Capítulo 1
A Lua está do meu lado
Eu não tenho razão para fugir
Então, alguém venha e me leve para casa esta noite
Os anjos nunca chegaram
Mas eu posso ouvir o coro
Então que alguém venha e me leve para casa
Fun. ft. Janelle Monáe - We Are Young
๑ ۞ ๑, ¸¸, ø¤º ° '° ๑ ۩ ๑, ¸¸, ø¤º ° '° ๑ ۞ ๑
No ano de 2015, cheguei no pequeno povoado de Hill City, a cidade era muito pequena e a maior parte do que conseguíamos ver eram montanhas e natureza. "Claro... onde mais estaria escondido esse maldito orfanato", eu pensava. Eu e a Lucy buscamos uma casa quase pela cidade inteira e finalmente conseguimos comprar uma pequena casa de dois cômodos em um local distante de outras casas, não precisávamos mais do que isso. Tiramos do carro todo o equipamento de computação de Lucy e levamos o carro para um lugar um pouco mais deserto da cidade e o explodimos ali mesmo. Não podíamos correr o risco de sermos encontradas.
Ela iria ficar em casa rastreando tudo o que ela conseguisse relacionado ao orfanato, incluindo a sua localização exata. A única coisa que sabíamos até então é que estava em alguma estrada que levava para as montanhas. Eu sairia e tentaria ver como era a segurança da cidade. Qualquer informação seria importante.
Minha cabeça não parava de girar desde que meu pai havia sumido e abandonado o orfanato. O edifício havia sido passado para o meu nome mais recente, o que só me mostrava que meu pai seguia de olho nos meus registros falsos, mas claro, eu não poderia ir buscar os documentos porque era uma pessoa procurada. Para que fique claro, não era bem um fugitiva da polícia, mas quem me buscava não pouparia esforços. Fugi no dia que eu matei a minha mãe, mais especificadamente no meio do ano de 1945. Foi um plano bom para sair daquele lugar, mas eu não pensei em como iria me virar na rua. Havia tido sorte até então.
O calor na cidade estava quase insuportável, tinha vontade de tirar aquela manga longa, mas sabia que não poderia fazê-lo para não ser reconhecida.
Andei por cerca de duas horas vendo toda a movimentação pacata da cidade, achei uma biblioteca que poderia nos ajudar muito e, também achei o prédio de arquivos da cidade. Vi apenas dois policiais que estavam calmamente comendo em uma padaria local.
Passei no mercado e comprei suprimentos para a nossa estadia e voltei para casa. Lucy parecia muito concentrada e não falou comigo inicialmente. Se passaram 30 minutos para que ela começasse a falar da segurança que colocaria na casa. Colocaríamos três etapas: senha, reconhecimento por câmera e confirmação de elemento alquímico. Caso alguém conseguisse burlar a senha, as câmeras detectariam o invasor, em seguida o sensor faria o reconhecimento, e se não fosse uma de nós duas, a bomba seria ativada. Nada do que tínhamos aqui poderia sair daqui.
Passamos o resto da tarde instalando a segurança e durante a noite Lucy voltou para seu trabalho. Resolvi sair novamente, coloquei a melhor roupa para a ocasião e fui para uma balada noturna chamada Stormdance, precisava conhecer melhor a cidade e, principalmente, saber se havia tido algum desaparecimento de alguma jovem recentemente.
O calor continuava forte apesar de ser noite já, o vestido preto que eu havia vestido também tinha as mangas longas, mas era mais fresco do que a roupa que eu estava durante a tarde. As pessoas aqui pareciam animadas, mas algo não estava certo. Sentia uma presença estranha e isso estava me enjoando. Lembro de ter sentido esse tipo de presença antes, mas não conseguia reconhecer, precisava ficar alerta.
Resolvi pedir um drink, o barman não tirava os olhos de mim, e pensei que talvez pudéssemos conversar um pouco.
Me sentei no bar e dei o meu melhor sorriso para ele, mas assim que ele estava chegando ele parou e recuou. Senti um frio na espinha e em seguida alguém falou comigo.
– Boa noite gracinha, acho que não nos conhecemos ainda – a voz era de um verdadeiro Don Juan e a presença estranha vinha claramente dele.
Cada parte do meu corpo havia ficando em estado de alerta.
"Tenho que manter o sorriso e não demonstrar nada do que eu senti", pensei enquanto eu me virava. Dei de cara com um homem branco de cabelos longos e escuro, se fosse para comparar com alguém eu diria que estaria bem próximo a Nuno Bettencourt quando novo, incluindo o jeito de se vestir (sim, adoro comparar as pessoas, sou só eu?), mas com um ar maior de Don Juan. Ele mantinha um sorriso sedutor o tempo todo e um olhar muito penetrante e predatório.
"Extremamente bonito, presença estranha, sorriso encantador para qualquer uma", abaixei a cabeça na mesma hora, não podia ficar encarando-o, já sabia o que ele era e o que podia fazer, não poderia olhar nos olhos dele por nada. Eu era uma presa fácil ali. Apesar de evitar seus olhos eu mantive a pose e respondi com calma.
– Não sou da cidade, estou apenas de passagem.
– Realmente notei que você não é daqui, conheço todos da cidade e acredite, nenhuma jovem daqui é tão linda quanto você.
"Ótimo, isso não era o que eu estava esperando", pensei ironicamente, "não posso fazer as perguntas que quero para ele, ele poderá interpretar de outra maneira, tenho que ser cautelosa".
– Obrigada pelo elogio – disse enquanto olhava para o barman – Se você me desculpa, preciso de uma bebida.
– Me deixa te convidar para um drink então, boneca – ele disse já pedindo dois whiskies – Adorei seu estilo. Cabelos negros com as pontas roxas escuras, não vemos esse tipo de pessoa aqui com frequência, mas você não me deixou nem ver a cor dos seus olhos. Por que não olha para mim para que eu possa te ver melhor? Sei que minha beleza é chocante, mas não precisa ficar se esquivando, não farei nada do que você não queira.
– Sinto muito querido Don Juan, mas não posso cair no seu charme hoje – disse enquanto pegava o copo em que me foi servido o whisky. Bebi em um só gole e pedi outro para o barman enquanto ele e o nosso Don Juan que estava ao meu lado me olhavam boquiabertos.
– Posso perguntar o que traz uma garota linda como você a uma cidade tão pacata quanto essa?
– Como eu disse, estou apenas de passagem.
– Que pena, então poderíamos aproveitar a nossa noite, o que você acha – ele me convidou estendendo a mão.
Mas antes que eu pudesse dar qualquer resposta, senti uma presença conhecida repentinamente, mas acabei me assustando e desci o punhal que eu sempre carregava na manga e com uma virada brusca parei o punhal no pescoço de Lucy que apenas levantou a mão com um sorriso divertido.
– Hannah, é assim que você recebe sua querida irmã?
– Lucy você me assustou – falei notando que o nosso Don Juan se divertia.
– Posso perguntar como a boneca conseguiu entrar com uma arma dessa aqui?
– Quem é ele Hannah?
– Não importa, conseguiu?
– Claro, com quem você acha que está falando...? Eu sou a melhor da área esqueceu? Agora será que você pode guardar o punhal antes que você nos coloque em encrenca de novo.
– Desculpa – respondi voltando o punhal para a manga com um movimento rápido – Sinto muito garanhão, mas nossa conversa acaba aqui. Tenho trabalho a fazer.
– Fingirei que não escutei nada doçura, mas acredito que as moças estão arrumando encrenca pela cidade. Espero que eu possa te ver novamente antes de que aconteça algo com você, preciosa.
– Melhor que você não se envolva – respondi tranquilamente.
Novamente sorri para ele, sem olhar nos olhos dele, desejei boa noite e saí puxando a Lucy comigo. Aquele linguajar dele estava me dando nos nervos, mas eu não podia deixar ele saber que eu conhecia seu segredo.
Lucy tentou me acompanhar com uma certa dificuldade, eu precisava trocar aquele vestido chamativo logo e saber o que ela tinha descoberto.
– Hannah, calma, por que a pressa? Quem era o cara afinal?
– Lucy, presta atenção, nunca, mas nunca mesmo fale com ele entendeu? Eu não esperava encontrar seres como ele aqui. De agora em diante você só sai durante o dia, se for sair durante a noite, garanta que tenha alguma rede por perto para você escapar entendeu?
– Ei, você está me assustando.
– Não importa, vamos voltar para casa para que você me conte o que descobriu. Minha saída agora de noite foi inútil na maior parte do tempo.
– Ele não é humano, certo? – ela perguntou ainda tentando entender a minha reação – Será que ele sente outros seres igual você?
– Duvido muito disso, mas o melhor agora é mantermos o foco no que já estamos fazendo ao invés de nos preocupar com outros seres.
Eu e a Lucy não éramos irmãs de verdade, mas estávamos há muito tempo juntas já e nos ajudávamos sempre. Eu com os meus eternos 22 anos e ela com seus eternos 20 anos, ou essa era a idade que sempre falávamos. Eu tinha esse dom de perceber os seres já fazia muito tempo e para minha sorte não havia conhecido nenhum outro ser que tivesse esse mesmo dom que eu.
Chegamos em casa muito rápido. Fizemos algo para comer e enquanto comíamos eu a fiquei olhando. Ela era extremamente diferente de mim. Uma ruiva linda, algumas sardas no rosto e os olhos castanhos claros, com o corpo bem definido, mas que frequentemente era escondido por roupas estranhas e um óculos grande na qual ela não precisava. Normalmente nos vestíamos de acordo com o que íamos fazer, mas ela dificilmente tinha a necessidade de sair dos lugares em que ficávamos hospedadas. Eu já mudava o meu estilo com uma frequência muito grande. Também era branca, tinha os cabelos bem longos e pretos, com apenas as pontas roxas. Tinha alguns piercings na orelha que ajudava na hora de me destacar em baladas como a de hoje, mas que normalmente estavam ocultos por mechas de cabelos. Meus olhos eram verdes e extremamente claros, o que dificultava minha vida em dias de muito sol. Só quem tem olhos claros entenderá esse dilema.
Tanto eu quanto Lucy mantínhamos os exercícios e a vida saudável na maior parte do tempo. Treinávamos as mais diversas lutas, pois nunca sabíamos quando iríamos precisar delas e raramente usávamos os poderes que tínhamos. Mantínhamos a descrição até que não tivesse outro meio durante nossas brigas, e acredite, não eram poucas.
Lucy era a melhor hacker que existia no mundo, então qualquer lugar que íamos, ela apagava nossos rastros e isso era sempre muito útil. Era viciada em qualquer tecnologia que aparecia e eu gostava mais das coisas a moda antiga, acho que porque eu nunca me desapeguei da minha época realmente. Ela era extremamente brincalhona e gostava de pregar peças em qualquer um e eu era o que eu precisava ser, brincalhona, séria, sedutora, tímida ou o que precisasse na hora... mas eu vivia em um constante conflito interno e tinha raiva constantemente, uma raiva interna que não me deixava viver tranquila. Essa raiva nos deu problemas muitas vezes e eu tentava controlar isso de qualquer jeito.
Graças a Lucy e a um grande golpe bancário, tínhamos dinheiro suficiente para muitas vidas ainda e assim podíamos nos mudar com bastante frequência.
Fiquei pensando em muitas coisas até que fui interrompida pela fala agitada da Lucy, que estava me olhando fixamente.
– Pensando no gatinho que você deixou no baile, Hannah?
– Nem brinca com isso Lucy, ele é sedutor do jeito que precisa para sobreviver, só isso. E eu não estou interessada em nenhuma diversão desse tipo. Vou buscar uma bebida para que você possa me falar o que encontrou. Rum ou Whisky?
– Hannah, você não acha que está bebendo muito?
– Ah, fala sério? Quem está sendo careta agora? É uma das poucas coisas "não saudável" que fazemos na vida... e a bebida nem faz efeito nenhum em nós... só nos dá um certo calor.
– Ta bom, ta bom..., mas eu prefiro uma cerveja hoje, está muito calor.
– Ok, uma cerveja então
Fui buscar as cervejas, mas não deixei para trás meu whisky. Sabia que iria precisar dele.
Servi a Lucy primeiro e logo em seguida me servi enquanto ouvia ela começar a falar sobre o que havia descoberto.
– Achei a localização exata do orfanato, isso foi uma coisa muito fácil na verdade, não tem nada que bloqueie o rastreio dele. O que já era de se esperar de um lugar abandonado. A última jovem que sumiu e que não deixou rastros de corpo e nem nada, foi há 19 anos. Você não acha estranho que não lembremos aonde fica?
– Um pouco. Então você acha que ele realmente abandonou o orfanato e simplesmente desapareceu?
– Achei em câmeras de segurança do aeroporto mais próximo imagens dele indo embora e logo em seguida a notícia de que o avião havia caído. O corpo dele deu como desaparecido pela polícia local e em seguida o deram como morto. Ele não poderia voltar para a cidade, porque iriam reconhecê-lo. Então acho que ir até o orfanato é seguro, mas como ele saiu preparado não sabemos se encontraremos algum rastro das pesquisas dele por lá
– Entendi, mas ir até lá é a única opção que temos.
– Certo... e qual é o plano agora?
– Bom, vamos seguir o plano original. Vamos implantar o chip rastreador atrás da minha orelha, celulares são muito arriscados para isso. Se eu precisar de ajuda você saberá para onde ir, mas só apareça em holograma, ok? Nada de se arriscar!
– Não seria melhor irmos juntas? Duas investigando será melhor – ela perguntou tentando me fazer repensar no que eu acabava de falar.
– Agradeço a sua preocupação, mas você sabe que seria um risco sem necessidade nenhuma. Preciso de você aqui, sendo meu apoio como sempre. Você é a melhor na sua área, lembra? E eu só consigo ajudar estando em campo. Assim, nós sabemos o nosso lugar.
– Está bem, mas me prometa que vai tomar cuidado.
– E quando eu não fui cuidadosa, medrosinha? – perguntei debochando um pouco da cara de preocupação dela.
– Aaaahm, muitas vezes eu diria – foi a vez de ela debochar.
– Lembre-se, preciso de você dentro da casa, mas se alguém conseguir invadir, deixa a bomba explodir e vá para o lugar de rede mais próximo. Essas coisas não podem cair nas mãos de ninguém.
– Você vai sair amanhã cedo?
– Não, vou agora.... vou apenas trocar de roupa. Irei andando, assim chegarei lá de madrugada e terei tempo de pesquisar o que eu precisar. Quero sair logo dessa cidade.
– Está bem, vou preparar a implantação do chip enquanto você se arruma.
Me arrumar não era um problema, para essa situação sempre colocava meu sobretudo que vai quase até os pés, cobria o rosto com uma máscara, deixava a maquiagem preta nos olhos e colocava a touca do próprio sobretudo. Era a roupa que mais cobria meu corpo. Coloquei uma blusinha apertada e uma calça legging e finalizei com a bota mais confortável que eu tinha. Parecia uma rockeira triste procurando o cemitério mais próximo (brincadeira). Mas para a escuridão da trilha que eu iria tomar e para poder me ocultar esse era sem dúvidas o melhor visual.
O calor da cidade continuava insuportável apesar de estar escuro. Ainda bem que havia me habituado a usar roupas quentes em qualquer situação.
Me despedi de Lucy enquanto fazia ela prometer que não sairia da casa e que iria captar qualquer movimento fora da residência. Ela me prometeu isso sem problemas e ainda disse que iria conseguir o documento do orfanato para que pudéssemos seguir com a investigação sem problemas com a polícia.
Apesar de ser noite, ainda era tecnicamente cedo para que as ruas estivessem vazias, por isso optei por caminhos menos movimentados e escuros. Chegar na trilha para as montanhas não era algo difícil e em pouco tempo eu estava caminhando por ali, já sem muita preocupação se as pessoas iriam me notar ou não.
Continuei andando por mais ou menos 3 horas até conseguir ver o orfanato. A imagem daquele lugar fez meu coração disparar e a raiva aumentar. Tentando segurar a vontade de simplesmente explodir aquele lugar e apagar qualquer recordação que eu pudesse ter. Tive que parar e respirar fundo para segurar esse pequeno impulso.
Quando me senti melhor segui até a entrada e foi então que senti novas presenças. "Não é possível, o orfanato não deveria estar habitado" pensei tentando definir quem estaria dentro da mansão e quantos eram.
Para minha frustração senti a presença de 3 seres em diferentes partes do orfanato e me arrepiei ao lembrar quando foi que eu senti aquela presença antes. Claro, o Don Juan da balada tinha a mesma presença. Eu estava em um covil de sanguessugas.
O suor começou a escorrer pela minha testa, o medo paralisou minhas pernas por alguns instantes. Eu sabia que precisava entrar. Precisaria bolar um plano para não ser vista.
Tinha dois lugares que eu poderia ir para procurar pistas, a biblioteca e o porão. A minha sorte é que ninguém mais tinha esse pequeno radar que eu tinha, mesmo assim eu deveria ser cuidadosa.
Dei a volta pela mansão o mais silenciosamente possível. Achei uma janela baixa para um pequeno depósito e resolvi entrar por ali, o depósito estava completamente cheio de pó e só tinha velharias, com certeza ninguém o havia visitado há anos.
Tentei sentir as três presenças que se moviam pela mansão e percebi que nenhuma delas estava por perto. Essa era a minha chance de seguir adiante. Cheguei de fininho até a porta e me deparei com uma porta trancada, felizmente eram trincos fáceis de abrir com meu pequeno equipamento e isso não foi muito difícil, mas ao abrir a porta não contei com um ruído imenso. Tentei sair enquanto me concentrava nos moradores da mansão... eles ouviram com certeza, os três se colocaram em movimento para essa direção. Teria que pensar rápido. Havia duas saídas, uma levava até uma pequena escada que dava para um pequeno salão que tinha acesso a biblioteca (lembro desse caminho pelas vezes que vim ver meu pai) e o outro caminho era um corredor que levava a uma escada que dava para o salão principal da casa, que era de onde os três estavam chegando.
Fui rumo a biblioteca, lembrava que havia uma saída secreta em algumas das prateleiras, uma passagem secreta que dava para um pequeno quarto perto do salão principal. O quarto era usado como escritório na época em que fugi.
Uma pena que eu não teria tempo de ver muita coisa da biblioteca. Apesar do medo eu fui o mais silenciosamente possível pelo caminho todo. Fechei com cuidado a porta da biblioteca e tranquei com a chave que estava na porta. Sentia que os três haviam parado no depósito. Não sabia quanto tempo eu tinha, mas precisava achar qualquer coisa ali mesmo.
Revirei as gavetas, olhei entre alguns livros e vi um livro de alquimia avançada, mas era muito grande para eu carregar enquanto fugia. Em compensação achei um papel com os mesmos símbolos que eu tinha nos braços, com uma linguagem estranha e com a assinatura do meu pai. Teria que voltar outro dia para pegar o livro. Senti que um deles vinha em direção a biblioteca e procurei a saída secreta. Escutei ele tentando abrir a porta e não conseguindo.
Ele xingou alguma coisa baixinho e resolveu perguntar quem estava aqui.
O quê? Quem seria louco de responder que invadiu uma casa pelo depósito? Mesmo se eu não soubesse quem eles eram eu não era tão burra assim.
Me concentrei nesse pequeno corredor onde os três estavam e saí pela passagem secreta, rumo ao salão principal. Esperava desesperadamente que a porta estivesse aberta.
Enquanto eu saía senti um arrepio novamente e uma presença forte atrás de mim. "Droga... baixei a minha guarda, de onde veio essa quarta 'pessoa'"?
– Olha só, encontramos uma ratinha na mansão, bem que senti um cheiro delicioso – eu escutei enquanto uma mão forte segurava meu braço me impossibilitando qualquer movimento brusco.
Ele falou alto o suficiente para que todos escutassem e claro, logo todos eles estavam vindo na direção do salão. Eu não podia arriscar lutar contra todos de uma vez.
A pessoa que estava me segurando tinha uma voz muito familiar, mas não conseguia pensar naquilo naquele momento e além do mais ele estava bloqueando a saída do orfanato.
Minha única saída era minha adaga, não podia usar poderes ali, eu ainda tinha alguma chance antes de partir para isso. Apesar de eu estar presa, consegui baixar minha adaga pela manga com uma certa facilidade e percebi que eu tinha movimento suficiente para machucar a perna de quem me segurava.
Foi tudo muito rápido, escutei ele gritando de dor e me soltando. Claro que usei a oportunidade para correr enquanto via os outros chegarem.
Tive que subir as escadas mesmo. Talvez ir para o sótão e tentar escalar até o telhado? Teria que tentar.
Corri o mais depressa que eu pude, mas acabei me esquecendo de uma coisa muito importante... eu estava deixando rastro com meu cheiro, o que era terrível, já que eles iriam me encontrar rápido.
Mal entrei no sótão e todos eles já estavam na porta, dei uma olhada em todos e descobri de onde vinha a voz que eu conhecia. Sim! O Don Juan estava ali e foi o primeiro a falar.
– Acho que já vi essa adaga antes certo, gracinha? Talvez esteja querendo retribuir a bebida?
Pelo visto eu estava sem sorte. Ele me reconheceu. Coloquei tudo a perder. Eu não teria tempo de escalar para o telhado.
Enquanto todos eles tentavam me acalmar, dizendo que só queriam conversar comigo, que não iriam me fazer mal, eu fiz uma careta e respondi irritada.
– Claro, vou acreditar que vocês possuem um estoque de bolsas de sangue lá embaixo e que milagrosamente o meu irá ficar dentro do meu corpo.
– Ora, acho que ela sabe mais do que acreditamos – falou um jovem dos olhos bem azuis.
– Moça calma, nós só queremos saber o que você veio fazer aqui – um outro que estava oculto pelas sombras falou com a voz compreensiva.
– Isso não resolve gente, ela claramente sabe quem somos – o rapaz de olhos azuis falou novamente.
– Calma doçura, não queremos te fazer nenhum mal – o Don Juan falou.
– Desculpa não acreditar em você, Don Juan – falei com um sorriso nervoso no rosto – preferia não ter te encontrado de novo.
Quando vi que ele se aproximava e ficava próximo o suficiente para me deixar em total perigo de novo tive que tentar tomar uma decisão... mostrar meus poderes e atacar? Não, não podia entregar quem eu era assim de cara. "Hannah, pula agora. Faz o selo do vento, você precisa fugir" – repeti por alguns segundos para mim mesma.
Pressionei o chip para alertar a Lucy que eu estava encrencada e para que ela viesse em holograma para me ajudar com alguma rota de fuga e pulei pela janela quebrando os vidros, mas assim que eu pulei me apareceu uma figura muito conhecida me impedindo de ativar o selo do vento.
Caí em cima de uma caixa de madeira e assim que a madeira quebrou senti algo me transpassando pelas costas até sair pela barriga.
A dor foi lancinante e não demorou muito para eu começar a cuspir sangue que passou a escorrer pelo canto da máscara. Antes que eu pudesse pensar em alguma coisa, meu velho amigo já estava com a cara muito próxima da minha.
– Quanto tempo Apollyon – falei com um esforço gigantesco enquanto cuspia mais uma bola de sangue.
– Hannah, nunca pensei que chegaria o dia em que você facilitaria tanto o meu trabalho. Mexer com vampiros não é muito do seu feitio, não? Mas não posso conversar muito, tenho que levar sua alma, então se entrega de uma vez.
Enquanto ele falava vi que os quatro vampiros se aproximavam.
– Sinto muito querido amigo, mas não posso – disse dando um sorriso fraco.
– Você sabe que está parecendo uma louca para os seus novos amigos, certo?
– Eles não são meus amigos.
Quando Lucy apareceu, seu semblante se contorceu pelo horror de me ver daquele jeito e notei o desespero nos seus olhos.
– Hannah! Não, não, por favor, não morre! – ela gritou sem conseguir me ajudar – Apollyon, sei que você está aí, sai de perto dela! Eu nunca vou te perdoar se você a levar! – eu sabia que ela não podia vê-lo, mas ela era esperta o suficiente para saber que ele estava sempre por perto.
Os quatro vampiros olharam para o holograma da Lucy e logo tentaram achar com quem ela estava falando. Um pouco mais assustados do que inicialmente eles recuaram poucos passos, tentando decidirem o que fariam.
A Lucy me deu a distração perfeita. Ativei o selo do fogo, levantei o braço direito com muita dificuldade, mas rápido o suficiente para não deixar brecha para que o meu ceifeiro reagisse. Com os braços um pouco mais levantados criei uma chama razoável e a lancei a poucos centímetros de mim fazendo com que Apollyon caísse em chamas se contorcendo de dor e finalmente aparecendo para todos.
– Desculpa ceifeiro, não posso morrer ainda. Ainda tenho que matar uma pessoa.
– Desgraçada! Você já viveu muito para uma humana não acha?
– É verdade – disse abaixando finalmente a máscara que já estava ensanguentada o suficiente para me sufocar. Cuspi mais um pouco de sangue e tentei continuar respirando normalmente.
Os vampiros todos ficaram olhando petrificados o que tinha acabado de acontecer.
Quando Apollyon tentou se levantar de novo, resolvi lançar fogo com vento. Assim ele ficaria longe. Sabia que ele detestava sentir dor, por mais que ele não morresse eu sabia que ele se irritaria.
Novamente as chamas chegaram nele e ele foi lançado longe deixando um rastro de fogo por onde passava. Para que não acontecesse nada, ativei o selo da água logo em seguida e o grito dele foi tão terrível que eu tive certeza de que ele não se levantaria tão cedo dessa vez.
– Sei que estou no meu limite, não posso mover mais um músculo Lucy. Não vá atrás dele sozinha – falei para Lucy.
– Por favor Hannah, não morre, você prometeu! – o desespero dela era tão grande que chegava a me oprimir o peito – Por favor, ajudem ela, eu faço qualquer coisa, por favor!
"Minha visão está escura, com quem será que a Lucy está falando?". Talvez eu pudesse ter tentando escutar eles no fim das contas, minha decisão precipitada finalmente havia acabado com a minha vida.
Senti que alguém se aproximava. Não conseguia ver quem era, mas sabia que era um dos vampiros. Eu não tinha mais saída.
– O que você é? – escutei-o perguntar muito próximo de mim.
– Hu.. humana – falei com muita dificuldade.
– Humanos não fazem o que você acabou de fazer. Escutei aquele ser que você atacou te chamar de humana, mas isso é impossível.
– Não ... me .... deixa .... morrer – falei com muita dificuldade. Eu não podia morrer, eu tinha muita coisa para resolver ainda – Aquele desgraçado... está... vivo...olha meu... braço...
– O que tem seu braço? – escutei ele perguntando... Ele tinha uma mescla de curiosidade e raiva na voz.
– Hannah? Não! – acho que a Lucy entendeu que eu iria revelar meu segredo, mas senti que ele não me salvaria se eu não mostrasse que eu seguia sendo humana.
– Olha... meus.... braços – continuava com muita dificuldade, mas levantei o braço para que ele pudesse abaixar as mangas do meu sobretudo – Entre... humanidade... e ... al... alquimia – terminei já sem força nenhuma e senti que já não podia fazer mais nada.
Perdi os sentidos em seguida.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro