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Capítulo dez

- Lisa? Oi! Você não deveria estar na escola?

- Deveria... - não queria explicar toda a história ali no corredor. Ela percebeu minha hesitação e abriu mais a porta.

- Entra. Julian não está.

- Obrigada. Espero não estar atrapalhando.

- Você nunca atrapalha. Mas o que houve? Está tudo bem?

- Sim, está. É que eu fui suspensa por três dias. - meus olhos se recusavam a parar no rosto de Luzia, eu estou envergonhada demais para suportar mais olhares estranhos.

- Oi? O que houve?

- Uma garota disse coisas homofóbicas contra meus pais e eu dei um tapa nela.

- Uau! Lisa, você é incrível!

- O-o quê? - precisei analisar até as menores nuances de sua face para ter certeza de que ela falava a verdade.

- Não é todo mundo que tem essa coragem.

- Essa coragem me custou três dias de aula.

- Deixa disso, você vai tirar esses dias de letra! O que importa é que você reagiu a algo que não acha certo. Mostra o caráter que você tem.

- Você é muito otimista, Lu.

- Não sou não, Lisa. Apenas tento ver a parte boa de uma situação ruim.

- Isso não é ser otimista?

- Prefiro chamar de observadora.

- Então você é muito observadora, Lu.

Ela ri e eu sorrio sem mostrar os dentes. Logo depois, suas feições voltam a apresentar preocupação.

- Bom, que clima mais "pra baixo", não é? Vamos animar esse lugar.

- E o que tem em mente, senhorita Luzia?

A menina não responde, apenas liga o celular e procura algo rapidamente. Quando ela parece achar essa coisa, liga a tv e conecta os dois aparelhos.
Fico sem entender ao vê-la se levantar do sofá com um sorriso ansioso.

Get up on the floor
Dancin' all night long
[...]

Luzia aumenta o volume e deixa o corpo seguir a batida, como se estivesse esperando por isso.

- O que você está esperando? Get up on the floor, baby! - deixei que ela me levantasse.

Demorei um pouco, mas entrei no ritmo. Quando vi, já estava cantando a letra e fazendo da sala uma pista de dança.
Diversas outras músicas animadas vieram depois dessa, fizemos questão de dançar todas.
Pude sentir toda a energia ruim indo embora junto com o suor a cada girar de calcanhares. Não conseguíamos parar de sorrir.
Era como se a felicidade morasse naquelas batidas, mas não. Ela morava em Luzia e em mim. Talvez ela não apareça muito na minha vida, porém parecia explodir quando eu estava com os gêmeos.
Somos as rainhas de nosso próprio baile particular e não tinha espaço para nada de ruim.
Depois que a playlist acabou, atacamos algumas trufas de leite em pó que estavam na geladeira, enquanto nos entretíamos com uma série qualquer.

- E como vão os negócios, Lu? - pergunto entre um episódio e outro.

- Meu irmão foi entregar três bolos hoje, acredita? Ainda temos uma encomenda temática à noite.

- Jura? Isso é ótimo!

- Sim! Estamos pensando em vender docinhos também. Mas seria um pouco mais para frente, precisamos respirar um pouco antes de mergulharmos em um novo projeto.

- Concordo plenamente. Se quiserem ajuda na organização, estou à disposição.

- Talvez precisemos sim. Obrigada.

- Não precisa me agradecer. É minha melhor amiga.

- Aaaa, você é um amor, Lisa! - deixo seus braços envolverem meu corpo em puro carinho.

- Que honra! Minhas duas garotas favoritas reunidas em um lugar só! Querem um abraço? - insinuou Julian ao passar pela porta todo suado das pedaladas.

- Que nojo! Vai tomar um banho! - gritamos em uníssono.

- Ah, vão fazer essa desfeita? - ele começou a correr atrás de nós. Levantamos do sofá e fugimos em direção ao banheiro, fechando a porta. - Como querem que eu tome banho se estão no banheiro?

- Vamos fazer o seguinte, Lu. - sussurrei para a garota que não parava de rir. - Coloca uma música alta, eu ligo a torneira da banheira e, quando ela estiver cheia o suficiente, abrimos a porta. Temos que ficar ao lado da porta quando ele entrar.

- Porque ele vai nos procurar, não é? - afirmo com a cabeça.

- E quando ele se virar para nós, estará de costas para a banheira.

- E então, jogamos as esferas de sais de banho para derrubá-lo! Ótimo plano!

A batida começou alta, não ouvimos se Julian reclamou, mas com certeza está se questionando o que estamos aprontando.
Ah, ele não perde por esperar!
Depois do plano montado e munidas dos sais de banho, abrimos a porta, tomando cuidado para que ele não nos visse.

- Vocês podem correr, mas não podem se esconder! Mas o quê...?

- ATACAR! - as esferas pareciam uma chuva roxa, já que o aroma era de lavanda e o garoto recuou até cair de costas na banheira.

- Vocês me pagam!

Em pura gargalhada, retornamos à sala, mas Julian não vem atrás, decretando nossa vitória. O sofá era nosso maior cúmplice, tanto em momentos sérios quanto nos mais descontraídos.

- Isso foi incrível!

- Com certeza foi!

- Ei, amanhã é quarta, não é? - confirmo com a cabeça - Então é dia de eu entregar as encomendas. O que acha de fazermos uns docinhos hoje e eu oferecer aos clientes?

- Perfeito!

Pego o leite condensado, o creme de leite e a manteiga na geladeira enquanto Luzia pega a panela, o chocolate em pó e os confeitos para enrolar. Colocamos as toucas e o avental, rindo de nossas próprias imagens.

Tudo estava relativamente bem, até que ela falou algo que gelou meu corpo todo:
- Lisa, por que você não tira essas luvas? - olhei para todos os cantos, não conseguindo pensar em uma boa desculpa. Quer dizer, eu poderia falar que é estilo, não é? Ela não tem motivo para duvidar de mim, tem?

Mas não precisei responder, Julian me salvou ao entrar na cozinha com seu sorriso radiante e desafiador. Por um instante, não consegui focar em mais nada além de sua imagem composta de uma bermuda jeans e uma blusa quadriculada de botão até a gola. Seus cachinhos pequenos e numerosos estavam com pouco volume e molhados do banho.

- Acho que não é prudente buscar minha revanche em um lugar que tem fogo. O que estão fazendo, garotas?

- Docinhos. - disse a irmã, passando um pouco de leite condensado na ponta do nariz dele.

- Ei, eu acabei de tomar banho. Vou jogar as duas na banheira, ok? Mas por que estão fazendo Elisabeths?

- Eu não acredito que você fez essa piada! - reclamei com um largo sorriso no rosto. - Você precisa ser parado, garoto!

- Está bem, está bem. Eu já disse que você fica linda de confeiteira? - ele também coloca touca e avental, enquanto vem até mim e dá um beijo em minha bochecha. Tenho quase certeza de que minha pele ficou da cor do meu cabelo.

- Ei, querem ficar a sós, pombinhos? Nunca imaginei que iria segurar vela para o meu irmão! E com minha melhor amiga? Não creio! - ok, eu já posso sumir.

- Não tem nada a ver, Luz. Está com ciúmes? Quer um beijinho na bochecha também?

- Guarde seus beijinhos para o seu amor! - e os dois soltaram altas risadas. Cheguei a sorrir e até forçar eu risinho, porém estava plantada no mesmo lugar.

Como reage a isso?

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*Notas da autora*

A música que apareceu no capítulo é "Dancin", de Aaron Smith.

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