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24. Colaboração e boa fé

O som das ondas quebrando à beira da praia se tornou um som costumeiro, tranquilo, sinal de segurança. A água calma e constante, trazendo a maresia e a brisa salgada que envolviam a menina como um embalo materno e reconfortante. A escuridão nunca foi um problema, contanto que escutasse o som das ondas como certeza de estar em casa, de estar a salvo e segura de todo o mundo externo.

Não soube discernir entre o som de vidro estilhaçado e o cheiro de enxofre, como uma nuvem nebulosa sendo impregnada em seus sentidos, e logo sua cabeça pesou e seu coração disparou em alerta. Frida levantou da própria cama em um pulo, e a cada passo em direção da porta, o cheiro de enxofre inundava seu nariz enquanto mais vidro era quebrado como se estivesse ao seu lado.

Sua visão turva a permitiu reconhecer o próprio pai na porta do quarto, alarmado, em posse de uma arma de fogo carregada. E então a visão mudou para sua mãe, ou alguém que ela identificava como a própria mãe sem ao menos ter visto aquela pessoa na vida. Não reconhecia o rosto feminino, mas sentia seu peito bater mais forte em medo pela face desesperada da mulher.

O vidro estilhaçado vinha junto da imagem de seu pai, o enxofre vinha junto da imagem da mulher, e em certo ponto ela já não sabia dizer o que era real, se era um sonho, se tinha ido diretamente ao inferno e viveria eternamente em um ciclo tortuoso e repetitivo. Mas uma coisa ela pode reconhecer, o pedido vindo de ambos, para ela correr e se esconder.

Não soube a quem realmente obedecia, mas Frida o fez. O som de tiros veio junto do calor do fogo se espalhando pela residência, e ao mesmo tempo em que escutava seu pai discutindo com vozes desconhecidas, escutava a mulher implorar pela própria vida e pela família, pela vida de Frida, referida por um nome que ela desconhecia, mas identificava como sendo direcionado a si mesma.

O fundo falso do armário nunca pareceu tão pequeno, tão sufocante, Frida cobriu o rosto e em seguida as orelhas para não sentir o cheiro de carne queimada e o som dos tiros que se seguiram. E então vieram os gritos, seu coração apertou pela familiaridade das vozes, mas sequer conseguiria nomear aquelas pessoas.

"Não há mais ninguém aqui" as vozes de seu pai e da mulher se entrelaçaram em uníssono, em um lamento choroso e odioso, e ela soube que alguém estava ali e era a causa do fogo e dos estilhaços.

Lágrimas desceram pelo rosto de Frida, ela sequer conseguia enxugá-las. Parada, imóvel, com as bochechas úmidas e a incapacidade de emitir qualquer ruído, assim ela permaneceu enquanto os tiros continuavam e o calor apenas aumentava.

Até que os tiros cessaram, mas não o calor, e diferente da memória que tinha sobre aquele dia, o fogo chegou até o armário.

Mas não havia fogo, ele não a consumira com inteiro, e ainda assim as chamas continuavam pela porta amadeirada enquanto ela se desesperava para abrir as venezianas e o ferrolho derretido. Cada pedaço de madeira, cada roupa, cada fio de cabelo dela mesma, Frida sentia o ardor do fogo consumindo sua própria pele enquanto gritava por ajuda, mas a ajuda nunca chegou.

A porta carbonizada do armário foi arrancada, e de lá ela teve a visão de seu pai jogado ao chão, sem vida, com a blusa repleta de manchas vermelhas e pulsantes. Em paralelo à ele, a voz tão familiar agora jazia ao chão, tomada pelas chamas, enquanto outra pessoa se debruçava sobre ela aos prantos, em luto e em culpa.

Frida não soube dizer em que momento as duas cenas se misturaram, ou sequer se tinham correlação, mas sentia fazer parte de ambas, como órfã, como pessoa com medo, como pessoa levada pelas chamas, e isso bastou para que seus pulmões se recusassem a continuar puxando o ar.

Ela acordou em um sobressalto desesperado, ansiando por ar, ansiando por algo sólido para se segurar e sentir estar acordada, viva, longe daquele lugar. Um calafrio lhe percorreu a espinha enquanto suava frio, com os olhos bem abertos e brilhando no mais puro verde água mesmo que ela não pudesse enxergar.

Encolheu-se contra o lençol, olhou ao redor, o ambiente hostil e desconhecido passava longe da calmaria das ondas de sua casa na infância. Não havia som, não havia brisa, sequer o ar salgado da praia e sim a sensação de sufoco tomando de conta de sua garganta como se fosse a sufocar.

— Que merda é essa... — ela resmungou, baixo, levando as duas mãos até a cabeça em um breve momento de tontura.

Lembrava perfeitamente do dia em que perdera o pai e a mãe, lembrava dos tiros, lembrava da casa destruída e revirada como se um furacão tivesse tomado de conta da residência. Aquela era sua lembrança, sua última memória de quem a tinha criado. Ao mesmo tempo sentia como se a lembrança do fogo fosse sua, mas não tinha presenciado, e ela estava lá.

Trouxe os joelhos para perto do peito e os abraçou, encostou o topo da testa nos joelhos e assim permaneceu, na tentativa de entender do que aquilo se tratava e falhando miseravelmente. Sonhar com a noite da morte de seus pais sempre foi uma maldição a qual Frida tentou se acostumar, mas o fogo lhe era tão familiar quanto os tiros, e esse definitivamente a assombrava.

Limpou a lágrima no canto do olho, geralmente poderia levantar e procurar por Max para um abraço molhado ou Enyo para um abraço reconfortante, mas nenhum deles estava ali, e ela sequer poderia sair. Pior ainda, sairia, mas para o exato lugar de seu pesadelo constante. Culparia o medo de voltar pelo sonho confuso, mas infelizmente não teve tempo o suficiente para cultivar aquela culpa.

Duas batidas contidas na porta do alojamento puxaram Frida de seus pensamentos, mas ela não levantou para atender, entrariam de qualquer forma. Pela calma e cuidado das batidas, ela sabia se tratar de Miguel, uma situação considerada "menos pior".

Ele colocou a cabeça para dentro do quarto como um gato receoso, e rapidamente Frida tentou se recompor, jamais derramaria uma lágrima na frente de um estranho.

— Que bom que tá acordada — Miguel começou, mas não teve a chance de continuar a falar.

— O que eles querem agora? — Frida perguntou, incisiva, erguendo o queixo para o encarar.

— Convenci a senhora Jorani a pelo menos ser legal com você antes de te obrigar a ir, então você tem visita.

E por algum motivo, soou como se ela fosse ainda mais prisioneira do que já era. Frida demorou a pensar em alguém elegível para ser sua visita, até lembrar da única pessoa que o faria naquela situação. Ela abriu bem os olhos, se apressou para tirar o lençol de cima de si e levantar da cama, procurando seus sapatos com pressa.

Não se importava em sair do alojamento com o macacão usado para dormir, a farda daquela gente já parecia um pijama, e no momento outras prioridades tomavam conta de suas preocupações.

Quase empurrou Miguel para ele sair do quarto e a levar para ver a visita, por pouco o rapaz não tropeçou nos próprios pés enquanto caminhava pelo corredor. Na realidade ele temia que Frida o esfaqueasse com a força do pensamento caso não fosse logo, e embora ela realmente pudesse fazer isso no sentido literal, ele nem tinha ideia.

Dois corredores pareciam uma eternidade, Frida teria passado com tudo pela porta caso Jorani não estivesse pessoalmente a esperando do lado de fora de uma das salas da entrada da Base. Poderia passar por cima de Jorani também, mas isso seria insensato, Frida precisava se preservar ao máximo.

— Senhorita Selistaz. — Jorani acenou com a cabeça.

— Oi — Frida respondeu, simplesmente, tentando manter a calma e conter a vontade de ignorar a presença da oficial.

— Espero que saiba que qualquer tentativa de fuga seria encarada como traição da sua parte, e como voto de confiança meu, vou deixar o Miguel encarregado de seu bem-estar — Jorani informou, sem olhar diretamente para Frida enquanto checava o próprio relógio. — Tem dez minutos, me encontre na sala do General assim que sair daqui.

— Por que?

— Porque confio que tem o mínimo de bom senso e vai fazer o que é certo. Vamos receber outra de vocês em uma situação muito parecida com a sua e com a do Viktor, é bom que esteja lá.

Jorani esboçou um sorriso sem separar os lábios, moveu os ombros, virou o corpo para se afastar. Droga. Se era esperada em algum lugar, realmente não poderia simplesmente correr.

Porém, isso seria problema de uma Frida dez minutos no futuro, a Frida do presente tinha mais interesse na pessoa do outro lado daquela porta.

Assim como esperava, sentiu o coração bater mais forte e derreter ao ver a face preocupada de Enyo dentro daquela sala. A pressa da mulher para levantar e ir de encontro com Frida foi imediata, e bastaram dois segundos de olhares trocados para um abraço forte ser feito ali mesmo.

— Não acredito... — Frida disse, baixo, com um sorriso genuíno nos lábios, apertando os braços ao redor de Enyo firmemente. — Eu nem sei por onde come...

— O estagiário desleixado já me contou tudo — Enyo disse, interrompendo a fala de Frida, que infelizmente não conseguiu ver a careta feita por Miguel ao ser mencionado. — Eu estou feliz que esteja viva, mas mentir pra essa gente é perigoso.

— Nada que você já não tenha feito antes.

— Mas eu mentia dentro da minha casa, dentro do meu empreendimento — Enyo disse, com as duas mãos segurando as laterais do rosto de Frida. Ela falava seriamente, embora quisesse muito apenas ouvir o que Frida tinha para dizer. — Você precisa tomar o dobro de cuidado... está suando frio.

— Eu sei. — Frida respirou fundo ao falar, e mesmo contra a própria vontade, afastou-se. Passou as costas da mão pela testa e os dedos pelo rosto, juntando as duas palmas em frente ao nariz.

Frida não gostaria de falar sobre isso, mas sabia que a pergunta viria ela querendo ou não. Não falaria na frente de Miguel, e ao olhar para trás, o rapaz tinha sumido. Isso a desesperou por uma fração de segundo, jamais pensaria que a falta dele seria um problema, mas quando estava dentro daquele lugar e sob os olhos daquelas pessoas, absolutamente qualquer acontecimento era preocupante.

— Aconteceu de novo, não foi? — Enyo perguntou, deu um passo a frente e encarou Frida de maneira firme, sem espaço para objeções ou para a possibilidade dela não responder.

Frida apenas assentiu, não teria tempo o suficiente para falar sobre isso e sinceramente não queria gastar os benditos dez minutos falando sobre algo que com certeza a levaria a ser internada na ala psiquiátrica. Felizmente, Enyo não pediu detalhes, nem precisava, sabia exatamente que sonho tinha sido, apesar de não ter conhecimento sobre a parte do fogo.

Entreolharam-se em silêncio, e Frida agradecia o olhar de quem sentia muito e ao mesmo tempo não tinha pena de tudo aquilo. Um pequeno e singelo detalhe tão reconfortante que a fez inclinar o corpo para a frente e abraçar Enyo novamente. Poderia passar os dez minutos abraçada, não reclamaria em momento algum, e infelizmente deviam sobrar no máximo uns sete minutos.

Frida tomou um susto pela porta abrindo novamente, e o susto veio em dobro por ver Miguel trazendo mais uma pessoa. Talvez a interrogação em sua face tivesse sido explícita o suficiente para Miguel querer se explicar.

— Ela me pagou, pra quem já tá com a corda no pescoço não custava nada — Miguel disse, apontando na direção de Enyo, e dessa vez trancou a porta atrás de si para não correr o risco de mais alguém entrar.

Junto dele, e agora encarando Frida atentamente, ela pode reconhecer a figura da mesma jornalista que a entrevistara antes da noite da apresentação. Isso sim é estranho, e alternar o olhar entre Miguel, Aleksy e Enyo foi uma reação involuntária para Frida. Se ela tinha pensado em ter mais sete minutos de tranquilidade, tudo isso escorria como água pelo ralo. Agora seis.

Bastou um olhar mais aberto e as sobrancelhas levantadas de Frida para Enyo entender a pergunta.

— Dois ridículos aparecem no programa dela, falam tudo e mais um pouco, e agora vão te mandar para Urano para resolver um problema que consideram mais importante do que literalmente o Sol e a Lua se exibirem? — Enyo perguntou, retoricamente, sem desviar o olhar da de cabelos verdes. — Essa gente esconde coisa, e depois da Aleksy ter sido a sortuda de ter cedido espaço pros palhaços falarem, ela vai ter credibilidade o suficiente para levar isso a público.

— E se o que falaram é verdade sobre você e os outros, vai faltar apenas um deus menor descendente de Urano naquele reino — Aleksy explicou, rapidamente, mesmo com o olhar desconfiado de Frida. Ela não julgaria a desconfiança, até entendia, mas precisava que Frida acreditasse naquelas palavras. — Muita coisa foi escondida, e ainda é escondida, é a chance perfeita de levar isso a público.

— O que te motiva a querer isso? — Frida perguntou, com os olhos estreitos.

— Minha família foi levada pela mesma coisa que matou um terço de Urano, eu sei disso, e tenho certeza que é a mesma fonte da mancha enorme naquela praia. Acobertaram incidentes antes, nada impede que façam a mesma coisa agora e divulguem tudo de um jeito tão distorcido que vai fazer parecer que você, a princesa ou qualquer outro seja o vilão de tudo isso por não ajudar no que querem — Aleksy disse, e ao lado dela Miguel engoliu em seco só com a possibilidade de algo dar tão errado.

Não era nem com ele, mas ele sentiu as palavras até mais que Frida. O olhar firme de Aleksy passou confiança o suficiente para Frida cogitar, até concordava, sabia das palavras serem certas, mas seu coração gritava para virar as costas e seguir na direção oposta daquele reino. Gostaria que tudo fosse esclarecido, mas queria ficar longe, bem longe, o suficiente para esquecerem totalmente de sua participação naquela vida.

O pedido vindo de Aleksy era óbvio, transparência, trânsito de informação o suficiente para o Controle não ser capaz de se pronunciar sem falar a verdade, a chance de livrar não somente ela da culpa, mas todos os outros acusados por algum motivo inútil. Não que Frida genuinamente pensasse na culpa dos outros, a grande maioria estava bem, longe dali, pensaria mais nela mesma por estar tão perto daquele buraco de cobras.

— Te mantiveram aqui sob ameaça e vão te fazer ir pra provar uma coisa que tiraram dos próprios delírios, e isso é absurdo. — Pelo tom de voz, Enyo poderia facilmente se aventurar em jogar um tijolo em Jorani se isso fosse abrir espaço para Frida ir embora. — Esconderam Júpiter, acusam Netuno até hoje, mandaram a princesa pra casa no primeiro problema, e sabe-se lá o que vão fazer com o Viktor caso ele saia da linha.

— Eu sei — Frida disse, baixo, e passou as mãos pelos fios verdes, devagar e com força. — O que espera que eu faça?

— Só fique de olho em tudo estranho e anormal, e repasse isso — Aleksy concluiu, dessa vez comprimindo os lábios de maneira apreensiva e esperançosa. — Vou estar em Urano também, vai ser mais fácil.

— Dois minutos, gente — Miguel avisou, agoniado ao olhar para o próprio relógio.

— Eu concordo com você, mas não gosto disso — Frida concluiu, tudo seria menos complicado se pudesse estar na companhia de alguém de confiança, e até ali, estaria cercada exatamente por pessoas a quem não confiaria um saco de terra. — Essa gente é perigosa quando é contrariada, não tem três dias que um deles apontou uma lâmina para o outro.

— Pra quem? — Enyo perguntou.

— Para o Viktor.

Enyo respirou fundo, soava impossível para ela qualquer tipo de agressão para aquele oficial em específico, e isso só mostrava o nível de perigo que corriam. Pelo aviso silencioso de Miguel, entenderam do tempo ter acabado, e precisavam urgentemente da resposta de Frida. Ela tinha uma breve ideia do que fazer para ajudar, mas não negaria o risco.

Frida optou por dar um último abraço em Enyo, despedindo-se, e tentou gravar a sensação do aperto na própria memória para não esquecer. Ao se separarem, Frida sentiu um peso a mais no bolso do macacão, e reconheceu o próprio celular.

Não teve tempo de agradecer Enyo por isso, e bastou um último sorriso para ela precisar sair do cômodo e ir em direção à sala do General. Odiaria se atrasar e receber uma fiscalização ainda mais rígida por parte daquelas pessoas.

[...]

— Vem cá, meu chapa, isso é mesmo necessário? — Jonathan perguntou, com uma careta estampada no rosto, sentado espaçosamente na poltrona da sala do General e encarando o próprio General com os olhos semicerrados.

— Se atenha às formalidades, Kenneth — o General respondeu, sem olhar para o Tenente.

— Devo concordar com o Tenente, é uma situação completamente desnecessária — Jab disse, seriamente, mantendo-se de pé à frente da mesa enquanto esperava por certa pessoa chegar.

— Ah, não, não me entenda mal, isso aqui é seguir protocolo — Jonathan disse, desfazendo-se da careta e erguendo as sobrancelhas. — Desnecessário é eu estar aqui quando o trabalho de fazer esses documentos de cooperação é do Viktor.

— O senhor Bellerose igualmente vai assinar os termos, portanto não pode ser ele a redigir a assinatura dos nossos termos de responsabilidade — o General explicou, apenas para receber uma bufada e um revirar de olhos vindos do Tenente.

— Não é só ele assinar dos dois lados?

— Como você mesmo disse, "isso aqui é seguir o protocolo". — O General forçou a voz para imitar a forma de falar de Jonathan, o Tenente achou de uma desrespeito enorme. Definitivamente ele não servia para teatro, e foi uma imitação bastante mixuruca.

— E desde quando essa regra existe? — Jonathan questionou.

— Desde hoje. Ah, cala a boca, Kenneth.

Jonathan odiava estar ali e precisar olhar para a cara daqueles dois por mais cinco minutos. Preferia até voltar para o laboratório de Jorani e escutar ela tagarelar por horas sobre qualquer assunto que ele não se dava ao trabalho de entender, mas servir de palhaço para aquele circo com certeza não o agradava o suficiente para gostar de permanecer.

Só a parte de precisar fazer o trabalho de Viktor pela equipe desfalcada já irritava Jonathan, e o fato de Viktor futuramente entrar pela porta daquela sala irritava Jab profundamente. A esse ponto, Jonathan tinha total noção do que acontecera entre o Major e o oficial Amin, e não podia dizer que aprovava. Para Jonathan, Viktor merecia alguém melhor, mas não iria julgar um ou outro dedo podre, isso já tinha se tornado normal.

Curiosamente, os primeiros a entrar pela porta foram Frida e Miguel. Jab virou o rosto em direção da porta com nervosismo, no receio de ser sua irmã, e apenas franziu o rosto em uma careta desgostosa ao ver Frida adentrar o recinto. Ela percebeu isso, e manteve o queixo erguido enquanto passava até a mesa do General.

— Sentem pra cá, ainda tem gente pra chegar — Jonathan avisou, indicando as outras poltronas acolchoadas perto de onde estava e o sofá do outro lado da mesinha de centro.

Frida e Miguel não poderiam recusar a oferta, não quando ambos gostariam de evitar a atenção do General e tampouco gostariam de receber o olhar enojado de Jab. Frida sabia muito bem o motivo, o mesmo que o levara a querer enfiar a lâmina em Viktor.

Mesmo visivelmente desconfortáveis, sentaram do lado mais próximo de Jonathan, e o Tenente acenou simpaticamente para ambos. Não soava como falsidade, tampouco queria permanecer, então o trio sentado partilhava do profundo desejo de sair.

Novamente a porta foi aberta, dessa vez Jorani vinha acompanhada de uma moça visivelmente venusiana, esta acompanhada de um pequeno ser translúcido de tonalidade azul repousando em seu ombro. Dessa vez Jab sentiu o coração bater mais rápido ao reconhecer a irmã, ao perceber a face apreensiva dela, e ainda assim, muito mais tranquila que ele.

— Irmã — ele falou, para que ela escutasse e pudesse saber a localização dele dentro da sala.

O olhar fixo de Jab na irmã o impediu de notar o olhar surpreso de Frida ao ver Ghada ali, certamente ele odiaria e falaria algo indevido.

— Estão aqui seu irmão, o General, o Tenente, meu novo assistente e a senhorita Selistaz, creio que já são conhecidas — Jorani comentou, e isso fez o sangue de Jab ferver. Sua irmã jamais seria conhecida de uma criatura daquelas, jamais chegaria perto novamente.

— Frida? Está aqui? — Ghada perguntou, e a leve tensão em sua face deu lugar a um sorriso aliviado.

— Senta aqui com a gente — Frida disse, e levantou para ir ao encontro da amiga, levemente mais animada. Pela primeira vez, um rosto conhecido, e ela ignoraria completamente o olhar de Jab enquanto pudesse.

Um breve abraço foi trocado pelas duas, e Jab só não interviu pois explicitamente Jorani indicou para ele sequer sair do lugar.

— Climão, hein? — Jonathan comentou, segurando o riso.

— Você acha isso engraçado? — Jab perguntou, ríspido, dessa vez encarando Jonathan diretamente.

— Acho.

— É tão corrompido quanto os que se envolvem com você — Jab declarou.

— O que está acontecendo? — Ghada perguntou, completamente confusa por não poder ver a face do irmão e do Tenente, ou qualquer outra.

— Nada, querida, ignore — Jorani pediu, direcionando o olhar repreensivo tanto para Jab quanto para Jonathan.

O General esfregava a cabeça, em uma tentativa de se preservar para continuar a falar minutos mais tarde, enquanto Jonathan mantinha a face bem humorada, Jab a mau humorada, e Jorani tentava impedir um crime de acontecer. Não entre eles dois, mas trabalhando o próprio autocontrole para ela mesma não dar fim a eles.

Já Frida preferiu engatar em uma conversa superficial com Ghada, enquanto Miguel só pensava que tinha se metido em um lugar absurdo demais e que deveria se demitir. Pena que ainda precisava do pagamento, então nada de demissão por enquanto.

O silêncio não durou sequer um minuto, o último convidado para aquela conversa adentrou a sala e imediatamente todos os olhares foram dirigidos a ele, menos o de Ghada.

Viktor realmente não esperava ser tão chamativo, também não esperava ser o último, mas agora teria que se virar de algum jeito. E o jeito foi levantar uma mão e acenar para todos como se nada estivesse acontecendo, como se não sentisse o clima ruim daquele lugar e daquelas pessoas, como se não sentisse o olhar de Jab queimando em sua face. Certamente se os olhos pudessem queimar alguém, os de Jab queimariam Viktor naquele momento.

— Ótimo, vamos começar. Bellerose, Selistaz e senhorita Amin, por favor, venham aqui — o General disse, incrivelmente calmo para os próprios parâmetros. Jonathan tinha certeza do homem ter exagerado na dose dos calmantes, não tinha outra explicação.

— Senhor, eu não acho que...

— Oficial Amin, está aqui apenas por se tratar de sua irmã, peço que não interfira.

Jab endireitou a coluna, contrariado, e cerrou os dentes ao ver a irmã tão perto de duas criaturas abomináveis. Não conseguia entender como Frida e Viktor mantinham o olhar tão calmo, tão firme, sendo de uma natureza tão impura. Ele se afastou da mesa em passos lentos, receosos, e manteve o queixo erguido enquanto não desviava o olhar da irmã e dos dois ao lado dela.

Incrivelmente, as pessoas mais tensas não eram os três ditos deuses à frente do General, e sim aqueles ao redor. Frida tentava manter a cabeça no lugar, Ghada não tinha pelo que se retratar, e Viktor já se culpava por coisas demais normalmente, não seria uma acusação a mais que o faria se sentir a pior pessoa do mundo ou sequer um criminoso.

Mais atrás, Jorani parabenizou Miguel por ter tido êxito em manter Frida calma, e se aproximou de Jonathan enquanto observava os três ao centro. O Tenente prosseguia sentado, bocejando vez ou outra.

— Não acha que ele tá calmo demais? — Jonathan perguntou, baixo.

— Depois de cinco comprimidos tranquilizantes, diria que tá até bem desperto — Jorani disse, tranquilamente.

Se tivessem realmente sido cinco, de fato bem desperto, e Jonathan não perguntaria se Jorani quem o tinha oferecido ou se o General tomou por conta própria, as duas opções facilmente aconteceriam. Não poderiam arriscar daquele momento dar errado, então seja qual fosse a entidade milagrosa a ter conseguido fazer o General estar calmo, a ideia tinha sido genial.

— Bom, todos viram aquele pronunciamento vergonhoso e todos já sabem as declarações feitas. Já ouvi a Selistaz e o Bellerose, mas você, senhorita Amin, dou a palavra a você para falar sobre as alegações feitas em seu nome. — As palavras do General foram duras e ao mesmo tempo compreensivas, uma novidade.

Ghada não respondeu de imediato, porém não parecia apreensiva ou com medo, apenas organizando os pensamentos antes de colocá-los para fora.

— Não posso afirmar ou negar o que foi dito sobre mim, senhor, porque eu não sei. O que posso afirmar é que independente disso, vou cooperar com o que precisar — Ghada disse, baixo, tranquila, apoiando as mãos na borda da mesa para ter certeza de estar com o corpo virado na direção certa. — Disseram que vive em mim a mesma deusa menor que fez muito pelo nosso reino, e em nome dela, tem minha lealdade para fazer o que é certo.

— De fato, o último receptáculo de Mnemosine foi o marido do fundador do Controle, estariam orgulhosos de sua boa vontade conosco — o General comentou, enquanto colocava três cópias do mesmo documento sob a mesa, uma para cada um.

— Senhor Bellerose, sei que não somos relacionados, mas em nome da relação de mãe e filha de Vênus e Mnemosine, assim como do afeto que os últimos de cada tinham pelo outro, gostaria de oferecer a você minha amizade também — Ghada continuou, e virou o rosto para o lado onde Viktor se mantinha de pé.

Não tinham ideia de como ela sabia para qual lado virar o rosto, ele sequer tinha falado, e isso intrigava Viktor em vários níveis sobre suas próprias teorias baseadas na relação invisível entre todos os seres divinos a pisarem naquele solo.

— Seria uma honra, senhorita — Viktor respondeu, educadamente, genuinamente agradecido.

— Ghada... — Jab tentou intervir, olhando rigidamente para a irmã e para Viktor. Aquilo era uma ofensa, um absurdo, sua irmã em nada deveria se relacionar com aquelas pessoas, com Viktor, ou com qualquer outra criatura com potencial destrutivo. — Não se deixe enganar por essas pessoas.

— O protocolo permite interrupções? — Jonathan perguntou, com uma mão levantada como se estivesse em sala de aula.

— Leve seu posto a sério, estou cuidando da segurança da minha irmã — Jab disse, duramente.

— E acabar paranoico com uma oferta de amizade? Não sou tão sem coração de roubar esse posto de você — Jonathan retrucou, e dessa vez foi Frida quem precisou cobrir a boca para conter o riso incrédulo.

Viktor passou uma mão pela testa, aquilo poderia seguir um rumo horrível, e ele sabia perfeitamente como Jonathan poderia ser irritante em paralelo com a facilidade de Jab se irritar. Jorani apenas revirou os olhos, as farpas já não eram novidade.

Jab deu um passo à frente, reprimindo ao máximo a vontade de retrucar ou reagir, mas o alarme de limites em sua cabeça apitava freneticamente. Não faria nada disso com sua irmã presente, com o General presente, seria um risco de perder a pouca patente ainda restante. Ao contrário dele, Jonathan desejava simplesmente ser demitido, mas sabia que o General não faria isso tão cedo.

— Mais uma palavra dos dois, dispenso um e promovo outro — o General disse, firme, e todos sabiam bem qual punição iria para cada. Ele respirou fundo, voltou a atenção para os três de seu interesse. — O acordo que os ofereço é simples, colaboração e boa fé. Declarem apoio e boa vontade para com o Controle, e podem seguir suas vidas tranquilamente até o dia que os poderes aparecerem, se é que vão aparecer. Senhorita Amin, sua vida permanecerá intacta, eu garanto. Bellerose continuará conosco, e Selistaz será de grande ajuda enquanto quiser permanecer após sua tarefa em seu reino de origem. Nenhum dos três é um risco explícito para nossa sociedade, por enquanto, portanto, serão tratados devidamente.

— Posso ter um tempo para ler todo o documento? — Frida perguntou, erguendo as sobrancelhas.

— À vontade.

A de cabelos verdes não precisava ler tudo, já sabia o conteúdo por Jorani ter explicado como quem ensina uma criança de cinco anos. Apenas queria tempo. Tempo para ver a reação de todos os outros e então ser capaz de fazer exigências.

Viktor tampouco precisava, ele quem escrevera aquele texto como forma de acordo preventivo. Só nunca imaginou ele mesmo precisar assinar do lado divino do papel. Já Ghada, gostaria bastante de ler as duas páginas escritas e entender completamente o protocolo, deveres e direitos.

A venusiana sempre foi a favor de regras de convivência para com divindades, não seria de todo ruim repassar cada detalhe, cada letra míuda. Ela pediria para o irmão ou alguém responsável pela validação do documento ler as palavras para ela, e teve uma boa surpresa ao tocar no papel à sua frente e sentir a escrita em relevo adaptada para aqueles impedidos de enxergar. Ela mesma leria.

Enquanto isso, ninguém poderia se aproximar dos três ditos divinos, e isso matava Jab por dentro. Cada vez mais sua certeza de que precisava cumprir a tarefa dada pelo General crescia, precisava manter Ghada longe daquelas pessoas e isso seria impossível com tantas tão perto, com tantas regalias, e para ele, andar livremente e sem algemas era uma regalia. Claro, o pensamento não se aplicava à irmã.

[...]

Caelus, reino de Urano

Para quem sempre tentou ser o mais normal possível, chamar menos atenção e parecer tão civil quanto qualquer outra pessoa, Cairbre odiava voltar para Urano no navio oficial da coroa uraniana. Chamativo demais, com gente demais disposta a bajular sem necessidade, e embora Cairbre gostasse de regalias, eram limitadas a no máximo um mimo vindo de Viktor ou de Jonathan, pessoas que se importavam com ela por todos os motivos do mundo que não fosse por ser a princesa.

Infelizmente, tudo parecia dar errado, e encarar o horizonte azul por muito tempo iria deixar sua cabeça insana. A viagem curta pela velocidade do navio não fazia ser menos tediosa ou enfadonha, só aumentava a chateação da ruiva pela parte em que tudo que tinha construído por si mesma foi desfeito por algo que ela mesma fez, e com isso botou em risco não só a si.

"Já chegou?" escutou a voz da prima na própria cabeça, e só não tomou um susto por ter se acostumado com o quão repentino aquilo poderia ser.

"Ainda não"

"Avisa quando chegar"

"O que você quer, Eana?" seria loucura esperar até aportar em Urano para saber o que realmente ela queria. Cairbre não aceitaria ficar na expectativa até chegar, e se Eana tinha falado algo, ou era uma coisa estúpida ou super importante.

"Nada não"

"Fala logo, eu tô no tédio"

"Será que a Faye aceita uns convidados a mais?"

Cairbre mantinha o corpo jogado sob o guarda-corpo largo da borda do navio, com um braço jogado para fora, e imediatamente levantou a cabeça em preocupação. Abriu bem os olhos, alarmada, e tentou mirar o olhar para qualquer canto em busca de uma distração o suficiente para sua preocupação não crescer.

"Por que ela teria convidados a mais?"

"Porque eu tô pensando em levar uma pessoa, e também pensei que..."

"Você pensando é que me preocupa" Cairbre interrompeu o pensamento de Eana, apreensivamente.

"Depois de tudo que aconteceu, seria legal convidar os outros pra mostrar que nem todos são animais. Quer dizer, o Nikolai até é, mas também seria a chance de você e o seu namorado número dois conversarem com a estrelinha, faria bem"

"Com quem?"

"A loira atraente, com o humor de um gato molhado, que vocês chamavam de amiga. Incrível como o Controle tem gente bonita, já pode esquecer aquela oferta de me dar o Viktor, já achei minha preferida"

Como ela esperava, odiava quando Eana se propunha a pensar em algo. Eficiência nada tinha a ver com a qualidade das ideias, e os conceitos nunca corriam em paralelo, mas sim em completa desordem. Cairbre cobriu a boca, incrédula. Tanto pela oferta, quanto pelo novo apelido de Danika, e por todo o resto. Certamente a loira teria odiado ser chamada assim.

Além do fato de que se Danika estivesse no mesmo ambiente que ela, Viktor ou Jonathan, era mais fácil todos irem direto para a vala do que ter uma conversa civilizada. A ideia em si era ótima, sua execução não, dependia demais da boa vontade de todas as partes.

"A ideia é boa, mas é uma merda" Cairbre concluiu, esfregando a testa com força enquanto sentia os respingos de água salgada tocarem sua face. "Vai ter gente do Controle, sabe disso, né?"

"Claro, tô contando com isso"

"Eu devia ter deixado pra insistir nisso quando já tivesse com os pés fora desse barco, já me arrependi"

"Pois se arrependa pensando em como convencer sua mãe e a Faye a aceitarem, por favor, eu levo pra ti aquele bolo lindão com cascata de chocolate"

"Golpe baixo"

"Amo você, falo contigo depois que chegar"

Se pudesse, Cairbre gostaria de poder rezar para Urano em busca de ajuda para tomar um rumo na vida. Porém, ela era Urano, e o último a carregar aquele poder infelizmente não atendia do além. Particularmente ela acreditava que o único deus disposto e talvez mentalmente capaz de ajudar fosse Zyr, mas nunca foi tão próxima dele a ponto de pedir um conselho na cara dura.

Poderia ir ao oráculo do reino de Urano, mas esse com certeza seria o último lugar a pisar. Não queria ouvir verdades de um jeito tão cru, nem queria ganhar mais responsabilidade, e geralmente era apenas isso que o oráculo oferecia. Uma resposta por mais cinco dores de cabeça não valiam a pena.

Pelo lado bom, já conseguia ver a orla e o porto da capital de Urano, Caelus, e felizmente não havia uma multidão para sua recepção como da última vez. De longe ela não conseguia ver uma multidão, ao menos. Da última vez a voltar para casa, quase a cidade inteira foi recebê-la porque a princesa filha da vice-rainha tinha prometido dinheiro a qualquer um que fizesse barulho, palmas e gritos empolgados no momento em que Cairbre pisasse na madeira do píer principal. Um dia Cairbre ainda mataria a pirralha por isso.

Para sua alegria, o píer se mantinha vazio até mesmo com a aproximação do navio, e a água cada vez mais cristalina dava visão para todas as criaturas a nadar abaixo da superfície. Ela procurou pelos dois golfinhos que criou desde pequena, geralmente eles encontravam o navio com ela desde a metade do caminho, mas dessa vez nenhum deu o ar da graça.

Somente com a parada total do navio, Cairbre conseguiu ver Guillem. Pelo visto a aversão do homem com o alto mar prosseguia a mesma, e ela não iria julgar, qualquer ficaria assustado ao saber o que nadava por ali, principalmente se não tivesse um animal como protegido. Além disso, ver ao longe parte da mancha escura fez seu corpo inteiro arrepiar, e mal haviam peixes naquelas águas.

Não havia multidão, porém não havia ninguém. Ninguém além de uma figura aparentemente mal humorada segurando uma plaquinha de boas-vindas escrita "vá embora" com o desenho de uma tartaruga mostrando o dedo do meio, se é que tartarugas possuem dedo do meio.

Cairbre riu, incrédula e divertida. Chegar mais perto daquela figura ruiva de tonalidade tão igual à sua era como olhar em um espelho. Um espelho menor e mais chato, mas um espelho.

— Pensei que ia contratar uma banda pra me receber — Cairbre disse, com as mãos na cintura, ao pisar no píer.

— Eu contratei, mas minha mãe descontratou. Assim como disse que ia me deixar sem participar da festa dela caso eu fizesse alguma coisa extravagante. Quem ela pensa que é pra mandar em mim desse jeito? — Caitriona perguntou, genuinamente indignada, e estar com óculos escuros enquanto falava só deixou Cairbre com ainda mais vontade de rir. — É um absurdo, completamente absurdo.

— Realmente...

Cairbre ainda segurava o riso, até responderia "só a vice-rainha do reino", mas isso não seria motivo suficiente para Caitriona parar de reclamar.

— Mas fique feliz, eu apareci, sou mais do que suficiente e minha presença é tão mais legal — Caitriona continuou, enquanto Cairbre indicava para o capitão do navio que ela mesma poderia carregar as duas malas a partir dali.

Uma mochila e uma bolsa de rodinhas eram o suficiente, poderia levar tranquilamente até a mansão real, seria muito mais difícil escutar Caitriona falando por todo o caminho.

— Você é um porre — Cairbre comentou, naturalmente. Enquanto caminhavam em direção da residência real, Cairbre acenava com a cabeça algumas vezes para quem a cumprimentava. — Cadê meus golfinhos?

— Fiz ensopado — Caitriona respondeu, e virou o rosto ainda com os óculos escuros, seriamente, para a prima. A pior parte era que Caitriona poderia estar blefando, mas também poderia não estar. Felizmente, Cairbre sabia da garota sequer comer carne, e também era incapaz de ferir qualquer um daqueles bichos. O mesmo não poderia ser dito do tratamento da garota para com pessoas. — A tia Isobel mandou que todos os animais fossem realocados pro outro lado da ilha, pra ficar longe da mancha.

O suspiro vindo de Cairbre não poderia ser classificado como de alívio ou preocupação, era os dois e ao mesmo tempo nenhum. Mais uma das questões que a atormentariam nos próximos dias, ou meses, pelo menos seus animais estavam seguros.

— Você tá sabendo muita coisa sobre essa mancha? — Cairbre tentou, não faria mal falar de algo realmente sério, porém isso seria impossível com aquela criatura em específico.

— Eu? — Caitriona apontou para si mesma, teatralmente, e embora tenha aberto a boca, não pronunciou palavra alguma de primeira. Ou desistiu de falar, repensou se deveria falar. — Umas coisas aí.

— Que coisas? — Cairbre insistiu, e pela face da menor, não eram somente "umas coisas aí" e sim "várias coisas aí".

Tinha sido uma pergunta estúpida, Cairbre tinha certeza da menina saber de absolutamente tudo, e agora demoraria uma eternidade para tirar uma resposta de Caitriona. Se a menina não tagarelou sobre o assunto, provavelmente nem mesmo o rei ou a rainha comentariam sobre isso, e omissões dificultariam absurdamente seu trabalho.

— Caitriona, que coisas?

— Olha sua mãe ali! Tia Isobel tá pra ficar doida com o Centenário, vai fazer bem a ela ter você pra desviar da preocupação com mais preocupação — Caitriona disse, animadamente, mudando o assunto sem pudor algum.

Cairbre mataria a pentelha, tinha a mais absoluta certeza. Em um piscar de olhos, perdeu Caitriona de vista, e não a encontrou mesmo olhando ao redor. Quis grunhir de raiva, mas logo precisou colocar um sorriso no rosto ao ver não somente sua mãe, a rainha, mas sua irmã gêmea, e futura rainha, chegando cada vez mais perto e com várias expectativas em seus olhares.

Não seria pedir muito para ficar junto dos animais do outro lado da ilha, definitivamente seria mais tranquilo.

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