☪ .☆ ━━ SEVENTY NINE ━━ ☪ .☆
Eu não fazia a menor ideia de onde Sam estava. Apesar da minha preocupação, não tinha forças mais para surtar a respeito disso. Apenas fiz o que ela tinha me pedido e fui buscar Angeli na escola, não sem antes surtar e devolver aquela merda de arma para Juju. Eu sabia o que Juju estava pensando a respeito das merdas que eu estava fazendo e ia fazer. E eu não dava a mínima para opinião dela. Porra, meu melhor amigo estava morto! Como eu deveria lidar com isso? Há apenas algumas horas atrás, ele estava vivo. E agora, eu não o tinha mais. E eu... Não fazia a menor ideia do como lidar com isso.
Respirei fundo, tentando controlar a tremedeira em minhas mãos enquanto fazia o leite de Angeli, que estava na sala entretida com suas bonecas, alheia a todas as merdas que tinha acontecido naquele dia. Que Baji estava morto e nunca mais ia vir aqui brincar de casinha com ela. E que aquilo tudo era culpa minha, por ser uma maldita filha da puta do caralho. Porra!
Deixei um copo cair no chão sem querer e ele se espatifou em milhares de pedaços. Apenas caí de joelhos, meu rosto manchado pelas lágrimas que escorriam sem parar enquanto eu tentava a todo custo reprimir um soluço que tentava escapar pela minha boca.
Eu tinha condenado Baji a morte naquele dia, porque tinha caído na burrice de contar a ele tudo o que Kisaki estava fazendo comigo; tinha feito Baji morrer porque esse imbecil do caralho não conseguia ficar um segundo sem se meter em brigas. Mas agora, Keisuke não se meteria mais em problemas nunca mais. Porque ele estava morto, e aquilo... Aquilo eu simplesmente não podia mudar.
Tentei salvar todos que eu amava da melhor maneira possível e falhei miseravelmente nisso. Tentei fazer tudo o que Kisaki queria para que mais ninguém se machucasse, mas olhe só! Não adiantou de nada; porque uma das pessoas que eu mais amava estava morta agora, morta porque falhei com ele. Porque não consegui proteger Baji ou mesmo salva-lo. E agora... Bem, se ficar quieta e fazer o que Kisaki queria não era o suficiente para salvar meus amigos, então, aquilo seria uma guerra. Eu não era burra de achar que Kisaki não ia cair matando pra cima de mim. A questão agora era apenas quem sabia jogar melhor aquele jogo.
Limpei o chão da cozinha antes que Angeli aparecesse e acabasse se machucando com algum caco de vidro. Depois fui até ela, entregando o leite a Angeli, que o pegou e correu para a cama. Eu sabia que não demoraria muito para ela dormir. O que era ótimo porque, por mais que eu odiasse deixar Angeli dormindo sozinha, eu precisava sair. Ou ia acabar surtando se ficasse ali, parada, olhando para as paredes.
Fui para o banheiro trocar de roupa de novo, colocando as roupas mais escuras que eu tinha. Eu sequer conseguia olhar para meu reflexo no espelho; não conseguia ver a pessoa que era a culpada pela morte de Baji. Não conseguia ver a mim mesma e saber o quanto eu tinha falhado com ele, com Chifuyu. Com todos.
Quando terminei, Angeli já estava, de fato, dormindo. Senti meus olhos encherem de lágrimas vendo o como ela parecia calma ali. Queria estar com aquela calma; queria não me sentir tão vazia e perdida. Queria não me sentir suja por dentro, não me sentir uma assassina do caralho. Ainda que eu tivesse matado Kisaki! Mas não;
As pressas, escrevi um bilhete para Sam e o larguei na mesa, ao lado de meu celular que eu certamente não precisaria. Nem mesmo sabia o que tinha escrito, não com a raiva e dor me consumindo por completo naquele momento. Eu só queria desaparecer.
E, assim que cheguei na rua e coloquei a máscara preta no meu rosto, foi exatamente o que eu fiz.
Alguém estava gritando para que eu parasse, mas eu não conseguia. Ou não queria. Meu punho descendo e decendo contra o nariz daquele garoto e eu não sentia absolutamente nada. Nem alegria, nem tristeza; nem prazer e nem culpa. Apenas sabia que era real porque a dor no meu punho era bem real. Porque o garoto engasgado com o próprio sangue era bem real.
Larguei a gola da camiseta dela e ele caiu no chão, gemendo de dor. Fodido, mas ainda vivo. Não que um bostinha como esse otário na minha frente merecesse viver. Limpei minhas mãos cheias de sangue, dele e de mais outros, na minha jaqueta. Me virei, começando a me afastar dali. Ninguém ousou me parar, ninguém ousou chegar perto de mim; ninguém queria ficar perto do demônio, afinal.
Voltei a andar sem rumo, caçando mais brigas para me meter. Não era nem um pouco difícil de fazer isso, afinal. Era fácil arranjar alguém fazendo merda ou alguém querendo problemas. E era satisfatório ver quando percebiam que eu era bem mais que apenas uma garota, quando percebiam que não poderiam me vencer naquela noite.
Estava passando por um parque quando escutei alguém soluçar. Bem, aparentemente, não sou só eu na merda hoje! Por algum motivo, acabei me virando em direção ao som. Meu choque foi encontrar Sayuri, encolhida na grama, abraçando as próprias pernas, o cabelo voando no vento.
Eu provavelmente deveria ir embora; eu não tinha sentimentos para me importar, ao menos, não o suficiente. Mas, por mais que Sayuri tivesse sido um dos motivos para eu me tornar esse tipo de pessoa que sou agora, ela, ainda assim, era minha irmã. E vê-la daquela forma...
Sayuri ergueu a cabeça quando me sentei ao lado dela, tirando a máscara preta que cobria minha boca e nariz. Os olhos dela estavam vermelhos e o rosto completamente inchado e choroso. Não precisava ser um gênio para saber o porque ela estava chorando; era pelo mesmo motivo pelo qual eu estava caçando briga de noite na rua.
-Ele morreu, não é?- ela disse, baixinho, lágrimas escorrendo com mais intensidade agora.
Apenas joguei a cabeça para trás, observando a lua brilhando sobre nós. No fim das contas, por mais que aquilo parecesse o fim do mundo, amanhã ainda chegaria; o sol nasceria, eu ainda teria que ir trabalhar, como se porra nenhuma tivesse acontecido e meu melhor amigo não estivesse morto.
-É.- eu disse, piscando os olhos com força e abraçando minhas pernas. -Ele morreu, Sayuri.
Ela voltou a chorar. Fiquei em silêncio ao lado dela, e sabia que tampouco precisava falar algo. Aquela dor...Era algo que Sayuri precisava sentir. E que eu também precisava sentir, mesmo que eu me negasse a isso naquele momento. Eu não sabia qual a intensidade do relacionamento de Baji com Sayuri, mas eles eram amigos também.
Minha irmã limpou o rosto e fechou os olhos com força antes de voltar a abri-los e fitar o céu. Ela tinha parado de chorar, mas a dor estava nítida em seu rosto.
-Chifuyu me contou tudo o que aconteceu.- ela disse num sussurro. Escutar o nome dele machucava de uma forma que eu não era capaz de descrever. Como eu sequer encararia Chifuyu novamente, ainda mais sendo a culpada pelo melhor amigo dele estar morto? Se eu apenas não tivesse os conhecido aquele dia no parque... Assim Baji estaria vivo agora. E Chifuyu não estaria sofrendo. -Da luta entre as gangues. Que você... Quase morreu também.
-Se eu tivesse morrido e Baji não, teria sido uma coisa boa.- eu disse num sussurro.
-Não diga essas coisas, Aiko.- ela disse em tom de censura. Eu ri, sem nenhum humor.
-É culpa minha ele ter morrido.
-Não, não é.- ela disse, me segurando pelo ombro. -Não é sua culpa!
-Você não estava lá, Sayuri!- eu quis gritar. Queria gritar e queria chorar e queria alguém para me dizer que tudo ficaria bem. Mas não podia fazer e nem ter nada daquilo;
-E isso importa? Você não é um monstro, mesmo que eu tenha te feito acreditar nisso. Mesmo que você mesma acredite nisso. - ela disse, me olhando. -O que aconteceu... Não pode carregar o peso disso como se fosse seu. Vai te matar, Aiko.
-E quem disse que eu quero estar viva, Sayuri? Quero morrer. Há tanto tempo que já nem sei mais o porque ainda acordo todos os dias, o porque meu coração ainda está batendo ou o porque meus pulmões ainda funcionam.- eu disse e vi as lágrimas nos olhos de Sayuri. -Eu quero morrer. Quero morrer e quero machucar pessoas quase que na mesma intensidade! Não acha que isso não me assusta pra caralho?
-Aiko...- ela disse chorosa, me abraçando com força. -Sinto muito. Sinto muito por tudo.
-Está tudo bem, Sayuri.- eu disse, baixinho, passando a mão pelo cabelo dela. Mesmo que nós duas soubéssemos que nada estava bem.
Ficamos em silêncio; por um bom, bom tempo. Até que aquele clima péssimo entre nós finalmente desaparecesse por completo.
-Eu gostava dele, sabia?- ela sussurrou baixinho. -Do Kei. Eu gostava dele. Tanto que achava que isso me mataria um dia. Mas ele nunca olhou pra mim, o idiota.- ela riu, sem nenhum humor. -Você achava que eu gostava do Chifuyu, não achava?
-Eu...- comecei, mas nada saiu. Porque, bem, era verdade, porra! Sayuri deu risada, se afastando para me olhar.
-Ele é meu melhor amigo. Mas eu sempre fui afim do Baji. Só queria ter tido mais tempo e mais coragem para dizer isso a ele. - ela disse, abaixando um pouco a cabeça para que eu não visse as lágrimas nos olhos dela.
-Sinto muito.- sussurrei. Sayuri segurou minha mão com força.
-Sei o que está pensando em fazer. Se afastar de Chifuyu porque você acha que ele te odeia, porque você acha que tudo isso é sua culpa.- ela disse, e abri a boca para dizer que, sim, era minha culpa, mas Sayuri me cortou. -Não faça isso com ele, Aiko. Ele perdeu o melhor amigo. Não vai ser bom perder a namorada também.
-Eu só vou arruinar a vida dele.- eu disse baixinho. Sayuri apertou minha mão com força.
-Ele te ama. De uma forma que nunca vi na vida. O jeito que ele fala de você, Aiko, é tão cheio de amor. Eu queria que alguém falasse de mim com tanto amor quanto Chifuyu faz quando fala de você. - ela disse e senti meus olhos encherem de lágrimas. -E eu sei que você sente o mesmo. Porque, querendo ou não, Aiko, eu te conheço. Eu vi a forma como seus olhos brilharam quando você estava com ele. Não posso deixar você fazer uma merda dessas.
-É melhor assim.- eu disse, decidida. Sayuri apenas balançou a cabeça.
-Vai machuca-lo ainda mais. E vai se arrepender disso se o fizer, Aiko. Para o resto da sua vida.
O pior era saber que Sayuri estava certa. Mas, ainda assim... O pior de tudo era saber que eu jamais seria o suficiente para faze-lo feliz. Para fazer qualquer um feliz. Porque eu apenas fodia com tudo. E estava cansada de arrastar quem eu amava para o buraco junto comigo.
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