𝐒𝐔𝐒𝐒𝐔𝐑𝐑𝐎𝐒 𝐃𝐎 𝐂𝐄́𝐔
dedicado a ValquiriaSavio
Que a sua curiosidade alimente minha alma errante.
Obrigada por me apoiar sempre!!!
I PURPLE YOU💜
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"𝑶 𝒄𝒐𝒓𝒂𝒄̧𝒂̃𝒐 𝒆́ 𝒖𝒎 𝒎𝒂𝒑𝒂, 𝒈𝒖𝒊𝒂𝒏𝒅𝒐-𝒏𝒐𝒔 𝒑𝒂𝒓𝒂 𝒐 𝒏𝒐𝒔𝒔𝒐 𝒗𝒆𝒓𝒅𝒂𝒅𝒆𝒊𝒓𝒐 𝒅𝒆𝒔𝒕𝒊𝒏𝒐."
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Jimin agitava-se na cama, preso em um torpor inquieto. Gotículas de suor frio deslizavam por sua pele, enquanto uma força avassaladora o arrastava para as profundezas do sonho. Era como ser puxado para um redemoinho de emoções intensas, esmagadoras, que roubavam seu fôlego. Em sua mente, ele via o céu ━ dourado, luminoso, imaculado. Ele era Leuviah, o anjo das memórias, de asas resplandecentes como a aurora, pairando sereno sobre um vasto mar de nuvens.
Mas aquela paz sublime foi abruptamente dilacerada. Um tremor ecoou pelo firmamento, vibrando com uma força descomunal que o arrancou de sua morada celestial. A luz dourada deu lugar a um vermelho ardente, abrasador. A dor foi instantânea, quase insuportável. Ele sentiu, em cada fibra de sua existência, o rasgar cruel de suas asas. E com a dor veio o medo ━ um pavor profundo de cair, de ser engolido pela vastidão desconhecida abaixo.
Desesperado, ele se agarrou à luz, tentando reter em si a memória de seu lar celestial. Mas o abismo o chamava. Sua queda foi vertiginosa, o vento frio cortando seu rosto enquanto a névoa verdejante da terra se aproximava. O impacto foi um choque ━ um golpe que reverberou por todo o seu ser.
Quando abriu os olhos, o mundo ao seu redor era confuso e enevoado. Seu corpo tremia, ainda ecoando os vestígios do sonho. Levantou-se cambaleante, observando o ambiente ao redor. Estava em uma floresta densa e escura. As árvores altas erguiam-se como sentinelas, suas copas sussurrando segredos ao vento. O aroma de terra úmida e folhas secas preenchia o ar, misturado ao toque salgado da brisa marinha.
"Mas agora, ele não era mais um anjo. Era apenas um homem, tentando entender a vastidão de sentimentos que habitavam seu coração."
Enquanto caminhava por entre as árvores, a dor persistente e a estranha familiaridade do lugar cravavam-se em sua mente. Kilmore... O nome flutuava, ecoando nas profundezas de sua consciência. Ele sabia que aquele era o lugar de sua queda, o refúgio que havia o acolhido em sua vulnerabilidade. Mas a razão de seu vínculo com aquele chalé permanecia um mistério envolto em névoas.
Os passos o levaram até um caminho estreito, ladeado por flores selvagens e musgos vibrantes, que culminava em uma vila serena. As casas, com suas estruturas de madeira e telhados de palha, pareciam guardar histórias tão antigas quanto o tempo. Havia uma calma inexplicável naquele lugar, uma simplicidade que o atraía como um ímã.
Detendo-se diante de uma cabana modesta, Jimin bateu à porta de madeira. Foi recebido por uma jovem mulher de cabelos grisalhos e olhos azuis como o céu de verão. Seu sorriso era um bálsamo.
━━ Olá, jovem. Você está perdido? ━ perguntou ela, com uma voz acolhedora como o calor de um lar.
Jimin hesitou. Sua voz saiu como um sussurro, frágil:
━━ Eu... não sei. Não sei onde estou.
A mulher o observou com uma doçura maternal.
━━ Bem-vindo a Kilmore. Aqui você está seguro ━ disse, gesticulando para que entrasse. ━━ Venha, aqueça-se eu lhe esperava.
Dentro da cabana, Jimin sentou-se em uma cadeira de madeira. Olhou ao redor, sentindo-se como uma peça deslocada em um quebra-cabeça. A sensação de pertencimento ao mesmo tempo o confortava e o intrigava. Ele não sabia quem era, nem por que havia chegado ali, mas algo naquele lugar parecia sussurrar que tudo estaria bem.
━━ Leuviah e esse é o seu lugar, seu novo lar.
"O nome 'Leuviah' ecoava em sua mente, uma melodia distante que ele não sabia de onde vinha, mas que trazia consigo uma mistura de dor e esperança."
━━ Não lembro como vim parar aqui, se tenho família ou quem realmente sou.
━━ Não se preocupe, Aingeal. Estás onde deveria estar. Sou Sinead O'Mulriain, serei sua família nesta vida.
Com o tempo, Kilmore tornou-se seu lar. Em um mundo medieval envolto por misticismo e reverência à natureza, Leuviah encontrou uma paz que parecia perdida em suas memórias. Ele aprendeu a viver da terra, a sentir a conexão com o solo, o vento, e a água. Cada gesto, cada rotina simples, fazia-o sentir-se mais vivo, como se estivesse sendo moldado novamente.
Sem memórias claras de seu passado, mas embalado pela esperança de um futuro que o aguardava, Leuviah sentiu, pela primeira vez, que havia encontrado seu lugar no mundo. Um refúgio que o aceitava plenamente, como se tivesse sido feito para ele desde o princípio dos tempos.
A luz cálida de Kilmore desapareceu, substituída por campos devastados e gritos que ecoavam pelo horizonte. Era um cenário de desespero, um palco onde a guerra e a dor reinavam soberanas.
Jimin corria pelos campos de batalha de seu sonho, a realidade se dissolvendo em cores vívidas e sensações avassaladoras. A luz dourada de outrora fora substituída por tons sombrios e carmesim. O horizonte era tomado por bárbaros de olhares ferozes, armas erguidas, e gritos que ecoavam como trovões. No meio do caos, Jimin empunhava uma lâmina, sentindo a gravidade da luta, mas também a fraqueza que se intensificava em seu peito.
A escuridão que o tragava era quase palpável, um manto pesado que sufocava a luz em seu coração. O eco dos gritos de guerra reverberava em seus ouvidos, misturado ao pulsar frenético de um coração em desalento. O campo de batalha se estendia à sua frente, uma miríade de corpos em movimento, sombras e chamas dançando sob um céu tingido de vermelho.
Um silvo cortante atravessou o ar. Ele mal teve tempo de reagir antes de sentir o impacto. Uma flecha negra, carregada de uma energia sinistra, cravou-se em seu coração. A dor veio de súbito, como o rugido de uma tempestade carregada de um ódio inominável. O calor insuportável espalhou-se como veneno, queimando até o âmago de sua essência. Ele cambaleou, os sentidos se turvando, mas ainda assim conseguiu erguer os olhos uma última vez.
Os joelhos cederam, e o solo duro acolheu sua queda. Diante dele, duas orbes flamejantes o encaravam, cheias de escárnio e desprezo. A voz que acompanhou aquele olhar foi um sussurro gélido, repleto de malícia.
━━ Adeus, Leuviah.
E então, ele foi tragado pelo escuro.
Acordou com um sobressalto, o corpo tomado por um frio que não era deste mundo. O quarto ao seu redor parecia ao mesmo tempo familiar e estranho, banhado pela luz suave da manhã que filtrava-se pelas cortinas. Por um instante, não soube onde estava. Tudo parecia desvanecer-se entre o real e o onírico.
A visão ao seu lado trouxe um alento breve: os contornos tranquilos de quem dividia com ele o refúgio. Jeon repousava em uma quietude quase etérea, os traços suaves moldados pela luz dourada. A simples presença bastava para acalmar parte da tempestade que ainda rugia em seu íntimo.
Mas a memória persistia, como brasas sob a cinza. Jimin levantou-se da cama com um movimento vacilante, as mãos trêmulas buscando um apoio que não encontravam. O peso do sonho ainda o sufocava, os ecos da queda e da dor pulsando em sua mente.
Um gemido baixo escapou de seus lábios, involuntário, mas suficiente para despertar o outro. Olhos ansiosos encontraram os seus, a serenidade de outrora substituída por uma preocupação palpável.
━━ O que houve? ━ A voz de Jungkook era grave, mas repleta de cuidado, como um fio que o puxava de volta à realidade.
Os lábios vacilaram, como se a língua hesitasse em dar forma às palavras. Por fim, o relato emergiu em fragmentos: o céu, a queda, a dor lancinante. Cada frase trazia de volta o peso do que havia vivido ━━ ou sonhado.
━━ Era Kilmore... O chalé... ━ A voz embargada carregava a intensidade da memória. ━━ Eu vi tudo. Era meu lar, mas também... também onde perdi tudo.
Jeon o escutava em silêncio, a expressão grave mas firme. A mão que pousou em seu ombro era quente, um ponto de ancoragem em meio ao caos.
━━ O que viu talvez seja mais do que um sonho. Talvez seja parte de quem você é, algo que ainda precisa ser desvendado.
Os olhos do escritor se fixaram nos dele, buscando refúgio e, ao mesmo tempo, uma verdade que parecia além de seu alcance. Havia algo naquelas palavras, na certeza com que eram ditas, que trouxe um pouco de paz ao espírito tumultuado.
━━ É como se eu estivesse fragmentado, como se não pudesse entender por que tudo isso pesa tanto.
O aperto em seu ombro tornou-se mais firme, um gesto carregado de significado.
━━ Não precisa compreender tudo agora. O que importa é que você não está sozinho.
O ar parecia menos denso, a confusão menos sufocante. Havia segurança naquelas palavras, uma força que o amparava. Jimin respirou fundo, permitindo-se, por um breve momento, descansar na presença daquele que o compreendia.
A luz da manhã continuava a banhar o quarto, dissipando as sombras remanescentes da noite. E, embora as respostas ainda estivessem distantes, havia conforto em saber que, mesmo na escuridão, havia uma mão que jamais o soltaria.
Por um momento, Jimin ficou deitado, os olhos fechados, permitindo-se afundar na tranquilidade da manhã. Seus pensamentos se entrelaçavam com as lembranças do sonho e com as novas sensações que ainda se arrastavam como névoas em sua mente, mas, ao lado de Jungkook, as dúvidas pareciam mais suportáveis. Quando finalmente se virou, encontrando os olhos tranquilos do outro, um sorriso sutil, quase imperceptível, se formou em seus lábios. A presença de Jungkook, mais do que qualquer palavra, trazia uma sensação de acolhimento, como se a confusão de sua jornada finalmente tivesse encontrado um ponto de ancoragem.
━━ Vamos, acho que já é hora de preparar algo para o café ━ Jimin disse, quebrando o silêncio, sua voz ainda carregada pela suavidade da manhã.
Jungkook, sorriu ao ouvi-lo. Levantou-se com a naturalidade de quem sabia que o pequeno gesto de compartilhar uma tarefa simples podia ser um elo poderoso entre eles. Juntos, caminharam até a cozinha, o ambiente já iluminado pela luz suave do dia. O espaço, aquecido pelo cheiro acolhedor do pão assando e pelo aroma de café fresco, parecia refletir a conexão que estavam começando a construir. As manhãs, geralmente vazias de emoção, carregavam uma nova carga de significado, e essa carga se manifestava em cada gesto compartilhado.
Jimin, que sempre tivera uma relação um tanto distante com os momentos de convivência cotidiana, se via envolvido em uma dança harmoniosa com Jeon. O aroma fresco que se espalhava pelo ar, o som suave do pão sendo cortado e os olhares trocados entre eles tornavam o ato de cozinhar mais do que um simples ritual diário. Era, naquele momento, uma expressão de cuidado, uma oportunidade de construir algo entre os dois, sem pressa, sem pressões externas. O toque sutil de suas mãos ao se passarem ingredientes, os risos abafados diante de erros pequenos, a troca de olhares cúmplices enquanto mexiam a panela, tudo parecia fazer parte de uma coreografia que os aproximava, camada por camada.
A cada gesto, Jimin se sentia mais à vontade, mais integrado àquele novo mundo. O processo de cozinhar, algo tão simples e comum, parecia imbuído de algo mais profundo, como se cada movimento fosse um passo em direção ao entendimento de si mesmo, ao entendimento do vínculo que agora existia entre ele e Jungkook.
Quando finalmente sentaram-se à mesa, o café diante deles, com pães frescos e frutas dispostas de maneira cuidadosa, Jimin sentiu que, embora ainda houvesse tanto a ser desvendado, a presença de Jungkook ao seu lado era o suficiente para trazer certa paz ao seu espírito.
Após o desjejum, cujos aromas ainda os envolviam, permaneceram na cozinha por mais um instante, imersos em um silêncio suave. As palavras não eram necessárias para que sentissem a plenitude daquele momento, como se o próprio tempo tivesse decidido se pausar, deixando apenas o som do café sendo derramado na xícara e o calor reconfortante que os envolvia. No entanto, no fundo da alma de Jimin, algo se agitava, uma chama instintiva que o chamava para além dos limites do chalé, como se a terra sob seus pés murmurasse em segredo um destino que ele ainda não compreendia em suma.
Os olhos de Jimin, que antes estavam tranquilos, se perderam na paisagem além da janela. Algo o atraía, distante e familiar, como um eco que reverberava em sua essência. Ele nada disse, mas o peso da inquietação era visível em seus gestos contidos. Por fim, os lábios se abriram, numa confissão sussurrada que parecia fluir com a leveza de um rio.
━━ Eu preciso ir até o jardim.
Jungkook, atento à mudança sutil na expressão de Jimin, observou-o com uma preocupação, seus olhos refletindo a serenidade que sempre o acompanhava, mas que estava tingida de profundidade. Sem dizer uma palavra, levantou-se como se soubesse, com uma certeza instintiva, que o seguir era o que Jimin necessitava. Sem hesitação, acompanhou-o até o limiar do jardim, onde a natureza parecia aguardá-los, como se os elementos do mundo estivessem preparados para recebê-los.
Ao saírem para o ar fresco da manhã, uma sensação de renovação os envolveu. O jardim diante deles se abria em uma explosão de cores e formas que pareciam pintadas por mãos divinas, onde as flores exalavam perfumes que mais pareciam sussurros de outros mundos. O chão, coberto por uma espessa camada de musgo, acolhia os passos com suavidade, como se o próprio solo estivesse feito para abraçá-los. As árvores, altivas, eram guardiãs de segredos que ninguém ousava desvendar, e os raios do sol, filtrados por entre os galhos, tocavam tudo ao seu redor com uma luz dourada e acolhedora.
Jimin caminhou em direção à fonte, como se fosse atraído por um poder invisível. Suas mãos se estenderam, hesitantes, até a água límpida e fria que refletia o céu. No instante em que seus dedos tocaram a superfície cristalina, um calafrio percorreu sua espinha, e uma onda de sensações assolou seu interior. Foi como se as águas tivessem se aberto para ele, revelando camadas de memória e verdade que antes estavam ocultas, guardadas nas profundezas de seu ser.
Ele fechou os olhos por um breve instante e, ao abri-los novamente, as imagens começaram a surgir, como sombras dançando na superfície aquosa. Uma voz distante, suave e imponente, sussurrou ao seu ouvido, trazendo à tona lembranças longínquas.
"O livre-arbítrio não é apenas uma escolha, Leuviah. Ele é a força que define sua existência, o fogo que guia sua alma. Não deixe que essa chama se apague, mesmo que para isso você enfrente o caos do firmamento."
A memória de Haziel, como um espectro de luz, se materializou diante dele, e ele se viu conversando com o anjo sobre a liberdade da escolha, sobre a responsabilidade que traz consigo a verdadeira autonomia. As palavras que antes pareciam distantes agora tinham um peso quase físico, reverberando na mente de Jimin, como se fosse um chamado.
A água da fonte, por sua vez, parecia pulsar com vida própria, como se guardasse fragmentos de um passado que transcende o tempo. Jimin soube, naquele momento, que aquelas águas não eram apenas um reflexo do céu, mas um elo entre o mundo mortal e o celestial. O jardim, com sua beleza inefável e sua aura quase divina, era mais do que um simples espaço natural. Ele era a extensão de um paraíso perdido, um pedaço de eternidade guardado sob a forma de flores e árvores, um local onde suas memórias angelicais se entrelaçavam com a terra e com os corações dos que ali se encontravam.
E naquele instante, a verdade parecia fluir para Jimin com a mesma naturalidade que a água da fonte fluía para o solo. O jardim era uma chave para o entendimento de seu ser, uma ponte entre seu passado celestial e o presente terreno. A conexão que sentia com aquele lugar, com a terra e com as águas, se tornava cada vez mais clara. O destino o havia conduzido até ali, para que ele desvendasse os mistérios que ainda repousavam em sua alma.
Jungkook, parado ao lado, observava tudo em silêncio, sentindo o peso do momento. Ele não compreendia totalmente o que se passava com Jimin, mas havia algo de sagrado no ar, algo que os unia de maneira mais profunda.
Jimin, ainda abalado pelas imagens que assaltaram sua mente na fonte, voltou-se para Jungkook. A pergunta que queimava em seus lábios parecia arder em sua alma, mas, ao pronunciá-la, soou como um sussurro carregado de um peso inominável:
━━ O que é... o caos do firmamento?
Jungkook, de pé à sombra de uma magnólia em flor, hesitou. Seus olhos, tão profundos quanto a própria eternidade, desviaram-se brevemente, buscando no horizonte uma força que parecia fugir-lhe. A linha de seus ombros se enrijeceu, e o suspiro que escapou de seus lábios trouxe consigo uma confissão enredada em dor.
━━ O caos do firmamento... ━ começou ele, a voz grave tingida por uma tristeza que parecia atravessar eras. ━━ Não é apenas um limiar, mas um cárcere. Um lugar onde o tempo se dissolve e os ecos do passado são o único alento... e também o maior tormento. Foi lá que fui aprisionado, Jimin.
O impacto das palavras fez o coração de Jimin estremecer como se um trovão ecoasse em seu peito. A atmosfera ao redor pareceu se alterar, como se o próprio jardim contivesse a respiração. Ele quis perguntar mais, mas as palavras se perderam antes de formar som. Jungkook, porém, continuou, como se a confissão fosse um fardo que ele não mais pudesse suportar sozinho.
━━ Na tua terceira vida... eras um fuzileiro, um homem cuja coragem era tão temerária quanto inspiradora. Não eras perfeito, mas tua alma ardia com uma intensidade que iluminava até os mais sombrios abismos. Foi nessa vida que conheceste alguém... um homem de outra terra, outro lado da guerra. Um espião. Um inimigo. E, contra toda lógica, amaste-o.
Jimin arregalou os olhos, sua mente tentando alcançar as imagens fragmentadas que as palavras de Jungkook evocavam. ━━ Um inimigo? Como... por quê?
━━ Porque o amor nunca obedece às linhas que os homens traçam ━ respondeu Jungkook, sua voz tremendo ao se inclinar para a fonte. Ele tocou a água, seus dedos criando círculos que pareciam refletir os turbilhões de sua alma. ━━ O teu coração o escolheu, Jimin. Assim como o meu te escolheu.
Ele parou, como se as palavras que viriam a seguir fossem tão dolorosas que exigissem um esforço sobre-humano para serem ditas. Quando finalmente falou, sua voz era um fio carregado de emoção.
━━ Quando percebi que esse amor te levaria à destruição, eu... eu tentei intervir. Desobedeci aos céus, usei minhas asas para te afastar do caminho da ruína. Mas os arcanjos não perdoam a insubordinação. Miguel e Uriel me encontraram e julgaram meu ato como traição. Fui condenado ao lugar do firmamento, onde o tempo não existe e onde cada fragmento de tuas vidas passadas ecoava incessantemente, como um lamento que jamais cessa.
Jimin sentiu uma pressão no peito, como se o peso das palavras de Jungkook fosse algo que ele próprio deveria suportar. Seus olhos estavam marejados, mas ele não permitiu que as lágrimas caíssem.
━━ Você sofreu... tudo isso... por minha causa? ━ murmurou, sua voz carregada de incredulidade e culpa.
Jungkook virou-se para ele, e o olhar que ofereceu não era de recriminação, mas de um amor tão profundo e puro que transcenderia o próprio universo.
━━ Não apenas por ti, mas pelo que somos. Pela eternidade que partilhamos, Jimin. Desde a primeira vez que te vi, ainda em meu nascimento, tomei minha missão em te proteger. Mas o que eu não esperava... era amar-te de tal forma que essa missão se tornasse minha própria essência.
O silêncio que caiu entre eles foi preenchido apenas pelo som suave da água na fonte e pelo vento que sussurrava entre as folhas. Jimin deu um passo à frente, aproximando-se de Jungkook, e ergueu a mão, tocando-lhe o rosto com uma delicadeza quase reverente.
━━ Mahasiah... meu Maha, ━ disse ele, baixinho, mas sua voz carregava um peso avassalador. ━━ Se os céus te julgaram por amar, então foram os céus que erraram, não você.
Jungkook fechou os olhos ao ouvir essas palavras, e um único suspiro escapou de seus lábios, como se o fardo de eras houvesse se aliviado, ainda que ligeiramente.
O dia transcorreu em uma harmonia silenciosa, enquanto o jardim, com seu frescor matinal, transformava-se em palco de momentos compartilhados. Após a descoberta na fonte e a conversa repleta de revelações, eles decidiram permanecer ali, imersos na tranquilidade que parecia envolvê-los como um manto protetor.
Entre os bancos de pedra e as árvores centenárias, improvisaram uma pequena refeição, composta pelos pães, frutas e queijos que Jeon preparou com esmero. Sentados lado a lado, compartilhavam mordidas e olhares, como se cada gesto simples fortalecesse o vínculo que os unia.
O sol, em sua ascensão preguiçosa, iluminava o jardim com um brilho azulado refletido das águas límpidas, e as horas pareciam diluir-se em conversas pausadas e reflexões. Jimin colheu flores para adornar a mesa improvisada e o interior do palacete, enquanto Jungkook, com um sorriso quase imperceptível, observava-o com a mesma atenção de quem contempla algo precioso.
Mais tarde, decidiram explorar a pequena Kilmore, uma taberna rústica lhes ofereceu um almoço simples, mas revigorante. O aroma de pão recém-assado misturava-se ao calor do ensopado servido em tigelas de barro, e o som de risadas e conversas preenchia o ambiente, criando um contraste reconfortante com o peso das memórias que os acompanhavam.
Quando o crepúsculo finalmente começou a colorir o céu com seus tons de fogo, eles sentiram o chamado instintivo de retornar ao palacete. O dia, embora simples, havia sido profundamente significativo, como se cada instante tivesse contribuído para solidificar o elo invisível que os conectava.
Sob o céu tingido pelo crepúsculo, o palacete erguia-se à distância, suas torres e janelas refletindo os últimos raios de sol. A caminhada de volta foi pontuada por um silêncio confortável, apenas o som de passos sobre o cascalho e as mãos entrelaçadas em sentimentos compartilhados.
Ao cruzarem os portões ornamentados, o ambiente os acolheu como velhos amigos. No salão principal, Jeon acendeu a lareira para espantar o frio da noite que se aproximava, o crepitar do fogo parecia um convite tácito para deixarem as preocupações à porta.
Jimin sentou-se à janela de sacada. O nicho acolchoado, decorado com almofadas macias, permitindo-lhe um momento de contemplação. A luz dourada do entardecer derramava-se sobre o chão polido, filtrando-se pelas amplas vidraças.
Seus pensamentos foram interrompidos por passos suaves, quase hesitantes. Antes que ele pudesse virar-se, sentiu o calor de uma presença atrás de si. Braços envolveram seus ombros com delicadeza, e a voz familiar sussurrou algo suave demais para ser ouvido, mas não para ser sentido.
Jimin sorriu, deixando-se afundar contra o peito de Jeon. Lá fora, o mundo parecia distante; ali, naquele pequeno refúgio de vidro e almofadas, só existiam os dois
━━ Ainda é difícil entender tudo isso ━ começou Jimin, sua voz baixa, como um sussurro. Ele ergueu os olhos para o céu, como se buscasse ali as respostas que o firmamento parecia esconder. ━━ Mas, ao mesmo tempo, sinto... sinto que há algo maior nos esperando. Como se todas essas vidas, todas essas memórias, fossem partes de um fio invisível que nos une.
Jungkook inclinou a cabeça, observando-o com atenção. A luz da lareira iluminava suavemente o perfil de Jimin, destacando a curva delicada de sua expressão pensativa.
━━ Já lhe disse que não é necessário entender tudo agora ━ respondeu ele, sua voz repleta de uma serenidade que ancorava o momento. ━━ O importante é estarmos aqui, juntos. E isso, por si só, já é uma resposta satisfatória para mim.
Jimin desviou o olhar do horizonte para encará-lo. Nos lumes incandescentes de Jungkook, encontrou conforto, uma promessa, uma certeza inabalável que o fazia sentir-se menos perdido. Ele sorriu de leve, em um gesto sutil, carregado de significados.
━━ Juntos, então? ━ indagou Jimin, a suavidade de sua voz contrastando com o peso de suas palavras.
Jungkook estendeu a mão, os dedos tocando de leve os do escritor antes de entrelaça-los com firmeza. ━━ Juntos. Para o que quer que venha.
Aquele instante, marcado apenas pelo crepitar do fogo e pela respiração ritmada de ambos, parecia conter o universo inteiro. As perguntas, as dúvidas e os mistérios não desapareceram, mas tornaram-se mais suportáveis sob o peso da promessa mútua.
Jimin apertou suavemente a mão de Jungkook, sentindo o calor que parecia irradiar não apenas do toque, mas da presença dele. E ali, no coração daquele palacete repleto de histórias e segredos, eles firmaram um pacto silencioso.
━━ Vamos encontrar as respostas. ━ A voz de Jimin era firme, mas carregava uma doçura que Jungkook sempre achava impossível resistir.
━━ E faremos isso juntos ━ completou Jungkook, sua voz envolvendo o ambiente como um juramento eterno.
Os dedos de Jungkook deslizavam com a suavidade de uma brisa noturna, tocando de leve os de Jimin antes de traçarem, com delicadeza quase reverente, o contorno deifico de sua mandíbula. Subiram vagarosamente, como se cada centímetro de pele fosse sagrado, até repousarem em sua bochecha. O gesto, tão sutil quanto um sussurro ao vento, carregava em si um mundo de ternura, uma promessa de consolo e esperança. A pele de Jimin reagia como cordas de um instrumento, vibrando em arrepio sob o toque que era ao mesmo tempo gentil e firme, provocando um formigamento que se espalhava como um rio de sensações.
Os olhos do escritor cerraram-se, não por hesitação, mas para absorver cada nuance daquele instante. Ele sentia a proximidade de Jungkook como uma onda de calor que o envolvia, o hálito quente do outro mesclando-se ao aroma inebriante de sua fragrância. Havia um toque amadeirado e especiado naquela essência, que o envolvia como o abraço invisível de uma noite de inverno. O ar entre eles era denso, carregado de expectativa, quase tangível, e vibrava com uma energia que apenas o amor verdadeiro poderia produzir.
Quando os lábios de Jungkook encontraram os de Jimin, foi como se o tempo parasse. O toque era delicado, um roçar de asas, mas continha a profundidade de mil histórias não contadas. Não havia pressa naquele beijo, apenas a intensidade de um sentimento que buscava se expressar em cada movimento. Jimin sentiu a maciez dos lábios de Jungkook e o calor que emanava deles, um calor que parecia derreter as barreiras de qualquer insegurança. O beijo transcendeu o físico, tornando-se uma ponte entre duas almas que se buscavam além do tangível.
A língua de Jungkook explorou com hesitação inicial, como quem descobre um território desconhecido, até ganhar confiança em uma dança silenciosa e íntima com a de Jimin. Havia algo quase intoxicante naquele contato, o sabor sutil que misturava o doce com a essência própria de Jungkook. Jimin deixou-se levar, permitindo que aquela conexão profunda tomasse conta de cada fibra de seu ser.
Quando os braços de Jungkook o envolveram, o abraço era mais do que um gesto; era uma declaração. Havia calor e força, uma proteção que dizia sem palavras que, juntos, poderiam enfrentar qualquer tempestade.
Ao se separarem, a respiração entrecortada e os olhos brilhando como constelações perdidas, eles sabiam que o caminho à frente seria repleto de desafios, mas a promessa estava feita, selada pelo beijo que entrelaçara suas almas. Jimin repousou a cabeça no peito de Jungkook, ouvindo o ritmo acelerado de seu coração, que pulsava em perfeita sintonia com o seu.
O crepúsculo fora testemunha de seu amor, e o palacete, tornara-se seu refúgio.
𝐏𝐔𝐁𝐋𝐈𝐂𝐀𝐃𝐎 𝐄𝐌: 11/12/2024
𝐓𝐎𝐃𝐎𝐒 𝐎𝐒 𝐃𝐈𝐑𝐄𝐈𝐓𝐎𝐒 𝐑𝐄𝐒𝐄𝐑𝐕𝐀𝐃𝐎𝐒 ©𝐋𝐘𝐃𝐈𝐀 𝐓𝐀𝐕𝐀𝐑𝐄𝐒
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