Os alicerces e as alturas
O livro Sobre a Escrita, de Stephen King, compila as memórias de um dos maiores escritores da atualidade.
Não é preciso enaltecer a escrita incrível dele, que prende a atenção de qualquer leitor. A escrita de King fala por si mesma.
O ponto é que ele comenta, em seu livro, o imbróglio de se vender uma fórmula de escrita bem sucedida. Porque um livro faz sucesso e outro não?
Entendo o que ele quer dizer, pois observei isso entre livros de sucesso comercial (alguns, os quais, considero uma porcaria; outros que mereceriam mais destaque e não receberam).
Existe o lance da embalagem midiática que vende mais?
Existe. Mas também existe a experiência pessoal, quando um livro fala a linguagem certa, no momento certo, para um grupo certo de leitores que se conectam à trama.
Existem várias questões que podem levar um livro ao sucesso, que nada têm a ver com a qualidade do texto. Temos o efeito "onda", "telefone sem fio", "estigma de vencedor", "mentalidade de gado" entre tantas miragens que fazem as pessoas acreditarem que o livro está onde deveria estar...
Quando perguntei a um amigo de longa data - um dos maiores desenhistas do país, se não o maior - o que um desenhista deve fazer para se tornar bem sucedido, ele me respondeu o seguinte: É impossível saber até onde um desenhista consegue chegar - isto é, o talento pode ser grande, mas também pode não ser desenvolvido à altura. Alguém com menos talento pode ir mais longe, pois investe mais, investe corretamente e não para de trabalhar até conquistar o objetivo.
Daí a máxima de Thomas Edison: Talento é 1% de inspiração e 99% de transpiração. Ou seja, temos um segundo de voo imaginativo para horas de trabalho árduo.
Uma coisa posso afirmar: são mais bem sucedidos aqueles que escrevem estabelecendo uma conexão entre sua própria experiência e a experiência dos leitores. Escritores que alegam não pensar no seu leitor em potencial têm mais dificuldade de atingir o público.
JK Rowling conhecia as lendas de seus conterrâneos; sabia o que lhes tocava o coração. O sucesso foi uma combinação de elementos, inclusive sorte. Mas, principalmente, a conexão com o leitor por meio da releitura dessas antigas lendas e mitos.
O bruxo Harry Potter representa toda a criança que se sente rejeitada, solitária, e que anseia por ser aceita, reconhecida, amada. Uma criança especial e poderosa (quem não quer ser reconhecido como especial e poderoso?) - algo que será confirmado ao longo de sua jornada, onde conhecerá inimigos perigosos, mas também amigos sinceros.
Escrever e ser bem sucedido envolve criar conexão afetiva e empática entre o seu texto e o leitor. Não adianta ignorar o leitor. Ele ou ela é parte da equação; é o elemento de ligação com o tema que você escreve.
🙃👌
Stephen King preferiu partir da própria experiência com a escrita, para explicar o que funcionou para ele, do que sair distribuindo conselhos, dicas e fórmulas mágicas sobre como escrever bem. Eu considero a atitude dele a mais acertada.
Quem somos nós para dizer se essa ou aquela forma de escrever é a correta, com tanta gente mais experiente por aí, fornecendo dicas de "A a Z" para orientar os novos escritores? Além do mais, como já disse, cada escritor tem uma trajetória.
Foi por isso que decidi falar um pouco das influências que alicerçaram a minha escrita - usando a memória como ponto de partida. Porque me tornei a escritora que sou, capaz de parar o que quer que esteja fazendo, só para assistir algo do tipo: "No Rastro do Abominável Homens das Neves"...
😅😅😅😅😅
Década de 1970. O homem acabou de andar na Lua (1969), ainda sob os auspícios de 2001, uma odisseia no espaço (também publicado em 1969). A Guerra do Vietnã era uma vergonhosa realidade, assim como o escândalo Watergate. A discoteca nos Embalos de Sábado à noite, com John Travolta, era uma febre tal e qual Dancin days, com Sônia Braga. O futuro é sonhado e idealizado. Mas as pessoas já começam a encarar os excluídos como a presidiária, interpretada por Sônia Braga, e o sem-futuro-rei-da-pista-de-dança, interpretado por Travolta, como personagens interessantes e reais. Resquícios, talvez, de uma revolução em Woodstock.
O mundo girava muito lentamente. Havia tempo para pensar, se divertir, trabalhar e descansar - o dia tinha 24 horas, não 12. As estações eram bem definidas - primavera, verão, outono, inverno. O leite tinha gosto de leite. O sol não causava câncer de pele, só ensolação, isso se você ficasse do meio dia às quatorze. Os alunos tinham que estudar para passar de ano.
A nuvem cor de rosa dos anos 50 e a mini revolta dos anos 60, começavam a se dissipar. E acontecia uma quebra de paradigma nos anos 70, quando eu nasci. Uma década em que homens e mulheres usavam visuais bizarros e utilizavam o simbolismos culturais para representar e expressar o que sentiam.
Minha mãe era muito jovem nos anos 70 e queria curtir a vida, de modo que eu fui criada pelo meu avô. Não tive amiguinhos na infância porque filhos de mulheres divorciadas eram excluídos socialmente. Ainda mais numa cidade do interior. Era o equivalente a dizer que você tem lepra.
Então, socialmente, eu tinha lepra.
Ou a marca escarlate, se preferir.
Por várias vezes, foi a minha imaginação e os meus cães que me salvaram do isolamento e da depressão. Sheik, Pelé, Sheik 2, Katucha, Chasko, Turca e Smokey. E muitos outros, sempre reverenciados em todas as obras que publiquei. Meus anjinhos do céu...
Quem precisa de outros, quando você os têm?
Quem precisa de outros quando você pode ser a Mulher-Maravilha, ou a filha de uma das Panteras, imaginando mil e uma aventuras com elas...? Quando pode atravessar espaços siderais e conhecer novos mundos com Space Ghost, os Mestres do Universo, os rebeldes de Star Wars, os Últimos Guerreiros das Estrelas, Thundercats, ou os Herculoides? Quando pode viajar à Ilha da Fantasia, no barco do amor...? Pegar carona na estrada com David Banner...? Correr com o Homem e a Mulher de 1 milhão de dólares...? Divertir-se, investigando crimes e mistérios com Salsicha e Scooby-doo; ou viver a vida dos Flinstones (na Idade da Pedra), dos Mussarellas (na Roma Antiga)...? Quando pode ser a Feiticeira, a Teela ou a She-Ra...? Quando pode ser Lois Lane e voar com o Superman quantas vezes quiser?
Sim, eu fazia tudo isso. Fui a criança mais poderosa do mundo! 😃🤩🤩🤩
Eu decifrava os mistérios de Agatha Christie, no Nilo, no Oriente Express, na ilha das dez estatuetas... Aliás, eu já tinha lido até os doze anos, quase todos os livros dela.
Na verdade, eu li muitos e muitos livros até os doze anos. Mais que um adulto normal pela vida toda. Calcule quantos os livros já li até os cinquenta... Sim, calcule, pois eu perdi a conta 😂👍. Fora o fato de que eu sempre estudo o livro que eu leio. Não engulo verdades prontas. Estudei a fundo o Egito Antigo, Astronomia, e mesmo a bíblia, até os 11 anos. Não lembro de tudo, mas o que importa sempre fica.
E hoje ainda cutuco esses temas... De vez em quando estudo as traduções dos originais dos evangelhos mais antigos encontrados. Não decoro nada. Já me lembrei mais no passado. Minha memória não anda boa de dois anos para cá.
Bem, não acredito nas versões cheias de erros de interpretação da Bíblia, por isso consulto Hammagi, o Código Sinaitico, Akhmim, etc..
Sim, leitura, filmes, seriados, quadrinhos e muita pesquisa, sempre fizeram parte da minha vida.
Assim sendo...
Minhas bonecas eram astronautas e viajavam à lua para enfrentar monstros espaciais. Coitadas das minhas bonecas! Acabavam meio machucadas de tanto pular daqui pra lá. Eu inventava filmes para elas estrelarem.
😁🤣
Fui educada pelo meu avô. Ele foi minha mãe e meu pai. E me amou muitíssimo. Se preocupava com o meu bem estar. Sabia tudo que eu assistia ou lia, porque ele assistia e lia comigo.
Infelizmente para mim, ele nos deixou muito cedo. Eu tinha seis anos e meio. Foi aí que descobri como faz falta você ter um parente que realmente se importe com você. Eu não tinha mais ninguém por mim, exceto uma mãe que não queria ser mãe e deixou isso claro desde o início.
Então, tudo o que eu herdei de valores me foram ensinados pelo meu avô mesmo. Minha mãe contribuiu eventualmente, em momentos em que ela se sentia benevolente. Mas era mais no plano intelectual. Ela me ensinou os macetes da escrita, ao detectar os erros que eu cometia na redação e interpretação de texto. Mas o comportamento dela e suas opiniões oscilavam muito. Aprendi a não confiar em tudo que ela dizia ou fazia, pois podia mudar a qualquer momento. Num dia, ela era benevolente. Noutro dia, tornava-se uma criatura completamente diferente. Eu fui muito espancada na infância. Espancada, torturada emocionalmente, entre outras coisas... Isso perdurou até a fase adulta, quando dei um basta.
Foi o meu avô que fez questão de que eu entendesse os princípios morais, nos quais devemos valorizar o ser humano e não as coisas: beleza não põe mesa; a modéstia é uma virtude; a autobajulação é fútil e feia; a palavra empenhada é uma só; a verdade deve ser dita, doa a quem doer; a cortesia e gentileza no trato com as pessoas deve ser igual do cargo mais elevado ao mais humilde (não são as posses que definem as pessoas, nem devem ditar a forma como as tratamos); atos falam mais do que palavras vazias e falsas; o conteúdo é mais importante do que a embalagem (isso serve para tudo: roupas, livros, pessoas); e muito importante: não coloque palavras na boca de Deus. Não ache que merece mais nesta Terra do que outras centenas de milhões de pessoas.
Fonte: @ heloisa.abrahão
Tendo sido educada dentro desses princípios morais, deve ser compreensível que eu me sinta na contramão da mentalidade atual; regada a imagens postadas e a egos inflados e tão frágeis que a melhor solução é não ter conversas francas, profundas e saudáveis... Do contrário, a gente acaba se aborrecendo com quem está mais preocupado em aparecer bem na conversa, do que realmente conversar.
Ao estudar num colégio particular e frequentar um clube, por causa do vovô, eu convivi de perto com os riquinhos. Sofri o mais alto grau de bullying que uma criança pode sofrer sem que aconteça uma tragédia. E quase aconteceu. Não uma, nem duas vezes. Eu passei por tanta coisa, que criei uma antipatia instintiva por metidos a intelectuais e filhinhos de papai e mamãe. Aprendi a desmontar a pose de criaturas metidas. Faço isso até hoje, não consigo evitar.
Eles me agrediam porque eu era filha da divorciada que gostava de causar na cidade e porque eu era gorda e pobre. (Quando vovô morreu, minha mãe torrou todo o dinheiro que ele deixou para manter um estilo de vida de ostentação; ela ficou um bom tempo desempregada, porque ninguém queria empregar alguém acostumada a não trabalhar)
Para me defender do que as crianças falavam dela, passei a usar a palavra. Aprendi a usá-la muito bem. Certa vez, fiz um garoto que gostava de me bater, chorar feito um bebê. Ele nunca mais tentou. Eu tinha oito anos e foi quando percebi que a palavra era uma arma tão poderosa quanto os chutes e socos que queriam me dar...
De toda a doutrina religiosa que me vi obrigada a assimilar no colégio das freiras, a figura de Jesus me causou vívida impressão. Mas não do jeito que as freiras queriam. A Bíblia também não foi assimilada como verdade absoluta. Nunca acreditei que Deus escolhesse povos para ajudar e desprezasse outros povos. Ele não seria preconcetuoso assim.
Além disso, eu não admirava figuras machistas, nem mulherengos de plantão como o Rei Davi ou o Rei Salomão...
Não acreditava que Deus fosse vingativo ou caprichoso, ao ponto de exigir sacrifícios. Nem que dissesse que as pessoas tinham o direito de matar quem invadisse a terra que Ele lhes prometeu. Credo... Como se Deus fosse um corretor de imóveis psicopata. Não, esse tipo de coisa não entrava na minha cabeça. Não acreditava no Deus do velho testamento. Mas eu tinha a firme convicção de que esse tipo de Lei foi construída por homens que queriam dominar os homens.
Mas no Deus de Jesus, eu acreditava... Jesus me conquistou pela sua profunda inteligência, sensibilidade, compaixão, habilidade como escritor oral (criou parábolas de valor eterno), e desafiou os mestres dos templos, ao escorraçar o comércio de dentro da casa do Senhor.
Ele nasceu como nós para mostrar que entendia como nós nos sentíamos com nossas falhas e pecados; e para mostrar que mesmo assim, nós poderíamos triunfar em seu exemplo.
Ele apresentou um Deus de amor, de aprendizado e de humildade. Um Deus que dizia: todos são meus filhos; não há ricos ou pobres, nem eleitos. Somos todos iguais para Deus porque somos todos seus filhos. O Deus de Jesus não exigia hierarquias, relicários, dízimos... É um Deus que não precisa de ouro, nem ostentação, nem imagens. Que não pune um povo em favor de outro povo; ou um grupo em favor de outro grupo; seita, gangue, máfia, país, etc., muito menos possui terras, catedrais, templos, e bancos.
Jesus sentava-se entre pescadores, prostitutas, e cobradores de impostos. Legislou para os arrogantes representantes da palavra, a Lei, como para as pobres viúvas das vilas. Ninguém era melhor do que ninguém para Jesus e todos mereciam o amor de Deus.
Fonte: www.biblegateway.com/passage/?search=Mateus%2015&version=ARC
A palavra é importante. Do manuseio com as palavras, surgem as interpretações coletivas de diferentes ideias. Inclusive dos evangelhos.
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De lá para cá, fui refletindo e tentando entender a máquina política, armamentista e ideológica que se tornou a construção histórica da bíblia atual, por meio da compilação de tradições orais-escritas desde o Concílio de Niceia, em 325 depois de Cristo. Ou melhor, desde que os cristãos primitivos, como eram denominados, começaram a compilar os evangelhos.
E principalmente o mau uso que se faz hoje da palavra neles contida. Ainda hoje criando eleitos, e excluídos.
Descobri que acredito em Deus, em Jesus, em sua mãe Maria, mas não acredito que Deus esteja num símbolo, numa estátua a ser adorada e muito menos num templo desta ou daquela religião. Deus está acima de qualquer religião. E ele está dentro de todos nós.
Por isso Jesus disse "amai uns aos outros". Porque cada um de nós carrega uma chama que é uma parte de Deus.
As religiões possuem belas passagens que calam mais fundo a este ou aquele seguidor e isso é ótimo. Ter uma fé, qualquer fé, é ótimo! Mas as religiões não são melhores umas que outras. Elas são tentativas de descrever ou capturar o entendimento sobre algo indescritível e incompreensível para nossos sentidos e mentes primitivas.
Não se iludam. Com toda a tecnologia atual, ainda somos pobres de conhecimento e de evolução afetiva-emocional. É muito triste ver que Deus criou essa perfeição de planeta, com um ecossistema tão complexo que os telescópios ainda não encontraram outro igual. Tudo neste planeta poderia vestir e dar de comer e dar de morar com extremo conforto para todos os habitantes. Não era preciso nos matar para ter mais luxo do que os outros. Bastavam três coisinhas simples para todos viverem bem:
Não procriarmos como coelhos.
Não depredar.
E nos respeitar.
Deus não é algo ou alguém que firma um acordo para esta ou aquela religião. Como um negócio. Faça isso e seja desse grupo, só então você vai cair nas minhas graças. Isso, para mim, é conversa de político. E eu acho que não devemos rebaixar Deus a este nível. Ele ama todos os seus filhos, (inclusive os políticos 😂).
E seu amor se extende por toda a criação. Aqueles que tentam compreender a visão amorosa de Deus, aproximam mais suas mentes de sua Concepção. Aqueles que não querem compreender, se perdem, por vezes ignorando os caminhos que Deus coloca diante deles.
As pessoas se aproximam de Deus não porque frequentam esta ou aquela religião, mas porque procuram seguir os Seus princípios. Que Ele nos deixou de diferentes maneiras, por diferentes figuras humanas ou não humanas.
Mas são as minhas crenças. Cada um acredita no que quiser.
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Três contextos iniciais nortearam os meus interesses, enquanto pessoa e escritora:
A) Meu amor pelos quadrinhos (cujos heróis e vilões povoaram a minha imaginação);
B) Meu amor pelo cinema (sou uma cinéfila de carteirinha. Devo ter assistido mais de cem mil filmes. Perdi a conta de quantos milhares já assisti); eu queria ser diretora, ou roteirista, e lia tudo que me caísse no colo, sobre a linguagem do cinema, os tipos de câmeras e técnicas de filmagem;
C)Meu amor pela pesquisa independente: astronomia, arqueologia, egiptologia, metafísica, paleontologia, arquitetura, paisagismo, história geral, antropologia, sociologia, política, lutas armadas, etc.
Em minha formação acadêmica, e em minha iniciativa independente, por exemplo, dei preferência a pensadores como Umberto Eco; Bakhtin; Vygotsky; Piaget; Philippe Aries; Foucault; Nietzsche; Hannah Arendt; Melanie Klein; Sigmund Freud; Hermínio C. Miranda; Chico Xavier/André Luís/ Emmanuel, Yvonne Pereira, Wera K./J.J. Rochester; Lucius; Quinto Fábio; Platão, Sócrates, Pitágoras e Aristóteles... São os que eu me lembro por agora, pois os conceitos ficaram gravados.
Fui impactada por reflexões teóricas interessantes, tais como a Psicanálise de Freud; a Microfísica do Poder, de Foucault; a iconografia das famílias e a construção de costumes de Aries; a normalização/banalização da maldade de Arendt; o conceito de sociopatia de Klein; a analogia brilhante das duas faces da moeda da opressão (o oprimido que se torna opressor e vice-versa), de Nietzsche; a mente ágil, organizadora e diligente do grande pesquisador Hermínio C. Miranda; e também os estudos de Bakhtin e Vygotsky, sobre como a linguagem intermedia o aprendizado, assim como a relação entre os conhecimentos prévios do aprendiz e o mundo ao seu redor...
Sócrates, Leonardo daVinci e Giordano Bruno me causaram profundas impressões. Os três tinham em comum a resiliência, predileção por democratizar o conhecimento, horror à ostentação intelectual, ao elitismo... A rebeldia inata.
Sócrates com seu método socrático, a maieutica e postura de humildade. "Só sei que nada sei", parafraseando sua ideia central. Ele acreditava que todos, dos pobres aos ricos, têm o direito de construir e compartilhar o conhecimento. Nas ruas, nas casas, nos templos, nao importa. Não existe essa de autor que merece ser publicado pelo poder aquisitivo ou pela ideia de ser subjugado pelo sistema. Tanto ele não era subjugado, que foi condenado ao suicídio. O que ele pregava era uma filosofia perigosa para as figuras de poder em Atenas.
Para Sócrates, se alguém tinha uma ideia, que a apresentasse! Sócrates incentivava a discussão saudável. Daí o método socrático que eu mesma adotei muito em sala de aula, com os meus alunos.
Leonardo, com sua sede de saber, não se detinha por limitações. A busca e o amor pelo conhecimento foi o guia, mesmo que tenha seguido por alguns caminhos obscuros.
Giordano Bruno, frade dominicano condenado à fogueira por desafiar as fake news da Igreja da época. Um escritor, matemático e filósofo que se tornou o grande mártir da ciência.
Mas não se constrói ideias e personalidades só de profetas, filósofos, cientistas e escritores. Outras influências me fizeram pensar fora da caixinha.
Na juventude, Steven Spielberg por meio de seus filmes, e Erick Von Daniken por meio de suas teorias, (especialmente em termos de não aceitar nem engolir receitas científicas prontas, convenientes, bem como dogmas e/ou ideias ortodoxas).
Chris Carter com Arquivo X... Maravilhoso!
Se na faculdade, o mundo já não era mais definido por duas cores, mas por todo um arco-íris, para tornar mais complexo, o mundo passou a ser visto por mim como um complexo prisma cheio de camadas de cores.
Depois, eu entendi que a cor também era uma ilusão provocada pela luz de um sol amarelo. Durma com um barulho desses 😂
A relatividade não serve apenas para a física maravilhosa de Einstein, no funcionamento do espacotempo (que eu chamo de gravitempo em Nahash). A relatividade envolve compreender um ser humano biológico e cultural. A cultura, os artefatos culturais criados, bem como os ritos e rituais ajudam a construir e a manter uma sociedade.
A história nos conta que a construção da sociedade humana foi feita de evoluções e involuções. Não existe progresso humano constante e linear, porque se existisse, hoje seríamos um povo único e altamente evoluído, com uma sociedade sustentável e integrada ao planeta que nos abriga. Ao contrário, nós nos comportamos como uma praga de gafanhotos.
Voltando à relatividade... O universo pode ser um grande bloco, com tudo acontecendo ao mesmo tempo e a gente só tem condições de assimilar um pequeno retrato nem um pouco dinâmico, por conta dos nossos sentidos primitivos.
Um conjunto de cordas que vibram doze notas... O universo poderia ser uma sinfonia tocando a música que temos dificuldade de compreender...
Quem sabe a verdade absoluta? Ninguém.
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Em termos de aquisição da linguagem e como me tornei a escritora que sou, hoje, remonto a questão à minha alfabetização. Quando eu era criança e tive meu primeiro contato com as letras; lembro da professora criando personagens para cada vogal: A, E, I, O, U. Ela sabia que se as crianças não estabelecessem um vínculo afetivo com as vogais e consoantes, não teriam interesse na literácia (termo que compreende o desenvolvimento de habilidades voltadas à leitura e à escrita).
Lembro que a letra O era um senhor fofinho e simpático, com um belo bigode. E eu queria saber mais a respeito dele. O que ele gostava de fazer, aonde gostava de ir, eu até criava histórias para ele.
Assim, desde cedo, aos 4 ou 5 anos de idade, já associava as imagens, ou cenas, às letras.
Eu adorava os quadrinhos. De Bolinha e Luluzinha, passando pelo Pato Donald, Turma da Mônica... Especialmente, os quadrinhos de super-heróis, antes mesmo de aprender propriamente a ler o conteúdo dos balões de diálogo e os blocos de textos.
Nos quadrinhos, minha musa inspiradora foi e sempre será a Mulher Maravilha. Meu herói salvador foi o Superman (depois, o He-man também). Meu grupo de injustiçados e perseguidos favoritos: os X-Men. Eu adorava o trio de amigos inseparáveis como os três mosqueteiros: Noturno, Wolverine e Colossus. Claro que havia um triângulo amoroso entre Ciclope, Garota Marvel (Fênix) e Wolverine. Mas eu só fui me deter nessas nuances quando cheguei à adolescência.
Havia os super vilões, alguns me assustavam, como o Salomon Grundy. Nunca esqueço o combate entre ele e o Superman.
Desenhos em quadrinhos de alto nível!
Drácula também tinha sua própria revista em quadrinhos e ele me atraía e assustava a um só tempo. Atraía porque era poderoso, mas eu sentia repulsa por causa das presas e unhas compridas.
Nunca achei graça em homem com unha mal aparada. O Zé do Caixão me provocava nojinho 😂 Também não curtia o Morbius, embora achasse os desenhos fenomenais.
Acho que aprendi a desenhar antes de ler ou escrever. Não como os profissionais fazem, mas já imitava as proporções e os pontos de fuga. Eu observava as imagens nos quadrinhos e tentava esboçar as minhas próprias cenas.
Foi num desses esboços que, aos 14 anos, fiz minha primeira versão da Juna, sem saber na época que seria a Juna. Eu explico: criei o uniforme, a espada e fiz ela lutar com a Sonja, a guerreira hirkaniana. Isso, porque eu admirava a ruiva esperta. Estava cansada de ver garotas bobinhas fazendo bobices e precisando ser salvas por garotos mais espertos que elas. Sonja não era bobinha. Ela era uma mercenária. E com ela, ninguém tirava farinha.
Quando eu ficava doente ou triste, eu recorria a minha coleção de gibis.
Construí um mundo que era um reflexo dos vários mundos que eu acessava por meio da TV, cinema e quadrinhos. Lá, eu comandava os destinos de todos os personagens. Criava aventuras diferentes das idealizadas por seus autores originais.
No meu mundo, eu podia ser filha da Sabrina, uma das três panteras que faziam as garotas dos anos 1970 sonharem com uma igualdade de gênero que, até então, não conhecíamos, embora lutássemos por ela.
Antes mesmo de saber ler e escrever, já considerava o livro como o meu maior tesouro. Alguém um dia disse que um livro pode mudar a vida de uma pessoa, e eu cresci com está convicção.
O cheiro de um livro e de um gibi novinho na banca, era a coisa mais fantástica do mundo. O melhor presente que alguém poderia me dar.
Primeiro foram os livros ilustrados. Depois, na adolescência, foram os livros de todos os tipos: teorias da conspiração, arqueologia, egiptologia, astronomia, romance de banca, policial, suspense, mistério, etc. Estar numa feira de livros era o mesmo que ir à Disneylândia.
Os livros sempre foram minha grande fonte de endividamento, junto com a conta do veterinário e as dívidas da mãe. 🤯🤣🤣🤣🤣🤣
Com 13 anos, eu me tornei uma bibliotecária, acredite se quiser. Naquela época, as exigências não eram as mesmas de hoje. Assumi a biblioteca pública de meu município e tenho minha carteira de trabalho para provar.
Eu sabia pesquisar e organizar os títulos e provei isso muito bem. Tinha gente que achava que uma garota com 13 anos não teria essa capacidade, então chamaram uma mulher formada na área. Eu fui rebaixada a assistente. Tudo bem. Na verdade, nunca liguei para títulos nem brincar de chefinho.
O problema é que a mulher não só não deu conta, como quase apanhou de um cliente da biblioteca.
Quer dizer, nem tanto kkkk, acho que ele apenas disse que preferia ser atendido por alguém que soubesse onde estão as coisas que ele precisava. Eu fui lá e resolvi. Na mesma semana, voltei à direção da biblioteca e a mulher foi rebaixada para minha assistente. Como ela achava uma ofensa ficar subordinada a uma garota de 13 anos, pediu demissão.
Eu trabalhei lá até os 16 anos. Mas daí, minha mãe arranjou um emprego na capitarrrrr e eu tive que largar o meu trabalho. Jamais deveria ter aceitado ir com ela. Hoje, eu poderia estar aposentada e razoavelmente bem de vida.
Ao contrário, não tenho mais perspectiva de me aposentar e meu salário de educadora é uma merda.
Quando nos mudamos, deixei de ser bibliotecária; não foi fácil para mim arrumar um novo emprego. Falava-se muito nos direitos das crianças e que elas não deviam trabalhar. Só estagiar. Então eu me tornei estagiária. No meu caso, leia-se: office-girl. O respeito que eu tinha trabalhando, não existia mais no estágio. No trabalho eu era tratada como adulta. No estágio, me tratavam como adolescente governável.
Acredite, os funcionários da repartição pública onde me chamaram pra fazer estágio, aos 16 anos, faziam a garotada rodar e rodopiar pela cidade pagando suas contas, comprando os seus lanches, entre outras coisas. Eu tinha 16 anos e aprendi bem o que é a vida de office boy.
De lá para cá, as leis de estágio foram rigorosamente impostas. Os empregadores já não abusam dos estagiários com tanta frequência.
Mas naquela época a gente era tratado como escravo.
Por outro lado, dei sorte com um dos meus chefes, que realmente entendia o significado do estágio e foi quando aprendi a usar uma máquina de escrever elétrica. Seu Rachadel, que Deus o tenha, foi um homem muito honesto, dedicado, trabalhador e que ensinou aos estagiários muitas coisas úteis. Ele tinha uma paciência de Jó e sempre foi muito educado com todos.
Datilografei inventários e mais inventários de material de expediente e permanente. Então... Por que não começar a datilografar os meus livros escritos à mão (em pilhas e mais pilhas de folhas verdes)?
Mas apesar de ter começado a escrever o esboço do meu "segundo" livro Papiro na adolescência... (o primeiro foi levado pela enxurrada), eu não tinha clara em minha mente nem a responsabilidade nem o interesse em ser escritora. Eu desistia muito fácil nos primeiros capítulos (ficava entediada). Queria mais ser desenhista em quadrinhos.
Aos 17 anos, fiz o primeiro fanzine da minha cidade e tive algum reconhecimento com os meus personagens em quadrinhos. Todos registrados, é claro. Juna, a pirata, foi homenageada na Argentina e participou de exposições na Catalunha. Foi lida por brasileiros em todo o Brasil, na Inglaterra, França, por brasileiros que xerocavam a revistinha e passavam adiante.
O Voyeur foi, ainda, o primeiro fanzine com reportagens, culinária e quadrinhos. Eclético como a filosofia pessoal da dona. Vendeu mais que Conan, o Bárbaro, nas bancas onde eu deixava por consignação. Os distribuidores da Editoria Abril ficavam doidos. Tentavam colocar o Voyeur para trás dos quadrinhos da Marvel. Mas os turistas sempre chegavam à cidade perguntando por ele. Queriam a Juna. E saber o que aconteceu no próximo episódio.
Tenho que reconhecer que as vendas do Voyeur me ajudaram a continuar produzindo o fanzine. Se bem me lembro foram 32 edições. Um dos fanzines mais duráveis (de maneira contínua) da sua época.
A Juna ficou tão famosa no meio underground, que foi desenhada pelos maiores desenhistas da época. Júlio Shimamoto, Mozart Couto, Watson Portela, Emir Ribeiro, entre outros gigantes, alguns já falecidos.
Eu também a desenhava, de vez em quando. E havia outros super heróis que pensei em transformar em livro. Não sei se vai dar tempo. Os Imbatíveis fizeram sucesso. No cômico, eu publicava Adelaide e sua turma.
Bons tempos. Mas a combinação de falta de tempo (eu estava começando o mestrado) e o machismo nos quadrinhos, levou-me a perder o gás. Era muito pronunciada e agressiva a forma como a mulher era tratada nos quadrinhos. O reduto dos garotos, sabe como é!
Eu cansei e larguei.
Não sei como está hoje. Espero que menos fofoca e menos machismo e mais mulher atuante. Na minha época éramos em duas ou três. Quando eu saí, em dez anos de produção, deviam ter umas seis garotas no meio.
Daí, resolvi retomar algo que comecei na adolescência, mas que me entediava: escrever livros. Aprendi muito escrevendo roteiros para quadrinhos e usei esse aprendizado na escrita de livros.
Acho que um dos motivos por me desinteressar da escrita, no passado, é que eu escrevia com facilidade. Nunca precisei estudar língua portuguesa para tirar notas estratosfericas. Não havia desafio. Além do mais, eu cometia o erro de tentar escrever como os livros da moda. Por isso ficava entediada. Mais tarde eu viria a descobrir minha arrogância adolescente de acreditar que conduzir uma trama fosse fácil. E comecei a criar minhas próprias estórias, deixando de lado os livros da moda. Não quis seguir o que já está no mercado. Tem enredos que já são tão batidos que eu fico entediada até antes de cogitar escrever algo do tipo. Foi por isso que relutei em fazer "A Herança de Fenris". Porque já tem muitos morceguinhos e lobinhos, por aí.
Ah, mas eu fiz A Muralha, diriam alguns... Com várias panterinhas. Escrevi quando Crepúsculo estava em alta e eu estava tentando entrar no mercado, então eu me esforcei para dar o tiro certo e ao mesmo tempo, manter a identidade do livro (minha assinatura, por assim dizer). E acho que consegui. Usei o que tenho de melhor, a pesquisa, e mergulhei além do vampiros tradicional. Fui até a origem dos mitos das criaturas das sombras. Parafraseando DaVinci: Para quê beber de um jarro se eu podia achar a nascente do rio.
A maioria dos agentes literários e editores achou A Muralha complicada demais. Para escrever complicado assim disse um crítico de Portugal, eu teria que escrever como homem. No caso, usar um pseudônimo masculino como fez J.K. Rowling. E mesmo que os americanos tenham gostado, meu inglês teria que ser excelente. Faltou um elemento para mim: dinheiro.
Dinheiro para traduzir e editar. Dinheiro para lançar no Brasil.
Enfim......................................................
Como pode ver, no quesito "entediar-me fácil com temas recorrentes"... Não mudei da adolescência para a fase adulta-madura. Mas quando estava me debatendo para retomar a escrita, lá pelos 24 anos, eu tive uma das primeiras revelações, como escritora. Quando descobri que desejava rodar o mundo. Eu desejava liberdade. Então entendi que poderia fazer isso por meio da escrita. Foi o que me motivou a terminar O Papiro. Isso e uma boa amiga que leu o manuscrito, uma década e meia depois.
O desejo de conhecer o Egito era enorme! Então estudei egiptologia por conta própria enquanto pesquisava para o livro, nas horas vagas. A minha veia de bibliotecária nunca me abandonou. Adoro pesquisar desde que aprendi a lidar com livros e classificar os assuntos.
Por sorte, mais pra frente, eu realmente conheci o Egito. Foi uma experiência maravilhosa e ajudou a fechar algumas lacunas do livro.
Foi o desejo de conhecer lugares que me ajudou a concluir os volumes 2 e 3 da Muralha.
O resto é história... e para conhecê-la, basta ler a apresentação e a nota dos meus livros. Cada livro meu teve um processo de escrita único. Por isso são tão diferentes entre si. Mesmo aqueles que compõem as trilogias.
No entanto, cada livro meu possui um pedacinho da minha trajetória e das pessoas que já conheci, convivi, ou mesmo as pessoas que apenas observei pelas ruas da cidade.
A escrita para mim é isso: um encontro de mentes e modos de ser ao longo de nossas jornadas. As pessoas seguem suas vidas, mas não sem produzir uma marca na vida das outras.
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PS - Alguns fanzineiros pediram a minha permissão para ressuscitar a Juna nos quadrinhos. Deve ser para aparecer em algum fanzine. Eu achei maneiro o desenho que criaram, atualizando a personagem:
Desenho de Alberto Pessoa.
Não sei se ele vai desenvolver ou não, mas dá pra ver que o rapaz tem muito talento. Lindo desenho! Obrigada pelo presente.
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