🎃 𝖕𝖊𝖘𝖆𝖉𝖊𝖑𝖔 𝖇𝖔̂𝖓𝖚𝖘 🎃
🌗 Sinopse: Você seria capaz de distinguir um destino cruel disfarçado de amor verdadeiro?
LINHA TÊNUE
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⠀⠀⠀⠀Existe uma linha tênue entre o amor e o ódio.
Ambos os sentimentos exigem toda a energia e dedicação de uma pessoa. Todos os seus pensamentos precisam estar inundados, transbordando, sobre a outra pessoa em questão. Você tem que deixar o posto de personagem principal da sua própria história, alguém o assume por você.
Me lembro perfeitamente quando você tomou esse posto na minha vida.
Era uma gélida noite de julho, a ventania era um objeto cortante em contato com a minha pele. O longo casaco preto que eu trajava fazia um péssimo trabalho em me manter aquecida, mas sempre tive o péssimo hábito de me apegar a coisas que não me faziam necessariamente bem. Sempre seguia pelo caminho mais longo para voltar para casa, assim evitava um viaduto no qual qualquer um que ousasse atravessar após o pôr do sol se tornaria uma notícia sensacionalista no dia seguinte.
Além das chances de morrer serem reduzidas, existia uma adorável lanchonete neste outro trajeto. Os preços não eram dos mais justos, o que gastava num pedaço de bolo provavelmente daria um bolo inteiro se cozinhasse eu mesma. Mas me permitia o luxo em dias estressantes e esse dia tinha sido particularmente estressante.
Nunca acreditei em destino, mas certamente havia algo predestinado naquela noite. Você não tem o poder de controlar o tempo, tem?! Às vezes realmente me pego pensando nessa possibilidade. O exato horário em que a chuva começou a despencar dos céus também estava nas suas anotações? Não me surpreenderia se fosse o caso.
Um trovão estridente me assustou enquanto fazia o meu típico pedido, uma fatia de bolo de limão. Não notei sua presença até você cutucar meu ombro e me entregar o batom que eu tinha derrubado sem perceber.
Não costumava aceitar convites de estranhos, então hesitei quando me convidou para se sentar na mesma mesa. Mas avaliando o dilúvio do lado de fora do estabelecimento, e o fato do meu celular estar praticamente sem bateria, aceitei. O sorriso gentil e a bela aparência também foram grandes fatores para me fazer baixar a guarda.
Mudei o pedido de viagem para consumir no local e adicionei a ele uma xícara de chá de frutas vermelhas, a qual você gentilmente pagou no final da noite. Um tanto irônico que a primeira coisa que me veio à mente quando nos conhecemos foi justamente essa palavra, gentil. O oposto do que você representa.
Não foi sua gentileza que me atraiu, no entanto. Não totalmente. O que me fez ficar fascinada por você foi o livro preto disposto na mesa, trancafiado por uma corrente com um cadeado de caveira.
– É meu diário! – você explicou.
Sempre tive certa inveja de pessoas que conseguiam manter diários. Fiz algumas tentativas quando era mais nova, mas ter meus pensamentos mais obscuros expostos não me trazia uma sensação de alívio. A tinta da caneta me passava a impressão de estar eternizando os sentimentos ali cravados. A sensação de vulnerabilidade nunca me trouxe conforto. Acabava arrancando todas as folhas riscadas em apenas alguns dias de documentação.
O que os olhos não veem o coração não sente.
Preferia manter as palavras engasgadas na minha garganta, quem sabe assim algum dia não se dissolvam? Mas admirava, e muito, quem não possuía esse medo de encarar a si mesmo. Pensei ter encontrado o yin do meu yang naquela noite. Sua coragem se contrastando com minha covardia, o complemento perfeito.
Quando me ofereceu uma carona para casa, tentei recusar. Já havíamos trocado nossos números de celular. Outro dia! Se for mesmo pra ser, nos encontraremos de novo sem problemas.
A atendente da lanchonete não concordou com a minha decisão.
– Não soube do que aconteceu por essas redondezas? Uma mulher simplesmente desapareceu! Estão se referindo a ela como "a sexta vítima". – disse a moça de cabelo colorido, os fios cobertos por um vermelho desbotado a tempos.
– Não pode ser! Este bairro é tão seguro, nunca acontece nada por aqui. Tem certeza?
– Certeza absoluta! Alguns policiais até estiveram por aqui fazendo algumas perguntas. Infelizmente nossas câmeras estão quebradas faz algum tempo, então não pudemos ajudar em muita coisa. – Ela suspirou colocando as mãos na cintura. – Parece que quanto mais ricos, mais mesquinho são os chefes. Não querem gastar o dinheiro nem com algo importante assim...
– Eu soube dessa história! – você se pronunciou com uma feição séria. – Se não se sente confortável com uma carona, me deixe pelo menos te pagar um táxi. As ruas devem estar desertas nesse horário com o tempo chuvoso assim.
– Não! Devem estar cobrando uma facada justamente por isso...
– Aceita a carona menina! Vai deixar seu orgulho ser mais importante que sua segurança?! – a atendente insistiu mais uma vez.
Então eu aceitei, segui a intuição dos outros ao invés da minha.
Quando chegamos na minha casa, a chuva já havia cessado. Nos despedimos com um breve abraço e uma promessa de tomarmos chá, juntos de novo.
– Boa noite! – você sorriu gentilmente.
Retribui o sorriso antes de fechar a porta.
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Odiar é tão profundo quanto amar. Uma profundidade que te afoga em escuridão ao invés da luz do amor. Entretanto, luz e trevas não são dois lados da mesma moeda? Você queria que eu pulasse do penhasco e mergulhasse no seu mar, que me afogasse em você. Então eu pulei, de agrado.
A ventania parecia estar levando tudo no seu caminho, até os dias. Os meses voaram e se mesclaram. Durante esse tempo fiz da sua casa a minha. Passava tanto tempo contigo que não me sentia mais em casa quando voltava para meu apartamento.
Então me mudei, rápido assim, segui a ventania.
Minha hora favorita do dia era observar você escrevendo em seu diário, com uma xícara de chá nas mãos. A curiosidade para saber seus pensamentos era grande, mas o respeito era maior. Não invadiria sua vulnerabilidade.
– Encontraram o corpo daquela moça!
– Do que está falando? – me perguntou erguendo uma sobrancelha e parando o movimento da caneta.
– Da noite em que nos conhecemos! Aquela da qual a atendente estava comentando... Ela foi assassinada mesmo, tinha a mesma marca redonda no pescoço que as outras. Será que o assassino está querendo passar alguma mensagem?
– Eu acho que você que está passando muito tempo assistindo documentários, querida. – Você riu de leve e voltou a escrever.
– Não acha estranho também?! Por que usar um objeto que deixa uma marca tão específica nas vítimas? É como se quisesse ser pego... Ou é tão confiante de que não vai ser encontrado, que nem se importa com esses detalhes.
– Não vamos falar de assuntos tão pesados antes de dormir. – Você disse enquanto envolvia o diário com a corrente e o trancava com o cadeado de caveira.
– Talvez ele mate elas com uma caneta! – brinquei, segurando a caneta contra seu pescoço e dando risada da ideia ridícula.
Você forçou uma risada e pareceu tenso, pensei que fosse por achar minha piada de mal gosto. Quando se deitou sem dizer uma palavra, deveria ter escutado o seu silêncio.
– Sabe, essa coisa de destino deve ser verdade no final das contas. Se não fosse por você naquela noite, eu poderia ter me tornado a sétima... – disse me deitando também.
– Nem pense em algo assim. Você está bem, está segura. – Você me confortou. – Boa noite querida!
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Acredito que a negação seja a base por trás de cada sentimento intenso. É o que nutre essas emoções. O que as rega para as manter fortes.
No amor você tem que ignorar os defeitos de quem ama, focar apenas nas partes boas. No ódio você tem que ignorar as qualidades de quem odeia, focar apenas nas partes ruins.
É branco ou preto, nada de cinza quando se trata de sensações extremas. Talvez esse tenha sido meu principal erro, não saber mesclar os dois. Ser ingênua de acreditar que quando existe luz, é impossível que também exista escuridão.
Quando o verão arrebatou a cidade, ainda estávamos bem. Troquei o chá quente pelo gelado, o casaco preto por um vestido e as notícias de assassinato por novelas de final da tarde.
Você estava prestes a viajar para outro estado, a empresa para qual trabalhava fazia um evento especial de verão todos os anos. Me senti triste, pois não teria sua presença confortante comigo por dias, mas seria injusto reclamar de algo que não estava sob seu controle.
Nos despedimos e assim que você passou pela porta senti minha paz ser inundada por melancolia.
Desliguei a televisão e subi para o quarto, talvez dormir ajudasse o tempo a passar mais rápido. Talvez eu passasse a semana dormindo, para despertar apenas quando você voltasse. O destino, no entanto, interrompeu meus planos mais uma vez, pela última vez.
O diário preto estava caído no pé da cama.
Você não deve ter notado que esquecera de o colocar na mala. Eu poderia ter corrido para ver se você já tinha dado partida no carro, poderia ter ligado para que voltasse para buscá-lo, pois sabia como era importante para você e poderia simplesmente ter guardado o diário na gaveta da escrivaninha — como desejo que tivesse escolhido fazer isso.
Porém, ele estava destrancado, a corrente frouxa e o cadeado caído ao seu lado.
Não pude resistir à tentação de dar uma olhada, uma breve invadida na sua vulnerabilidade. Me pergunto se o que se sucedeu não foi apenas parte do meu carma, uma punição por deixar meus pensamentos feios tomarem conta.
Ao pegar o livro preto, fotos deslizaram das páginas dele. Sete fotos. De sete garotas diferentes. Cada uma com uma data diferente escrita em seu verso. A data mais recente estava escrita na foto de uma garota conhecida. Sim, sentia que a conhecia de tanto ver seu rosto nos noticiários. Era a sexta vítima do assassino em série.
A sétima foto foi a que mais me surpreendeu. Eu a conhecia, não devido ao noticiário.
Ela ainda não estava morta. Estava viva.
Estava viva, encarando as fotos das outras vítimas.
A minha foto era a sétima. O verso ainda estava em branco.
Minha mente não teve tempo de reagir ao peso das informações que havia acabado de descobrir. Uma dor aguda atingiu meu pescoço. Senti um líquido quente escorrer pela minha pele. Só tive tempo de encarar o espelho a minha frente, observando como o sangue jorrava da perfuração em meu pescoço pela caneta.
Sua caneta.
Seu reflexo no espelho foi a última coisa que vi antes de cair no chão, sem forças nem para manter os olhos abertos.
Acreditava que você era como um anjo da guarda que apareceu na minha vida, mas agora entendo que a sombra tem a mesma intensidade que a luz. Apenas não soube distinguir na época. Provavelmente não quis.
– Ah, meu amor, é realmente uma pena. Era pra você durar pelo menos mais um mês... – Sua voz soou no quarto, quase não conseguindo me alcançar enquanto o cheiro do meu próprio sangue tomava conta de todos os outros sentidos. – Sei como amava o fato de eu escrever tanto, então, se serve de consolo, saiba que você foi meu capítulo preferido. O que mais gostei de escrever.
Dizem que vemos nossa vida toda passar diante nossos olhos quando morremos. Você, meu querido, foi a primeira e última memória que passou no filme antecedente a minha morte. Seu sorriso gentil foi a primeira e seu reflexo no espelho a última.
– Boa noite querida!
E assim apaguei, afogada por sua escuridão.
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O amor te mantém preso a uma pessoa, mesmo quando você tem todos os motivos para querer se libertar. Mas o que me manteve presa a você foi o ódio. Ódio pela enganação, negação e por mesmo depois de tudo não conseguir te odiar por completo.
Até mesmo na morte não consegui sair do seu lado, permaneci aqui, nas sombras onde você me jogou.
Observei você nos dias a fio em que ficou escrevendo, aperfeiçoando os relatos registrados em seu diário. Alterando diversos fatos para que não te ligarem aos assassinatos ocorridos meses atrás. Mortes estas que ninguém nem mais lembrava, o novo assunto do momento era o divórcio de duas celebridades.
Você modificou até o país em que os assassinatos ocorreram, a causa das mortes, o tempo que passou entre mim e elas. Meu nome foi alterado para um parecido, mesma inicial para que não fugisse tanto assim da realidade.
Você comemorou com uma garrafa de whisky quando conseguiu uma reunião com uma editora. Ninguém suspeitou de nada. Era apenas mais um enredo sobre um crime entre milhares de outros. Nem imaginam que neste a arte imita a vida, literalmente. A editora descreveu o trecho que você enviou para eles como "Tão realista que parece verdade!".
Você se recusou a passar tudo para um arquivo digital, "Escritores de verdade usam papel e caneta!". A editora não reclamou, acharam excêntrico. Podiam usar isso como marketing para vender o livro. O autor bonitão, excêntrico e preso numa era passada. Você seria vendido como o clássico homem romântico que transformou sentimentos ruins em arte. O pior de tudo é que estavam certos, essa estratégia funcionou. Certamente compareceria na sua estreia se ainda estivesse viva, como a boa amante de histórias criminais que era.
Se ao menos nossos caminhos não tivessem se cruzado pelo destino.
Destino este que descobri ser nada mais do que algo planejado por você. Não estava naquela lanchonete por acaso. Estava aguardando sua próxima vítima passar pela entrada, para que pudesse oferecê-la gentileza e em troca pegasse sua vida para se tornar um mero capítulo de um livro. Na sua mente, parecia uma troca justa.
Após meses te observando, percebi que não existia nenhum poder mágico que lhe faria pagar pelo que fez. Então quando o whisky te fez apagar na poltrona do escritório, tomei o destino nas minhas mãos.
Rasguei as folhas do manuscrito em vários pedaços, para ter certeza de que não poderia ser recuperado. Assim como minha vida não podia ser retomada. Quando terminei, as joguei no ar. Os pedacinhos brancos voavam como se fossem plumas. O carpete do chão aos poucos se tornou um mar branco.
Sorri com o meu feito, mas ainda não era o suficiente. A cereja do bolo seria me deleitar com o seu mais puro desespero quando acordasse. Mal esperava para escutar os seus lamentos do porquê o destino tinha sido tão injusto com você. Queria que pegasse cada papel rasgado do chão e sentisse a sensação de perda te dominar por completo.
Posso não ter conseguido seu amor em vida, mas agora terei seu ódio na morte.
Durma bem meu querido, estarei aqui quando despertar.
Eu não vou a lugar nenhum. Temos sua vida inteira pela frente, para vivermos juntos, como prometemos.
Com amor, sua querida.
Boa noite!
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𝔢𝔰𝔠𝔯𝔦𝔱𝔬 𝔭𝔬𝔯: rkbunny
Olá, caro leitor.
Se está aqui, então foi corajoso o bastante para ignorar nossos avisos, não?
Você ao menos seguiu nossos conselhos ou teve muitos pesadelos?
Gostaríamos de lamentar por quaisquer distúrbios que cada conto neste livro possa ter provocado em seu sono, mas estaríamos mentindo se dissessemos que sentimos muito. 🤫
No entanto, somos gratas por termos encontrado um leitor tão audacioso e destemido, para nos acompanhar até o fim dessa jornada assombrada.
Esperamos que cada segundo que tenha passado preso nessas páginas tenha válido a pena.
Obrigada por nos dar seu tempo.
Tenha um Halloween muito assombrado e um dia dos mortos feliz! 🎃👻
Agradecimento especial às escritoras fantásticas:
torialiteraria
Anylight
Tamcauzi
Astronaut99s
laxiverso
rkbunny
Obrigada por embarcarem nessa collab junto a mim (narrandoilusoes). Sei o quanto foi desafiador para algumas de vocês, por saírem de suas zonas de confortos na escrita. Espero que essa aventura tenha sido prazerosa e enriquecedora para vocês, enquanto escritoras e leitoras, sou muito grata por fazer parte disso com vocês. ˖♡
chiharunnie, nossa designer, muito obrigada pelas artes lindas que complementou nosso livro.
Você é demais! ˖♡
Aos leitores que leram até aqui, isso não é um adeus. Você pode continuar a se encantar com a escrita e universo mágico criado por cada uma das autoras deste livro acompanhando as obras que estão em seus respectivos perfis.
Nos vemos por aí... 👻
Beijos e sussurros,
Equipe Fanfics Union.
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