Hospitalizado
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12:00
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Levamos ele rapidamente a emergência da escola. Eu contei tudo que havia acontecido em detalhes e elas o encaminharam ao hospital da cidade. Disseram que ele estava em estado grave e que só poderíamos ir junto caso fossemos a pé. O diretor resolveu pegar férias, mas isso até que foi bom, caso contrário não teríamos como sair dessa prisão. Apenas conversamos com a direção, que nos deixaram acompanhá-lo. Nathaly veio o caminho todo esclarecendo a história para Gustavo.
Estamos na sala de espera enquanto ele foi com urgência para o pronto socorro. Estou muito apreensivo, tenho medo do que pode ter acontecido com ele. Não consigo ficar quieto, preciso de informações. Será... que ele vai sobreviver?
— Dá pra você se acalmar? — Pergunta Nathaly, sentada ao lado de Gustavo.
— Você fala como se fosse a coisa mais fácil do mundo. — A olho de canto.
— É, eu sei que não é, mas ficar andando de um lado para o outro igual uma barata tonta não vai te ajudar em nada. — Diz ela.
— Você está dizendo isso, por que não foi o Gustavo que caiu nos seus braços desacordado e cheio de droga na boca! — Merda. Para de aumentar o tom, Guilherme, se controla! Depois de uma longa pausa e de uma respiração bem funda, eu me acalmo e enxugo as lágrimas alheias que insistem em cair. — Desculpa.
— Tudo bem, eu sei que você está nervoso. — Responde Nathaly vindo até mim e me abraçando firmemente. — Ele vai ficar bem, tá?
— Uhum.
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13:30
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O tempo parece não passar, cada minuto parece uma eternidade e a agonia que me faz roer as unhas não me deixa descansar. De repente um médico aparece na recepção. Uma pontada de alegria me assusta e envolve meu peito, um sorriso involuntário se faz presente.
— Parentes do Caio?
As esperanças que criei em nanosegundos parecem ter sido atropeladas por um trem. Por que o mundo é tão cruel?
— Estamos aqui! — Uma mulher se levanta junto a uma menina, eu a identifiquei imediatamente.
— Tenho duas notícias, — Diz o médico. — a primeira é que o transplante foi bem sucedido.
As duas soltam a respiração e suspiram aliviadas. Mas a feição do médico revela que o que vem a seguir não é muito bom.
— Mas? — Pergunta a menina estranha. O médico suspira.
— A cirurgia teve algumas complicações e ele terá que ficar na UTI por um mês, é apenas um tempo estimado.
— Ele vai sobreviver, não vai? — Pergunta a menina.
— Não quero dar falsas esperanças, mas tem sim chance de sobrevivência.
A menina encara o médico.
— 33% de chance de ele sobreviver à complicação.
A mãe parece arrasada. O médico se oferece para levá-las uma de cada vez à sala dele. A menina insiste para que a mãe vá primeiro. Assim é feito.
— O que está fazendo aqui? — Ela pergunta pra mim.
— O Rafael foi encaminhado pro pronto socorro. Não temos notícias dele. — Meu semblante tristonho não a surpreende.
— Estava na hora. — Diz ela.
— Você... sabia? — Pergunta Nathaly. — Como?
— Não contou sobre mim para eles? — Está todo mundo com olhar confuso. — Ok, isso não importa agora. E sim, eu sabia, mas não podia revelar tudo assim, de uma vez.
— Entendi.
Todos nós sentamos, e mantínhamos o ambiente quieto. Todos estávamos pensativos. O silêncio foi quebrado pelo barulho distante dos passos de outro médico que se aproximava.
— Parentes do paciente Rafael? — Diz, o médico em tom de voz elevado.
— Aqui! — Respondo, indo em direção a ele.
— Você é o parente mais próximo?
— Sim, sou eu.
— Estudante de medicina? — Pergunta o médico.
— Sim. — Respondo rápido.
— Bom... devido às condições do paciente, tivemos que impedir a insuficiência respiratória aguda causada pelo excesso de melatonina antes que se agravasse e resultasse em hipoxemia. Fizemos a Intubação Orotraqueal e conseguimos estimar a quantidade de remédio no sangue dele. E é uma quantidade fatalmente alta. Ele está tomando melatonina a meses e pelo seu histórico médico e familiar, ele já havia se drogado antes, mas, depois de uma série de dores de cabeça, confusão mental e sonolência extrema, ele havia parado de tomar. Porém, depois de pouco tempo depois de recuperado, ele cedeu ao remédio novamente e tentou uma morte por overdose de melatonina. Os principais sintomas de overdose de melatonina são: sonolência excessiva, sonhos vívidos ou pesadelos à noite, agitação, irritabilidade, nervosismo, dor de cabeça, tontura, náuseas ou vômitos.
— Ele relatou tudo isso! Como eu não percebi!? — Grito comigo mesmo.
— Então a mudança de comportamento repentina foi... por causa do remédio!? — Pergunta Nathaly.
— Sim, é um dos diversos efeitos colaterais da melatonina. Cefaleia, que é a dor de cabeça relatada constantemente, irritabilidade, mudanças de humor, confusão mental, tontura, náuseas e sonolência extrema.
Eu não consigo falar, meu corpo não se move. Minha cabeça está uma bagunça e meu pensamento diz que a culpa é somente minha. A vida dele era perfeita e eu estraguei tudo. Minha boca treme, minhas mãos suam frio, minha cabeça pesa e minha consciência me culpa. Minha garganta se fecha num nó e meu estômago dói. A única reação consciente do meu corpo é o choro que escorre sem cessar pelas minhas bochechas.
— Ele vai sobreviver? — Pergunta Gustavo, sentado ao lado de Nathaly.
— Não tem muitas chances... logo daremos liberdade para visitação. — Conclui o médico.
— Ok... obrigado. — Digo a ele.
— Com licença. — Diz o médico enquanto se retira.
— O-olha Guinho, vai ficar tudo bem, ok? — Tenta Nathaly vindo em minha direção.
Eu não consigo olhar para ela. Apenas a ignoro e vou ao lado de fora do hospital. A visitação provavelmente vai demorar alguns minutos, que são suficientes para me desfazer pelo menos um pouco do peso que carrego. Nathaly não tenta outra vez. Ela fica do lado de dentro junto a Gustavo. Os chuviscos que me pegaram de surpresa começaram a umedecer meus fios castanhos e quando a chuva engrossou, aproveitei para chorar sem medir esforços. Como se apenas a água da chuva escorresse pelo meu rosto. Chorei como se não estivesse chorando, mas quando a ficha caiu e percebi que o amor da minha vida e o único talvez não fosse sobreviver, a culpa veio à tona e comecei a chorar sem conseguir parar. Estava ficando alto, nunca havia chorado daquele jeito. Senti uma mão no meu ombro e me virei para abraçar quem quer que fosse. Abracei com mais força que o necessário, estava precisando. O abraço foi retribuído com a mesma força.
De repente uma voz feminina me chama. A hora da visitação havia chegado. Me soltei do abraço e vi Gustavo com a roupa toda molhada, mas não mais que a minha. Fomos para dentro do hospital e o médico sinalizou para que eu o acompanhasse.
— Podem ir, eu não vou embora tão cedo. — Digo para eles e então, assentem em concordância.
Seguimos por um longo corredor e completo silêncio, quebrado apenas pelo barulho dos passos e das gotas de água que escorriam do meu ser. Chegamos à uma porta branca e o médico abriu a porta.
Vi a cena que mais corroeu meu peito.
(Chorem e finjam que este abençoado é loirinho)
— Vou deixá-los a sós. — Diz o médico. Ele fecha a porta devagar e eu consigo escutar seus passos se distanciando.
Eu me aproximo lentamente da cama em que Rafael repousava. Não se mostrava respirando. A máquina que registrava sua frequência cardíaca estava a 50 batimentos por minuto. Não quero perdê-lo. Não mesmo.
— Desculpa pelo que fiz você fazer... juro que não queria que aquilo acontecesse. — Encaro seus olhos fechados. — Era tão bom deitar no sofá pra maratonar a tarde toda... tenho saudade daquilo. Saudade da comida da sua mãe, das travessuras do seu irmão. Saudade do que a gente era antes de eu acidentalmente estragar nossas vidas. Por que você não foi o único que se prejudicou depois daquilo.
Respiro fundo. Aliso seu rosto delicado e volto a falar sem retirar a mão do seu rosto.
— Eu também sonho com o que aconteceu naquele dia... Você não tem noção do tamanho da culpa que eu imponho sobre mim mesmo. — Vejo ele abrir os olhos. Meus olhos estão lacrimejando. — Ah, para. Não quero que me veja chorando.
Viro meu rosto. Ele, com muita dificuldade levanta o braço e vira meu rosto para que eu olhe para ele. Mesmo com a tremedeira, ele consegue enxugar uma lágrima minha.
— Está bem, eu paro... desculpa.
Ele me olha com brilho no olhar. Mal tem forças para se mexer, falar é um desafio e mesmo assim, ele se ofereceu para fazer com que eu parasse de chorar. Ofereço um sorriso sem graça.
— Está se sentindo melhor? — Ele mexe a cabeça lentamente de um lado para o outro. Não se estende muito, afinal, a dor de cabeça ainda parece estar presente. — Não? Oh, meu amor. — Acaricio seus cabelos louros. Sua franja está bagunçada e ainda meio úmida. — Eu vou ficar aqui com você, tá bem?
Rafael pisca demoradamente. Eu me sento num banco ao lado da cama e entrelaço minhas mãos às dele. Deito minha cabeça ao seu lado e me deixo levar pelo sono. Fechando lentamente meus olhos, enquanto Rafael me observa.
...
16:00
...
Nathaly's P.O.V. 💜
Estou consideravelmente preocupada com os dois. Estou no nosso quarto e Gustavo está tentando me acalmar. Estamos fazendo o possível para não pensar em coisas negativas e como fazer isso?
É.
Assistir desenhos infantis. Meu Amigãozão sempre vai estar no top 1 da minha lista. Eu amo de paixão esse desenho. Estamos na frente da TV, na cama do Guinho. Gustavo está lutando contra o sono e eu estou deitada em seu peito. O lugar mais confortável do mundo. Guinho deve ficar por lá por bastante tempo, então não me admiro com sua demora.
Depois de muito tempo, em que eu e Gustavo lutávamos contra o sono, meu celular toca. Eu me levanto sonolenta e atendo. Gustavo olha para mim confuso e esfrega os olhos.
— Alô? — Digo.
— Nathaly! O Rafael teve uma overdose! — Diz Guilherme desesperadamente. Ele falou tão rápido que eu mal entendi o que estava querendo dizer. Não acreditei no que havia escutado. Não, eu devo ter escutado errado.
— O quê!? Calma, fala devagar! — Digo em tom de voz mais alto. Gustavo se assusta e me encara.
— O Rafael começou a sufocar, ele não conseguia respirar, os dedos já estavam azuis! Ele vomitou muito e a frequência cardíaca caiu de repente! — Diz. Noto seu choro.
— Você chamou os médicos? — Ô pergunta besta, nem parece que eu estava quase dormindo.
— Claro que chamei! Ele voltou para a sala de emergência... ah, Nathaly, se ele morrer eu não sei o que eu vou fazer! Logo quando a gente tinha se resolvido! E ele nem precisou falar nada! — Seu choro fica mais alto, e pelo barulho de carros no fundo, ele está do lado de fora do hospital.
— Estamos chegando! — Desligo e coloco o celular no bolso. — Vamos voltar pro hospital, agora foi pra valer.
— Ele teve uma overdose? — Assinto com a cabeça enquanto coloco meus calçados. — Vamos.
Ele coloca os sapatos também.
...
16:50
...
Chegamos. Guinho está deitado em dois bancos da recepção. Está claramente cansado. Eu e Gustavo ficamos sentados atrás dele. Estamos esperando notícias dele. Não quero acordar Guilherme, talvez ele fique ainda mais emotivo. Seus olhos estão inchados. Mal consigo acreditar que tudo que aconteceu foi efeito do remédio. Isso é assustador.
— Tenho medo do que pode acontecer com o Rafael. O Guinho vai enlouquecer se ele morrer. — Digo para Gustavo.
— Você está certa. Mas vamos na fé de que ele não vai morrer. — Ele nos aconchega ainda mais e eu descanso em seu peito. Minha cabeça dói de leve quando penso na possível morte de Rafael. Por mais que eu tente, é meio inevitável simplesmente deixar pra lá.
Quando eu estava prestes a fechar meus olhos, um médico aparece no começo do corredor. Eu cutuco Guilherme e ele abre os olhos.
— Ahn? — Diz, se espreguiçando.
— Parentes do paciente Rafael? — Diz o médico. Guinho logo se levanta e vai em direção ao médico.
—Estou aqui. — Responde Guilherme. O médico o olha com semblante tristonho.
— Trago... péssimas notícias...
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Miau - :P
CHOREM JEJHJWHEJHWJHEH
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