13 - NOVEMBRO DE 1864 - parte 2
– Você não pode estar falando sério! – eu gritei com Lucca – Não estou de acordo com isso em hipótese alguma!
– Seja razoável Ambar – Lucca tentou se manter calmo – Por que você acha que ele mandou os frascos? Eles são homens fortes, talvez a transformação dê certo.
– E talvez não dê. Acha que eu confio no meu pai? – eu falei irritada – Não vou fazer isso com eles!
– O que você não irá fazer com a gente? – o senhor Tanizake me surpreendeu ao aparecer na porta do quarto.
– Senhor Tanizake, eu... – não sabia exatamente como responder.
– Tenho uma sugestão – meu irmão falou como se não tivéssemos sido interrompidos – Deixe-os provar que são fortes o suficiente. Lute com um deles e se eles vencerem, você pelo menos falará sobre o assunto.
– Acho que vocês dois podem seguir discutindo isso na presença de todos. Iremos retomar a reunião – o senhor Tanizake disse deixando claro, pelo seu tom de voz que aquilo não era um pedido.
O seguimos em silêncio até o salão, mas assim que sentamos meu irmão voltou ao mesmo tema.
– Talvez vocês dois queiram esclarecer sobre o que estavam discutindo na hora que eu cheguei – Tanizake disse calmamente.
– Ambar, por favor – meu irmão voltou a insistir – Você não está sendo razoável.
– Como eu não estou sendo razoável, Lucca?! – eu comecei a gritar com ele até me doer a garganta – Você tem noção do que está pedindo?
– Não sou eu que estou te pedindo. Você viu os frascos. Seu pai claramente te pediu que você usasse – meu irmão tentou ainda manter a voz controlada.
– Meu pai? – falei entredentes – O mesmo homem que deixou a minha mãe morrer e depois desapareceu?
– Ambar, ele é uma das entidades mais fortes que conhecemos e está nos ajudando – todos prestavam atenção na briga – Deixa eles decidirem se aceitam ou não o que ele está oferecendo.
– Muito bem – Tatsuo disse aumentando a voz – Estamos confusos de novo.
– Eu não vou aceitar isso de jeito nenhum! – gritei de novo.
Lucca vendo que não chegaria a lugar nenhum com aquela discussão, pacientemente agarrou um dos frascos e me mostrou o selo da família imperial de Himura.
– Nosso rei autorizou. Ele não fez isso sem a autorização de Himura – Lucca seguiu – Aceite a minha proposta, lute com um deles e se eles ganharem, também ganharão o direito de decidir se vão querer aceitar a oferta.
– E se eu ganhar – falei firme – descartamos essa questão e para que siga assim, destruirei os frascos.
– Se você ganhar, você faz o que quiser – meu irmão disse se dando por vencido.
– Acho que vocês estão esquecendo da parte interessada aqui. Podem nos dizer do que exatamente vocês estão falando? – o senhor Tanizake interferiu claramente irritado – Parece que não temos mais voz nos nossos próprios domínios.
– Sim, senhor – fiz uma reverência em pedido de desculpas – Sinto muito minha falta de educação. Meu pai, não estou dizendo aquele que me adotou e sim meu verdadeiro pai, enviou frascos com algo que talvez, poderia nos ajudar a ganhar, mas o preço a se pagar é alto. Eu sou contra usar esse método e, portanto, me recuso a dizer o que vocês ganhariam ou perderiam com isso.
– Entendo – ele disse coçando levemente o queixo – E a proposta do seu irmão é que decidamos isso em uma luta. É isso?
– Sim, senhor.
– Seria um bom método – Saito falou estoico – Mas acho que essa luta só vale a pena se ela usar essa tal manipulação.
– O quê?! – eu disse sobressaltada – Não! De jeito nenhum!
– Por que não? – Satoru perguntou antes mesmo de Saito – Iremos lutar contra pessoas da sua raça, seria melhor se soubéssemos quais são seus pontos fracos e assim poderemos explorar melhor nossas possibilidades.
– Você tem razão nisso, os nefilins muitas vezes combinam armas com manipulações. Ambar não está exatamente a altura de nenhum deles no momento por motivos de segurança, mas acho que seria uma boa maneira de ter mais ou menos noção de como seria.
– Achei uma ótima ideia – o senhor Tanizake falou substituindo seu tom zangado por um mais alegre – E então? Quem lutaria contra ela?
– Obviamente Saito – Yukio, que havia estado em silêncio até aquele momento falou – Ele é o melhor entre nós e se temos a intenção de saber do que ela estava falando, temos que garantir a nossa vitória.
– Ambar – meu irmão disse tentando me consolar enquanto levava sua mão até meu ombro – Eles terão a opção de recusar.
– Ainda assim – respondi batendo em sua mão para que ele não encostasse em mim – Não tenho escolha a não ser vencer... tentarei vencer seja de quem for, seja de Saito ou de outra pessoa. Usarei todas as minhas manipulações. Farei de tudo para que esses frascos fiquem apenas esquecidos.
Saí sem responder mais nenhuma queixa ou comentários que vieram após isso.
Com o dia da luta já definido, eu não parava mais quieta. Andava pensando na reviravolta que toda essa história havia dado, eu tinha que vencer essa luta, mas mesmo com a minha manipulação, eu sabia que estava em desvantagem.
Saito veio devagar para perto, sem interromper meu treino e ficou olhando, sem dizer uma única palavra, até que eu o notasse.
– Ah – disse ofegante após abaixar a espada – Tudo bem, Saito?
Ele me olhou por alguns segundos antes de me responder com outra pergunta.
– Acha que aceitaremos? – sua voz era passiva – Quero dizer, acha que aceitaremos o que tem nos frascos?
Pensei um pouco antes de responder, mentir não era uma boa alternativa, então preferi ser sincera, e com um pesar nítido na voz, respondi:
– Sim, vocês irão aceitar.
– Não irei perder para você – ele disse sem tirar os olhos de mim – Você sabe disso.
– Sim – minha voz estava quase apagada, olhei para o chão antes de seguir – Mas irei tentar. De qualquer jeito, meu irmão não me deixaria em paz até que eu contasse, ou, na melhor das hipóteses, ele mesmo contaria a vocês. Ele vai fazer de tudo para que eu saia vitoriosa disso tudo. Ele estava contra o teste.
– E você? Queria fazer o teste?
– Não.
– Como foi o teste para ele? – Saito me olhava e parecia que ele podia ler minha alma.
– Ele apareceu em um lugar chamado campo de concentração, no planeta Terra, houve uma guerra sangrenta, uma guerra que possivelmente nenhum de vocês jamais conseguiria imaginar. A segunda guerra mundial. Ele viu a guerra inteira e depois viu as consequências dela no pós guerra. Ele nunca mais foi o mesmo... nunca mais nem dormiu direito.
– Mundial? – Saito pareceu surpreso com isso.
– Sim – minha voz era quase um sussurro, me esforcei para falar normalmente novamente – Não houve nenhum país que ficou isento da guerra. Cerca de 40 milhões de civis morreram – notei que Saito arregalava os olhos, tentando assimilar a nova informação – Meu irmão foi um prisioneiro de guerra durante 5 anos. Forçado a trabalhos escravos e vendo dia após dia pessoas morrendo nas trincheiras que ele era forçado a abrir. Ele não havia perdido a manipulação, e com ela, ajudou muitas pessoas a fugirem da situação em que estavam, mas o terror da guerra estava por todos os lados. Também ajudou alguns dos líderes antinazistas quando estes eram capturados. A missão dele estava longe de ser mais fácil. Com a guerra, houve também muitos seres que se aproveitavam dos campos de batalha para se alimentarem e era aí que estava a missão real dele, mas ele não conseguia se concentrar só na missão, ele não conseguiu nem mesmo ir embora após a missão acabar. Acho que demorou uns três anos para realmente se decidir a voltar. Posso dizer que eu tive sorte.
– Por que os líderes não faziam o ritual do seppuku antes de cair em mãos inimigas? – ele me perguntou com naturalidade.
Busquei as palavras certas para não ofender seus costumes, mas sem sucesso respondi como me veio à mente.
– O seppuku é visto como um suicídio qualquer lá, e o suicídio não é bem-visto. Não quero te ofender, então por favor, me perdoa, mas o suicídio muitas vezes é visto como covardia. Houve um tempo em que era algo bom, principalmente entre os japoneses, mas na época da guerra e até mesmo atualmente, não há honra na morte. A morte é apenas o fim para uns e o começo para outros.
Ele me olhou pensativo e não respondeu nada mais. Ficamos em silêncio durante um tempo e de repente vi que ele carregava um pequeno pacote em suas mãos, algo que eu não havia notado antes, ele me ofereceu o pacote e se inclinou levemente.
– O que é isso? – perguntei pegando o pacote enquanto fazia uma leve reverencia também.
– Um presente – ele respondeu voltando seu corpo ao normal.
Fiquei sem palavras e o olhei por segundos que pareceram uma eternidade.
– Por quê? – perguntei um pouco confusa.
– Não abra agora. Aqui, não se abre presentes na frente de quem os deu – ele disse com sua voz moderada como sempre e ignorando minha pergunta, se virou e foi embora.
Fiquei ali, parada, vendo-o sumir da minha vista e quando já não podia vê-lo, abri o pacote. Dentro havia um Omamori envolto a um tecido vermelho com detalhes dourados, estava amarrado com uma fita de couro. O fechei em minha mão me perguntando se Saito de fato acreditava naquilo, nunca havíamos falado nada sobre nossas crenças ou qualquer coisa do tipo, também nunca havia visto ninguém dali falar sobre tais assuntos. Olhei novamente para onde Saito havia estado. Por que ele havia me dado isso? Sentia meu coração acelerado, tive a sensação de que logo iria sair pela garganta. Amarrei o Omamori em uma parte da roupa e me senti incapaz de voltar ao treino durante este dia.
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