Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

Faça O Que Quiser | Capítulo Trinta E Três

AVISO DE GATILHO: colapso mental.


Clarissa estava na sala quando Azazel abriu a porta, tinha as pernas dobradas em cima do sofá e um livro aberto nas mãos. Sempre vestia essa mesma máscara de alienação, fingindo ler e se recusando a colaborar com o que quer que Azazel pedisse.

Não era difícil irritá-la, só precisava ser teimosa o bastante e isso não era esforço algum. Desta vez, seus olhos tinham um tom frio quando se sentou na poltrona em sua frente, mãos sobre os joelhos em uma posição muito séria.

— O rubi sumiu — disse ela, e Clarissa a ignorou, fingindo-se concentrada nas páginas. — O que sabe sobre isso? — continuou a loira, lhe encarando tão fixamente que Clarissa levantou o olhar, piscando levemente e sem alterar a expressão.

— O que te faz achar que sei alguma coisa sobre isso? — Era fácil fingir e atuar quando lembrava-se de todas as vezes que ela lhe manipulara, de todas as vezes que confiara em Azazel e acabara levando a pior.

Manteve o rosto transparente como um espelho, sem se alterar, sem demonstrar nada muito alarmante. Azazel nunca usara o controle do pingente para exigir a verdade, mas Clarissa sabia que ela podia fazer isso.

Se ela colocasse a mão no maldito pingente e ordenasse que lhe contasse tudo o que estava fazendo desde que chegara ali, abriria a boca no mesmo instante. Surpreendentemente, ela não parecia ter noção disso, ou tinha, mas nunca usara.

— Você realmente quer jogar esse jogo? — insistiu a loira, batendo as botas de salto no chão e estreitando os olhos. Ela parecia a mesma Azazel que conhecera, sempre de saltos e couro, cabelos brilhantes e encaracolados.

As vezes precisava se concentrar para não dar aberturas, porque todas as vezes que Azazel lhe protegera, todos os momentos que Clarissa achara que tinham alguma amizade, foram completamente quebrados pelo momento em que se dera conta do motivo de sua morte.

— Você perguntou, eu respondi. Se minhas respostas te irritam, não pergunte. —Fechou o livro abruptamente e se levantou. Manteve a expressão mal humorada e entediada que assumira desde que chegara ali, encarando-a nos olhos por um momento, desafiando-a. — Não faço a mínima ideia do que você está falando.

Estar com Azazel era assumir o papel de um clichê adolescente: Clarissa agia de forma mal humorada quando ela estava por perto, se trancava no quarto quando tinha chance, batendo a porta na cara dela e escapando do apartamento quando podia.

Estava justamente atravessando o corredor, em direção ao próprio quarto para se trancar lá. Precisava admitir que gostava do quarto, era como se Azazel tivesse pensando-o para si: Havia uma estante cheia de clássicos e edições raríssimas de livros antigos, que Clarissa passara dias explorando, apesar de se sentir culpada por ceder aos encantos de Azazel. O lugar também tinha poltronas, uma escrivaninha, até mesmo uma janela panorâmica que dava para o bosque e tornava o cenário perfeito.

Por isso era tão fácil ficar lá, podia passar o dia lendo e escrevendo, estudando os livros raros e fazendo anotações enquanto a ignorava.

— Pare — exigiu Azazel, e Clarissa parou abruptamente. Não parou porque quis, mas porque a voz dela parecia ter um comando que afetava todo seu corpo. Bufou levemente, parada na entrada do corredor e olhando para a porta do próprio quarto.

Se virou lentamente, cruzando os braços para encará-la.

— Você precisa parar de fazer isso. — Deixou que cachinhos loiros caíssem sobre os olhos, emoldurando seu rosto e manchando sua visão.

— Sabe que estamos do mesmo lado, não é? — Ela ajeitou-se na poltrona e assumiu uma postura mais autoritária. Era nesses momentos que Azazel se parecia mais com a regente infernal que realmente era, adotando a postura rígida de comandante respeitável.

— Isso é mesmo lado, na sua mente distorcida? — retrucou Clarissa, praticamente cuspindo as palavras e sem fazer questão de esconder a própria repulsa. Azazel inclinou a cabeça para trás, encarando o teto de uma maneira cansada.

— O que você queria que eu fizesse, Clarissa? Eu tentei, realmente tentei te ajudar, mas não pude. Se não fosse você a peça principal do plano dele, seria outra pessoa que colaborasse com as ideias de Mamon. O que você queria que eu fizesse? Deixasse que ele te controlasse e fizesse um inferno na terra?

— Você deixou que ele enfiasse uma espada em mim, foi capaz de me ver sufocando com meu próprio sangue e não fez nada — retrucou a outra, com tanta prontidão que Azazel levantou a cabeça para lhe encarar. Clarissa tinha os olhos claros semicerrados, faiscando com chamas roxas azuladas. — Jogou Bethany de um penhasco, me fez confiar em você e então fingiu o tempo inteiro ser inocente — continuou, listando os acontecimentos que vinham em sua mente. — Ao que parece, você se esqueceu disso tudo e voltou para a época em que eu te dei uma chance, mas você estragou tudo.

— Eu precisava que Mamon pensasse que rompi com os querubins, não podia deixar que minha aliança com eles se espalhasse pela dimensão infernal. Sou uma líder do inferno, ninguém fica satisfeito quando um governante se junta com os anjos, isso é quase uma ofensa — relatou ela, cruzando as pernas e batendo com o salto no chão de madeira do apartamento luxuoso. Clarissa trincou os dentes. É claro que os demônios sobre controle de Azazel ficariam revoltados ao ver a chefe colaborando com os supostos inimigos. — Foi por isso que fiz o que fiz com a menina, sabia que você a salvaria a tempo, então Mamon pensaria que estou contra vocês. Funcionou, os outros pararam de encher meu saco e ameaçar revoltas. A garota está bem, não está? — Clarissa não respondeu, não queria dar essa satisfação a ela. Depois de um momento de silêncio, Azazel voltou a falar. — Tudo o que estou dizendo é que melhor eu no controle do que Mamon, comigo você tem uma chance, porque no fundo nós duas temos o mesmo objetivo de fazê-lo queimar no inferno — argumentou ela, se colocando de pé e fazendo com que os cabelos loiros voassem com o vento que entrava pelas portas da sacada. Parecia uma auréola, criando um ar ironicamente angelical ao redor de Azazel.

Clarissa riu secamente.

— Vai precisar de algo melhor que isso para me convencer — afirmou, dando um passo para frente. Pisou no tapete felpudo com os pés descalços, inclinando-se para ela com um olhar profundo. — Suas ordens não duram muito, ou você acha uma forma melhor de me controlar, ou vai se arrepender de ter me trazido para cá — falou por fim, e se virou para o corredor largo e já familiar do apartamento. Estava quase chegando à porta do próprio quarto quando Azazel apareceu abruptamente no caminho, bloqueado a passagem.

— O que mais você quer? — Clarissa sorriu com acidez, desviando para passar por ela, aproveitando que a largura do corredor permitia isso.

— Distância. Quero você bem longe de mim — retrucou, já preparada para bater a porta do próprio quarto, mas Azazel lhe impediu antes que pudesse colocar a mão no trinco. Sentiu a mão dela segurando seu braço, lhe virando subitamente.

— Clarissa — chamou ela, e Clarissa recuou contra a parede, furiosa.

— Não me toque — alertou, se afastando dela e puxando o braço com força. O cotovelo bateu na parede, levantou o rosto para encará-la. Para sua surpresa, não havia fúria e nem impaciência na face de Azazel, só certo abatimento e exaustão. Nunca a vira tão aberta vulnerável antes, aquilo lhe surpreendeu.

— Estou cansada, preciso de você ao meu lado se quiser vencer isso. — Ela levou a mão até o pescoço e puxou o cordão com o pingente que Clarissa tanto planejava roubar. O corrente que era a razão de tudo, era a fonte do controle e do elo. Sem aquilo, Azazel não tinha nada. — Então faça o que quiser, aproveite os próprios poderes, não sou eu quem vai te impedir — disse Azazel, e Clarissa mal conseguiu se mexer ou sentir o próprio corpo quando ela colocou o pingente em sua mão, se afastando em seguida.

Simples assim, Clarissa apertou os dedos em volta da fonte de todos os problemas e de tudo o que precisava para sair dali e voltar para Lena e Elisa, para um lugar seguro na dimensão dos querubins.

Azazel não esperou uma resposta, se virou e atravessou o corredor sem olhar para trás uma única vez. Clarissa ouviu a porta da frente batendo, o que significava que estava sozinha no apartamento.

« ♡ »

— Você ainda está aqui — afirmou Azazel, ao lhe encontrar na sala depois de voltar de onde quer que estivesse. Se ela estava surpresa, não transparecia com sua usual expressão de superioridade. — Achei que já tivesse desaparecido por aí.

Voltara a ser a Azazel com o ar arrogante que Clarissa conhecia.

— Por que ainda não destruiu o elo, se quer acabar com os planos de Mamon? — indagou Clarissa. Azazel atravessou a sala para se sentar em sua frente, Clarissa estava com a postura rígida no sofá branco, encarando-a com desconfiança.

Tudo ali era luxuoso, desde os sofás de couro branco ao lustre brilhante no teto e os tapetes felpudos espalhados pelo piso de madeira. Não havia televisão, nem nenhum outro eletrônico.

— Porque não resolveria nada — respondeu ela, o tom de voz tão direto que lhe surpreendeu. — Mamon vai encontrar outro plano, vai continuar tentando e tentando até conseguir. Destruir o cordão não vai ajudar, precisamos ir para a fonte do problema. — Azazel conseguiu a atenção de Clarissa aos pouquinhos, lhe atraindo com cada palavra. — Enquanto tivermos o elo, temos vantagem sobre ele. Quero destruir Mamon, não os planos dele.

— Não confio em você — falou Clarissa, com clareza e o rosto focado no dela. Azazel sorriu com ironia, curvando levemente o canto dos lábios.

— Ótimo, também não confio em você.

— Por que me deu o pingente? — A pergunta pareceu trazer de volta a Azazel mais vulnerável. Ela remexeu-se na poltrona e jogou os cabelos loiros para trás, revelando a tensão que ressaltava os contornos de seu rosto.

— Enquanto tiver você, tenho mais vantagem sobre Mamon. Você é poderosa, sabe disso. — Azazel levantou o olhar para Clarissa, que fez questão de fixar os olhos nos dela para ter certeza de que aquela era a verdade. — Preciso achar uma maneira de resolver tudo isso e preciso que colabore, ou que não me atrapalhe. Ter você do meu lado é mais vantajoso — deu de ombros, afundando na poltrona em um gesto de desânimo. — Se o cordão era a fonte da sua desconfiança, então...

— Por que agora? — Clarissa inclinou-se para perto dela e tocou o pingente no pescoço. Não o tiraria mais, não até quebrar o elo para não correr mais riscos.

— Porque Mamon conseguiu levar os demônios para a dimensão humana, ele está conseguindo o que quer — falou Azazel, e Clarissa lembrou-se de Elisa falando sobre Lilith, pensou em Asmodeus e Azazel organizando os próprios exércitos. — Não sei como pará-lo, não posso fazer isso sozinha.

— Eu ficarei aqui e farei o que posso para ajudar, mas o pingente fica comigo — afirmou, depois de considerar as palavras por um tempo. Por enquanto, ficar ao lado de Azazel era a melhor forma de ajudar os querubins e servir de mediadora entre ela e Onyx, sem quem Azazel perdesse apoio na dimensão infernal. Ela e seu exército poderiam ser muito úteis no meio de uma guerra iminente. — Qualquer sinal de que você está me enganando de novo, eu me mando e volto para os querubins — avisou-a, pensando que deveria encontrar uma maneira eficiente de proteger o colar, guardá-lo dos outros e até mesmo dela.

— Parece justo. — Azazel massageou as pálpebras com os polegares, um gesto que exalava cansaço. Ela voltou a lhe encarar com uma sobrancelha erguida, cheia de desdém. — E toda aquela história de que estava cansada dos querubins, queria ter os próprios poderes e usá-los sem o controle deles? — Clarissa sorriu sem que ela visse. Essa era a história que estava vendendo para ela desde que chegara ali, de que queria autonomia longe dos querubins, de que sentia-se sufocada naquela dimensão e precisava se afastar. Por isso decidira vir com ela, por isso. Não para ajudá-la, só para se afastar dos querubins.

Era meio verdade, meio mentira. Sentia-se sufocada pela dimensão angelical, precisava de um tempo longe de lá ou enlouqueceria, mas não era essa pessoa gananciosa e ambiciosa que passara a interpretar para Azazel.

Ela estava acreditando até agora, principalmente depois de Clarissa ter se afastado de Lena e Elisa tão bruscamente, rejeitá-las com tanta força. Aquilo servira de base para quando convocara Azazel na dimensão dos querubins e lhe pedira para sair de lá.

— Pura conveniência — justificou com uma mentira, sem querer entregar a verdade. Enquanto ela achava que seus elos com Onyx estavam desfeitos, Clarissa passava informações o tempo inteiro. — Assim como estou aqui com você — piscou, já se virando em direção ao corredor. Não bateu a porta do quarto desta vez, foi direto para a escrivaninha anotar as novas informações. Precisava ficar sozinha por algum tempo, pensar no que estava fazendo e refletir sobre as novas informações.

Assim como da primeira vez, sentia que estava fazendo um pacto com o diabo, mas que agora tinha algum controle.

« ♡ »

Bethany tinha um olhar perplexo quando lhes viu entrar na biblioteca.

Não era um lugar que Noah costumava frequentar, mas ela não falou nada quando o loiro puxou Nicholas em sua direção. Bethany estava sentada em uma das últimas mesas de estudo, o caderno aberto e uma caneta na mão.

Provavelmente já tinha terminado o trabalho e agora estava fazendo alguma atividade da escola. Amara estava atendendo duas mulheres no balcão de recepção, não notou quando os garotos se sentaram junto com Bethany.

Ela levantou as sobrancelhas com desdém.

— Achei que fossem alérgicos a tantos livros. — Tudo o que ela falava vinha banhado de ironia e acidez ultimamente, Noah não levava para o pessoal porque sabia que era só a maneira dela lidar com as coisas. Desde que Thomas morrera, as crises de insônia e pânico voltaram, Bethany tinha grandes olheiras e parecia cansada o tempo inteiro, além de estar distante e distraída na maioria das vezes.

Ela se recusava a tomar os remédios para regular o sono, Liam não insistia. Fazia sentido desde tudo o que acontecera, mas Noah ficava cada vez mais preocupado.

— Está com o baralho de tarô? — Noah bateu os dedos na mesa com expectativa, lembrando-se de que Bethany costumava carregar ao baralho para todo lugar. Esperava que ela ainda tivesse esse hábito.

Hm, sim — respondeu ela, desconfiada. — Por quê?

— Nick foi aprovado numa universidade em Nova York, mas não quer ir — disse Noah, indo direto ao ponto. — Preciso que você me ajude a colocar alguma racionalidade nessa cabecinha, pra que ele possa enxergar que ficar aqui é uma escolha burra. — O loiro cruzou os braços na frente do corpo, entregando o problema para Bethany, que levou alguns segundos para processar a informação.

— E você quer que você eu use o tarô pra isso? — A menina piscou, surpresa com a iniciativa. Nicholas lhe lançou um olhar quase insultado, sem realmente querer estar ali.

— Por que não diz logo que quer se livrar de mim? — Noah inspirou fundo e apontou o polegar para ele. A biblioteca tinha cheiro de poeira e livros velhos.

— Viu só do que eu estou falando? — Bethany riu levemente e assentiu.

A discussão sobre ir ou não para Nova York estava durando dias, Nicholas não estava exatamente animado para se mudar. Ele dizia que não era só por causa do relacionamento, apesar de ser um dos pontos que lhe faziam querer ficar.

Bethany inclinou-se sobre a mesa e puxou a própria mochila, jogada no canto esquerdo. Ela abriu um zíper na parte frontal da bolsa, puxando o baralho de uma divisão pequena e então colocando-o sobre a mesa.

Noah sabia que ela sempre carregava o baralho de tarô enrolado num lenço, assim não sujaria as cartas quando as espalhasse sobre outras superfícies. Quando desenrolou o pano, formou um quadrado perfeito em volta das cartas empilhadas.

Os garotos se inclinaram sobre o baralho, subitamente curiosos.

— Isso prevê o futuro? — Nicholas exibiu um interesse genuíno, esquecendo-se de seu mau humor de dois minutos atrás. Bethany negou com a cabeça, embaralhando as cartas com a agilidade de quem já estava acostumada com aquilo.

— Ele te dá uma análise da situação e te mostra para onde está se encaminhando. Não é nenhuma profecia, é só uma forma de autoconhecimento e aconselhamento — explicou para ele, manuseando o batalho com rapidez. — Faça uma pergunta, se concentre e escolha três cartas.

— Talvez deva perguntar por que está tão relutante em ir para Nova York — sugeriu Noah, esperando que a leitura resolvesse de uma vez por todas a indecisão. Estava cansado das alfinetadas e discussões sobre isso.

— Tudo bem, você venceu. — Nicholas tinha um leve tom irritado, mas baixou o olhar para o baralho disposto numa linha sobre o pano. Levou um tempo para escolher, então puxou três cartas e colocou-as uma do lado da outra.

Bethany virou a primeira.

Seis de copas.

A segunda.

Quatro de copas.

A terceira.

Às de paus

— Está vendo isso? — Ela apontou para a carta do seis de copas, em que duas crianças estavam cercadas por um castelo dourado cheio de cálices e flores. — É sinal de nostalgia, apego ao passado. — Depois apontou para o quatro de copas, que mostrava um garoto sentado embaixo de uma árvore, olhando de forma apática e entediada para três cálices no chão. Uma mão lhe ofereceria um quarto cálice, mas ele ignorava a oferta e continuava encarando o que já tinha. — É por causa desse apego ao passado que você não consegue ver novas oportunidades surgindo. Você está tão apegado a ideia de ficar aqui e continuar com a mesma vida de sempre que não consegue ver outro futuro. — Bethany parecia mais empolgada enquanto falava, Noah quase sorriu ao ver o brilho nos olhos dela enquanto explicava as cartas. Fazia tempo que não a via tão focada. — O ás de paus garante que novas oportunidades estão aí, todas no campo das conquistas materiais. Esse deve ser seu foco agora, mas precisa deixar todo o apego emocional para trás — orientou, ainda encarando as figuras. Nicholas estava um tanto espantado com a análise, mas não era nada que Noah já não sabia. — Em resumo, você está sendo burro por não querer ir para Nova York, sabe que terá mais oportunidades lá. Não é hora de pensar na parte emocional da coisa, nas pessoas e na vida que você está deixando, mas nas bases que você estará construindo para o futuro. — Nicholas estava um tanto pálido e perplexo, sem olhar para Bethany ou Noah, tentando assimilar os significados. — Todo às é carta de recomeço, ela avisa que é hora de deixar isso para trás e recomeçar.

Nicholas e Noah ficaram em silêncio, se encararam por alguns segundos. Deixou que Nicholas internalizasse o conselho e então deu de ombros, sem se impressionar.

— Eu falei.

— Talvez deva perguntar sobre como será um relacionamento a distância, ou se devemos terminar antes de eu me mudar — ironizou Nicholas, afastando a cadeira da mesa e se levantando. Ele não era uma pessoa irritadiça, mas estava tão inquieto que era estranho. — Obrigado, Beth. — Nicholas se virou e se afastou sem dar mais satisfações

Noah afundou na cadeira, mordendo o lábio. Pelo menos o agradecimento foi sincero, talvez ele considerasse os conselhos de Bethany.

— Vocês ficarão bem? Se quiser, posso fazer outra leitura — perguntou a menina, olhando-lhe com preocupação.

Noah revirou os olhos.

— Crises no paraíso gay, vai ficar tudo bem. — Já estava se levantando enquanto falava, Bethany observava as cartas de maneira atenciosa. Talvez ela voltasse com o tarô e paganismo, Noah tinha isso como parte do plano quando pedira para que ela lesse as cartas para Nicholas. — Preciso resolver isso — disse, por fim. A menina assentiu, logo depois Noah correu para fora da biblioteca.

Nicholas ainda estava descendo os degraus quando Noah o alcançou, colocando a mão em seu ombro. O virou, encarando-o nos olhos. Tinham a mesma altura, mas Noah estava um degrau acima e ficou um pouquinho mais alto.

— Por que está tão bravo? — Nicholas riu secamente, desviando o olhar.

— Parece que você não se importa que eu vou para outro lado do país.

— Meu Deus, você enlouqueceu? — exclamou Noah, descendo o degrau e ficando de frente para ele. Obrigou-o a lhe encarar, fixando os olhos nos dele para que entendesse a seriedade. — Nick, eu sou seu namorado! Isso quer dizer que me dói muito ver você jogando essa oportunidade fora — falou com sinceridade, mesmo que sentisse as palavras pesarem na língua. Era difícil saber que Nicholas não estaria na cidade dali alguns meses, que não passariam as tardes juntos, nem trocariam mensagens sobre os mesmos professores no meio da aula e seria o fim dos pequenos shows rotineiros. — Nova York é incrível, você pode ter um futuro maravilhoso lá. Eu odiaria te ver aqui, sabendo que é impossível para um artista viver nessa cidade. — Manteve-se firme, mesmo tendo consciência do buraco gigantesco que a falta dele deixaria. Talvez devesse se acostumar a perder pessoas depois de Sara.

Nicholas recostou-se na barreira de proteção da escada, evitando seu olhar.

— E se Nova York foi horrível? — Ele sussurrou tão baixinho que era como se não quisesse que Noah ouvisse.

— Então você volta — respondeu Noah, com um sorriso melancólico enquanto se recostava ao lado dele. Colocou a mão sobre a de Nicholas, entrelaçando os dedos nos dele e apertando com força. — Não pense que será fácil para mim. Beth vai se mudar para outra cidade, você vai para Nova York e eu ficarei preso no ensino médio para sempre. — Levantou o olhar para o céu e deixou o corpo pesar contra a grade, desanimado. Encarou as nuvens brancas que passeavam como barcos pelo mar azul. Tudo seria tão melhor se pudesse se formar esse ano. — Mas eu continuarei sendo seu namorado, se quiser. São só dois anos, nós podemos aguentar essa barra. — Encarou Nicholas, subitamente inseguro e aflito com a resposta dele. Tantas pessoas incríveis em Nova York, tantos novos caminhos se abrindo...

Ele riu, desta vez sem escárnio. Riu com suavidade quando se virou para Noah.

Nicholas lhe puxou pela cintura com um gesto suave, Noah estava contra a grade de proteção quando ele lhe beijou. Ficou alarmado por um momento, lembrando-se de que estavam num local muito aberto e não queria chamar atenção, mas a rua estava vazia, percebeu com certo alívio. Pôde beijá-lo calmamente.

Se eu quiser? — Nicholas levantou as sobrancelhas, ainda com os lábios encostados nos seus. — Como se você precisasse perguntar. — Noah riu baixinho e o abraçou com força.

— Vou morrer de saudades — confessou, encaixando o corpo no abraço dele. Ficaram assim por um momento, quietos e sentindo a presença um do outro como se fossem demorar a ter essa oportunidade novamente.

O celular de Nicholas vibrou no bolso, ele se afastou e pegou o aparelho. Noah esperou enquanto ele lia a mensagem.

— Preciso ir, meu pai está na cidade — disse o menino, guardando o celular. — Precisa de carona para casa? — Noah considerou a oferta, mas então recusou.

— Não, vou ficar com Beth. Está quase na hora dela sair. — Nicholas assentiu e lhe deu um beijo rápido de despedida, o loiro observou enquanto ele descia as escadas em direção ao próprio carro.

Antes que Nicholas pudesse pisar na calçada, Noah o chamou.

— Nick... Eles sabem sobre nós? — Não conhecia os pais dele, não como Nicholas conhecia os seus. Nunca planejaram nenhum jantar em família para conhecê-los formalmente, nem nada do tipo.

Chegara a desconfiar disso, mas sabia que Nicholas se incomodava com a ausência dos pais, já havia reclamado sobre isso diversas vezes. Ele se virou e cruzou os braços antes de responder à pergunta, tensionando os lábios.

— Como se eles soubessem alguma coisa sobre mim. — Noah não perguntou mais nada, deixou que Nicholas entrasse no carro e partisse. Talvez pudesse sugerir uma janta com o pai dele, seria interessante ver a casa de Nicholas ocupada, geralmente estava vazia.

Talvez por isso o receio de se mudar para Nova York, considerou Noah. Talvez fosse medo de perder seu único laço, já que não podia contar com o apoio dos pais. Como namorado, era a única pessoa realmente recorrente na vida dele.

Subiu os degraus, imaginando se Bethany poderia tirar cartas para lhe ajudar a entender aquilo. Ela estava sentada no mesmo lugar, com as cartas espalhadas em cima do lenço e o olhar baixo na bagunça de tarô.

Amara estava anotando alguma coisa numa ficha enquanto Noah atravessava o lugar para chegar até a irmã, foi só quando chegou perto o bastante de Bethany que percebeu o olhar estranho dela, a face completamente sem cor.

— O que aconteceu? — A expressão perturbada dela ficava cada vez mais visível conforme desviava de uma mesa e se aproximava. Bethany não respondeu, foi só então que Noah viu a carta d'A Morte em cima do pano, destacada do baralho.

Ficou estático, encarando a caveira encapuzada e sem coragem de perguntar o que significava. Houve um momento de silêncio. Amara pareceu notar algo estranho e Noah ouviu seus passos se aproximando.

— Eu perguntei sobre mamãe — sussurrou ela, a voz tremendo e falhando conforme as palavras se transformavam em lágrimas. Noah não conseguia pensar, ou se mexer. Só conseguia encarar aquela carta, a maldita caveira encapuzada que montava um cavalo branco.

Bethany resfolegou e então agarrou a carta com as mãos trêmulas, Noah recuou quando ela rasgou a carta com força. Ela deixou os pedacinhos destruídos caírem sobre a mesa e se voltou para o resto do baralho, agarrando as outras cartas e prestes a rasgá-las.

— Beth, pare! — A advertência de Noah não foi o suficiente, ela continuava rasgado e jogando as cartas no chão enquanto soluçava, lágrimas escorriam por suas bochechas delicadas. O loiro não conseguia respirar, observando os pedacinhos de baralho caindo ao redor dela. Ela amava tanto aquele baralho. Desde que Aislinn lhe dera, nunca mais havia largado.

Estava tão atônito e sem reação que mal notou quando Amara correu até Bethany, segurando os braços da menina e fazendo com que ela largasse as cartas em cima da mesa.

O baralho já estava completamente destruído, menos da metade permanecia intacta.

— Beth — sussurrou Amara, abraçando a menina por trás e afastando-a do tarô. Bethany se debateu por um momento, mas então desabou numa crise de choro e se encolheu, o corpo inteiro tremendo enquanto soluçava forte.

Amara deu a volta na cadeira e continuou abraçando Bethany, tentando reconfortá-la. A menina engasgava-se, mal conseguindo respirar entre as lágrimas, o fôlego pesado e incompleto.

Noah considerou se deveria pegar água, tentar acalmá-la. Não tinha certeza se era apenas uma crise de choro, ou uma crise de pânico, mas Amara sussurrava algo suave que o loiro mal compreendia. Bethany tremia e tremia, Amara continuava tentando acalmá-la aos poucos.

— Liga para o seu pai, peça para ele vir — pediu ela, baixinho e com certa gentileza na voz. Noah pegou o próprio celular com as mãos trêmulas, ignorou o próprio pânico quando procurou o número de Liam.

« ♡ »

Liam chegou poucos minutos depois, ficou ao lado de Bethany o tempo inteiro e aos poucos conseguiu acalmá-la. Ele fazia perguntas num tom suave, tentando desviar o foco dela do pânico e finalmente conseguiu fazê-la falar, diminuir a força da respiração.

Noah ficou observando tudo, encolhido numa cadeira e tentando conter as próprias lágrimas.

Depois de três copos da água e quase uma hora ajudando Bethany, finalmente a levaram para casa. A menina não disse nada, subiu para o próprio quarto e se jogou na cama, dormiu logo depois.

Noah ficou na sala pelo resto da noite, tentando abafar a vontade de ligar para Nicholas. Não queria ficar sozinho, mas também não queria atrapalhar o pouco tempo que Nicholas tinha com o pai, então pegou o notebook para ler sobre o arcano d'A Morte.

Era uma carta que assustava a maioria das pessoas, mas sua interpretação não era tão literal quanto a figura e o nome. A Morte falava sobre fim de ciclos e a metamorfose para um outro caminho, raramente representava morte física — embora, no caso de Sara, tudo parecesse muito literal. A metamorfose de seus poderes, o fim de um ciclo e vida humana para se tornar uma líder infernal.

Estava naquele estado entorpecido, mal absorvendo as palavras na tela do computador, quando seu pai lhe chamou.

— Comprei pizza, deveria comer alguma coisa — sugeriu ele, e Noah apenas assentiu. Talvez a pizza lhe ajudasse a voltar para a realidade e esquecer a imagem de Bethany soluçando e rasgando o baralho.

Liam não comeu, Noah afundou na cadeira da cozinha e mordiscou alguns pedaços de uma pizza de queijo. Não estava com fome, seu pai fora para a sala e agora falava baixo ao celular, andando de um lado para o outro. Não sabia se era o psiquiatra de Bethany, ou talvez Rafael ou Naomi, até mesmo Camila.

Noah conseguia vê-lo da cozinha, enquanto estava sentado na ponta da mesa. Por isso viu quando Bethany desceu as escadas, os cabelos presos numa bagunça emaranhada e as chaves do carro na mão.

Tinha uma mochila nas costas, era a mochila que usava quando precisava levar roupas e coisas mais pesadas.

— Eu vou sair — anunciou ela, girando as chaves entre os dedos e se dirigindo para a porta. Liam desligou o celular e colocou-se na frente dela, as sobrancelhas erguidas com incredulidade.

— Para aonde vai?

— Para o apartamento da mãe, vou ficar lá — disse Bethany, tentando dar um passo à frente. Ele continuou a encarando, bloqueando sua passagem sem nem ao menos considerar a ideia dela.

— Não, não vai sozinha.

— Sim, eu vou. Não pode me tratar como uma criança e me dizer o que fazer. — A menina desviou de Liam, desta vez chegando até a porta. Seu pai se virou para ela de uma maneira rígida.

— É quase meia-noite, você pode esperar até amanhã. — Bethany parou por um momento, apertando a mão em volta da chave do carro.

— Não, não posso. — O tom dela era tão duro e inquestionável que Noah se assustou. Ela nunca havia falado assim com Liam, havia tanta raiva em suas palavras que era assustador. — Você vai fazer o quê? Pegar meu celular? As chaves do carro? Até quando vai fazer isso e agir como se eu não pudesse fazer minhas próprias escolhas? — Bethany se virou para ele, desafiando-o com os olhos completamente escuros, esperando que ele fizesse alguma coisa. Noah estava se levantando no mesmo momento, observando a postura ríspida do pai. — Não estou pedindo sua permissão, só estou dizendo que estou indo para lá — informou ela, girando mais uma vez a chave e se virando para a porta. Liam estava prestes a falar alguma coisa quando Noah correu para a sala e pigarreou, chamando a atenção dos dois. Precisava apaziguar aquela briga antes que piorasse.

— Se você vai, eu vou também — afirmou com toda a firmeza que possuía, quem sabe assim Bethany desistisse daquela loucura.

— Não...

— É minha casa também, tenho as chaves. Não pode me expulsar de lá — interrompe-a, entrando numa guerra de olhares com a menina. Manteve-se firme, sem desviar os olhos dos dela. — Não vai ficar sozinha. — Bethany gemeu de maneira frustrada, mas Noah não recuou.

— Você não está entendendo, eu não vou voltar para cá. — Ela se voltou para Liam, cheia de dureza. — Quem sabe assim você possa morar com Candace e esquecer mamãe completamente — Bethany não deu mais satisfações, apenas se virou e saiu, batendo a porta com força. Os outros dois ficaram em silêncio, perplexos e sem saber como reagir àquilo.

Noah piscou, se virando para o pai e sabendo que precisaria tomar alguma atitude para acalmar a situação antes que tudo explodisse. Liam estava um tanto tenso, os lábios e maxilar pressionados.

— Eu te ligo assim que chegarmos lá — prometeu o menino, então correu para fora e foi atrás da irmã.

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro