Capítulo onze
- Lisa?
- Hã? Oi? - desperto de meu transe com um sobressalto. Aquela situação com os gêmeos me deixou tão aérea que mal toquei na comida. Será que...?
- Está tudo bem? Está tão quieta. - Caleb lança um olhar preocupado e desconfiado, não faz ideia de como passei a tarde. Sorrio de forma boba.
- Está tudo bem, sim. Eu só estou lembrando de um romance que li hoje no celular.
- Certo. Mas trate de comer, ok? Não quero prato cheio.
- Não se preocupe, pai. Como foi seu dia?
- Hoje eu só treinei. Estou exausto, detalhe. Com licença. - ele já levantava da mesa com prato e copo nas mãos quando lembrei de uma coisa.
- Não! Eu tenho uma surpresa para vocês. - corro até a cozinha, abrindo a geladeira e tirando uma vasilha transparente de tampa azul. - Luzia trouxe mais cedo, são amostras dos doces que ela pretende vender junto com os bolos. - menti com um sorriso treinado.
- Parecem ótimos. Depois agradeça a ela por nós.
- Sem dúvida.
Já estava arrumando a cama quando Thiago entrou no quarto com um olhar agitado e me chama a atenção em silêncio.
- Lisa, eu sei que te deixei ir hoje nos gêmeos. Mas não poderá voltar lá pelo resto da suspensão, ok? Seu pai ficaria uma fera comigo e com você. Afinal, isso é uma punição pelo seu comportamento.
- Certo. Mas... Eles podem vir aqui?
- Lisa, querida, não. Você está em casa, mas não está de férias. Precisa estudar. As provas se aproximam e você sabe disso mais do que ninguém. Por favor, não torne isso mais difícil.
- Tudo bem, pai.
- Sabia que podia contar com você, estrelinha. - seus lábios depositam um beijo em minha testa antes de ele sair do quarto.
Não consigo evitar uma pontada de tristeza. Quer dizer, são meus melhores amigos desde... Desde sempre! No entanto, não posso tirar a razão dele e de Caleb. Fui suspensa da escola e preciso arcar com isso.
Deito e puxo as cobertas para mim. Poderia ir até o armário pegar minha lâmina, balanço a cabeça em negação. Não é disso que preciso agora. Preciso mostrar que não sou a pessoa violenta que Dália criou para a diretora e meus pais.
Pela porta entreaberta, vejo todas as luzes se apagarem e o apartamento afundar no mais puro silêncio. Viro de um lado para o outro, eles estão demorando mais do que o normal. Será que está tudo bem? Fico de pé e, enquanto estou trancando o quarto, ouço meu nome do lado de fora. Ando rapidamente até a janela com um grande sorriso, porém minha intuição diz que algo está diferente hoje.
- Oi, gente. Por que demoraram?
- Nada demais. Ficamos esperando Diego, mas ele disse que iria ficar em casa hoje. - contou Bia com um tremor na voz. Estão me escondendo alguma coisa e eu posso sentir.
- Está tudo bem com ele?
- Sim, sim. Ele só disse que estava exausto. - concordei em silêncio, mesmo sabendo que eles não estão vendo.
- Ih, gente. Deixa a tristeza para outra hora. E aí, Lisa qual o seu passatempo favorito? - Caio está tentando se parecer com o amigo, afinal Diego sempre foi o mais animado do grupo.
- Hum... Eu gosto de aprender línguas novas e fazer doces com meus vizinhos. E vocês?
- Eu adoro tudo relacionado à arte. Pintar, desenhar, cantar, entre outras coisas. - respondeu o garoto com um entusiasmo genuíno de alguém que fala de uma paixão profunda e antiga. Posso jurar que seus olhos estão brilhando, mesmo que não o esteja vendo. - Também gosto de jogar videogame com o Diego e a Bia.
- Só que eu sempre venço. Está até ficando sem graça, sabe? - sem mais nem menos, rimos. - Além de vencer dos meninos, adoro praticar parkour e lutas com minha irmã. - ela fala com confiança e orgulho.
- Bia radical! - brinco antes de rir mais. De repente, fico um pouco séria e pensativa. - E medo? Vocês têm algum medo?
- Hum, eu tenho medo de agulhas e hospitais. Acho que é normal.
- Eu tenho pavor de altura.
- Como você pratica parkour se tem medo de altura?
- Bom, minha irmã me incentivou a praticar exatamente para perder esse medo. Talvez esteja dando certo. Eu não sei. E você? Do que você tem medo?
- Eu... - inspiro profundamente. Não é muito fácil explicar o meu medo. - Eu tenho medo de estar viva.
- Hã? Como assim, Lisa?
- É que... Tudo é tão difícil. Viver é complicado, sabe? E eu tenho tanto medo disso. Vidas influenciam vidas, escolhas influenciam escolhas. Tanto de maneira boa, quanto de maneira ruim. Eu não gosto da possibilidade de decepcionar as pessoas que eu amo, mas parece inevitável.
- E é. É inevitável, Lisa. Ninguém é perfeito e ninguém agrada todo mundo o tempo todo. Mas isso é normal. É sinônimo de viver e não precisa ter medo disso. Afinal, quando é amor de verdade, a gente não larga de jeito nenhum.
- Você é muito inteligente, Caio.
- Não, eu não sou. Minha mãe é psicóloga e, talvez, eu já tenha me acostumado com algumas situações e saiba reagir a elas.
- Faz sentido.
- Por falar nisso, se quiser, ela pode te atender e te ajudar.
- Obrigada, mas acho que posso vencer isso. Sem ninguém.
- A questão é que você não precisa passar por isso sozinha. Afinal, estamos aqui com você. - comentou Bia. - Se quiser, podemos te acompanhar nisso.
- Muito obrigada. De verdade. Eu prometo pensar, ok? Ficam mais tranquilos assim?
- Com certeza. - o uníssono chegou a ser engraçado. O que não era engraçado com eles?
- Queria poder descer até aí e levar docinhos.
- Nunca recuso um bom doce. - disse o garoto animadamente e tenho quase certeza de que a garota está concordando com a cabeça. - E que tipo de docinho tem aí?
- Brigadeiros. Brigadeiros enrolados em confete e em lascas de chocolate amargo.
- Ah, Caio. Nem pergunta mais. Não vim aqui para passar vontade. - ficamos quietos por um momento até que ela retoma a palavra. - Lisa, o que acha de nos conhecermos na festa de fim de ano da nossa escola? Vai acontecer na Sonhos Diversos. Como é aqui perto, vamos estar próximos querendo ou não. A gente te espera aqui embaixo e nos conhecemos enquanto andamos para lá.
- Vocês me dão um banho de sabedoria, hein? Bom, se não for tirar muitas horas de sono de vocês, acho que é uma ótima ideia.
- Não tira, fique tranquila. Só temos que resolver direito com o Diego também.
- Já estou ansiosa para a festa.
- Estamos, Lisa. Estamos.
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