Chapter twenty nine
Em toda minha vida depois daquele fatídico dia que descobri o que realmente estava acontecendo, eu planejei trazer o confronto a ele, e mostrar para o mundo quem ele era...
No entanto, após mais de 20 anos revivendo as mesmas coisas diariamente em minha memória, aqui estava, há mais de 9 mil quilômetros de distância de onde deveria estar.
Estava certo que essa era a melhor distração para o que acontecia lá, e também o melhor disfarce que poderia ter... mas... era lá que eu queria estar. Mesmo que meu coração batesse tão forte... minha pele soasse frio... e meu estômago se revirasse lembrando exatamente a sensação que eu sentia quando ele estava perto de chegar... era lá que precisava estar... era lá, que queria estar.
- O que você tanto olha nesse celular e notebook, que está te deixando mais estranha do que já é?
Olhei para a porta tendo um lampejo de memória com a mesma cena, porém com Prasad atuando, e foi impossível não comparar, e observar as diferenças gritantes entre os dois.
Voltei os olhos para tela mais uma vez, somente para notar que nenhuma nova atualização havia chegado. Só relatórios que não importavam tanto, estampavam o lugar tentando me distrair.
- Apenas trabalho. – Respondi depois de um longo espaço de tempo, observando Luca fazer carinho na minha filhote.
- Então não deve estar fazendo direito.
Olhei para ele com os olhos faiscando, hoje não era um bom dia para nossas provocações. Não tinha feito nada errado, mas também não tinha poder sobre todas as coisas.
Havia perdido tempo demais com a investigação de Elyna, que por sinal ainda me perseguia como um cão que não quer largar o osso, e ainda tinha aquelas vadias das Marias Batalhão. Por mais que essas últimas, não tenha sido eu a investigar.
- Onde está empacada?
Olhei para ele sem entender aonde ele queria chegar com isso, levantando de onde estava, deixando o computador na mesinha de centro de frente ao sofá que estava.
Luca se moveu terminando de entrar no cômodo, passando direto para onde estava, olhando para tela do computador.
Não me preocupei com o que ele poderia encontrar ali, tinha minimizado os relatórios, antes mesmo de ameaçar levantar.
- Por que está pesquisando sobre onde colocar câmeras? – Não estava, não exatamente.
Olhei para ele que me encarava desconfiado, e seria uma ótima brecha para lançar algo do tipo "para o que você acha?" e sugerir coisas que ele certamente ficaria desconfortável de início, mas depois usaria disso para me confrontar de um jeito que meu corpo não deveria estar se adaptando tão bem, contudo, nada disso me animava. E não era como se estivesse a fim de atuar agora.
- Estava fazendo o caminho reverso.
Olhei para ele notando que um sorriso genuíno preenchia o seu rosto, e quando fui reparar no meu próprio, percebi que algo similar também acontecia ali.
Observei o homem à minha frente por mais um tempo, me perguntando desde quando isso vinha acontecendo e não percebia? Por seu olhar... era a mais tempo do que tinha reparado.
Encarei aquele sorriso... algo realmente puro... e mesmo se não quisesse... mais uma vez estava armazenado. Uma pena que nada disso faria diferença. Não era o seu sorriso... a gargalhada doce de Mia quando meus cães se dispunham a brincar com ela... a voz firme, porém sempre acolhedora de Ezra... ou as barbaridades ingênuas de Isabelle, que inundavam minhas malditas memórias quando fechava os olhos. Era ele... era sempre ele...
Amaldiçoava com todo o meu ser, quem tivesse me dado esse negócio que Ezra chamava de dom. Amaldiçoava aquele que Ezra falava e acreditava que cuidava de nós... mas Ele nunca... nunca me protegeu...
Talvez eu também fosse uma maldição... um demônio como muitos me chamavam. E até aí era explicável, por mais que ainda fosse uma criança e não tivesse feito nada. Mas Mia... como Ele poderia explicar todo mal que foi feito a ela? Uma criança que nunca nem mesmo tinha matado uma formiga? Uma que ainda acreditava em papai Noel e fada do dente, mesmo aos 11 anos? Isso não tinha explicação... não para mim...
- Você está perdendo o controle. – Luca destacou, e dei um sorriso debochado em sua direção, que logo me arrependi.
Ele sabia bem o que era perder o controle, mas ele era apenas mais um amaldiçoado. Por que qual justificativa, o Ser considerado o mais poderoso do universo, amaldiçoaria alguém como a Docinho?
Tínhamos um sexo selvagem, e todas as vezes que terminávamos, via o quanto ele se sentia dividido entre a culpa e a satisfação de tudo que tinha feito, e todas as marcas que ele tinha deixado. Mas o que ele não notava, era que ele jamais seria como ele... ou seria como aqueles que tantas vezes vi no meu trabalho. Aqueles que fizeram mal a Mia...
Nunca. Isso eu tinha convicção, Luca nunca seria como nenhum deles. Porque por mais que fosse ríspido, arrogante, e grosseiro, ele se preocupava, amava e protegia. Via ele com Isabelle. Sabia o remorso que sentia pelo que acontecera com a mãe. E senti... por mais que quisesse negar... a proteção que seus braços me ofereceram quanto tudo que conseguia ver e sentir... era ele... eram os toques dele na minha pele e no meu corpo de novo...
De repente acabei rindo.
- Mia me chama de Malévola.
Recordei o exato momento que vivi com Mia, após a memória ser evocada pela frase de Luca sobre estar perdendo o controle. Mesmo sem querer ou perceber, ele era bom. Simplesmente não tinha como negar a si mesmo. Não quem ele era dentro de si por trás da máscara.
- Devo esperar uma fumaça negra preencher o cômodo? – Contrapôs com escárnio, mantendo a postura arrogante e grosseira de sempre.
- Poderia te transformar em um corvo.
- Não. Não poderia. – Declarou com convicção, olhando mais uma vez para a tela do computador enquanto acariciava preguiçosamente a cadela mimada que não cansava de sua atenção. – Tenho algo que você gosta muito.
O sorriso presunçoso cresceu em seus lábios, fazendo meus olhos revirarem com tal arrogância, apesar de que não estava errado. Estava me acostumando demais com essa ideia de brincar livre no parquinho. Quando enjoarmos um do outro, precisaria fazer um novo contrato com os meus associados ao redor do mundo. Seria basicamente impossível encontrar outro brinquedo com as mesmas especificações.
- Pensando nele não é? – Sorriu sarcástico. – Não precisa, ele está aqui.
Apertou o membro que já se destacava sob o tecido da calça, me fazendo morder os lábios e contrair minha vagina que latejava em necessidade sôfrega e dolorosa. Esse último, por ainda lembrar da última foda naquele mesmo lugar que ele estava.
- Deseja cair de boca de novo?
- Figlio di puttana.
Agora estava pegando também o seu italiano. Porra de homem gostoso.
- O que você está fazendo aqui mesmo? – Desconversei buscando distrair meu próprio corpo.
- Iuri resolveu dar o ar da graça. – Informou em tom irônico, ganhando outra postura.
Era de conhecimento geral, que Luca odiava que as coisas fugissem de seu controle e que não passava a mão na cabeça de seus clientes, mas aqui estávamos a dois dias aguardando a dondoquinha russa que resolveu desaparecer para resolver problemas que ele disse ser do governo.
Conhecia bem o que o desgraçado estava fazendo, e não passou despercebido pelos olhos e ouvidos que tenho por aí, quando em meio a um assunto importante que ele estava resolvendo, abandonou tudo para ir a uma certa casa noturna bem longe da Rússia.
Poderia ser uma coincidência dos infernos ele ir à mesma casa noturna em que ela estava, porém não pagaria para ver se de fato era obra do maldito acaso. Meus pequenos ratinhos já estavam trabalhando no assunto.
- Não se esqueça do que falei.
Fiz carinho na cabeça do cachorro que acabou de adentrar o cômodo em comum que dividimos no hotel. O quarto era basicamente um pequeno apartamento, duas suítes anexas a uma pequena sala entre elas.
Achei bom que fosse assim, não confiava no bastardo Russo, e muito menos considerava ideal que alguém tão próximo a Isabelle se envolvesse com gente do mundo de Iuri Kuznetsov.
- Você não disse nada. – Rebateu irritado, e um sorriso debochado cresceu em meus lábios.
- Disse o que precisava.
Ignorei a carranca que ele certamente estava fazendo, caminhando para o quarto onde estava ficando. Luca ficou com o outro quarto, e o Garcia se conformou em ficar com o sofá na sala, após Apolo e Duquesa fazerem um complô contra ele, e expulsaram o pobre coitado dos dois quartos com duas camas em cada.
- Ah, sim. – Escutei os passos vindo na mesma direção que a minha. – Não, assine contrato algum como representante legal do idiota russo. Não vá a qualquer lugar que ele queira te mostrar e você já não conheça. E só assine o contrato de assessoria externa, sem vínculo algum além disso. – Destacou com impaciência, chegando aonde estava.
Ri da expressão irritada que ele mantinha no rosto, enquanto brincava com a cadela que logo chegou atrás dele. Apolo já tinha se posicionado em cima da minha cama, fingindo não ver a cara de tédio que seu dono fez para ele.
- Não vejo nada faltando aí. – Escarneci com prepotência, e não demorou para que os olhos em chamas percorressem meu corpo.
Com toda certeza não deveríamos fazer isso agora, mas quando vi, já estava sendo sufocada contra a parede, enquanto ele me pegava com força depois de ter ordenado que os dois bandidinhos que facilmente me abandonaram, saíssem do quarto.
- Tente os espelhos. – Olhei para a voz grossa e ríspida vindo da porta ao lado, mostrando uma Docinho perfeitamente alinhada e possivelmente se confundindo com um russo legítimo.
Às vezes me esquecia que ele era uma mistura de duas nações. Hoje ele certamente parecia mais Russo do que Italiano. O que seria de encharcar a roupa íntima, se a minha não passasse alguns emaranhados de fitas ligadas em uns pontos. Não tampava nada, mas com sorte não atrapalharia que nada entrasse também. Uma iguaria russa por favor.
- O que tem os espelhos? – Perguntei ficando de frente para ele. – Assim é melhor.
Mas que porra eu estava fazendo? Antes que percebesse a gravata da Docinho já tinha saído de seu pescoço. Mierda. Ele com toda certeza estava mais gostoso sem ela. Caldo figlio di puttana.
- É...
Deu uma pausa limpando a garganta, e desviamos os olhos juntos, observando Garcia entrar no cômodo vindo da área externa do quarto.
- As câmeras podem estar atrás dos espelhos. – Porra, era para voz dele ter ficado mais limpa não mais rouca, não?
Empurrei de volta a sensação que sentia emanando de dentro do meu íntimo querendo vir para fora, e analisei a sugestão por alguns segundos.
- Droga, como pude ser tão cega? – Murmurei sem me importar com quem escutava, colocando a mão na parte de dentro da coxa puxando meu celular dali.
Senti os olhos dos dois homens no cômodo seguindo cada movimento meu até que estivesse com aparelho em mãos, mas não seria a primeira vez que algo assim acontecia, logo, desconsiderei tal atenção que emanava mais curiosidade do que qualquer outra coisa.
Enviei uma mensagem para Brown, ele também se sentiria idiota por não ter pensado nisso. E depois voltei para o quarto que usava entrando no banheiro e acionando quase tudo que saísse água, deixando apenas os sprinklers de incêndio sem acionar. Apertei o botão aguardando que chamasse, esperando sua resposta. Torcia para que a diferença de fuso não atrapalhasse. Agora seria por volta das 5 da manhã para ele.
Alô... – Escutei a voz bonita e desperta do outro lado da linha.
- Esqueci dos espelhos. – Disse baixo.
Não era obrigação dele saber essas coisas, era minha. E eu tinha falhado nisso em um momento tão decisivo... não devia ter me distraído... precisava ter focado apenas nisso... sendo a cadelinha da CIA, tendo parte da minha reputação arruinada... não que me importasse.
- É comum hoje que espelhos sejam usados para cobrir pontos de acesso. Afinal, ninguém quer ver um bolo de fios, ou câmeras feias expostas por aí.
Suspirei irritada comigo mesma, ainda não acreditava que tinha esquecido desse detalhe... ainda mais sendo o desgraçado narcisista que ele era. Era óbvio que ele ia querer ter acesso rápido às filmagens. Mas todas os televisores e HDs de armazenamento que encontramos camuflados nos móveis, não tinham nada útil além da vadiagem já conhecida da esposa tão desgraçada quanto ele.
- Vou descobrir o fabricante e te mando em detalhes como deve procu...
Não vai precisar.
Interrompeu, e me irritei com o sorrisinho grave que escutei. Isso era sério, caralho.
Ontem uma nova peça de vidro chegou, parece que o patrão quebrou alguma...
Não era incomum o desgraçado ficar irritado quando não conseguia o que queria.
Não entendi direito o que estava acontecendo, mas fui chamado para limpar a sujeira depois. Hoje vou voltar para limpar depois que terminarem a instalação.
Isso seria perfeito. Esse garoto estava sendo perfeito. Daria tudo que quisesse se ele conseguisse.
Por curiosidade estava conversando um pouco ontem com o técnico, e acabamos fazendo uma certa amizade, ele me chamou para um bar.
Oh, que pena. Talvez tudo não vá tão longe. Uma falta de sorte eu diria. Não que eu tivesse alguma.
Perguntarei a ele como funciona. Os patrões vão viajar, e passaremos o fim de semana limpando tudo para o evento que vão fazer.
Claro que iam. Era a cara daquela vadia, sair quando precisavam limpar, para que ela não sentisse o cheiro de poeira. Só queria ver quando eu a enterrasse a sete palmos nesta poeira.
Aproveite a saída, não esqueça das luvas e da máscara quando for trabalhar.
Dei um sorriso perverso, já iniciando o processo de desligamento das torneiras, ao mesmo tempo que ouvia ele dizer "pode deixar". Jawari era um garoto muito inteligente e observador, pegou rápido o meu funcionamento.
- Podemos ir? – Foi Garcia que perguntou, quando me receberam na pequena sala novamente.
Ainda estava com o celular em mãos, e não demorou para que os dois cães viessem me verificar. Senti o peso do olhar de Luca passando por mim também, porém não demorou para que voltasse a sua postura de poderoso chefão. Oh, merda. Ele poderia ser chefe do meu...
- Já disse que não precisa ficar imaginando.
Me surpreendi com a aproximação que não tinha notado, porque estava pensando no que não devia, e dei um passo para trás, mostrando uma vulnerabilidade que desconhecia outro momento que já tivesse acontecido. Nunca era surpreendida dessa forma. Não sem ter uma das minhas facas no pescoço do intruso. E hoje... hoje eu nem tinha tocado nelas...
Olhei em seus olhos com um sorriso debochado recuperando a postura, e desfilei para fora, sem dar atenção para Garcia com uma arma apontada em minha direção. Errado ele não estava. Da última vez que Brown fez algo parecido, um filete de sangue escorreu por seu pescoço.
- Sonhe Docinho, e quem sabe a noite, eu não sou seu motivo de insônia?
Insônia era algo sério para se brincar entre nós. Nenhum dos dois costuma dormir bem, e se não fosse pelos remédios duvidava que ele tivesse sempre uma noite mais completa de sono. No entanto, acredito que essa não era uma novidade para a sociedade. Milhões sofriam com o mesmo. A pequena menina gênio, sofria com o mesmo. Mas cada um tinha seus próprios demônios para lhe perturbar... Nada era de fato igual.
Escutei o Garcia engasgar com a frase que ouviu, quase disparando a maldita arma por causa da tosse frenética.
Olhei para ele com repreensão, ganhando a atenção de Apolo e Duquesa que mesmo iniciante no treinamento, tinha em seu sangue o desejo de proteger. Em questão de segundos Garcia tinha largado a arma em cima da mesa.
- Não esqueça essa porra aí. – Foi a última coisa que disse antes de passar pela porta, e escutar abafado pela distância, Luca dizer o nome de Apolo como uma ordem.
Um passo mais distante na porta, caminhando pelo corredor, Apolo me alcançou com a mesma postura de Hades. O demônio em forma de cachorro. Acho que eu contaminava os animais...
Nota do Autor
E aí meus bebês, um capítulo "parece, mas não é".. Concordam?
Ele parece simples, se faz de simples, mas no fundo é aqui que começamos a conhecer mais da nossa personagem feminina..
Então, quem será esse Ele que ela tanto se refere..
Se observaram bem, temos três tipos de "ele" se mesclando o tempo todo, conseguiram identificar quem era cada um deles?
E essa questão da memória, vocês repararam nisso antes, ou só agora que Cath falou, que foram perceber? Possuem algum chute sobre esse assunto?
Gostaram da interação entre o nosso casal? Estão bem íntimos não estão?
E para não perdermos a piada, Garcia mais uma vez sofrendo na mão, ou melhor, nas garras dos cachorros 🤭..
Me conte tudo meus amores, aguardo vocês nos comentários..
Uma ótimo fim de semana, até o próximo 😘..
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