[décimo oitavo]
Boa leitura!
•°[🌼]
《 𝒅𝒐𝒎 𝒔𝒆𝒈 𝒕𝒆𝒓 𝒒𝒖𝒂 𝒒𝒖𝒊 𝒔𝒆𝒙 𝒔𝒂𝒃 》
27/04/2019
27 de novembro de 2016
Jungkookie :)
|obrigado tae
[às 14:23]
kookie?|
[visualizada às 14:24]
Três anos depois...
Taehyung havia acabado de chegar de sua caminhada naquela manhã ensolarada de sábado, o verão estava batendo à porta e prometia ser quente esse ano, estava ansioso pelas férias. Tirou as roupas suadas de academia e tomou um banho frio, estranhando o total silêncio daquela casa, mas não se preocupou muito com isso, era capaz de seu namorado ainda estar dormindo; e ele tinha razão. Jungkook ainda enrolava para se levantar da cama de casal, visto que dormira bem tarde no dia anterior por conta de um trabalho da faculdade, suas energias estavam quase esgotadas, mas havia quem poderia animá-lo a mais um longo dia de tarefas. E bem, era um dia especial para ele, então teria que se levantar de qualquer forma.
Quando terminou de arrumar os cabelos, Kim deixou o banheiro e, escorado no batente da porta do quarto, observou a manha e preguiça do namorado com um sincero sorriso, seu Jungkook era adorável. Ficava até com pena de fazê-lo acordar, mas já se passavam das nove horas, e a rotina deles não permitia tanta regalia. Estavam crescendo e as responsabilidades chegavam cada vez mais emboladas com o tempo, sabia que Jeon estava cansado pois ele mesmo estava também, mas precisavam seguir em frente. Andou em passos silenciosos e, depois de vestir algo mais confortável, deitou-se ao lado de seu primeiro amor, se segurando para não se acomodar com ele e voltar a dormir – era bem preguiçoso, e a corrida havia esgotado um pouco das energias de seus músculos – ou beijar rapidamente a boca que tinha um biquinho adorável, sabia que ele não gostava disso.
— Kookie... Já passou da hora. Levante. — sussurrou, abraçando o namorado por cima e deixando um beijinho em sua bochecha amassada. — Vou preparar nosso café da manhã.
— Eu não... Hm... Não quero sair daqui, 'tá confortável... — Taehyung estava a ponto de deixá-lo ali, mas não podia dar o braço a torcer, não podia ceder às manhas do garoto.
— Eu sei, amor. Mas não podemos nos acostumar a dormir até tarde, você vai ter tempo quando as férias chegarem. — Taehyung se levantou e puxou a coberta ouvindo os resmungos irritados do outro, que sentou-se na cama, coçando os olhos. — Vamos logo! Estarei te esperando na cozinha. — deixou um beijo na testa de Jeon antes de sair do quarto para fazer o que precisava.
Jungkook terminou de se alongar e pegar uma toalha limpa, indo em direção ao banheiro. Teria um dia cheio, então precisava de um banho bem relaxante para tirar um pouco a tensão de final de semestre de suas costas. Estava sendo difícil conciliar todas aquelas matérias que pareciam se acumular cada vez mais, mas não poderia reclamar porque mesmo com todos os empecilhos, amava seu curso, estudar a psicologia era uma descoberta incrível de um mundo completamente diferente e complexo, um mundo que o dava ainda mais vontade de investigar e entender. Oh, ele queria tanto... Queria entender e ajudar outros jovens que também tem suas confusões emaranhadas em fios impossíveis de desconectar, outros jovens sem esperança de um futuro, sem uma luz para ter como guia. Jungkook sabia, sentia, há três anos ele talvez não tivesse esperança também, mas tivera outra chance de decidir por isso, tivera alguém que desse o primeiro passo por ele, para que então prosseguisse em sua caminhada sozinho. Pois sim, essa é uma luta que precisamos nos armar e amar, pois nós somos nossa própria linha de defesa e ataque. Nós somos o nosso próprio destino.
Assim que terminou seu curto e morno banho, vestiu uma bermuda e blusa comuns, fazendo uma nota mental de que precisava pôr as roupas da semana que se passou para lavar ainda naquele dia. Aproveitou a lembrança para já colocar suas peças no cesto, e enquanto fazia isso encontrou algumas roupas de Taehyung, que estavam jogadas de qualquer jeito por cima da mesinha de estudos. Ah, outra vez. Ele não tinha jeito mesmo. Recolheu-as e andou em passos moderados primeiro até a lavanderia e depois até a cozinha, sentindo o cheiro maravilhoso do café da manhã de Taehyung, nunca iria deixar de babar pelos dotes culinários dele. Mas agora sua missão era outra.
— Bom dia, Kookie. — Taehyung sorriu ouvindo os passos ecoando pela casa e se aproximando dele. Deixou os dois sanduíches naturais e o café que fazia, e virou-se esperando receber finalmente seu beijinho, mas em vez disso Jungkook empurrou uma pilha de roupas contra ele. — Ai!
— Vai pôr na máquina, seu bagunceiro. — riu, vendo o rostinho fofo do namorado ficar emburrado. — E bom dia também, amor.
O Kim resmungou, mas fez o que Jeon ordenou, afinal, era mesmo bagunceiro e vez ou outra tinha alguma roupa sua espalhada pela casa. Era uma péssima mania que estava sendo difícil abandonar, mas eram pacientes. Tão logo assim que colocou suas roupas sujas na máquina, Jungkook se aproximou dele ainda dentro da área de serviço e o abraçou por trás, encaixando seu maxilar no vão entre o pescoço e o ombro do Kim, sentindo o cheirinho de sabonete de lavanda que gostava tanto e os pelos daquela área se arrepiando quando sua respiração quente o alcançava. Deixou um beijinho na pele alva e ouviu um suspiro derretido de amor, acabou sorrindo. Amava ver seu namorado tão entregue, tão receptível, Taehyung não escondia o quanto gostava de sentir os carinhos de Jungkook e este sempre fazia questão de mostrar seu lado mais carinhoso com ele. Como quebra-cabeças, talvez Jungkook fosse a peça que faltava.
Depois de um tempinho aconchegados naquela posição, Taehyung virou-se de frente para, pela primeira vez de verdade naquela manhã, aproveitar da companhia do namorado. Tocou seu rosto de leve com ambas as mãos, apreciando as bochechas fofinhas as quais nutria uma vontade secreta de apertar e morder e os olhos que transmitiam tanta paz, finalmente paz. Sentia que seu Jeon poderia ser feliz ao seu lado, ainda que muitas cicatrizes não estivessem totalmente curadas, não iria medir esforços para que ele ficasse bem, independente de estar ao seu lado ou não. Da face, os dígitos de Taehyung desceram pela pele de seu namorado, explorando toques em seu pescoço e braços descobertos, até que as mãos grandes e cálidas parassem em sua cintura encaixando-se perfeitamente, fazendo carinho com os polegares enquanto sorriam cúmplices com suas testas coladas e respirações tranquilas, era uma conexão tão irreal, como barquinho e água, uma remada por vez e novos mundos a descobrir. Ah, como era apaixonado... E só teve mais certeza disso depois de findarem seus espaços e transformarem-se em quase um só. Com calma, exploravam suas estrelas a partir de algo tão simplório como um beijo.
Para Taehyung, a atitude de Jeon em unir seus lábios era de longe uma das mais incríveis que conseguia pensar, pois uau, seu beijo era avassalador, e não apenas pela união carnal, mas sim por tirar-lhe totalmente dos eixos, de inundar sua alma com inúmeros sentimentos bons e puros. Jungkook achava a mesma coisa dos beijos do Kim: expandiam suas órbitas. O toque de línguas, o calor dos corpos, as respirações, os sentimentos, a cumplicidade, o amor... Não conseguia descrever a onda de euforia que o invadia, só sabia sentir, só poderia ser. O ser, o existir, o amar.
— Dormiu bem, Kookie? — Jungkook recebeu a pergunta ainda de olhos fechados, abraçados, notando apenas pela voz que Taehyung se encontrava sorrindo. Bem, ele havia finalmente ganhado seu beijinho de "bom dia".
— Uhum... — murmurou, um pouco preguiçoso e querendo se sentir mais perto do namorado, entrelaçou seus braços e mergulhou em seu peito, ouvindo as batidas ritmadas de seu coração. — Me sinto melhor.
— Você sabe que dia é hoje, não sabe?
— Sei sim. — respondeu, soltando o ar de seus pulmões, um pouco... preocupado. Bem, seria uma missão difícil a que tinha para aquele dia, mas não queria desistir. Era algo que o consumia desde, bem... Não queria se lembrar de suas cicatrizes agora, teria tempo para isso mais tarde e sofrer em antecipação era uma das coisas que havia aprendido a tirar de seus hábitos. Porém, as vezes era complicado não sentir, porque querendo ou não, aquele Jeonzinho ainda residia em si como raízes e ele tinha medo. Não queria ter medo. — Tae, você... Não precisa ir se não quiser, sabe?
O comentário deixou Taehyung em alerta. Sabia que algo incomodava seu namorado, era só ver em seus olhos inquietos e em seus braços o segurando mais forte, como se pudesse fugir. Ah, Jeon se sentia vulnerável... Kim sabia que ele precisaria de muito apoio, ainda que falsamente quisesse passar a impressão de estar bem e confiante, Jungkook era um baita orgulhoso quando se tratava de demonstrar que tinha medo ou que não conseguia sozinho, mas de qualquer forma Taehyung sentia quando Jeon precisava dele. Queria muito estar junto a ele em um momento como esse, entretanto respeitaria se Jungkook quisesse ir sozinho até o cemitério.
— Você quer que eu fique em casa? — perguntou, vendo os olhinhos de jabuticaba se arregalando um pouco.
— Não é isso, é que...
— Está com medo? — Jungkook pensou um pouco antes de responder àquela pergunta, ainda que Taehyung não estivesse realmente esperando por uma resposta, pois no fundo já sabia. Não adiantaria mentir, estava estampada em seu rosto a verdade.
— Sim. — falou, finalmente. Parou de abraçar o Kim para manter melhor o contato visual, já que era um assunto sério e queria toda a sua atenção. — Eu não volto lá há três anos, não sei como meu psicológico vai ficar depois de tanto tempo, você sabe o que o terapeuta falou sobre enfrentar meus traumas. Não quero que se preocupe comigo caso eu comece a chorar ou não consiga entrar lá, eu preciso lidar sozinho com minhas confusões senão nunca vou fazer por mim mesmo.
— Eu vou me preocupar de qualquer forma, mas antes disso, eu vou procurar te entender e respeitar seu espaço, amor. É um passo de cada vez, se tem confiança, ande mais um pouco, se não a tem, monte uma cabaninha e acampe por um tempinho antes de continuar. — Taehyung deu um beijinho no nariz de Jungkook e ele sorriu, amava aquelas comparações porque faziam seu coração ficar quentinho mesmo que fossem coisas simples. Taetae conseguia acalmá-lo com muita facilidade. — Eu vou estar com você em todas essas caminhadas, Kookie, desde as tranquilas até as mais difíceis, não importa a montanha que venha pela frente. — Jungkook não conseguia desviar do olhar sereno do namorado, ele brilhava tanto, tão lindo, seus olhos eram sua constelação particular e nunca se cansaria de observá-la. — Se você quer ir sozinho tudo bem, contanto que se sinta confortável, eu fico bem também, uh?
— Eu quero você comigo. — decidiu rápido, tirando uma risadinha do Kim que voltou a tomá-lo nos braços, andando lentamente até a cozinha. — O carro está abastecido?
— Uhum. Jungoo... — chamou, atraindo os olhinhos curiosos do namorado em direção aos seus. — Me ajuda com a minha roupa depois?
— Você me pedindo ajuda com roupa? O que deu em você? — a pergunta em entonação de desconfiança fez Taehyung corar um pouco enquanto colocava os alimentos prontos sobre a mesa. Era desconcertante quando Jungkook era questionador, pois seus olhos se estreitavam e parecia que sua voz ficava mais grave como, se ele estivesse sério, mas gostava. Nada escapava daqueles olhos atentos.
— É que eu quero causar uma boa impressão. — justificou, mas Jungkook não estava muito convencido. Pôs ambas as mãos apoiando o queixo enquanto observava o namorado sentar-se também, todo vermelhinho.
— Minha família já te conhece, Taehyung. Eles já viram seu estilo de se vestir.
— Mas sua irmã não. Eu quero ficar bonito e apresentável pra ela não me achar estranho ou maluco, ainda que eu não seja lá muito normal. — Taehyung terminou sua breve explicação mordendo um pedaço de seu sanduíche e Jungkook o encarou, desacreditado. — O que foi? Eu quero conversar com ela. — falou, ainda com as bochechas cheinhas.
— Conversar? Com Syuwon?
— É, como você fazia com suas cartas. Quero que ela me conheça, não podemos namorar sem a aprovação dela. — Jeon sorriu, as vezes o coração puro de Taehyung conseguia o surpreender. Era como conversar com uma criança, sempre sincera e inocente. Admirava essa personalidade dele, que não tinha medo de dizer verdadeiramente o que sentia ou pensava, independente dos julgamentos ou de parecer infantil. Ah, tantas peças nesse quebra-cabeças que formavam-no no homem que via em sua frente, o homem pelo qual se apaixonava umas cinquenta vezes por dia, no mínimo. — Você devia tentar também, ela deve estar com saudades.
— Eu vou tentar.
— Tudo bem. — Taehyung sorriu também ao ouvi-lo prometer. — Agora vamos comer antes que o café esfrie, mocinho.
[...]
Taehyung estacionou o carro com calma, passando seus olhos curiosos pelo local antes de retirar o cinto de segurança e sair do veículo. Jungkook fez o mesmo, respirando fundo e encarando seus longos dedos ossudos. Há quanto tempo não pisava naquele lugar, as lembranças remotas vinham fortes em suas memórias, mas nem todas eram boas. Bem, depois de sua recuperação da intoxicação naquela fatídica tarde, passou muito tempo se culpando por todos aqueles acontecimentos, a ponto de em um acesso de raiva, simplesmente afirmar que nunca mais queria visitar sua irmã, ainda que não fosse culpa dela. Sentia que enquanto escrevesse para ela continuaria vulnerável, nunca conseguiria se levantar das sombras do passado, até porque, ela não estava mais ali para escutá-lo (ou lê-lo), então não fazia sentido fingir que seu fantasma o compreendesse. Jeon Syuwon não existia mais, precisava entender e amadurecer essa concepção, no desespero, desejou nunca ter escrito uma única carta.
Mas o tempo e os tratamentos certos lhe mostrariam que nem tudo nessa concepção estava correto. Apesar dos pesares sentia falta de ter sua irmã, ainda que não em corpo, como sua confidente fiel como sempre foi. Aos poucos, sua mente que havia se fechado para tantas coisas com o intuito de bloquear a dor logo se abriria novamente a entender a si mesmo, seus sentimentos, suas manias, vontades, vocações, seu eu por inteiro. Entenderia seu jeito de amar. Pois sim, suas palavras escritas em papel de caderno era sua forma de demonstrar amor, de mostrar que a amava da forma mais pura que pudesse pensar. Arrependia-se tanto por ter se afastado, que sentia até vergonha de agora pisar naquele lugar depois de tudo, mas, durante o tratamento, não tinha coragem de enfrentar algo que sem querer o machucou, precisava de tempo para acalmar seu coração. Sim, achava que sua irmã merecia um irmão melhor.
— Eles já estão aqui. — Taehyung quebrou o silêncio, constatando o carro da família Jeon estacionado há alguns metros deles. Percebia que seu namorado estava inquieto e pensou que talvez ele não estivesse pronto ainda, entenderia se ele quisesse voltar pra casa. — Jungoo... Você tem certeza de que pode e quer fazer isso? — perguntou, tendo os olhos deste nos seus de verdade. Jungkook estava com medo.
— Eu preciso. — sua resposta não era tão segura, mas ele já havia chegado até ali, então não queria voltar. Precisava reviver pesadelos se quisesse seguir em frente, sem mais dores. — Me dá a mão, Taetae?
O Kim não tardou a enlaçar seus longos dedos aos de Jungkook, tendo o cuidado de acariciá-los em uma tentativa de confortá-lo. Sabia que era difícil pra ele, então todos os mínimos detalhes e ações poderiam ajudar Jeon a se sentir seguro, faria tudo o que estivesse a seu alcance para que ele se sentisse bem.
Jungkook foi quem deu o primeiro passo para dentro do local, em vista de que essa atitude deveria partir exclusivamente dele. Taehyung apertou sua mão e seguiu o caminho ao seu lado, vez ou outra chutando alguma pedrinha, observando as datas e nomes nas lápides cinzas, e conferindo se Jeon estava bem. Seu menino era silencioso por natureza, mas queria tanto que ele falasse ou demonstrasse alguma reação durante aquela caminhada que parecia não ter fim... Porém sabia que não aconteceria. Jungkook estava imerso em pensamentos, a cada passada cenas se passavam por seus olhos, cenas felizes, cenas tristes, lembranças que o tempo havia feito ele esquecer e que agora pareciam vivas em sua frente, como se pudesse tocá-las.
Era realmente estranho para o Jungkook do presente estar no corpo daquele garotinho franzino e confuso do passado, com o coração vazio por ter perdido alguém que amava, com medo de perder sua família também, por medo de se perder. Ele não era o único de coração vazio, mas as dores pareciam ter ele em seu foco. Ver sua família que tanto amava desmoronar aos poucos sob seus olhos e não poder fazer nada era angustiante, ver eles sofrendo, voltando aos erros do passado, se machucando, machucava seu coração. E quando pensou que tinha esperança de que tudo poderia melhorar... Fora sem querer o responsável por decepcioná-los também. Entretanto não era sua culpa, nem deles, nem de Taehyung. Sua família não pôde compreendê-lo naquele momento por estar abalada, como ele também estava por descobrir seu amor pelo mesmo gênero. Nenhum deles estavam preparados, o que gerou ainda mais tormentos; sua família não via como ele sofria pela sua rejeição e Jungkook não via como eles estavam perdidos por não saberem como agir, porque queriam que os filhos fossem felizes mas não percebiam que suas tentativas de lhes mostrar a felicidade trancafiavam ainda mais seus corações. Oh, mesmo tão vividos conheciam tão pouco da vida, mesmo morando juntos conheciam tão pouco de seus filhos... A falta de diálogo e observação quase pôs tudo a perder, por pouco não velariam outro de seu sangue naquela tarde fria por não tomarem cuidado com suas palavras. As palavras... Elas têm mais poder do que se imagina.
O Jeon mais novo de repente estancou seus passos, atraindo a atenção de Taehyung que estava distraído demais com o céu limpo e os passarinhos voando, porém assim que este olhou para a mesma direção que o namorado, entendeu sua súbita parada. Há poucos metros, o restante da família Jeon estavam reunidos em frente à uma lápide, com um buquê de lírios. Então ali estava, Jeon Syuwon, filha do meio, morta aos dezenove anos por um atropelamento. Jeon Syuwon, única filha mulher da família, espontânea, briguenta, divertida e comunicativa, porto seguro de Jeon Jungkook, seu irmão mais novo.
Taehyung sentiu um aperto maior em sua mão, e ao olhar novamente para Jungkook, percebeu que ele prendia o choro da melhor forma que podia e conseguia. Quebrava seu coração ver aquelas gotinhas intrusas de água salgada escorrendo pelas bochechinhas de seu namorado, sabia que estava doendo muito e ele sentia também, mas precisava ser forte por seu Jungoo. Precisava ser seu porto seguro agora.
— Ei, Kookie... Eu estou aqui... — Tae levou as mãos entrelaçadas até bem perto dos lábios, deixando um selar nas costas da mão dele, e sorrindo em conforto em seguida. Com a mão livre, limpou algumas das lágrimas que insistiam em continuar marcando sua trilha pelo rostinho imaculado. — Você consegue, Jungoo, eu confio em você, eu acredito em você. — essas palavras foram o suficiente para Jungkook liberar todo o medo e dor que sentia de seu peito, chorando copiosamente abraçado e apertado ao Kim, deixando que suas lágrimas molhassem a camisa monocromática sem receio.
O som dos soluços de Jungkook chamaram a atenção dos outros presentes que até o momento não haviam percebido a chegada do casal; senhora Jeon imediatamente correu até seu filho quando viu que ele estava ali, desabando por completo. O coração da mulher se apertou ao ver seu pequeno, ele havia sido tão forte de ter ido até ali depois de tudo, enfrentando seus fantasmas mais profundos por eles, por sua família. Sentia tanto orgulho da força de seu menino...
Ao ver que a mulher se aproximava, Taehyung cutucou o ombro do namorado com carinho, esperando que este percebesse a presença dela e pudessem compartilhar desse momento. Ainda um pouco contrariado e claramente com vergonha, Jungkook soltou-o, mas, vendo sua mãe de braços estendidos em sua direção e também com lágrimas nos olhos, não hesitou e tomá-la em um abraço cheio de saudade e tristeza. Oh, eram tantas as sensações... Compartilhavam seus sentimentos, mágoas e lágrimas, mas também seu carinho, conforto e superações. Todos naquela familia possuíam uma cicatriz, e todos haviam de se curar.
Assim que deram por terminado o momento, Jeon Jiwon separou seu abraço do filho, se recompondo e ajudando-o a fazer o mesmo. Ambos sorriam envergonhados por estarem chorando como crianças e chamando tanta atenção, ainda que só estivessem eles ali.
— Estou muito feliz em te ver, filho... — a mulher sorriu e se apoiou na pontinha dos pés deixando um beijo na bochecha direita do filho. Tinha a impressão de que ele havia crescido mais nos últimos meses, mesmo que já estivesse com quase dezenove anos. — Oi Taehyung. — Jiwon se aproximou dele, abraçando-o carinhosamente. O Kim retribuiu o gesto, beijando o topo da cabeça dela.
— Olá Jiwon. — cumprimentou-a, logo depois direcionando seu olhar aos outros dois que vinham até ele em passos lentos. — Olá Leehyun e Junghyun hyungs. Espero não estar atrapalhando.
— Não está, Kim, pode ficar tranquilo. — O pai de Jungkook tranquilizou-o, sorrindo pequeno. — Ficamos felizes que tenham vindo.
— Saeng... — Jungkook ouviu baixa a voz de seu irmão, chamando-o. Não precisaram de mais palavras para os dois irmãos se abraçarem também, depois o pai e novamente a mãe, unidos. Em meio à toda aquela demonstração, Jungkook levantou os olhos, chamando também a Taehyung com o olhar e lábios mudos, este que prontamente se juntou ao coletivo, acolhido por aquela família que era sua também, agora. Havia demorado bastante tempo para que fosse aceito, mas agora parecia que nascera junto a eles, tamanho o carinho que nutria por aquela família. Erros estavam no passado e apenas lá ficariam.
Encerraram aquele momento com uma sensação de liberdade maior, de submersão, de tranquilidade, entre sorrisos tímidos e poucas lágrimas teimosas. Era como afirmar que nada iria impedi-los de tentarem alcançar a pequena e doce felicidade, mesmo distante, mesmo sofrida. O destino havia tirado alguém muito importante, sim, mas havia os aproximado mais, mostrado os vários lados da vida e lhes dado uma oportunidade de viverem mais e sem medo do que o universo reservasse. Haviam voltado a serem uma família, com seus defeitos, falhas, e com seu amor.
Após Junghyun pirraguear levemente, ele direcionou seu olhar para a esposa e ela entendeu o que deveria fazer. Jiwon pegou as delicadas flores das mãos de seu marido e pediu para que seu caçula depositasse os lírios no túmulo de Syuwon, como forma de encorajá-lo. Jungkook hesitou, mas tomou o buquê em mãos e dirigiu-se até o local, observando cada pequeno detalhe esculpido, os anjinhos tocando trombetas, as estrelinhas, as datas de nascimento e falecimento, o nome de Syuwon em bela caligrafia, a foto de seu último aniversário e a frase que dizia: "a metamorfose é necessária para que as borboletas um dia possam conhecer os céus". Talvez nunca tivesse realmente se atentado a essas palavras, mas agora elas dançavam sob seus olhos, indicando o caminho que deveria seguir, mostrando que todo esse tempo foi necessário para que se transformasse, para que deixasse o casulo e pudesse voar, para que pudesse encontrá-la. Talvez todo esse tempo Syuwon fosse apenas uma borboleta esperando pelo seu momento de alcançar os céus. Sorriu, permitindo que mais algumas lágrimas caíssem em sinal de entendimento, em sinal de amor. Amava-a, tanto, ela havia cuidado de si todo esse tempo, era grato. Deixou as flores no vaso que estava ali, vendo de relance alguns dos envelopes que escondia nos vãos entre as pedras, desgastados pela umidade e tempo, e novamente sorriu em nostalgia, sibilando um "obrigado" vindo do fundo de seu coração em seguida.
O Jeon mais novo saiu de seu transe quando sentiu ambas as mãos vazias serem entrelaçadas, e ao olhar para os lados, viu que eram sua mãe e seu namorado a tomarem-nas, e seu pai e irmão fazerem o mesmo, iniciando uma corrente de oração silenciosa.
Taehyung sorriu pequeno, observando de fininho os lábios do namorado que se moviam em palavras tenras para a alma de sua Syu. Ele estava aparentemente mais calmo, parecia perdido, mas não mais tão incomodado. Ainda estava, porém não com os presentes ali, mas com o ambiente a qual o trazia lembranças de uma fase complicada. Ele se preocupava, de qualquer maneira. Sentia como as mãos dele tremiam e ainda que não estivesse tão perto, sabia que a cada palavra proferida ele respirava mais fundo, como se temesse imergir por completo. Taehyung queria ajudá-lo de algum jeito, mas não iria interferir sem o consentimento dele. Não poderia fazer tudo por Jungkook, ainda que essa fosse sua vontade, afinal. Ele parecia bem, ele parecia finalmente em paz. Seu Jeon iria se curar.
A família se despediu alguns minutos mais tarde, com promessas de que queriam visitá-los quando chegassem as férias e que eles deveriam fazer o mesmo já que era quase impossíveis de se verem durante o período de aulas. Era difícil manterem contato quando todos andavam tão ocupados, mas fariam de tudo para passarem um tempo juntos assim que possível. Jiwon encheu seu pequeno de beijos e Leehyun combinou de estrear um jogo novo com seu cunhado, que adorava video-games e jogava com Jungkook sempre que tinham um tempo. Junghyun sugeriu que todos fossem para o litoral e ficaram de acertar os detalhes da viagem em um momento mais tranquilo. Jungkook e Taehyung observaram os três voltarem juntos pelo mesmo caminho que fizeram anteriormente até que estivessem ali, aproveitando um pouco a brisa leve que balançavam suas roupas e refrescavam a tarde quente. O Kim abraçava seu namorado de lado, enquanto ele mantinha a cabeça deitada em seu ombro, vendo sua família partir. Nenhum dos dois se moveram por um tempo, estavam apenas sentindo suas respirações e refletindo sobre nada em específico.
— Está tudo bem, amor? — Taehyung quebrou o silêncio, não realmente preocupado, pois sentia pela respiração de Jeon que ele estava bem, mas sim porque era imperativo demais e tinha dificuldade de ficar em silêncio. Jungkook sorriu, ainda sem coragem de olhar em seus olhos, e fez que sim. — Você não quer ir embora, quer?
— N-não. — respondeu, fechando os olhos e aspirando um pouquinho mais o perfume gostoso que o lembrava de casa. — Podemos ficar mais um pouco, amor? Eu... Eu acho que estava com saudades dela.
Taehyung beijou os cabelinhos castanho escuros, feliz pela resposta.
— Claro que podemos. — sorriu, e então uma lembrança recente cruzou seus pensamentos como um raio. — Ei, acabei de me lembrar... O que acha de fazer o que conversamos em casa?
— Sobre conversar com ela? — Jeon questionou, ainda incerto, recebendo um aceno positivo em resposta. — Eu não sei...
— É fácil, quer que eu demonstre? Olha. — antes que Jungkook pudesse responder que não, por talvez achar a ideia absurda demais para alguém da idade deles, Taehyung soltou-o e andou até a lápide, sentando-se no chão e olhando diretamente para o que seria a irmã de seu amor. — Olá Syuwon... Eu não me apresentei antes, mas eu sou o Taehyung. — o pequeno Kim balançou as mãozinhas em um cumprimento desajeitado e Jungkook faltou se derreter com toda aquela fofura. Seu Taehyung tinha somente estatura de adulto, pois por dentro habitava uma criança de cinco anos. — Kookie me falou muito de você, ele disse que você foi alguém muito importante pra ele. Queria ter te conhecido em outras circunstâncias, mas fico feliz por estar cuidando de nós. Espero que não sinta muito ciúmes dele por minha causa.
— Eu tenho certeza que ela sente... — Taehyung quase gritou pelo leve susto ao ouvir a voz de seu namorado tão perto e ver que ele agora sentava-se ao seu lado, Jungkook era mesmo muito silencioso e por vezes acabava surpreendendo o Kim. — É capaz de puxar seu pé de noite.
— Que ela não te ouça, viu? — brincou, mas havia certa insegurança em suas palavras. Melhor não arriscar, não é? — Por favor, cunhada, não escuta ele. — sussurrou, aproximando-se um pouco mais de Syuwon. Jungkook riu quando percebeu que Tae levava o que disse ao pé da letra.
— Ela não está nos escutando, bobinho. Não se preocupe, ela não vai puxar seu pé, e se puxar, eu brigo com ela.
— Se você me garante...
Jungkook apenas sorriu vendo a expressão mais relaxada de Taehyung e abraçou o namorado, fazendo com que ele deitasse tranquilamente em seu ombro, ainda sentados na companhia da irmãzinha do Jeon. O mais novo se sentia mais confiante e mais leve agora, sentia-se em paz, algo que há tempos não se lembrava de sentir. Era especial. Era diferente. A dor ainda estava ali, cutucando seus espinhos, mas sabia que deles surgiria uma bela rosa, que precisaria de muito cuidado e carinho, pois ainda era frágil. Jungkook admitia que ainda era frágil, um trauma não se desfaz de uma hora pra outra, entretanto estar ali, anteriormente na companhia de sua família e agora sozinho com Taehyung – que também era sua família – fazia-o se sentir mais forte, pois poderia contar com eles caso precisasse. Estava aprendendo que não poderia suportar tudo sozinho, grandes heróis também sentem dor, medo e caem as vezes, por isso eles contam com seus parceiros que os ajudam nos momentos difíceis. O Capitão América precisa do Homem de Ferro, e claro, o Homem de Ferro precisa do Capitão América, e seu colar estava sempre junto a ele para sempre lembrá-lo onde residia seu Capitão.
Jungkook acabou perdendo seu olhar no homem que agora rodeava sua cintura com seus braços, aconchegando-se em seu coração, de olhos ainda fechados e respiração serena, poderia até dizer que seus lábios prendiam um sorriso pela forma que estavam unidos. Ah, Taehyung era tão... Ele. Não havia algo a quem ser comparado pois nada se comparava a sua singularidade. Ele era diferente de tudo que algum dia conheceu, de tudo que poderia conhecer, de tudo que poderia não conhecer. Era uma jóia rara, ou como gostava de pensar as vezes, uma estrela que apenas ele poderia ver. Isso fê-lo lembrar da noite em que dormiram juntos pela primeira vez, debaixo daquele céu estrelado e lindo. Fora naquele dia que descobriu mais do que sua imensidão, mas descobriu a si próprio, descobriu os seus tão confusos sentimentos pelo seu garoto quebra-cabeças, descobriu que seus toques por mais singelos que fossem poderiam levá-lo aos céus e mostrá-lo toda a beleza escondida por entre as nuvens até além da estratosfera, além do seu universo. É tão perfeito como em vez de completarem um ao outro, eles multiplicavam-se em constelações únicas, cada uma com sua particularidade e emoção, porém ambas interagindo entre si, seja por sua poeira, por seu brilho, por seus alienígenas que habitavam em seus planetinhas ou os asteróides que as vezes escapavam de suas órbitas e colidiam-se, formando os mais lindos desenhos no vácuo do universo.
— Tae... O que acha de tentarmos recuperar seu telescópio? — Jeon perguntou de súbito e Taehyung abriu os olhos, um pouco surpreso por seu namorado ainda se lembrar do objeto que estava esquecido na casa de seus pais. Jungkook não sabia se estava fazendo o certo, mas não queria pensar, ele apenas deixou seu coração falar em voz alta. Talvez estivesse pronto para esse passo também. — Estou com saudades de ver nossas estrelas... Quem sabe eu possa ver a Syu de novo?
— Eu gosto da ideia. Vamos amanhã na casa dos meus pais para buscá-lo e então eu levo no conserto segunda-feira, pode ser? — Jungkook confirmou, deixando um sorriso mínimo escapar e então aquecendo o coração do Kim, que continuou: — Preciso ver se meu cartão ainda tá nos conformes também, tô achando que já passei do limite...
— Ninguém mandou você comprar aquele fone gamer que acende quando o seu outro ainda está em ótimo estado. — o Jeon cutucou a falta de controle do namorado e Taehyung arregalou seus olhinhos pidões, indignado com a falta de sensibilidade do seu Jungkookie. Poxa, eram mais que fones de ouvido, eram seu mais novo xodó.
— Mas ele fica trocando as cores, é a coisa mais linda quando fica roxinho... — argumentou, ao que o Jeon somente respirou contrariado. Seu namorado precisava parar de comprar coisas sem real necessidade. — Valeu a pena cada centavo.
— Cada centavo absurdamente caro. E eu nem pude ficar com o fone antigo. — reclamou, fechando os lábios em um bico teimoso e afastando as mãos do namorado, que ficou todo perdido. Não que Taehyung não soubesse lidar com um Jungkook "bravo", mas realmente não esperava aquela reação naquela hora da tarde. Sem contar que seu Jeonzinho ficava duzentos porcento mais fofo desse jeito, tentando se fazer de durão. Precisava se controlar para não apertá-lo de tanto amor e acabar levando um chute.
— Kookie... — manhou, tentando chamar a atenção e desfazer a carranca do garoto, mas não adiantou muito, ele continuava de braços cruzados e se esquivando de seus toques, por menores que fossem. — Jungkookie... Não faz isso, eu dou o fone antigo pra você, se você quiser.
— Não, não adianta tentar me convencer agora. É inadmissível, Kim Taehyung! Estou magoadinho. — reclamou mais uma vez e sentou-se mais afastado, com o rosto virado para o outro lado em protesto. Taehyung então resolveu mudar de tática, apelando para sua grande arma secreta: seus beijinhos melados, aos quais Jungkook não sabia se amava ou odiava. Se aproximou quase que sorrateiramente dele e o abraçou bem apertado para que não escapasse, e aproveitando que não havia mais ninguém ali, começou a distribuir selares por todo o rostinho branquinho que se contraía em caretas de nojinho e risadas pelas cócegas involuntárias. — P-para! Tae! E-eu não quer-ro falar com você, sai!
Taehyung não cessou o ataque, até porque, sabia que era fingimento e que Jeon só queria chamar sua atenção por causa do bendito fone de ouvido novo que nem mesmo ele sabia exatamente o porquê de ter comprado, talvez ele realmente precisasse de mais controle na hora de adquirir produtos, essa mania casava com sua falta de organização, mas que bom que tinha Jungkook para puxar suas orelhas quando passasse dos limites, que bom que tinha Jungkook para ensiná-lo e fazê-lo se entender e descobrir. Era tão... Diferente ter ele perto de si, receber seu amor, sua atenção, seu carinho, era diferente que seu coração disparasse com apenas um olhar deste, com apenas um sorriso. Taehyung se sentia o cara mais sortudo do sistema solar durante toda a existência, pois em todos os momentos da história em que ele poderia viver, ele vivia ao mesmo tempo que Jeon Jungkook, isso era suficiente para que fosse feliz. Descobriu ao lado dele todos os sentimentos bons que possuía e que compunham sua alma, e que fariam parte de si para sempre. Era grato por ser com ele, por ser ele, por ser Jungkook, ali, sorrindo alto como uma criança. A risada dele o fazia sorrir também, como se todos os problemas evaporassem, como receber um abraço de reencontro, como estar em um jardim de fadas, transportava-o para outra dimensão. Se pudesse ouvir um som antes de morrer, com certeza seriam as gargalhadas gostosas que ouvia agora quando suas mãos tocavam em partes sensíveis do corpo do namorado, principalmente sua barriguinha. E, ah, aqueles olhos... Nem mesmo as estrelas mais belas se comparavam aos olhos de seu Jungkookie, elas não chegavam nem sequer aos pés dele...
Entre gargalhadas e reclamações, os dois acabaram caindo um ao lado do outro (quase abraçados, diga-se de passagem), deitando suas costas sob o chão de pedra sem se importarem que talvez fosse anti-higiênico ou desrespeitoso se alguém passasse por ali. No fundo, ainda eram dois adolescentes inconsequentes que tinham toda uma vida a desenhar com linhas confusas pela frente.
Jeon e Taehyung ficaram a observar o céu enquanto suas respirações voltavam à normalidade. Era um dia bonito de sábado e, agora em silêncio, conseguiam ouvir bem o canto dos pássaros, as folhas das árvores entoando também suas canções e poucos carros transitando e buzinando dissonantes as vezes. Uma melodia tão comum que seria imperceptível em um dia comum, mas aquele não era um dia comum, era o dia de visitar Syuwon. E Jungkook quase pôde imaginá-la deitada ali ao lado deles, rindo de suas palhaçadas ou também observando o céu de onde agora fazia parte junto às outras estrelas. Sorriu, sem perceber. Sua irmã era tão preciosa a ponto de qualquer pensamento remetido à ela despertar um pouco de felicidade, era apenas triste que, por tanto tempo, evitasse pensar nela pelo medo do que poderia sentir, do que poderia lhe causar. Agora parecia até um medo bobo, porém sabia que estava longe de ser, somente o íntimo de Jungkook saberia explicar todos os entrelaços causados por seus transtornos. Transtornos esses que aos poucos deixavam tanto aquela mente quanto aquele coraçãozinho em paz. E se seu coração estava em paz, ele poderia voar, como as borboletas.
Um suspiro mais pesado acabou por chamar a atenção do distraído Jeon, que ao virar-se em direção à Taehyung, viu que ele já tinha os olhos presos aos seus, com um brilho inexplicável que, além de deixá-lo confuso, despertou uma onda de sentimentos fortes e gostosos em seu coração. Era inevitável a conexão que possuíam e que mantinham suas almas unidas mesmo com a distância. Se a "akai ito" é real, ela têm a aparência desse amor, e se esse amor existe, ela continua viva.
— Tae... O que foi? — Jungkook manteve um tom baixo, preocupado por perceber que uma lágrima se formava nos olhos de seu hyung. Taehyung não costumava chorar com facilidade.
— É que você é tão lindo... Talvez não precisemos tanto assim de um telescópio, não quando vejo todas as estrelas que já habitam brilhantes em você. — confessou o que a alma de ambos conheciam e sentiam. Jeon sentiu-se tentado a findar o espaço entre eles tocando seus lábios, pois não haviam palavras suficientes para dizer ao namorado o quanto ele significava em sua vida. Mas Taehyung não havia terminado de falar. — Você é um universo inteiro, Jungkookie... Com muitos planetinhas coloridos por baixo dessas poeiras cósmicas góticas. Mas eu gosto delas também.
— E você é um astronauta muito paciente por ainda tentar me descobrir. — não conseguiu segurar as risadas por conta dessa comparação boba, Taehyung nunca deixaria seu jeitinho emo em paz. Ainda que os olhos de seu Kim fossem mais atrativos no momento, preferiu encarar o céu limpo e tentar não parecer tão afetado pelas palavras que ouviu, não queria que o namorado o visse vermelhinho por causa disso. — Ainda não sei o que você viu de tão interessante em mim.
— Eu gosto de montar quebra-cabeças. —Taehyung levantou-se, apoiando-se nos cotovelos para observar bem cada traço do homem por quem era perdidamente apaixonado. — Você me descrevia assim pra Syu nas cartas, lembra? Sempre achei essa denominação tão linda, e ela se encaixa perfeitamente em você também. Amo cada pecinha que o compõe. — Taehyung riu quando Jungkook escondeu o rosto rosado com o braço livre, despertando em si uma vontade enorme de beijá-lo por achar aquelas reações adoráveis. E Taehyung fez como pensou, beijou‐o várias e várias vezes seguidas até que seu Jeonzinho ficasse vermelhinho outra vez. — Ei, falando nisso, o que acha de escrever uma carta?
— Mas nem tem papel e caneta aqui. — disse, ao que Taehyung se levantou completamente e, procurando por alguns poucos segundos, tirou um papel e caneta dos bolsos e mostrou-os ao namorado, que ficou um tanto surpreso. — Taehyung!
— Oh! Olha o que temos aqui, coincidência não? Eu sou um cara preparado, não posso evitar. — deu de ombros, sorrindo por ter se lembrado desse detalhe. Jungkook negou pelo menos umas três vezes em sua mente, rindo também, antes de se levantar.
— Você planejou isso, não foi? — perguntou, mas não precisaria de resposta, não ao ver o sorriso sapeca e cúmplice deixando os lábios do namorado. É claro que ele teria pensado nisso, era Taehyung.
— Talvez. — o mais velho desconversou, mais para não fugir do foco do que realmente omitir aquela informação que deveria estar escrita em letras neon na sua testa, era sempre muito transparente ao que sentia. Olhando uma última vez para os objetos em suas mãos, estendeu ambos em direção a Jungkook, que ainda estava confuso e surpreso. — Quer tentar? Não precisa ser um texto grande, pode ser só uma linha ou uma palavra, ela vai ficar feliz.
Em uma inspiração mais intensa, Jungkook pegou o papel e a caneta, levemente perdido se faria mesmo aquilo, não escrevia uma carta a sua irmã há muito tempo. Desde aquele dia... Desde sua última carta... Era tudo muito triste, eram lembranças que não deixariam sua mente tão facilmente e ele sabia. Mas estava ali exatamente para quebrar essas correntes que o prendiam, para se libertar de qualquer pensamento ruim que poderia rondar em sua mente, para deixar por terra o que impedia-o de ascender, de voar livre como uma borboleta. Eram passos pequenos, mas significativos. Poderia começar com uma letra, que se tornaria palavra, que se tornaria uma frase, um parágrafo, um texto, um sentimento. Escrever era deixar-se fluir, como água.
Jeon então andou até o túmulo de Syuwon e posicionou o papel sobre ele, usando-o como aparador, como fazia quando escrevia para ela naquele lugar quando tinha a oportunidade. A caneta ainda estava um pouco trêmula em sua destra, mas ao sentir o cheiro de Taehyung tão próximo, pôde se acalmar. O outro envolveu-o em um singelo abraço, acariciando o peito do namorado, sentindo seu coração acelerar. Com um toque tão simples, Jungkook pôde conhecer os céus e voltar em segundos, tamanho sentimento que transbordava pelas bordas de sua alma e que o aquecia por completo. Taehyung era realmente... Surpreendente. Sua confiança nele era tão grande, a ponto de uma atitude ser suficiente para entregar-se, pois sabia que o Kim estaria de braços abertos para recebê-lo, como estaria para ensiná-lo a voar também. Era seu porto seguro, sua estrela mais brilhante, seu arco-íris, que mostrava lindamente todas as suas cores e coloriam sua vida.
As primeiras palavras saíram um pouco tortas pela falta de prática, mas bem aos pouquinhos aquela criança esperançosa que ainda morava em seu coração tomou espaço, claro que, se lembrando de sua idade quase adulta agora. Jungkook percebia em cada linha o quanto havia amadurecido, o quanto havia crescido e aprendido, estava orgulhoso por estar aos poucos se tornando um homem. Taehyung também via como seu menino estava mudando, ambos viam suas transformações de perto, ensinando e aprendendo juntos. Como uma família. Confiavam um no outro e essa confiança se multiplicava com o passar dos segundos e cada um de seus infinitos. Continuariam assim, sendo o universo um do outro até que lhes fosse permitido.
Momentos depois, a cartinha de Jungkook estava terminada, e Taehyung não conseguia parar de se sentir orgulhoso pelo seu Jeon ter feito algo tão lindo, e sem precisar de sua ajuda. Após dobrá-la e deixá-la no cantinho florido junto às outras correspondências antigas, Jungkook sentiu que sua missão havia se cumprido. Estava feliz e Taehyung percebia pelo sorriso radiante que o garoto transmitia, um sorriso tão belo que faria questão de gravar na mente e no coração, como todos que ele dava, com ou sem motivo. Não precisavam de motivos para serem felizes. Talvez Syuwon estivesse feliz também.
— Tae, eu... Estou pronto.
Taehyung analisou bem o olhar do namorado antes de confirmar sua decisão. Era a hora de voltar pra casa.
— Tudo bem. Então vamos? — perguntou, recebendo um aceno breve e sentindo os dedinhos macios entrelaçando-se aos seus. Os dois andaram juntos até o carro do lado do grande portão de ferro pouco desgastado pelo tempo e umidade. As mãos se soltaram para que Taehyung procurasse as chaves que havia se esquecido onde exatamente havia colocado, então Jungkook aproveitou para gravar bem o local sob seus olhos. Voltaria em breve, talvez mais seguro de si, talvez sozinho, talvez mais feliz, ou não. Não sabia. Porém queria formar novas lembranças, lembranças que fariam-no se sentir melhor, que se tornariam boas recordações e deixassem seu coração em euforia. Nem tudo precisava ser triste agora.
— Vamos? — Taehyung despertou-o de seu transe assim que encontrou as chaves perdidas nos bolsos e destrancou o carro. Jungkook deu uma última olhada no lugar antes de andar até o outro lado, sentar no banco do passageiro e colocar o cinto de segurança.
— Hum... Acho que vou passar resto do dia assistindo filme. — o comentário despreocupado de Jeon fez com que Taehyung franzisse as sobrancelhas enquanto terminava de se equipar.
— Nada disso, mocinho. — falou, quase que imediatamente. — Você tem que entender como a serotonina age no cérebro humano e eu preciso fingir que gosto de geometria pra construir prédios.
Jungkook bufou, já cansado só de imaginar o resto de seu sábado sob os livros. Ah, não estava de férias ainda, droga. Seu lado imaturo e birrento queria brigar e dizer que não ia pegar em nenhum caderno aquele dia, mas não podia se dar a esse luxo com as provas da faculdade se aproximando.
— Precisava lembrar? — o Jeonzinho cruzou os braços e Taehyung acenou, rindo por causa da voz manhosa reclamando. Jungkook era precioso demais para si.
— Precisava. — Taehyung ignorou a chave posta na ignição, e direcionou sua atenção ao namorado, deixando um beijinho na ponta do nariz do outro e recebendo um sorriso tímido dele. Fofamente apaixonável, como diria. — Eu amo você, Kookie.
Jungkook não conseguiu conter o sorriso que surgiu em seus lábios.
— Eu também amo você, Tae.
[...]
Olá Syuwon noona, sou eu... Seu irmão mais novo, Jungkook. Não me esqueci de você.
Estivemos longe nos últimos 3 anos, mas foi necessário. Na última carta que te deixei, eu dizia que não queria mais ficar aqui e que iria te encontrar, mas o destino decidiu fazer eu ficar um pouco e eu vi que era melhor assim também. Poderemos nos encontrar em outro momento, noona, quando eu já estiver bem velhinho para que você possa ficar zoando minhas rugas, mas pelo menos serei tecnicamente mais velho, então terá que me respeitar. Bem, eu continuo um péssimo irmão, mas... estou tentando melhorar nisso. Não perca a esperança ainda.
Hoje eu vim aqui porque me senti corajoso para te ver. Há quatro anos você nos deixava de uma forma triste, e isso perpetuou por muito tempo. Em alguma carta que escrevi eu disse que os dias 27 traziam dor e sofrimento, mas agora eu não quero que seja assim. A partir de hoje, os dias 27 não serão mais dias tristes, agora serão apenas... dias. Como os outros. Dias que guardavam lembranças mas que têm algo de especial, porque serão nesses dias – e em seus aniversários – que vamos te visitar e lembrar das coisas legais que já fez. Nem tudo precisa ser negativo. Já não bastam os números que Taehyung vive estudando e calculando pela casa, eu realmente não sei como ele sobrevive nesse negócio de arquitetura. É loucura. Eu prefiro mais a minha psicologia, é complicado também mas tem partes legais.
Ah, sim... Nós estamos dividindo uma casa, juntos. Fica melhor pra ir para a faculdade sem pegar muito trânsito e eu queria mais independência de casa, as vezes me sentia sufocado. Não que nossos pais estivessem sendo ruins comigo, eles me entenderam da maneira que podiam, mas eu precisava disso. Já tem quase um ano que tomei essa decisão, consegui uma bolsa de estudos e outra de um projeto que estou desenvolvendo em grupo, o que me ajuda a me manter com Taehyung, que também trabalha. Estamos virando adultos, e isso é um pouco assustador e diferente. Espero que consigamos ficar estáveis nessa nova fase, nessa nova vida que vivemos juntos.
Morar com Taehyung é algo que nunca me imaginei fazendo, porém não me arrependo de ter dado um passo tão grande sendo seu namorado. Na verdade, isso nos aproximou mais, fez com que nos conhecêssemos melhor e mais profundamente. E cada vez que o conheço mais, mais eu nutro um sentimento cada vez maior. Ah, eu o amo tanto, noona... Tanto... Espero nunca deixar de sentir isso, eu sei que não posso controlar o que irá acontecer no futuro, mas se pudesse, iria fazer Taehyung ficar pra sempre ao meu lado. Eu sei que é difícil porque estamos em um mundo um pouco cruel, mas eu tenho esperança de que possa melhorar. Taehyung faz meus dias felizes e eu acho que faço ele feliz também, então deve bastar. Nosso amor vai durar pela eternidade necessária, e quando ela chegar ao fim, eu serei igualmente grato por ter tido a oportunidade de amar. Eu finalmente descobri que posso amar sem medo de ser quem sou, ainda que eu seja também um quebra-cabeças desmontado. Com o tempo minhas peças vão se encaixar e eu vou me transformar em uma paisagem ou personagem de desenho, nunca se sabe. Mas independente da imagem que meu quebra-cabeças forme, eu vou aceitar e seguir em frente, sorrindo. Se sou oceano, que eu derrame, e se sou amor, que eu ame principalmente a mim, para que assim meu amor se reflita em quem está perto de mim e eles se sintam amados também.
Acho que encontrei o que posso chamar de felicidade. Ela ainda está nascendo bem pequenina, mas eu sei que a sinto. Ainda que hajam problemas, eles já não parecem tão grandes e impossíveis, as contas matemáticas de Taehyung são três vezes mais complicadas e isso me faz rir. Acredito que posso ser feliz. Vou apenas continuar, com a esperança de que isso possa se concretizar.
Ps.: Ei! Aqui agora é o Taehyung, mas você pode me chamar de Tae, não tenho problemas com apelidos. Eu roubei essa carta com a permissão do Kookie pra dizer que você parece ser muito legal e que eu quero te conhecer quando eu morrer. Podemos ser amigos no céu? Jungkook me disse que você gostava de estrelas e assistia com ele os filmes dos Vingadores, podemos assistir todos juntos no cinema, você pode aproveitar que é um fantasminha para não pagar a entrada, o que acha? Fica aqui o convite! Até mais!
Ok, agora é novamente o Jungkook. Por favor, não leia uma palavra do que Taehyung escreveu, ele não tem maturidade e eu não quero que saia do conforto do seu cantinho para lidar com a hiperatividade dele. Ah noona... Somos bem diferentes, mas isso é divertido, quase como um arco-íris sendo melhor amigo de um corvo, e sim, o corvo sou eu, não posso mais negar minha alma emo. Ok, isso me deu vontade de rir. Taehyung está ao meu lado e está rindo. Eu gosto muito do som de sua risada, porque me traz uma sensação de euforia. É libertador e fofo. É aconchegante e confortável. É gostoso e acolhedor. Como uma casa, um lar, o meu lar. Eu encontrei meu lugar, noona.
Eu só tenho a agradecer por todas as superações e momentos felizes que aos poucos posso apreciar. Mesmo distantes, você não se esqueceu de mim. Não se esqueceu de nós. Obrigado por me deixar continuar aqui. Obrigado por cuidar de nós, noona. Obrigado. Eu a amo, minha borboleta.
De Jungkookie, para Syuwon noona.
💜💜💜
:)
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