XXIX -Alicia
-O que houve entre Tâmara e Tamires? –Alícia tentou puxar um assunto para acabar com o clima tenso entre os amigos. Ela sabia que as primeiras gêmeas não se gostavam, só não sabia o porquê. Ela também não dava a mínima para os motivos delas, só queria escapar daquele desconforto.
-Não sei –Riley respondeu- Sempre deve ter havido uma certa competição entre as duas. Coisa de irmão, sabem?
-Acho que já basta de histórias sobre a vida pessoal da família real, não acham? - Dave comentou
Alícia deu de ombros. Já ia fazer uma hora que eles estavam andando naquela trilha. Como era a única com uma bolsa, tinha que ficar parando para dividir a garrafa de água com os dois meninos, por mais que estivesse frio. As princesas haviam dito que ia levar apenas alguns minutos. Dave se desculpava as todo o momento.
-É sério, não se preocupe -Riley falou- Está nos fazendo um favor. Além do mais estamos nos divertindo, não é?
-Acho que chegamos –Alícia falou.
Ela olhava para uma enorme muralha de tijolos laranja com uma torre bem na frente deles. O muro continuava até onde os olhos deles podiam ver e fazia um ângulo reto quanto chegava na torre. Tâmara dissera que era só entregar o papel com um carimbo dela e eles os deixariam passar pela fronteira entre as províncias sem nenhum problema.
-Como fazemos para chamar atenção de quem quer que esteja lá em cima? –Dave perguntou, parando a alguns metros da muralha.
Riley chegou mais perto, tocando os tijolos e tirando certa quantidade de poeira deles.
-Gritamos? –Alícia sugeriu.
Ela estava tão cansada que faria qualquer coisa só para poder descansar um pouco.
-Ei! –Alguém gritou à esquerda deles. As crianças pularam de susto. Um homem vestindo uma armadura completa vinha na direção deles com uma lança enorme apontada para o céu. -Quem são vocês? O que fazem aqui?
Eles se encararam, mas não disseram nada. Alícia revirou os olhos e deu um passo à frente.
-Fomos enviados pela futura rainha Thaila e pela princesa Tâmara. Devemos cruzar a fronteira e entregar uma mensagem para...
-Não podem simplesmente cruzar essa fronteira sem certas formalizações. –o homem a interrompeu. –Primeiro, preciso ter certeza de que fazem parte deste reino.
Ótimo. A menina pensou. Acho que preferia os documentos de papel. O frio a atingiu no momento em que tirou a primeira manga do casaco e continuou a lhe torturar até poder colocá-lo de volta. O homem não demorou muito para dizer que as marcas deles eram legítimas. A coroa nas costas de Dave provavelmente arrancou uma expressão de surpresa no homem, não tinha como saber ao certo por causa de seu capacete, mas ele se demorou mais no representante de Thaila.
-Também temos isso -Dave deu o papel carimbado para ele.
-Certo... É meio que uma situação especial... –ele analisou bem o papel.- Vou levá-los para falar com Marineva. Ela decidirá o que fazer.
-Quem é Marineva? –Riley sussurrou para a irmã.
-E como é que eu vou saber? -ela respondeu.
–Acho que devíamos simplesmente seguir o cara. -Dave sugeriu e começou a caminhar.
Não muito longe de onde estavam havia um portão que levava a um pátio.
-Terão que deixar os sapatos aqui –O homem os informou.
Alícia resmungou. Tinha acabado de se aquecer novamente. Mas mesmo assim tirou os sapatos e os deixou junto dos outros. O homem finalmente tirou o capacete e revelou olhos pretos penetrantes para os convidados. Não tinhas uma face muito elegante. O rosto era cumprido e o nariz grande demais. Ela ignorou-o e voltou sua atenção para o lugar a sua frente. O pátio era composto por diversas colunas em estilo jônico de onde pendiam tapeçarias que mostravam o sol e a lua nas mais diversas perspectivas e situações. O chão de mármore era frio, mas a textura ficou esquisita depois de alguns passos. Parecia...
-Cabelo? Isso é cabelo? –Riley falou, com certo nojo na voz.
-Eca! –Dave acrescentou.
No centro do pátio havia uma cadeira onde sentava-se uma mulher que se olhava em um espelho. E Alícia achava que o cabelo de Lilian seria o maior que veria em toda a vida. O da moça cobria todo o pátio. Metros e mais metros de cachos loiros que escorriam de sua cabeça para o chão, escondendo o mármore branco dos olhos de quem olhava. Vinham de uma cabeça que abrigava um rosto de pele clara e feições delicadas. Os lábios da moça quase não existiam de tão finos e delicados. Ela parecia uma boneca de porcelana com uma cascata de cabelos pelo chão.
-Senhorita Marineva –O homem se curvou.
-Temos visitas? –ela perguntou- É ele, Claudo, é ele?
-Não senhorita –Claudo respondeu. Ela pareceu muito desapontada. Quem quer que fosse "ele" devia ser mesmo bastante importante. -São viajantes. Enviados pela futura rainha e pela princesa da terra. Querem cruzar a fronteira para entregar uma mensagem a alguém.
-Uau. Ele estava mesmo ouvindo. –Alícia comentou com Dave.
-Por que alguém cruzaria a fronteira a pé? –Marineva parecia chocada. –Temos trens hoje em dia!
-A senhorita está certa. Mas tenho que saber se tenho ou não autorização para deixar que eles passem.
Por favor, decidam-se logo! Alícia pensou. O fato de estar pisando no cabelo dela a incomodava mais do que a sensação estranha de fazer tal coisa.
-Como vamos saber se não estão nos enganando? E se estiverem trabalhando para minha irmã? –Ela pareceu desesperada. –Não! Eles não podem passar! Serão meus prisioneiros. Dneva não vai conseguir me enganar de novo! EU SOU MAIS ESPERTA DO QUE VOCÊ, IRMÃZINHA!
-Não senhorita! –O cavaleiro a interrompeu. As crianças se entreolharam e chegaram a um acordo silencioso: Marineva era louca. –Eles têm um carimbo da princesa da terra.
-Então por que os trouxe aqui? –Ela se acalmou de repente. –Pode deixar eles irem. Não corram com facas, a não ser que estejam atrás de minha irmã. Cuidado com ela.
-Ok –Riley falou.- Obrigado pelo conselho. Podemos ir?
-Quem ousa dirigir a palavra a mim? –Ela se levantou da cadeira.
-Sou Riley. Weis. Riley Weis.
-Muito bem Riley Weis. Você pode ir e leve seus amiguinhos com você. Mas terão que me prometer uma coisa, Riley Weis e amiguinhos... -Ela se levantou e caminhou por entre seus próprios cachos até as crianças. -Causarão algum tipo de dano, não me importa qual, se um dia virem minha irmã. Temos um acordo?
As crianças se entreolharam, um pouco receosas. Riley deu de ombros.
-Claro. Acordo fechado.
-Claudo, pegue os sapatos deles e abra os protões.- Seus finos lábios se curvaram num pequeno sorriso.- Obrigada Riley Weis. E se o virem...-sua voz adquiriu um tom apaixonado e sonhador. Ela se jogou no próprio cabelo, deitando de costas no chão.- Se o virem digam que eu ainda estou esperando.
-Vir quem? - Alícia perguntou.
-Aqui estão seus sapatos- Claudo voltou- Podem calçá-los quando chegarmos do outro lado do pátio. A senhorita vai ficar bem?
-Sim, Claudo –ela respondeu.- Talvez agora tudo fique bem, graças a Riley Weis. Provavelmente devo tudo a ele. Trate-o bem.
Dave e Alícia encararam o novo favorito da moça louca. Seus olhos diziam que ele estava contente com as palavras dela.
-Vocês ouviram, não é? Tratem-no bem. -Riley não parara de repetir as palavras de Marineva o caminho todo. Alicia não reclamava porquê era bom ver o irmão se sentindo importante. Os outros dois do trio já tinham tido seu momento, ambos envolvendo legado. Agora era a vez de Riley -Querem saber? Se eu encontrar essa tal Dneva, vou mesmo causar-lhe dano. E de quem será que ela estava falando quando disse "ele"?
-Não sei Riley, mas sinceramente, temos que nos preocupar em achar Resmungo agora -Dave falou delicadamente.
-Certo –O irmão parecia frustrado.
Alícia sorriu. Dave olhava constantemente para os lados, procurando qualquer sinal de civilização. A carta de Thaila estava na sua bolsa. A menina via o quanto era importante que ele cumprisse a tarefa para ganhar a confiança tanto da rainha quanto da mãe.
-O que Thaila disse sobre a localização da casa dele? -Alícia perguntou.
-Nada que me desse muita certeza -ele respondeu.- Na verdade só estou andando com a esperança de encontrarmos alguém que nos diga exatamente para onde ir.
Eles caíram num silêncio que permaneceu por mais alguns minutos, até Riley começar a cantarolar músicas diversas. Os ouvidos da menina foram gradualmente perdendo a audição; o efeito do alcaçuz foi passando. Os sons da floresta ficavam mais nítidos e a música de Riley mais irritante. Ela prestou mais atenção ao barulho das folhas secas sendo esmagadas por seus pés. Era quase relaxante. Algumas coisas rastejavam quase imperceptivelmente próximas as raízes das árvores. Ela desejou que não fossem cobras. No começo elas apareciam de vez em quando, tímidas, se escondendo na folhagem, mas conforme eles foram andando, Dave olhando ainda mais para os lados e Riley cantando ainda mais alto, essas coisas rastejantes foram aparecendo cada vez mais. Não só no chão como nos troncos e copas de árvores, atazanando a paz de Alícia.
-Ai! - Sem perceber que Dave havia parado ela esbarrou contra ele.
-O que foi? -Riley, que andava na frente, parou e se virou, segurando a espada precariamente.
-Ouviram isso? -ele olhou para os lados mais freneticamente do que antes. –Acho que são vozes. Espero que possam nos dar alguma informação. OI! –Ele gritou.
-Dave! - Alícia o repreendeu.- Não podemos simplesmente confiar em estranhos na floresta!
Eles permaneceram em silêncio, tentando ouvir possíveis vozes. O chão continuava a tremular, se mexer na direção deles, vagarosa e timidamente.
-Dave...-ela tentou alertar, mas já era tarde demais.
Dois pares de cipós verdes e pegajosos se agarraram aos tornozelos dos dois e os viraram de cabeça para baixo, derrubando tudo o que seguravam.
-Alícia! - Riley gritou e correu na direção da irmã.
-Riley não! -ela tentou o impedir, mas outro par o pegou e o deixou pendurado junto com os outros dois, derrubando também a espada que ele segurava de qualquer jeito.
-O que é isso? -Dave gritou.
-Não sei. Só quero sair daqui! Socorro! -Riley gritou e se debateu inutilmente. –Cadê minha espada?
-No chão. Tudo está no chão. Como vamos sair daqui?
-Acho que eu consigo. Desta vez eu conciso. –Alícia falou.
Aquelas semanas treinando na casa de Tia Rosa podiam ou não ter sido suficientes para que ela conseguisse trazer as espadas para si. Desta vez ia dar certo. Tinha que dar certo.
-Não! Péssima ideia! Dave, não deixe ela fazer isso. Ela se cortou várias vezes com facas. O que acha que vai acontecer se ela tentar com espadas?
-Riley, cale a boca! - Alícia gritou.
-Eu só quero sair daqui! - Dave gritou de volta. O rosto dele começava a ficar vermelho, e o da menina não devia estar diferente.
Certo. Ela pensou. É só trazê-las até aqui. Você consegue Alícia, vamos lá!
-Não! Alícia, é sério. –Riley tentou alcançar os próprios pés, lutando contra a gravidade.- Dave, proteja a cabeça!
Alguém abaixo deles falou alguma coisa. Alícia não fazia ideia do que aquilo significava, porém, a voz vinha de um velho que carregava uma cesta cheia de algo de coloração azulada. E algo que se mexia.
-Por favor! - Riley gritou -Nos tire daqui antes que ela faça alguma besteira!
-Riley, silêncio! - Alícia ia tentar. Ela ia conseguir.
-O que está fazendo? Essas coisas são nossas! - Dave gritou para o chão.
O homem havia se abaixado e estava recolhendo as espadas das crianças, analisando-as contra a luz e checando se estavam afiadas, passando as lâminas nas coisas azuis que carregava.
-Ei! –Foi a vez de Riley falar.- Seu ladrão! Deixe nossas coisas em paz!
O homem voltou a atenção para as crianças e disse mais algumas palavras. Parecia alemão. Ele estava bastante ofendido em alemão. Alícia desejou ter seu alcaçuz com ela. O velho então pôs as coisas no chão e sussurrou algumas palavras para a cesta que carregava. A coisa que se mexia, que se mostrou ser um furão, correu pelo chão e subiu na árvore até o topo. Cinco segundos depois de desaparecer por entre as folhas, Riley caiu de costas no chão, depois Dave, e por último, Alícia, caindo em cima das pernas do irmão, e arranhando o interior da sua boca com o aparelho. Ela sentiu o gosto de sangue.
-Ora, você está louco? –Dave reclamou.- Podia ter nos matado!
O homem começou a responder-lhes e Alícia buscou em sua bolsa pelo alcaçuz.
-...Então pensei que deveria ajuda-los! -O velho disse.
-Thaila lhe disse que viríamos? - Dave se pôs de pé e pôs a espada no bolso. –Quando foi que ela falou com você?
-Não, ela nunca me disse nada pessoalmente. Thaila me evita. Mas não é culpa dela. Ela tem seus motivos. Nosso encontro seria um tanto perturbador para os dois. Mas pelo jeito ela precisa de ajuda, não? –O furão voltou descendo da árvore e se enfiou na cesta novamente. O velho sorria.
-Sim. Precisa que o senhor...
-Não, não não! São meus primeiros convidados em dez ou treze anos. Vou preparar chá e biscoitos com creme para vocês. Em minha casa. Vamos.
As crianças se encararam. Riley ainda estava no chão.
-Temos que ir. Tenho que falar com ele.
-Alícia, você está bem? –O irmão se levantou- Está sangrando!
-E eu caí em cima de você. Mas estou bem sim. Por que não me deixou tentar trazer as espadas para nós?
-Porque ia nos matar!
-Não, não ia.
-Ei! –Dave já estava quase desaparecendo de vista- Vocês dois vêm ou não?
Eles recolheram as coisas e seguiram o homem.
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Minhas provas finalmente acabram!!! Espero que gostem do capítulo, e que não se esqueçam de votar e comentar!!
De acordo com a LEI N 9.610 DE FEVEREIRO DE 1998, PLÁGIO É CRIME.
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