Hoje está tendo show na praça!
O som do rádio estala e a voz animada do radialista invade o ambiente.
"Alô, alô, meus queridos ouvintes! Como é que vocês estão? Tá todo mundo aí grudado nesse rádio velho ou estão me traindo com a televisão, hein? Hoje é um dia especial! A gente tem uma EX-PO-SI-ÇÃO de arte na praça! Isso mesmo, a nossa querida praça central tá um luxo só, meus amores. Eu até queria estar lá no meio da muvuca, mas adivinha? Essa desgraça de trabalho me prendeu aqui. Maaaasss... a produção é boazinha comigo. Botaram uma TV aqui na minha frente, então eu vou narrar tudinho pra vocês! Quer saber? Eu vou transformar isso aqui numa experiência interativa. Quem tá comigo levanta a mão! Hahaha! Vamos começar!"
A coisa bate palmas e puxa um ar exagerado.
"Tá começando, tá começando! Primeira apresentação da noite, meus queridos ouvintes: 'Meus novos amiguinhos!' Olha só que nome fofo! E quem tá por trás disso? A Liza! Ah, essa menina sempre foi criativa, mas agora ela tá ultrapassando todos os limites, viu? Parece que ela resolveu... hmmm... como posso dizer... dar um upgrade nos bichinhos de estimação dela. Vamos ver como ficaram?"
"Ahhh, que coisa LINDA! Olha só: os gatos dela... Meu Deus do céu! A pele das costas foi toda arrancada, e as costelas estão presas em umas estruturas que lembram asas! Uma obra de gênio, hein? E o maxilar... arrancado, claro, porque ninguém gosta de um gato reclamando, não é mesmo? Genial, Liza! Genial! Agora, a cachorrinha dela, a belinha... Ah, minha doce Belinha, que espetáculo! Sabe o que ela fez? Arrancou tudo do abdômen pra baixo e costurou o corpo de uma lebre no lugar! Hahaha! E aquelas orelhas grandes que a Liza sempre odiou? Fora! Liza, você me surpreende, minha querida! Aplaudindo de pé aqui no estúdio!"
Ele está eufórico.
"E agora... agora... 'O Menininho do Milho!' Aaaah, meus ouvintes, vocês não vão acreditar nisso. Um menininho com a pele cheia de texturas de milho. Lindo demais! Tá podre em algumas partes, mas quem se importa? Olha só! Tem um monte de crianças sorrindo, felizes da vida, começando a devorá-lo enquanto ele canta! Ahhh, que espetáculo maravilhoso! Vamos cantar junto com ele, gente!"
A voz da coisa não parece a mesma.
"Milho docinho, come com carinho,
No meu braço, no meu rostinho,
Mastiga, mastiga, até o final,
Sou o milho que você vai amar!"
"Hahaha! Maravilhoso! Isso é arte, minha gente! Isso é emoção! Isso é... nossa cultura!"
"Agora, a próxima obra: 'Novos meios de comunicação.' Eu tô vendo aqui e, olha, eu tô emocionado. Dona Laurinda se superou, meus queridos! Ela conseguiu DOBRAR essa 'coisa' de um jeito... Nossa! Parece impossível! Sabe o que é? É um orelhão! Sim, aqueles de antigamente, que você usava pra ligar pra sua tia fofoqueira. Mas, dessa vez, a cabine é um ser humano todo dobrado e amassado. Que OBRA! Que mente brilhante! Laurinda, minha rainha, você merece todos os prêmios do mundo!"
O radialista bate na mesa de novo, com força, ele está adorando.
"E pra fechar a noite com chave de ouro, temos... espera aí, o quê? Não, não, não! Isso é uma PIADA! Eu não acredito que botaram isso aqui. Essa MERDA é um espetáculo? Vocês tão brincando com a minha cara!?"
Sua voz muda. É sombria, furiosa, carregada de ódio.
"Eu vou matar vocês! TODAS VOCÊS, SUAS BISCATES! E ESSES VIADINHOS?"
A coisa... tá diferente.
"Isso... ISSO É UMA OFENSA! UMA OFENSA À ARTE! EU NÃO VOU PERMITIR!"
"Me aguardem! Peraí, licença, meus ouvintes... Eu volto já.
Tem alguma coisa rasgando... carne. Ele está tremendo, o que é isso em seus cotovelos?
"Eu sou a verdadeira ARTE!"
O som da TV toma conta da transmissão. Gritos de pânico, seguidos por o barulho de carne sendo despedaçada, ossos quebrando, e passos frenéticos tentando escapar. Essa risada... é ele, ele está lá, ele É a ARTE.
Estática.
Transmissão encerrada.
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