37 - NOVEMBRO DE 1865
Naquela noite, Yukio e Tanizake voltaram para o complexo após dias ausentes.
- Desculpa por termos demorado - Yukio se apressou a dizer quando nos viu no salão.
- Parece que já faz um tempo desde a última vez que estivemos aqui - Tanizake falou um pouco mal-humorado, humor que ele mantinha com frequência já fazia um tempo.
Tanizake não parecia estar entusiasmado em estar de volta, principalmente após as brigas entre ele e Natsu e parecia que Tanizake guardava um certo ressentimento contra o amigo desde a derrota em Kofu.
- Sem problemas - Saito falou com seu tom habitual e se curvou rapidamente para cada um deles - Fico feliz em ver que vocês dois estão seguros.
Já fazia algum tempo desde a última vez que os vimos, mas Natsu e Satoru não vieram recebê-los como era costume antes. Eu sabia que não havia nada a ser feito sobre isso, mas o salão parecia tão vazio sem eles.
- Tudo bem - Yukio disse suspirando - Precisamos de todos aqui. Alguém pode ir chamar Natsu e Satoru por favor?
Saito se prontificou a fazê-lo e voltou rapidamente com os dois, eles entraram silenciosos sem saudar os recém-chegados.
- O inimigo tem essas almas malditas, armas e agmas - Yukio iniciou com a voz baixa, mas constante - está claro que não conseguiremos chegar a lugar nenhum tentando atacá-los.
Vi que todos acenavam, apenas Tanizake seguia emburrado em seu canto.
- Sim - Saito seguiu - são difíceis de matar e diferente de alguns de nós, eles não têm aversão ao sol.
- O que é isso? - Tatsuo perguntou surpreso.
- Resumindo, almas malditas ou maldições como as chamamos muitas vezes, são almas que fizeram pacto com alguma entidade ainda em vida e, portanto, passam a ser escravos de quem aceitou o pacto. Eles não possuem aversão ao sol porque simplesmente não são seres noturnos, são seres humanos. Quando eles voltam ao mundo humano, seus corpos passam a ser temporários, o ato de atacá-los no coração ou cortar suas cabeças, inutiliza os corpos, fazendo com que suas almas voltem para Himura.
- Isso é um pacto, então? - Satoru perguntou baixo - Foi isso que Tashiro fez?
- Sim - falei sem coragem de olhá-lo diretamente.
Notei que todas as cabeças se viravam novamente para mim. Era difícil saber se me julgavam ou o que pensavam e eu não estava interessada realmente em saber.
- Uma outra pergunta - Yukio seguiu - Fui informado de que há outro nefilim ou outro ser junto com eles que está treinando os inimigos, o que sabemos dele até agora?
- Bem... - Saito olhou para mim hesitante, dei a ele um pequeno aceno de cabeça e seus lábios se apertaram em confirmação - Eles estavam lá com Kiyoshi que está conectado diretamente com Saikhan. Quanto aos treinamentos, eles estão sendo treinados por um homem chamado Viter Anhely. A velocidade e força de suas tropas parecem ser superiores às de nossos homens.
- Viter Anhely - Yukio passou a mão no queixo e franziu a testa enquanto pensava - Não lembro de ter ouvido esse nome antes.
- Am ... Ele... ele é meu pai - me forcei a falar. A frase saiu cuspida e rápida - Ele foi capturado e lorde Saikhan o transformou, porém, parece que ele foi corrompido. Aparentemente o sol não o incomoda e apesar de Saito ter ganhado dele, ele tem muita experiência em treinamento de tropas.
Falei tudo sem olhar para ninguém, eu olhava para baixo, para os meus próprios joelhos.
- Entendo - Yukio seguiu sem nenhum tom de acusação - A luz do sol não os incomoda, são fortes e são bem treinados. Isso não é bom.
Seus dedos batiam distraidamente no chão. A conversa em si era realmente muito importante, todos estavam na sala, mas apenas Saito e Yukio conversavam. Tanizake suspirou desanimado em vários pontos, mas ficou silencioso o tempo inteiro, ele parecia haver perdido toda a sua ambição. Não sabia dizer se Natsu e Satoru estavam prestando atenção na conversa e Tatsuo as vezes olhava para mim com um semblante preocupado e as vezes parecia perdido em pensamentos. O fardo sobre todos eles parecia que só aumentava. De repente senti falta de Tashiro e suas piadas fora de hora.
Me sentia inútil, e tudo o que eu podia fazer era me sentar e vê-los lutar a cada dia, levando seus corpos ao máximo até o ponto de quase desmaiarem.
- De qualquer maneira - Yukio disse acenando para um soldado que estava próximo a porta - Trouxemos uma dessas coisas para nos dar alguma informação do inimigo.
O soldado veio arrastando um agma inimigo que se debatia enquanto repetia a palavra "sangue" e "matar" a cada meio segundo. Olhei com pena para o homem que beirava a loucura total.
- Coisa não - resmunguei - ele...
- O que você disse? - Tatsuo perguntou tentando me ouvir.
- Disse - falei um pouco mais alto para que ele ouvisse - Disse que não é "coisa", é ele.
- Que diferença faz se o chamamos de coisa ou de ele? - Yukio perguntou com certa impaciência.
- Faz toda a diferença - falei mais para mim mesma que para ele, mas logo me virei em direção a ele - Aprendi com você que devemos honrar nossos inimigos.
Ele sorriu.
- Que inferno - Tanizake falou - Essa coisa matou meus homens e você o quer honrar? Esse monstro? Esse.... esse demônio.
Olhei para ele e sorri com tristeza. Ele pareceu de repente sem graça com o que havia dito e tentou se arrumar.
- Eu... eu não quis dizer que você... - ele não conseguia concluir.
- Eu entendi o que você quis dizer - falei ainda sorrindo tristemente - demônios são seres cruéis, não é mesmo? Matam por prazer, usam as pessoas e as mantém como escravos. Mas, se eu fizer distinção dele, como eu poderia olhar para vocês depois? Como eu seria capaz de dizer que ele é uma coisa sem pensar o mesmo de vocês? Vocês não são coisas, são pessoas e boas pessoas. Ele matou seus homens? Quantos homens de seus inimigos você também matou? Sei que você está frustrado, senhor Tanizake, mas não perca seus valores por isso.
A sala caiu em um silêncio fúnebre por uns minutos até que Yukio seguiu.
- Acho que devemos fazê-lo falar no fim das contas - Yukio falou suspirando - Ambar, se não aguenta ver essas coisas, sugiro que deixe o salão por enquanto.
- Não tenho medo de torturas. Não leve o que eu falei antes como uma fraqueza, ele continua sendo meu inimigo e não me importo de usar da tortura para que ele fale.
Mas ele não falou. Tentávamos fazer com que ele nos desse qualquer pista, e por mais que os capitães o torturassem ele apenas ria sem dizer uma palavra. Ficamos olhando para ele um tempo, ninguém falava nada, ficamos simplesmente ali parados, tentando decidir o nosso próximo passo e então eu senti uma presença sufocante chegando, minha respiração começou a ficar difícil. Eu suei frio, o agma parou de rir e começou a tremer e se jogou no chão. Me arrastei até onde Yukio havia caído, eu havia ensinado Saito e Tatsuo a levarem seu ruah para o corpo, mas nunca havia feito isso com Yukio.
- O que está acontecendo? - Satoru correu em direção a Saito que estava dobrado com a roupa já molhada de suor enquanto Natsu tentava ajudar Tatsuo.
- Yukio - falei com dificuldade. Se estava insuportável para mim, não conseguia imaginar como eles estavam aguentando - Tenta achar um foco um pouco acima do estômago. Esse é o seu ruah, se concentra e tenta enviá-lo para o resto do corpo.
Minha voz saiu ofegante e comecei sentir a garganta fechar.
- Ambar - o senhor Tanizake tentou me levantar.
Senti a roupa grudar na pele e olhei para trás a tempo de ver um portal se abrir. Diferente de nós, os portais dos ceifeiros eram muito mais sutis. Do portal saiu primeiro Ceci, nossa rainha. Me arrastei com esforço, praticamente limpando o chão com o corpo para próximo dela e tentei me manter de joelhos sem muito sucesso. Fiz o possível para não olhar direto para ela, pois assim havia aprendido. Todos pareceram ver, pois a sala estava completamente silenciosa a não ser pelos gemidos de dor do agma, de Tatsuo, Yukio e Saito. Ceci olhou para Tatsuo que segurava a cabeça e gemia cada vez mais alto, com tal visão, ela externizou seu ruah, um poder que eu nunca havia visto, mas que eu sabia que poucos eram capazes de usar. Seu ruah era uma jovem extremamente branca na qual ela chamou de Endy.
- Endy, crie uma barreira protetora para todos eles, por favor - sua voz era suave.
- Sim, senhora - Endy respondeu e de uma maneira suave, como se deslizasse, foi para o centro do salão e criou uma barreira protetora, fazendo com que todos nós finalmente pudéssemos respirar melhor.
Logo atrás dela apareceu Ükhel, nosso rei. Me sentei sobre os calcanhares, coloquei minhas mãos ao chão e coloquei a testa sobre as mãos. Ele estava sério como todas as vezes que eu o havia visto, algo que dava um grande contraste com o agradável sorriso de Ceci.
- Meu rei - disse com a voz firme, tentando não demonstrar o nervosismo que eu estava sentindo.
- Pode se levantar, Ambar - Ceci disse carinhosamente. Levantei o corpo, mas não ousei ficar de pé. Segui de joelhos.
Ao lado esquerdo do rei, estava Uiara, uma menina que aparentava uma fragilidade grande, tinha a aparência de no máximo 10 anos humanos, mas eu sabia que era forte. Ela usava seus cabelos longos preso em duas partes ao estilo caipirinha, o que dava a ela um ar ainda mais infantil. Ela não sorria, ela nunca sorria. Era uma das guerreiras de confiança do rei.
- Minha rainha - falei sem olhar muito para a criança a minha frente - A que devo a honra?
Ceci olhou para o agma e sussurrou um "pobrezinho" enquanto negava com a cabeça.
- O que você acha, Uiara? - Ükhel perguntou com sua voz inexpressiva sem que eu obtivesse a minha resposta.
Sem esforço ela levantou uma arma extremamente grande de seu lado direito e eu estremeci.
- Uiara, com a espada - Ceci falou friamente com a garota, mas ela não deu mostras de ter se aborrecido.
Uiara encostou novamente sua arma e tirou duas espadas da cintura e em poucos segundos o matou. Todos pareciam ter sentido o mesmo que eu, a aparência infantil não combinava com a frieza com que ela o havia matado.
- Recebi o seu pedido. Estamos retirando as tropas das divindades do caso. Todos os sobreviventes já foram mandados de volta para casa também - Ükhel falou como se nada tivesse acontecido.
- Obrigada, senhor - falei sentindo o suor escorrendo ao lado do rosto, mas ousei falar - Posso fazer um pedido?
- Estava esperando que o fizesse. O que você quer? - sua voz era fria como o aço, mas eu já havia me adaptado a tratamentos assim
- Deixe-me terminar o trabalho. E se houver algo que eu possa fazer por Himura, por favor, deixe-me fazer.
- Muito bem - vi de relance um breve e pequeno sorriso surgir no canto de sua boca - Me deixe falar com Nyx.
- O quê? - perguntei estremecendo.
- Não me faça repetir - seu tom sério me fez estremecer. Já não havia rastro do pequeno sorriso anterior. Saito me olhou e evitei seu olhar. Respirei fundo, fechei meus olhos e sussurrei.
- Nyx, nosso rei exige a sua presença. Darei apenas o tempo necessário para que vocês conversem.
Senti meu corpo mudar e passei a assistir o que ocorria através dos meus próprios olhos.
- Olá, Ükhel - Nyx desenhou um rosto fascinante para ele - Que honra o ver de novo.
- Não tenho tempo para suas tolices - Ükhel falou severamente e então Nyx se levantou.
Ela se aproximou a ele e sussurrou.
- Um rosto tão lindo e tão severo - a voz de Nyx estava entre o sedutor e o debochado e eu sentia a raiva aumentar - Ambar está irritada aqui dentro, talvez ela ache que eu esteja perto demais do rei? - ela se aproximou um pouco mais e tentou levar a mão até o rosto dele, mas antes que realmente conseguisse, eu estava caída e Uiara estava em cima do meu corpo com uma espada direto na minha garganta. Seu semblante não havia mudado nada.
- Olha, se não é o cachorrinho do rei - Nyx falou rindo.
- Uiara, solte-a - escutei Ceci ordenando, ordem que foi prontamente atendida.
Nyx, ainda rindo se sentou antes de falar:
- Eis a rainha mestiça dando ordens. Estou curiosa Ükhel - ela passou a língua pelo lábio - Como é estar casado com a sua própria irmã? Posso te mostrar um lado melhor das mulheres... Como foi condenar sua própria mãe? Você chorou quando cortaram sua cabeça? - ela ria e eu notava o prazer que ela sentia com aquilo.
Ceci, calmamente abaixou próximo a nós, com seu sorriso intacto.
- Soube que você gosta de sangue, Nyx - o fato do sorriso de Ceci seguir sendo quente e acolhedor só fez a cena ficar mais aterrorizante - Vamos ver qual de nós duas gosta mais? O que você acha? Podemos duelar. Se você conseguir aguentar 5 minutos comigo na arena, eu posso pensar em ser piedosa - senti o corpo tensionar pelo terrível medo - Não? Que pena... Nyx, abra sua boca para falar algo assim de novo e você verá o que é o verdadeiro inferno.
Se você soubesse como é encarar o verdadeiro sofrimento sem descanso poderia entender a reação de Nyx. Ela rapidamente se jogou contra uma parede e se encolheu, como um gato assustado, mas antes que realmente pudesse relaxar ou reagir de forma menos humilhante Ükhel a havia sustentado, ou melhor, sustentando o meu corpo pelo pescoço.
- Você é apenas o ruah dela. Deve obediência a sua senhora - a voz de Ükhel não havia se alterado, mas suas mãos estavam firmes no meu pescoço. Nyx lutava para se libertar e eu podia sentir a voz fraca que tentava sair, não demorou para que ele me soltasse e eu senti o meu corpo caindo ao chão - Essa luta é dela. Seu ruah a pertence. A atrapalhe e você se arrependerá. Atrapalhe a luta dela e você sofrerá as consequências. Se ponha no seu lugar. Se a desobedecer e ela se ferir por sua culpa, você desejará nunca haver nascido. Me entendeu?
- Se você me machucar, irá machucá-la também - Nyx respondeu em uma tentativa desesperada de se sentir menos humilhada.
- Quer pagar para ver? - a voz ponderada do rei fez Nyx suar frio - Se ponha no seu lugar.
- Sim, senhor - ela respondeu tremendo e trocou de lugar comigo sem esperar qualquer ordem.
Suspirei e voltei a me colocar de joelhos, mas ele não se dirigiu novamente a mim.
- E quanto a vocês? - Ükhel perguntou agora olhando para tantos homens sem reação à sua frente.
- Queremos seguir a luta - Yukio disse com um nervosismo incomum na voz - Temos nosso próprio orgulho para defender também.
- Esse é um caminho sem volta - Ceci disse ficando séria, mas sua voz seguia sendo calorosa - Se vocês forem, é possível que não possam voltar. Estão dispostos a isso?
Todos concordaram em silencio e logo responderam em uníssono "sim".
- Eu reconheço um guerreiro quando vejo um - Ükhel falou e eu senti que era o maior elogio que eu poderia esperar para os rapazes. Ükhel voltou-se para mim - Seres vivos não podem interagir com os que já morreram, e humanos não podem pisar na cidade do céu vermelho. Tome seu tempo e se eles ainda estiverem decididos, leve-os para o seu castelo em Nephilim. Estará tudo preparado para a sua chegada. Mas lembre-se, em Himura, se segue as regras de Himura.
- Sim, senhor - falei de repente me sentindo extremamente emocionada, eu era incapaz de esconder meu sorriso - Darei minha vida se assim for necessário.
- Você tem ordens de não morrer - ele estreitou os olhos que mais pareciam adagas me perfurando - Se o fizer, garantirei que se arrependa. Além do mais, Ceci jamais me perdoaria.
- Ükhel, você não tem jeito mesmo - Ceci suspirou e colocou a mão na testa - Está assustando a garota. Vamos embora e vamos levar essa criança logo, vocês dois não mudam nunca.
- Nasci para ouvir isso da mulher mais assustadora que eu já conheci - para a minha surpresa Ükhel sorriu de uma maneira que eu nunca havia visto antes e se virou para ir embora.
Ceci sorriu para mim e abriu novamente o portal, fez com que Ükhel e Uiara desaparecessem da nossa visão, se virou para mim e falou com sua voz suave.
- Estarei te esperando em Himura, princesa - ela passou os olhos por todos da sala - Posso ver o porquê são tão importantes para você. Endy, vamos voltar.
Endy desapareceu diante de nossos olhos. Sorri para Ceci, podia sentir o calor de suas palavras e isso me aqueceu por completo.
- Então, esse é seu rei? - Yukio perguntou após um longo tempo de silêncio.
- Sim - eu ainda tinha o mesmo sorriso bobo na cara - Noto uma certa semelhança entre vocês, Yukio. Lembro de já ter recebido ordens de não morrer antes.
- Se eu desse um terço do medo que eu senti aqui, ninguém nunca entraria em guerra com a gente.
- Isso foi realmente assustador - Satoru disse assobiando baixo - Dói tanto assim tê-lo por perto? Por quê?
- Sabe o que você sentiu quando... bem, quando eu perdi o controle? - tentei explicar enquanto ele acenava com a cabeça - Então, é aquilo, mas mil vezes pior.
Ele arregalou os olhos antes de continuar.
- E por que eu não senti nada?
- Porque você é um ser humano comum, seres humanos comuns não sentem a presença de um ceifeiro.
- Ele é quão mais forte que Nyx? - Saito perguntou apertando os olhos.
- Am - falei colocando uma mão no queixo enquanto pensava - Acho que Nyx não passa de uma criança mimada perto dele. No caso, seria como comparar a força de um ser humano e de uma formiga - falei dando de ombros por fim - Por isso ele não interfere na briga de outros seres. Acho que vocês conheceram oficialmente a Nyx. Nunca a tinha visto tão assustada... - ri quando escutei um "cala a boca" na cabeça.
- Resumindo, o que ele quis dizer? - Saito seguiu ainda apertando os olhos. Ele era o único que havia tido uma experiência real com Nyx e o único que aparentemente estava menos surpreendido.
- Pedi para que ele levasse lorde Saikhan novamente a Himura, para que deixasse Garig em paz. Declarei guerra aberta em Himura - falei tranquilamente - fiz esse pedido no mesmo dia em que pedi para levaram Isao. Assim, as pessoas daqui estariam seguras. Ele atendeu o meu pedido, por isso veio me ver. Peço desculpas por não ter informado vocês antes, mas eu não sabia se meu pedido seria atendido ou não. Ele resumidamente disse que lorde Saikhan está em Himura e que lutas em Himura seguem as leis de lá.
- Então, você está dizendo que ele não só levou lorde Saikhan daqui, como também permitiu que nos vingássemos? - Yukio disse parecendo duvidar de algo da história.
- Sim, ele levou lorde Saikhan de volta a Himura e sim ele permitiu que vocês se vingassem, mas lembra quando Ceci disse que poderia ser um caminho sem volta? - eles acenaram com a cabeça - Então... é que seres humanos vivos não podem ir para Himura.
- Ou seja, não poderemos ir? - Saito perguntou um pouco confuso.
- Na verdade você, Yukio e Tatsuo sim. Vocês tecnicamente não são mais humanos - falei tentando me desculpar - Mas Satoru, Natsu e o senhor Tanizake são seres humanos, não poderão atravessar a fenda.
- Isso é um problema - Yukio olhou para baixo pensativo.
- Olha - falei entendendo seu dilema - Eu agradeço tudo o que vocês fizeram por mim e sinto muito por todas as perdas que vocês tiveram que passar. Talvez seja a hora de nos despedirmos.
- Talvez - ele olhou para mim pensativo.
- Então... é... acho que vou arrumar minhas coisas - eu lhe ofereci um pequeno sorriso sentindo um vazio por dentro.
Me levantei sem querer mostrar o quanto me despedir deles seria doloroso para mim.
- Eu disse talvez - Yukio levantou um pouco mais a voz - Não demos nossa resposta ainda.
- O quê? - eu me virei para ele arregalando os olhos.
Antes que ele pudesse me responder, uma fenda se abriu e Selina apareceu.
- Ambar, tem um minuto?
Olhei para Yukio que acenou com a cabeça antes de eu responder.
- Claro, ocorreu algo Selina?
- Lorde Saikhan aceitou a guerra contra sua casa abertamente em Himura.
- Estou sabendo disso - falei tranquilamente - o rei esteve aqui há pouco tempo.
Ela deixou transparecer a surpresa em seu semblante, mas se recompôs rapidamente.
- Após a notícia, várias casas se prepararam para o seu retorno.
- Muito bem, resolverei algumas coisas aqui e estarei de volta em alguns dias.
- Sim, senhora. Estará tudo pronto para o seu retorno. Devo preparar quartos extras? - ela olhou com certa ansiedade para todos no salão.
- Ainda não sei dizer. De qualquer forma, deixe-os preparado, o máximo que vai acontecer é ninguém os usar.
- Ambar, há mais uma coisa - ela disse, parecendo constrangida ao se aproximar do meu ouvido para que ninguém mais escutasse - Quando a notícia se espalhou, a duquesa Lidy Kankara veio te ver. Ela aparentemente esteve escondida nos domínios de Naemah por todos esses anos.
- O quê?! Naemah? A rainha dos sucubus? - falei alto demais, mas ela apenas se dignou a acenar com a cabeça.
- Onde ela está agora? - perguntei tentando abaixar a voz novamente.
- Está nos seus domínios. Mas prefere que ninguém saiba até o seu retorno, parece que lorde Saikhan a buscou por muito tempo para terminar o trabalho. Saikhan a considerou traidora por ser aliada da sua casa.
- Acho que isso muda as coisas, mas o ideal é que isso seja mantido em segredo mesmo. Acha que temos o apoio da família Kankara, então? - tentei manter a voz baixa, mas aparentemente foi em vão, pois Yukio arregalou os olhos com a menção do nome.
- Sim. Parece que darão patrocínio e ajudarão com a segurança dos cidadãos. A cidade está uma loucura.
- Entendo. Estarei o mais depressa possível. Obrigada, Selina.
- Ah - Selina disse como se lembrasse de algo - Erica, filha de Naemah, pediu estadia em sua casa, pois quer ver a guerra de primeira mão. O que devo dizer a ela?
- Se a rainha Naemah autorizar, diga a ela que será muito bem-vinda.
Selina fez uma reverência e desapareceu pela fenda. Olhei para Yukio e suspirei antes de falar.
- Você ouviu, certo? - de repente me senti muito cansada.
- Apenas ouvi que a família dela apoia a sua, algo que com certeza deverá pesar na minha decisão a partir de agora.
- Preciso que entendam que as guerras em Himura não são como aqui. Seria mais como uma espécie de torneio onde quem perde, perde junto a sua vida. Lá, somente tem a vida em jogo quem participa da guerra, os outros não poderão ser envolvidos, se isso ocorrer os ceifeiros entram na briga acabando com a família que quebrou a lei. A partir do momento que a família dela entrou na guerra, eles colocaram suas vidas em jogo como qualquer outro ser dali.
- Então, quem não quer lutar apenas fica neutro na guerra e não sofrerá com isso? - Saito perguntou.
- Sim, para isso eles fazem uma espécie de símbolo de ruah em suas casas e em seus corpos. Se forem mortos durante a guerra, os ceifeiros saberão imediatamente quem os matou.
Todos ficaram em silêncio por algum tempo até que Yukio o quebrou.
- Acredito que depois de tudo o que vimos ou ouvimos, não poderíamos simplesmente seguir aqui por muito tempo. Essa é apenas a minha opinião. Se nós ficarmos aqui, o que acontecerá de agora em diante?
-Nos despediremos como bons amigos e eu voltarei apenas para deixar... am... para deixar as capsulas - falei tentando não usar a palavra sangue - E vocês tentarão seguir com as suas vidas.
- Perdemos praticamente todos os nossos homens, será realmente uma prova e tanto retomar nossas vidas como eram antes - Satoru disse parecendo pensativo.
- O que você acha, Natsu? - perguntei para ele, ele ainda não havia falado nada desde que havia entrado na sala.
- Acho que preciso de um tempo para pensar melhor em tudo - ele respondeu brevemente e deixou novamente de falar.
- Talvez essa decisão deva ser individual - Yukio disse parecendo pensativo - A decisão de renunciar à vida que conhecemos é algo realmente grande. A cidade aqui estará em paz agora que Saikhan foi mandado de volta para o lugar dele, ficar aqui pode significar finalmente um bom descanso para quem não está mais interessado em lutar. Eu particularmente, em vez de ficar aqui sentado e perder a chance de uma batalha, prefiro encontrar algumas pessoas que estão dispostos a lutar, além do mais, ainda não tive a minha vingança.
- Nesse caso - Saito disse - você está decidindo ir para Himura.
- Certo - ele deu um pequeno sorriso para o amigo - Ambar seguirá lutando e durante muito tempo não fomos mais úteis do que um simples soldado. Jurei me vingar no dia da morte de Takashi e não pretendo voltar atrás. Acho que não poderia dormir em paz se desistisse agora. E então, senhor Tanizake? Só irei com a sua permissão.
Tanizake não disse nada, ele nem parecia estar ouvindo a conversa.
- Senhor Tanizake? - o chamei - o senhor está bem?
Por fim, minhas palavras pareceram penetrar na névoa densa que cercava o senhor Tanizake, ele olhou para cima antes de responder.
- Hum - ele murmurou - Sim, certo. Estou bem.
Certamente não era a afirmação empolgante que Yukio queria escutar. O senhor Tanizake suspirou novamente e seus ombros caíram.
- Yukio... - ele falou - Acha que eu tenho que ir também? Acha que ela estará lá?
- Senhor Tanizake - eu disse com a voz triste - Os vivos não podem ter contato com os mortos.
Ele pareceu ficar ainda pior após isso.
- Olha - Yukio falou para o amigo - O que sobrou para nós aqui? Sei que é uma decisão difícil, mas eu apreciaria se você fosse junto.
Yukio certamente se preocupava com o amigo e talvez pensasse que sair daquele ambiente o ajudaria. Eu não saberia dizer se isso funcionaria ou não, mas qualquer coisa parecia melhor do que o deixar ali para viver com suas perdas. Quando a vida é boa, tudo corre conforme o planejado, mas uma vez que as coisas ficam ruins, o sucesso parece uma utopia cada vez mais difícil de ser alcançado.
- Então - Tatsuo começou - Como você planeja fazer isso? Quero dizer, como iríamos para Himura?
- Ir para lá é fácil, usaremos minha casa como sede. Essa parte é simples. As coisas de quem decidir ir poderá ser movida em etapas, dará um pouco de trabalho, mas também não é impossível. Então, você também quer ir Tatsuo? - perguntei sem saber se me sentia feliz ou triste.
- Entendi - de repente um sorriso gigante brotou em sua boca como se ele tivesse excitado com a luta que se aproximava - Eu acho que seria impossível recusar algo assim, além do mais eu preciso dar umas boas pancadas no Tashiro por ter feito aquilo sem avisar ninguém.
Acenei com um pequeno sorriso.
- Tashiro estará lá? - apesar da voz monótona de Saito eu pude sentir um leve sinal de empolgação em sua voz.
- Sim - respondi ainda achando aquele tema delicado demais - Ele fez um pacto comigo. Ele é uma alma maldita agora.
- Entendo - Saito falou olhando para baixo.
Saito e Tashiro se conheciam havia muito tempo, eu só podia imaginar tudo o que se passava pela cabeça dele agora. Ele provavelmente queria lutar ao lado de seu amigo novamente. Quando foi que todos eles mudaram? Era a pergunta que eu mais me fazia.
- E então, Saito? - Yukio perguntou ao amigo - O que você decidiu?
- Farei o que tiver que ser feito, comandante - Saito parecia calmo e controlado como sempre fazia, mas escondido em suas palavras havia um pequeno indício de solidão.
- Sabia que podia contar com você - Yukio sorriu.
- Natsu, Satoru? - chamei-os - Sei que é uma decisão difícil, se quiserem, posso dar mais tempo para vocês.
- Pro inferno essa decisão - Natsu falou parecendo irritado - Afinal, o que vamos ficar fazendo aqui?
- Natsu, calma - Satoru falou colocando a mão sobre o ombro do amigo - sempre há o que fazer se a decisão for ficar.
- Satoru está certo, Natsu - falei com calma - Aqui sempre precisarão de bons homens como você.
- Não - ele disse parecendo carrancudo - Naquele dia em que você falou com a gente em Kofu, eu decidi segui-la até o inferno e se para isso eu preciso desistir da minha humanidade, então eu farei isso.
- Então acho que está decidido. Todos iremos - Satoru disse dando de ombros como se só dependesse da opinião do amigo
Naquela noite, Natsu, Satoru e o senhor Tanizake passaram pela transformação.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro