O dia em que tudo aconteceu
Estou nesse mundo há tempo demais para uma só vida e, se hoje escrevo, é porque finalmente eu estou perto do fim. Você que está lendo pode não acreditar, mas já faz mais de um século que eu não envelheço um ano sequer, permanecendo assim com meus eternos 17 anos. Pode parecer, a princípio, que não envelhecer é algo bom, ou até mesmo invejável, mas receio dizer que a desilusão enfrentada pela vida, me mostrou que o medo da morte é o que nos torna vivos e nos faz levantar todos os dias querendo aproveitar ao máximo.
Tive a dádiva do tempo tirada de mim no ano de 1578, o dia em que meu vilarejo fora atacado. Naquela época acreditava-se em bruxas, diriam os historiadores atuais. Enquanto eu, certamente, digo de outra forma: Naquela época sabiam-se das bruxas. Infelizmente, hoje restaram poucas delas, se é que ainda existem, considerando que já faz mais de 150 anos que não vejo uma. (se você que está lendo for uma bruxa\bruxo, favor me contatar, caso eu ainda esteja vivo, no número que estará indicado no último capítulo desta história). Por fim, vejo que muitos relatos foram modificados com o intuito de não causarem pânico, como por exemplo, o famoso caso de Dom Sebastião. Para você que não o conhece, ele era rei de Portugal e desapareceu na Batalha de Alcácer-Quibir, na África, e até hoje não se sabem o que aconteceu com ele. Você pode achar isso normal, mas o engraçado é que depois de seu desaparecimento criou-se uma lenda. Assim, para a crença de muitos, Dom Sebastião retornaria para o seu povo, criando-se algo parecido com uma religião, chamada de Sebastianismo (Atenção: Se você for sebastianista é melhor não ler os próximos capítulos, pois será revelado algo que talvez você não goste... A verdade). Eu não estou mentindo, pode pesquisar na internet, o sebastianismo é real. Por fim, sei que deve estar se perguntando se cheguei a conhecê-lo, digo, o rei de Portugal, mas preciso esclarecer algumas coisas antes de contar toda a verdade.
Tudo começou em Agosto, de 1578, em um pequeno vilarejo no interior de uma cidadezinha bem pequena em Portugal. Nunca gostei muito de romantizar as situações, até porque o romantismo só entraria em vigor no século XVIII, mas aquele vilarejo tinha belíssimas árvores, eram grandes e espalhadas por um vasto terreno plano e verde, coberto por flores de todas as cores. As pessoas caminhavam pelas estreitas ruas com olhares alegres, algumas em suas lindas casas. Ouvia-se o som da natureza, o cantar dos pássaros, o som do galopar dos cavalos, que era o meio de transporte da época, tudo em perfeita harmonia... Você que está franzindo a testa se perguntando que lugar encantado é esse em pleno século XVII, calma! Eu estou brincando. Vou trazer um pouco de realismo para este relato. Era um vilarejo sujo, repleto de doenças por conta do lixo que era despejado nas calçadas, pois naqueles tempos não se tinha o conhecimento que hoje a medicina nos trás; em outras palavras não sabíamos da importância de um saneamento básico. Minha família tinha bastante dinheiro, morávamos um pouco afastado do vilarejo; era um terreno plano e verde, enorme, não havia árvores, postes ou qualquer coisa que intervisse a vista do céu à noite. Nada fora do comum acontecia naquele lugar. Mas isso não durou muito. Foi em uma clássica noite chuvosa em que tudo começou.
Eu estava deitado em meu quarto, dormindo ao som de trovões, quando ouvi, se aproximarem de minha casa, um galopar de cavalos. Levantei rapidamente e olhei através da janela de meu quarto, cuja vista seria impecável se não fosse pela escuridão afora. Era uma carruagem, havia uma mulher e um homem, mas isso eu ainda iria descobrir. Ouvi batidas na porta. Meus pais logo acordaram assustados. Meu pai, sempre desconfiado, se aproximou da porta sorrateiramente. Eu podia pressentir algo de ruim, acho que todos em uma situação dessas naquela época sentiriam o mesmo que eu. Eu saí de meu quarto, que se localizava no andar acima da casa, de frente com uma longa escada que ficava de frente a porta de entrada. Minha mãe tremia, segurando o braço de seu marido, que finalmente girara a maçaneta e abrira a porta...
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