegado ali naquela tarde, da vergonha que havia passado, pude até mesmo esquecer o desenho, que aparentemente Tashiro guardou para si.
Notei Satoru me olhando e sorrindo algumas vezes, do mesmo jeito que meu irmão fazia quando queria me animar e via que havia funcionado. Me senti agradecida a ele. Me sentia confusa, não sabia como me sentir, mas naquele momento, eu queria apenas aproveitar a companhia de todos.
– Não, ela não bebe – Tashiro disse rindo quando Satoru me ofereceu um pouco de saquê também.
– Já perguntou a ela se ela bebe ou não? Ela não é daqui, de repente, de onde ela vem, mulheres bebem – Satoru respondeu enfaticamente – Ambar, quer beber um pouco?
– Está bem – eu disse pegando um masu com saquê que ele havia me oferecido, o cheirei antes e pude sentir um aroma adocicado, lembrei das vezes em que estive em restaurantes japoneses e tomava uma dose de saque para acompanhar o sushi. Tomei de uma tragada e saboreei cada gota do saque descendo pela garganta.
– Wow... ela não fez nem careta... te ganhou nessa com certeza, Natsu – Tatsuo disse provocando-o.
Nos divertimos, rimos e conversamos sobre muitas coisas, mas, como filha de Erubus e herdeira do trono dos nefilins, parece que eu estava fadada a ter minha felicidade sempre interrompida.
A porta que dava para a cozinha se abriu em um estrondo.
– Senhores, vocês têm um segundo? – Takashi disse em voz grave e solene.
O clima da sala desapareceu quase que instantaneamente.
– Houve um ataque, Yukio não especificou se foram soldados da China, dos Hunos ou se foi um daqueles monstros novamente, mas Isao foi gravemente ferido.
– O que?! – eu falei espantada para mim mesma e a sala entrou em um silêncio mortal.
– Um homem que se diz médico, fez os primeiros socorros e o medicou. Parece que ele irá sobreviver, mas não sabemos se poderá seguir lutando.
Eu soltei o ar que eu não tinha percebido que estava segurando até aquele momento.
– Ele estará aqui em breve, mas pedirá permissão para tirar a vida com dignidade – ele deixou essas palavras pairando no ar e se virou para avisar outras pessoas.
– Se sua lesão é grave – Saito disse com a voz firme – Deveremos atender ao pedido dele. Um samurai não é nada se não puder lutar.
– Não! – eu disse alto e em um tom grave que deixou todos um pouco atônitos...
– Você não entende, Isao vive para lutar, como nós... se ele não puder mais... – Tashiro começou a falar, mas não terminou.
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