Os sinos da Igreja de Beacon Hills tocavam de forma harmoniosa, atraindo a população. Sempre ligeiramente desafinados, era a primeira vez que a música saía perfeita e melodiosa, preenchendo a cidade de alegria. Humanos e Sobrenaturais viam-se passar por ali mesmo que não fosse o seu objetivo, atraídos pela música e pela alegria que ali se vivia.

    Lydia Martin saiu esplendorosa da igreja, o vestido longo roçando pelo chão, o véu caindo pelas suas costas e cobrindo o seu cabelo longo e muito ruivo. Ao seu lado, Stiles andava de forma atabalhoada para não pisar o vestido da sua mais recente mulher, uma tarefa em vão dadas as circunstâncias. Os sinos da igreja tocavam alegremente e mesmo quem não tinha sido convidado para o casamento acabava por passar por ali só para ver a alegria geral que se vivia.

     Junto da igreja, as copas frondosas das árvores criavam sombras frescas naquela zona, um lugar discreto e afastado o suficiente para passar despercebido. Uma figura pálida desfrutava do casamento naquelas sombras, o seu corpo meio translúcido e fundido com a pouca luz do lugar. Ella Stillinsky observava com um sorriso o seu irmão mais novo, o espírito meio presente, meio preso no Submundo. Não se importava de estar assim; fazia muito tempo desde que desejara ser o centro das atenções, o seu lugar era nas Sombras e na invisibilidade de alguém que decidiu viver a vida nos bastidores e não no palco principal. Ainda assim, era inevitável sentir um aperto no peito ao ver o seu pai abraçar Stiles com orgulho e lágrimas e não poder fazer parte. A única coisa que Ella sentia falta era do toque, algo que nunca mais poderia vir a ter.

    Jordan Parrish aproximou-se da Rainha, tendo sentido a sua presença. O Cão do Inferno parou ao lado da jovem, os olhos fixos no bando e na alegria do casamento, embora muito consciente da figura ao seu lado. Os cabelos negros de Ella caíam-lhe em mechas longas e onduladas pelos ombros, os lábios cor de vinho esboçando um sorriso permanente e os olhos verdes brilhantes contra a sua pele branca. Usava um vestido preto com bolas brancas, idêntico ao que vira uma vez no armário de Lydia quando lá pernoitara, parecendo pela primeira vez em meses apenas uma jovem normal e não uma fada, muito menos uma Rainha.

- Eles vão ser muito felizes.- disse Parrish, os olhos brilhando com uma cor alaranjada devido à sua natureza.

    Ella assentiu, não se surpreendendo pelo homem conseguir vê-la.

- Não tenho dúvidas disso. - retorquiu a jovem - Como meu braço direito aqui na Terra e tão ligado ao Submundo como eu, depreendo que vais protegê-los a todo o custo.- afirmou Ella, erguendo o queixo de forma elegante.

- Claro, Majestade. - Jordan sorriu, observando Lydia com um brilho no olhar - Vou sempre proteger quem precisa, com ordens da Rainha do Submundo ou não. Aparentemente, sou teu súbdito também.

- És um Cão do Inferno e eu a sua Rainha. É legítimo.

    Um silêncio confortável pairou entre os dois. Nunca se tinham falado e agora, Ella confiava naquele homem para tomar conta dos seus onde ela não podia. O mundo dava muitas voltas, percebia isso agora.

    Os olhos castanhos de Stiles encontraram os verdes de Ella, o vestígio de sangue mágico nas suas veias ligado ao sangue da irmã providenciava a oportunidade de a ver. Um sorriso genuíno surgiu no rosto do jovem hiperativo que tanto desconfiara da fada, mostrando como as coias tinham mudado desde que se viram na primeira vez. Ella sorriu de volta, o corpo translúcido misturado nas Sombras não a impedindo de mostrar a sua felicidade pelo irmão que não chegara a conhecera. Os dois fitaram-se por segundos, antes de Lydia puxar Stiles na direção do jipe azul que os acompanhara em todas as aventuras e que agora os iria levar para o seu copo de água e mais tarde para a sua tão merecida lua de mel.

    A luz do Sol reluziu no cabelo loiro de Isaac Lahey, fazendo o coração de Ella falhar uma batida. A tristeza que sempre vira nos olhos azuis do lobisomem tinha desaparecido, tão brilhantes enquanto falava com Scott, Malia e os restantes membros do bando. Isaac tinha reencontrado o seu lugar e Ella queria acreditar que ambos se tinham ajudado um ao outro, apoiando-se e ensinando-se novamente a amar alguém. Por isso, as lágrimas que escorriam pelo rosto da fada não eram de saudade ou tristeza; era de orgulho puro pelo rapaz que lhe contara histórias e lhe dera o carinho que ninguém lhe dava há anos.

     A Rainha fechou os olhos, apreciando a brisa que soprava naquele fim de manhã agradável. Parrish há muito que se distanciara, juntando-se a Derek e a Chris, que abraçava uma Melissa muito emocionada e chorosa. Devagar, o som de risos, dos sinos e da alegria foi substituído pelo silêncio da manhã, à medida que o bando e convidados se dispersavam, indo celebrar o resto do casamento noutro lugar. Ella deixou-se ficar, apreciando o vento e a luz do sol que iluminava todo o lugar exceto aquele onde se encontrava. No seu íntimo, as Sombras chamavam-na, puxando-a de novo para o Submundo, onde milhares de espíritos a aguardavam. A fada estava verdadeiramente bem; apesar da Maldade presente em muitos Abandonados, havia vários que tal como ela se tinham tornando maus por esquemas mesquinhos de outrém. Sem escrúpulos e sem medo de ser Boa ou Má, Ella desvanecera-se no Submundo e entregara-se ao seu novo povo, enchendo-os de histórias, de vislumbres dos seus familiares, de Luz e de Escuridão. Num mundo de Sombras e mágoas antigas, Ella decidira que iria dar o que não lhe tinham dado a ela nem aos restantes Relicta quando ainda eram vivos: uma chance de ser feliz.

     Ella Stillinsky sorriu, invocando as Sombras, que acariciaram o seu corpo com meiguice. Como fumo, a jovem fada desvaneceu-se, deixando para trás o seu perfume de rosas e o som da sua risada inocente.