29 - FUNDAÇÃO
"Ao invés de olhar para o passado, eu me coloco 20 anos à frente e tento observar o que eu preciso fazer para chegar no meu objetivo."
Diana Ross
E como prometido o treino foi bem intenso, Rick tinha toda a confiança de colocar as cargas e repetições necessárias, pois agora sabia que era possível forçar um pouco mais os músculos sem prejudicar.
Se antes estava às cegas, agora sabia exatamente o que tinha que ser feito.
— Acho que por hoje chega. - o Personal faz suas últimas anotações nas novas planilhas que imprimiu.
— Ufa... - Jully senta no peitoral da vidraça que estava fechada. - — Você sabe como acabar com alguém.
Ainda anotando nos papéis, ele dá uma risada. - — Preciso fazer jus aos apelidos "carinhosos" que meus alunos me dão.
— Como casca grossa? - ela diz fazendo uma leve careta.
— Esse é o meu preferido. - o rapaz diz dando uma piscada rápida para a piloto antes de voltar às suas anotações.
— E aí como me saí?
— Incrível em todos os sentidos, não falo apenas fisicamente, falo como o conjunto de obra por um todo.
— Como assim.
— Você está sob uma baita pressão e mesmo assim não perde seu foco, ao contrário, usa isso como estímulo.
— Num mundo onde existem mais palavras rudes do que gentis, precisei aprender a me virar sozinha. - ela dá de ombros.
O Personal para de escrever dando atenção total a garota. - — É por isso que quanto mais te conheço, mais aumenta minha admiração por você.
Jully sorri satisfeita. - — Você acha mesmo?
— Com certeza, você vem construindo uma carreira sensacional vencendo todos os obstáculos, mas eu não fazia ideia o quanto eram difíceis esses obstáculos que te impõem. - Rick fala sobre o boicote que a Escuderia quer fazer com ela.
— Eu era muito nova quando recebi a proposta da Team Racing e fiquei completamente encantada. - ela para momentaneamente de falar lembrando desses pensamentos nostálgicos. - — Nem o seu Zé da mercearia do bairro queria me patrocinar e de repente vem uma famosa Escuderia bater na minha porta!
— Totalmente compreensível, foi como um sonho se materializando, ninguém nessas condições seria capaz de questionar nada no momento. - Rick sabia bem o quanto atletas precisam se submeter para conseguir seguir o caminho escolhido.
— Sim...mas apesar de tudo sou bem grata a eles, investiram em mim, nos meus estudos, na minha carreira...tudo estava tão perfeito que até parecia que estava vivendo num conto de fadas, até me colocaram dentro de um carro deles...aí a conversa começou a mudar de rumo.
— Como assim? - o Personal senta ao lado dela.
— Não questionar e obedecer as ordens da equipe era a regra número 1 deles e já na primeira corrida percebi que algo não estava certo.
— O que eles fizeram?
— Eu via toda a equipe empenhada apenas no carro do Dener, antigo "companheiro" de equipe na F3, enquanto o meu ficava no canto do boxe "ocupando espaço", afinal é obrigatório ter dois carros na Escuderia, mas eles não precisam ser iguais.
— Mas isso chega a ser imoral dar prioridade apenas a um! - Rick diz indignado desse método esquisito da Team Racing.
— O pai do Dener era o principal patrocinador na época, então a dedicação da equipe era toda para ele, mas na frente dos holofotes me queriam ao lado como "estrela da marca", afinal a Team se vangloria de ser a única Escuderia do mundo a ter uma mulher piloto... você não faz idéia de como eles faturam com isso, os patrocinadores ficam loucos.
Rick não consegue falar nada tamanho choque que estava.
— Lógico que eu ia começar a questionar, mas sempre recebia como resposta que estava tudo no contrato que eu assinei.
— E estava?? - o rapaz questiona imediatamente.
— Sim estava, ninguém me enganou...eu sabia muito bem o que estava assinando, mas que outro jeito eu conseguiria entrar no mundo automobilístico se não concordando com os termos?
Rick aperta os lábios numa linha reta, ele sabia muito bem que os esportistas precisam ter esse jogo de cintura para alcançar seus objetivos, ela continua.
— Eles só não contavam que sou péssima em obedecer regras, se sem entender quase nada eu já mexia no motor do meu Kart, quem dirá agora como Engenheira Mecânica.
O Personal abre um sorriso, lógico que Jully ia achar um meio.
— Não estava no contrato que eu não poderia modificar meu motor então se os mecânicos não podiam tocar no meu carro, eu poderia...arregacei as mangas do meu macacão e coloquei a mão na massa ou melhor: na graxa.
— É a sua marca registrada. - o rapaz dá um leve sorriso encantado.
— E usei o próprio sistema que eles criaram a meu favor, as vitórias começaram e a curiosidades dos engenheiros em saber o que eu fazia também no carro também.
— E você não contou?
— Não...eles que se virem tentando fazer igual no carro do Karl. - a garota volta a dar de ombros.
Rick solta uma risada alta. - — É por isso que não canso de repetir o quanto eu te admiro.
Jully também sorri. - — Nunca foi um conto de fadas como tentam mostrar na frente dos holofotes.
— Não entendo porque só querem se vangloriar de ser a única Escuderia a ter uma mulher piloto e não almejar que também sejam a primeira a ter uma mulher campeã.
— O machismo do Sr. Wagner não permite, foi bem difícil convencer ele a me contratar. O velho Müller gosta do dinheiro dos patrocinadores que trago para a Escuderia, mas não de mim.
— Que idiota!!! - Rick se irrita.
Jully vira a cabeça olhando para fora da janela e fica um tempo pensativa olhando a paisagem urbana noturna pela vidraça, milhares de luzes se perdem na imensidão.
— Há algum tempo tenho pensado em fazer mais...sabe, tipo ajudar pessoas. - ela fala enfim.
— Uma instituição?
— Mais que isso... - agora ela fixa o olhar num pequeno galpão velho do outro lado da rua com uma placa de aluga-se. - — ...uma fundação.
— Daquelas que todo atleta abre depois que se aposenta?
— Isso, mas hoje eu penso que não quero esperar tanto tempo assim. - a garota ainda está reflexiva.
— Ir devagar nunca foi o seu forte. - Rick repete as palavras dela fazendo-a sorrir.
— As meninas do Kart me fizeram entender melhor a urgência da situação, quero abrir uma Fundação para crianças, talvez ter mais atividades além da automobilística...ainda não sei ao certo o que mais poderia ter.
— Esse ambiente tem potencial para muitas possibilidades. - Rick analisa a ideia.
— Sim, quero um lugar que faça as garotas saberem desde cedo seu verdadeiro valor no mundo e ao mesmo tempo que ensine aos garotos respeito e empatia. Quero que desde pequenos entendam que existe lugar para todos no mundo sem que isso vire uma disputa acirrada entre gêneros.
O Personal olha admirado para a piloto. - — Esse lugar será incrível!
— Eu imagino quantas mulheres adultas não são hoje o que sonharam quando criança exatamente porque não tiveram ninguém que as incentivaram.
— Fundação Ross. - Rick diz ao mesmo tempo mexendo a mão direita à sua frente como visualizando a placa do futuro local.
A garota faz uma leve careta vendo essa cena. - — Ainda não pensei no nome, mas até que ficou legal.
— Pode contar comigo para ser voluntário. - o rapaz se oferece prontamente.
A garota abre um sorriso enorme para seu Personal.
— O papo está bom, mas está ficando tarde e você precisa de no mínimo 8 horas de sono agora.
— Tudo isso? - ela estranha.
— O descanso é fundamental para a recuperação muscular e depois vem a alimentação, você está seguindo à risca o cardápio que te dei não é?
— Nem um grão de arroz a menos. - ela levanta a mão simulando juramento.
— Ótimo...Vamos alongar.
Ele se põe em pé e Jully o acompanha, quando ela estica os braços faz uma leve careta.
— Essa dor é comum, fazia algum tempo que esses músculos estavam inativos, amanhã estará mais intenso. - o Personal explica.
— Hummmmm tinha me esquecido dessa parte chata. - A piloto franze as sobrancelhas.
— Sorte sua que vi que você tem uma hidro anexa na piscina da casa. - ele já tem a solução.
— Porque?
— Após o esforço físico, a água quente da hidromassagem ajuda a dilatar os vasos sanguíneos e aumentar o fluxo de sangue, causando o relaxamento das articulações com os músculos e consequentemente, a melhoria nas dores no corpo e fadiga.
— Você também sabe dar aula de hidro? - a garota fala surpresa.
— Lógico, eu sou um pacote completo. - ele dá um sorriso de boca fechada.
— O quê você irá fazer? - ela se aproxima do rapaz ficando nas pontas dos pés para falar bem próxima aos lábios dele.
— Agora vai vir a segunda parte do protocolo. - ele diz inclinando para beijá-la.
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