Tomas

Olho para o copo de Uísque parado em minha mão... A vontade ingerir o liquido e sentir o seu queimar em minha garganta já não é a mesma de anos atrás... Olho para a tela do notebook aberta em minha frente e o buscador de pesquisa faz a busca que já sei a resposta '' Qual a maior dor que um ser humano pode sentir''. Jogo o copo na parede e o vejo se espatifando sem nem ao menos ter sentido o gosto da bebida... O cheiro inebria o quarto e logo já me sinto enjoado, assim como a dor em meu peito... Hoje vinte e cinco de março... Quatro anos que ela se foi, e nada faz a dor em meu peito parar, nada silencia a dor. Não consigo entender qual o propósito da vida em entregar alguém para ser o amor da sua vida, e retirar de você de maneira tão brusca e tão dolorida. Minha Talia... Fecho os olhos e consigo ver sua imagem em minha frente... Com seus cabelos longos e ruivos ela rodopia enquanto me olha com seu sorriso que sempre ganhou qualquer pedido, ou até mesmo a mais boba das discussões. Posso ouvir o som do seu riso e sentir o seu perfume, e enquanto isso sinto o que restou do meu coração sendo comprimido em meu peito.

-Filho? – Minha mãe diz me trazendo de volta à tona. – Você está bem? Eu escutei um barulho... – A preocupação em seus olhos é a prova viva de que a minha dor tem arrastado a todos em minha volta, e o quanto os anos anteriores foram pior.

-Estou bem mãe. São só quatro anos, e hoje não estou a fim de beber... – Digo já me levantando antes que ela comece com toda a palestra.

-Você sabe que vai passar, sabe não sabe filho? – Ela diz com os olhos emocionados.

-Minha esposa e minha filha irão voltar mãe? Somente quando isso acontecer tudo isso vai passar – Pergunta a ela em um sorriso debochado, porém carregado de dor.

-Tomas... Talia não ia querer isso? – Fecho meus olhos tentando calar a dor.

-Mãe... Por favor... Não... Só bom... Não começa...

-Você precisa seguir em frente Tomas, já faz algum tempo... Talvez seja a hora de você encontrar outra pessoa... Talia iria querer que você seguisse em frente... – Ela diz com lágrimas caindo dos seus olhos preocupados. Sinto vontade de abraça-la e gritar por socorro por ajuda, não aguento mais carregar comigo essa dor... Enxugo algumas lágrimas que tentam cair, e saio com o meu carro. Em minha cabeça algumas ideias passam, e alguma sugestões de como silenciar essa dor passam em minha mente. Dirijo um pouco enquanto tento acalmar meus pensamentos. Preciso pôr um fim nesse sofrimento... Talia não vai voltar... Muito menos gostaria de me ver assim... Era pra eu embarcar junto naquele avião, e não fui. Tive uma segunda chance, a vida me deu uma segunda chance, me deu uma chance de começar de novo, mas antes me destruiu junto, sinto que morri junto com aquele acidente, uma parte de mim, um grande pedaço do que eu sou se desfez. Sei que é mais do que minha obrigação viver a vida cada segundo dela novamente. Só não é tão fácil sem Talia por aqui. Sua alegria era contagiante, ela trazia cor ao meu mundo, ela dava um sentido a minha vida. Tudo era motivo para comemoração, e com a sua partida tudo foi ficando cinza, tudo perdeu o sentido... Inclusive a minha vida... Continuo dirigindo ainda sem rumo... Se eu olhar para o lado ainda consigo ver o vento brincando com seus cabelos ruivos, vejo seu sorriso apaixonado me olhando fazendo meu coração transbordar de amor. Em um momento de loucura, sinto o seu perfume inebriando o interior do carro. Ouço sua voz, cantarolando baixinho suas canções preferidas. E então ela está aqui ao meu lado, comigo, segura. Viva, radiante como sempre foi.

-Eu te amo Tomas... – Ela diz sorrindo sendo impossível não sorrir também. –É uma menina, eu sinto que é uma menina... – Ela diz enquanto acaricia a barriga que começa a aparecer. – Quero que ela se chame Helena, e se for menino, quero que você escolha o nome. Mas pensei em alguns também... Gosto de Levi... – Ela diz enquanto carinhosamente segura em minha mão colocando junto da sua em sua barriga. Eu me aproximo para tocar de leve seu rosto, e para minha decepção ela desaparece com os olhos cheios de lágrimas. Tento voltar à atenção para a estrada quando algumas buzinas me assustam, tento frear o carro, mas o mesmo está sem controle algum. E quando eu consigo parar o mesmo, uma batida é inevitável... Aperto o volante com força que até sinto minhas mãos formigarem, algumas pessoas se aproximam e tudo acontece muito rapidamente. Sinto-me totalmente imóvel... Vejo que um rapaz se ajoelha ao chão chorando muito, e só então noto que eu atropelei alguém... Em estado de choque desço do carro, e então vejo seu corpo projetado ao chão. Seus cabelos pretos chamam atenção assim como seus olhos que por um segundo se encontram com os meus fazendo com que meu coração acelere em meu peito... Um rapaz a segura chorando muito, gritando ao seu lado tentando acordá-la... Um senhor pede para que eu encoste no carro, pois estou machucado, mas não sinto nada, tudo parece ser uma miragem, minha visão está completamente embaçada e tudo começa a ficar escuro, a única coisa que fica em minha mente é um par de olhos verdes expressivos e assustados, e um chamado de dor.

-Lola, por favor, fique comigo, Lola, por favor! Você não pode me deixar meu amor!