d e s t r u i ç ã o
"Tem sido uma linda luta. Ainda é.
Como você ficaria se tudo de você fosse destruído?"
-Charles Bukowski
***
Eu nunca quis saber a resposta, mas acabei descobrindo da pior maneira possível.
Pois bem, chegamos na nossa carta, o declínio do nosso falso amor. E a verdade por trás de todo nosso relacionamento.
E tudo aconteceu depois de eu me entregar de corpo e alma para você, enquanto eu encarava seu rosto durante seu sono, torcendo para que quando eu sempre abri-los você estivesse ali. Depois de alguns segundos você abriu seus lindos olhos, deixando eles fixados em mim e naquele momento eu havia percebido o quão sortudo - azarado - era por acordar ao seu lado.
Nos dois, nus, abraçados, sentido o sol fraco invadir minha janela, seu sorriso aparecendo em seu semblante e sua mão esquerda acariciando minha barriga. Nossos olhos fechados e narizes se tocando, corações batendo como se fossem apenas um e só um sentimento poderia resumir aquele momento. Paz.
Essa foi a única paz que senti ao longo da minha vida. Mas hoje percebo que aquilo era um presságio, um sinal de toda bagunça que viriam nas horas seguintes e que romperiam todas as forças do meu corpo, me rascando como papel.
Depois de algumas carícias você se levantou com cuidado, passando por cima de mim e catou as suas roupas que estavam espalhadas pelo chão do meu quarto, apenas uma lembrança passageira da noite de ontem.
Meu corpo doía um pouco, mas não era incomodo, a ponto de eu querer chorar. E ver você nu, se vestindo era incrivelmente lindo e engraçado. Era bom observar seus músculos definidos se contraindo ao abotoarem a calça e seu cabelo que estava totalmente bagunçados, por minha culpa e das minhas mãos que não conseguiam larga-los na noite anterior, caindo sobre sua testa.
Ao ficar totalmente vestindo, você veio até mim sorrindo e eu me sentei na cama, com o lençol sobre minhas partes intimas.
- Bom dia!
- E que dia. - sorri
Seus lábios tocaram os meus brevemente e naquele momento eu devo ter percebido algo. Você estava distante e nervoso e eu consegui sentir isso. Mas ignorei.
- A gente se ver na escola? - perguntei ao ver você saindo pela porta.
E você me respondeu com um vago
- Talvez.
Não era uma resposta carinhosa como você sempre dava. Nenhum odioso "até depois". Você disse um talvez, de uma maneira que significava "de jeito nenhum". E aquilo fez algo dentro do meu peito ficar inquieto.
Voltei a deitar na tentativa de dormir e que essa angústia saísse de mim, mas no exato momento que faço isso, sinto seu cheiro doce misturado com nossos suores em meu travesseiro e como consequência sorri. Pus o travesseiro sobre minha cara inspirando profundamente e como se eu estivesse banhado pela chuva da lembrança, as imagens da noite de ontem penetraram minha mente.
Sua mão direita segurando minha nuca enquanto eu estava por cima de você, te beijando com força, soltando leves gemidos e sua outra mão pairava sobre minha bunda. Em seguida veio outra memória nossa, você por cima de mim enquanto minhas pernas estavam enroladas em seu quadril e nossas mãos unidas. Eu beijando e mordendo seu ombro quando uma onda de dor me invadia e você retribuía beijando meu pescoço e apertando minha cintura e fazendo movimentos mais rápidos. Tudo isso em cima desses lençóis. E depois, quando ambos haviam acabado, você deitou sobre meu peito, com seus braços envolta de mim e eu acariciei seus cabelos macios e beijava o topo da sua cabeça até você pegar no sono. E eu pensei. "Eu inevitavelmente amo você."
Antes de eu me levantar da cama e me arrumar para ir a escola a única coisa que queria naquele instante era ser tocada por você novamente, sentir sua pele na minha, ver o calor emanar do seu corpo, sua expressão de satisfação ao estar comigo, e uma mistura de emoções, que em meio a sorrisos me faltar ar. Fazendo não só com que as borboletas em meu estômago o revirem, mas com que deem a intenção de sair pela boca voando e colorindo o mundo.
E ao caminhar pelas calçadas indo até escola eu estava sorrindo, completamente feliz imaginado nos dois juntos, na faculdade, longe daqui. Acordando cedo, tomando café juntos. Dormindo abraçados e eu sempre sentindo seu cheiro.
Adentrei a escola e depois de tempos sinto algo estranho. Alguns grupos de amigos, estavam fascinados por algo que estava no celular da pessoa que ficou no meio dos três, fixaram seus olhos em mim e não pararam de me encarar.
- "Você é lindo" - um garoto do time de basquete disse para mim com tom de deboche enquanto andava na minha direção e bateu contra meu ombro. - Viadinho de merda.
Bruno, eu era tão ingênuo que não fazia ideia do que tava acontecendo, todos do colégio me olhavam estranhos, olhos cheios de raiva e nojo, alguns até mesmo com pena.
O que havia acontecido? O que eu fiz? Perguntava a mim mesmo.
Mas a verdadeira pergunta deveria ser:
O que VOCÊ vez?
Pois a única coisa que fiz de errado foi te amar e me arrependo amargamente por isso.
- Oh Henrique como você está? - Melissa que não falava comigo fazia meses, mas naquele dia ela correu até mim no meio do corredor e me abraçou.
- Melissa o que está acontecendo? Por que eles estão olhando assim pra mim?
Ah Bruno, eu nem fazia ideia que o nosso momentos mais íntimos estava sendo espalhados para os celulares de todo mundo da cidade.
- Você precisa ficar calmo, mas o Bruno...
- O que é que tem o Bruno?
Ela parecia receosa, com algumas lágrimas no canto dos olhos.
- É melhor ver você mesmo.
Melissa retirou o celular do bolso e abriu um vídeo.
E ali, naquele instante, você poderia ter uma certeza.
Eu morri. O antigo Henrique, estava morto e uma nova pessoa, ruim e dolorosa, estava nascendo em seu lugar. Um substituto inevitável.
Na tela do celular estava nos dois, aos beijos, sua voz rouca me dizendo que eu era lindo, nos dois abraçados, eu dizendo que amava você. Tudo estava ali e em todo lugar. Mas havia um porém, só dava para ver o meu rosto. O seu, estava borrado.
A primeira lágrima veio, e eu sabia que não conseguiria segurar as outras. Sair correndo pelos corredores na intenção de ir para minha casa, mas a passagem estava bloqueada por pessoas curiosas que tiraram o celular do bolso e filmavam minha cara, rindo. Por isso corri para o banheiro e me tranquei no box com o choro preso na garganta, queimando todo meu pescoço.
Bruno, você gravou nossa primeira vez e divulgou para o mundo, mostrou tudo de mim sem pena, sem receio. O que eu era pra você?
Só mais um?
Só mais dois?
Só mais quantos?
Eu não sei e nem quero saber para dizer a verdade.
Porém as minhas respostas vieram do jeito mais inesperado que poderia acontecer. Você e alguém, que não lembro o nome, do time do basquete entraram no banheiro.
- Não acredito que você traçou aquele viadinho. - ambos sorriam. - Cara, você é louco.
- Foi apenas um trote, ele caiu facinho, facinho. Mas ei... - você passou a sussurrar. - Não conta pra ninguém que era eu naquele vídeo, sério. Eu acabo com você.
- Cara relaxa. Seu segredo tá guardado. Agora conta, como foi foder ele? Era virgem?
- Óbvio que sim. - as torneiras da pia foram ligadas - Todo inexperiente e carente. Deu até dó.
E antes que o choro escapasse de mim o sinal tocou e seu amigo saiu. E você ficou só. Eu relutei, mas precisava fazer algo em relação a você. Abri a porta do box e seus olhos encontravam os meus através do espelho. Ao virar para mim seus olhos expressavam surpresa.
- Henrique? - disse com total descrença.
Ah Bruno, todo meu corpo queimava, me corroendo de raiva, mas acima de tudo isso, havia tristeza. Eu não respondi você.
Apenas soquei seu olho esquerdo e você caiu no chão surpreso. Eu fui pra cima e continuei batendo com seu rosto com toda força, urgindo de dor. Eu gritei, gritei como um selvagem, liberando tudo que estava preso dentro de mim. Bati não uma, nem duas e nem três. Bati tantas vezes em seu rosto perfeito que perdi a conta, deixando ele nem tão perfeito assim.
Só parei quando Melissa entrou no banheiro masculino e me puxou de cima de ti. Sua boca sangrava e eu esperava fortemente que eu tivesse quebrado seu nariz. Eu acabaria com tudo que você era, mas no fundo, mesmo você aparentando que estava acabado, era eu que estava de fato destruído.
Meu corpo era como um receptáculo cheio de dores que havia se rompido e emanava pelos meus poros, revelando, no fim, a solidão que eu era.
Antes que Melissa pudesse dizer alguma coisa e você pudesse levantar, eu corri. Chorando, morrendo, me desfalecendo por você, por mim, pelo mundo. Eu nunca me senti tão vazio como naquele momento.
Havia dado tanto de mim a você que acabei ficando sem nada, sem eu. Então o que sobrou? Como eu me reergueria? Eu não sabia.
E ninguém sabia, apenas eu poderia descobrir.
Bem, hoje, percebo que acabei chegando numa fase da minha vida que vejo que a única coisa que fiz até agora foi fugir, fugir de mim mesmo, do meu nada, e agora não tenho mais para onde ir, nem sei o que vou fazer, fui péssimo em tudo.
Bruno, confesso que naquele momento e por anos eu passei a cultivar raiva por você, talvez até mesmo algo maior que raiva. Mas depois de noites em claro refletindo vejo que não existe mocinho e bandido nesse enredo. Você errou, eu errei também. Mas vai ver a gente estava tentando ser feliz, e felicidade é um patamar complicado de alcançar
Escrever isso me fez bem, de verdade. Agora veremos a pior parte de tudo isso.
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