XLI -Alícia
Último capítulo da Alícia no livro 1!!!
Espero que gostem...
Ela lançava olhares desconfiados com a sobrancelha franzida constantemente para Isabelle. Deixava bem claro que a menina não era bem-vinda em seu grupo de amigos em nenhum momento. A punição de Dave acabara bem no dia domingo de Páscoa, dando ao garoto a oportunidade de acordar tarde e descansar os meses que tinha passado ajudando aos funcionários da escola. Foi bem estranho não acordar e correr para tomar um café da manhã especial e depois decidir qual ovo de páscoa deveria ser comido primeiro, brigar com o irmão a respeito e acabar abrindo o da mãe. Era sempre assim, mas não este ano. Não tinha nada de diferente no café da manhã e não havia nenhum ovo de chocolate. Talvez estejam escondidos, uma parte de si pensou, porém conhecia a verdade; Érestha não tinha Páscoa e aquele era apenas mais um domingo. Costumava ser o feriado favorito de Alícia Weis.
O novo trimestre tinha se iniciado e mais trabalhos e provas estavam começando a ser marcados pelos professores. Tinha um trabalho escrito de História e outro de Geografia; um exercício em grupo para a aula de Lorena e algo do qual não lembrava pois não tinha prestado atenção na aula de Bennu. Tudo para o próximo mês. Também tinha o dentista no dia 8, como todo o mês, e um encontro marcado com Candace, a irmã do homem quem lhe contara sobre os polaristas, que tinha o mesmo legado que Alícia.
-A primeira aula de amanhã é da professora Wills –seu irmão comentou. –Tinhamos alguma lição?
A carioca o encarou antes de responder. É páscoa. Quem liga para lição de casa na páscoa?
-Não. Não sei.
Alícia viu Dave se servindo na comprida mesa onde esqueletos colocavam pratos cheios de comida para substituir os que estavam ficando vazios. Riley tinha pães, frios e manteiga em seu prato. Alícia também, além de um pedaço de bolo, geléia e queijo branco com doce de leite. Ela não comia muito no café da manhã normalmente, mas resolveu se servir de tudo que lhe parecia gostoso com o intuito de começar o dia bem, tentar ganhar a mágica perdida de seu feriado predileto. Teria pego bacon e torrada se não fosse o tipo de pessoa que se preocupa com o peso. O representante da futura rainha se juntou a eles com um bocejo demorado que contagiou os outros dois.
-Bom dia –ele se sentou.
-Bom dia –os gêmeos responderam juntos.
-É engraçado quando quando vocês fazem isso de falarem as coisas ao mesmo tempo -Dave sorriu.
-Feliz Páscoa –Alícia desejou a Dave. O menino ficou surpreso por já estarem nessa época do ano e disse que escreveria para sua família assim que terminasse o café.
A menina ofereceu um pedaço de seu bolo ao dois garotos como um presente do feriado que não estavam comemorando. Na mesa ao lado, Isabelle se sentava na companhia de uma caneca cheia de café e um prato de linguiças e pão preto. Ela tremia um pouco e tinha olheiras enormes. Alícia quase se sentiu mal por ela, mas se lembrou rapidamente de que era uma mentirosa e tinha feito com que seu melhor amigo tivesse problemas com o diretor. A semana passada tinha sido repleta de pequenos acontecimentos que pareciam ter sido notados apenas por Alícia. Na segunda-feira, durante a aula de Controle de Temperatura, ou CT, a favorita de Riley, Isabelle tinha produzido uma chama negra com o pequeno instrumento do kit que eles usavam na aula que se parece com um isqueiro. Não durara mais do que alguns segundos, mas Alícia havia visto. A legado de Tabata parecera tão assustada quanto a polarista e atirou o objeto para longe de si. Alícia não sabia o que era aquilo, só que não era normal. Na quarta-feira ela vira a menina andar encapuzada novamente até a floresta e a noite ficara cobreta por uma cortina de neblina. E no dia anterior, sábado, Isabelle havia desaparecido. Ela não andava com ninguém, então não pareceram perceber, mas Dave havia perguntado sobre ela pela manhã e o diretor e Lorena andaram pelos arredores da escola com expressôes preocupadas. Antes do toque de recolher a menina fora vista pela primeira vez no dia entrando na casinha azul e fora chamada por seu desesperado pai. No domingo de Páscoa ela ainda não fizera nada. Ainda.
-Não deveria se preocupar tanto com ela –Dave falou. Alícia mal percebeu que estava encarando Isabelle enquanto pensava. –Sei que não parece seguro e ela nunca teve sua confiança, mas Belle não vai fazer mal para ninguém.
À menção de seu nome a menina largou sua caneca e se virou. Dave sorriu para ela gentilmente e Riley encarou seu prato. Alícia continuou com seus olhares desinteressados e até malvados, e a menina apenas voltou a se preocupar com o café da manhã.
Alícia chacoalhou a cabeça pensando como seu melhor amigo era bondoso com aquela garota sinistra que claramente o prejudicara. E então percebeu que era a primeira vez que pensava em Dave como um melhor amigo. No Brasil, Riley era seu melhor amigo e nas escolas ela nunca tinha uma amiga por muito tempo. As pessoas se afastavam muito facilmente dela, mas isso não a irritava tanto quanto quando ela era uma criança. Em Érestha, ela começara apenas com Riley e Dave, ganhara a companhia de Ajala e Tyler e perdera os dois para os pais desesperados. Riley e Dave ainda estavam ali. Riley sempre esteve e ela esperava que Dave ficasse. Que será preciso para que ele veja perigo no rosto de Isabelle, e não apenas os olhos azuis escuros dela?
-O que foi? –Dave perguntou. Alícia percebeu que agora estava olhando diretamente para o menino. Tinha que perder logo essa mania de olhar tão obviamente para uma pessoa enquanto viajava em pensamentos.
Ficou envergonhada, mas não teve que responder, por sua sorte. Ou não. Sua perna começou a doer de repente. Uma dor forte e aguda, como se algo estivesse perfurando sua carne. Gritou na mesma hora. Sentiu um pouco de sangue escorrendo pela sua panturrilha. Quando olhou para baixo para ver o que causara aquela dor, viu um coelho branco pulando para longe dela com uma mancha vermelha em sua boca. Olhou para sua panturrilha que ardia em dor e viu sangue escorrendo de dois buracos em forma de dentes enormes. Ela ainda não tinha parado de gritar e lágrimas estavam se formando em seus olhos.
Dave se levantou e derrubou seu copo cheio de suco. Riley engasgou com seu pão enquanto olhava, desesperado, para a irmã gêmea. Alícia ficou ainda mais assustada ao ver o ferimento e tentou se levantar com o intuito de correr até a enfermaria, mas não conseguiu aguentar a dor que se espalhou por toda a perna ao se por de pé. Ela caiu com a mão sobre o ferimento, podendo ver mais dos animais que se espalhavam por toda a área e perseguiam outras pessoas ou eram perseguidos e levavam tapas com a parte chata da espada. Rileu se ajoelhou, ainda tossindo, ao lado da irmã e falou algo para ela. Alícia não entendeu. Começou a ouvir tudo como se fosse dito de muito longe. Dave apareceu na sua frente, empunhando um garfo e tapando sua visão da confusão. A única palavra que conseguiu distinguir fora assombrados. Se tinha mesmo prestado atenção nas aulas, isso significava que os coelhinhos haviam sido transformados em máquinas do mal, reprogramados para perseguir e infectar pessoas inocentes. Ela não fazia ideia do tipo de efeito que o pequeno coelho branco faria nela, mas ficou ainda mais desesperada. Os dois meninos se levantaram para chutar para longe alguns outros que se aproximavam e Isabelle se levantou calmamente de sua cadeira. Se abaixou na altura da visão de Alícia, que ainda estava deitada no chão. Pontos pretos começaram a invadir a visão dela e a cabeça doía. Isabelle virou o rosto e olhou para a menina com um sorriso.
-Vai me ouvir –ela disse, e foi a última coisa que Alícia ouviu antes de desmaiar.
Acordou no meio de uma neblina bastante expessa. Ainda estava deitada e a cabeça doía muito. Não tentou se levantar de imediato. O chão era grama e pedras e o ar era muito frio. A tontura se mostou presente quando ela virou a cabeça para olhar do outro lado e o mundo rodou angustiantemente. Fechou os olhos mais uma vez com força para não desmaiar novamente. Quando se sentou, percebeu o cabelo e a nuca molhados de suor. Não ouvia nenhum barulho, nenhuma voz. Olhou em volta. Conseguiu distinguir o contorno de uma árvore no meio da neblina e tentou se levantar para andar até lá, mas não conseguiu. A perna ainda doía e a cabeça rodava, pontos pretos ameaçando escurecer sua visão novamente.
-A perna vai se curar rápido –uma voz veio de tráz da árvore.
-Isabelle? –Alícia se afastou, arratando-se no chão.
A menina de cachos pretos e olhos azuis escuros ficou claramente visível na frente de Alícia. Ainda vestia as mesmas roupas do que quando abaixara para segredar com Alícia.
-Sei que não gosta de mim –ela foi bem direta. –Talvez não goste também desse lugar, mas ainda estou aprendendo como aperfeiçoa-lo. Consegui uma árvore recentemente.
Alícia não respondeu nada. Tinha os olhos arregalados de medo. Onde é esse lugar?
-Não há segredos aqui, Alícia. Posso ouvir o que pensa –ela continuou. Foi só então que a carioca percebeu que Isabelle falava sem mexer os lábios. As palavras não vinham de suas cordas vocais, mas de seus pensamentos. –Exatamente –concordou com a conclusão de Alícia. –Esse lugar é um pensamento em si, algo que criei para quando quisesse ficar em paz, ficar sozinha. Mas tenho que dividi-lo com você. Sinto que vou precisar disso logo. Não se preocupe, vou tentar melhorar a aparência disso aqui.
Dividir comigo? Ela pensou. Não quero que divida nada comigo, quero saír daqui.
-Certo –Isabelle concordou. –Mas tenho que estabelecer algumas regras simples. Não conte para ninguém sobre como esse lugar existe e que eu divido ele com você.
-Eu não quero –Alícia falou. –Não quero fazer parte disso, eu não...
-Confio em você –Isabelle terminou. –Disse que podia ouvir o que pensa aqui e já sei mais do que bem que você não gosta de mim. Mas eu preciso de você, e queira você ou não, vai precisar de mim. Espero que um dia me agradeça. E lembre-se...
Ela colocou o indicador sobre os lábios. Imediatamente, Alícia acordou. Não havia mais neblina nem grama e nem pedras, apenas uma cama confortável e lençóis a cobrindo. Nada mais estava doendo e não havia suor. Lá fora já era noite, provavelmente bem tarde na madrugada.
Uma senhora de avental enchia um copo de água no criado-mudo ao lado da cama de Alícia. Atrás da mulher, dois meninos, um de cabelos morenos e curtos e outro pretos e bagunçados, dormiam sentados num sofá de couro. Riley roncava e Dave mexia os lábios, sonhando. A enferimeira não pareceu notar que Alícia estava acordada e se reirou por trás da cama onde ela deitava. Na cabiceira também se encontrava uma prancheta e um vaso com uma única violeta muito bonita, além de alguns ramos bem verdes e outros secos. Riley. Ela reconheceu de imediato. Ele as fez para mim!
Olhou com um sorriso para o irmão. Quis acordar os meninos, mas dormiam tão pacificamente que desistiu. Será que estavam sonhando o mesmo sonho que ela? Da janela não era possível ver a floresta. A visão era bloqueada pelo prédio de aulas. De alguma forma, ela ainda sentia o olhar de Isabelle sobre ela. Jogou uma almofada no irmão. Ele engasgou no próprio ronco e acordou com um susto. Foi uma cena cômica de se assistir, mas Alícia não riu. Dave acordou pacificamente de seu sono pesado com um bocejo.
-Obrigada pela flor –Alícia falou.
Só então os dois perceberam que ela estava acordada. Eles se entreolharam, felizes e surpresos, e Riley se levantou, meio cambaleante do sono, para abraça-la.
-Você está bem? Quer que eu chame a enfermeira?
-Não, eu 'tô bem! –Ela se sentou.
-Bom , nesse caso -ele voltou a se sentar, -foi difícil fazer com que essa flor ficasse bonita.
-Teve que pedir ajuda para a Lilian –Dave falou, sorindo para o amigo. Levou um empurrão. –Certo, certo. Fez tudo sozinho e não levou um dia inteiro.
-Um dia inteiro? –Alícia arregalou os olhos. Riley começou a se explicar, dizendo que não fora exatamente um dia inteiro, e Lilian ajudara apenas no fim, mas ela o cortou. –Quanto tempo estive lá?
Os meninos franziram o cenho.
-Quer dizer desmaiada? –Dave perguntou. Alícia disse que sim, resolvendo que não era hora de contar sobre o lugar secreto de Isabelle. –Quase três dias. Estamos na madrugada de terça-feira.
-Wow –ela fez.
Não sabia muito bem o que esperar como resposta. Talvez tivesse estado desmaiada antes de acordar no meio da neblina, ou o tempo naquele lugar era diferente do tempo normal, não tinha como saber.
-Você teve muita febre e suou bastante no domingo -continuou. –Ontem ficou apenas ai, deitada, como se estivesse dormindo. Sua mãe e seus irmãos vieram te vizitar.
-Todos eles? –Perguntou, de certa forma animada.
-Ramona não –Riley respondeu, sem cerimôneas.
Ela já sabia. A irmã mais velha dava tanta atenção para ela quanto para um inseto morto na sola de seu sapato. Pelo menos a mãe se preocupara o suficiente para vir vê-la. Não estava mais ali, mas já era melhor do que nada. Alícia escolheu sorrir e abrir os braços. Riley sorriu devolta e andou de novo até a irmã. Dave permaneceu sentado, bocejando.
-Você também –ela falou.
Dave a encarou em confusão. Por um momento o coração da menina bateu mais rápido, em desespero. Tinha depositado certa confiança nele e até atribuído o título de melhor amigo. Ficou com medo que o tivesse julgado errado ou que pedir um abraço não fosse certo para sete meses de amizade. Ela não sabia, não sabia mesmo como cultivar um amigo. O irmão era amigo por obrigação, mas pessoas de fora nunca se apegavam a ela. Para seu alívio, Dave sorriu e se levantou. Andou de bom grado até o braço estendido da menina e resmungou ao ter que se abaixar para retribuir o abraço. Seu coração se acalmou e ela quase lhes contou sobre Isabelle, mas algo a impediu. Não soube dizer se fora curiosidade ou medo.
De acordo com a LEI N 9.610 DE FEVEREIRO DE 1998, PLÁGIO É CRIME
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