XXIII -Riley
Ele não estava dando espaço para sua mente pensar em nada além de andar e respirar. Se pensasse nos tipo de coisa pelos quais Alícia podia estar passando iria se culpar, gritar, socar coisas e até chorar. Dave tinha um plano, mas Riley não havia escutado nada mais do que "Thaila", e ele não se importava. Queria chegar até alguma fronteira com a província de Tabata e depois pensaria mais em como proceder. Ele já estava planejando empurrar todos em seu caminho para bem longe quando um homem e um dragão o obrigaram a parar.
-Adnei?
O homem trazia um pedaço de papel amassado nas mãos e rugas de preocupação por todo o rosto. Alfos estava pendurado como conseguia nos ombros dele. O dragão tinha apenas três meses de idade, mas já tinha o tamanho de um dálmatan adulto. As asas estavam encolhidas, acomodadas em suas costas. Ele tinha as garras das patas agarradas na blusa do homem para se segurar, e a cauda enrolada no braço direito. O fucinho exalava fumaça, e ele mostrava os dentes, nervoso. Todos os seus amigos pararm atrás de si. Tinham acabado de passar pela passagem habitual de Dave, e o homem parecia estar andando para longe da praça.
-Riley! –ele girou em seus calcanhares e abraçou o filho com urgência. –Oh, graças ao rei! Pensei que também estivesse perdido.
-Alícia –ele falou com pressa, e não precisou dizer mais nada.
-Ela me deixou isso –ele mostrou o papel. –Apareceu em casa ontem bem tarde e... Parecia uma despedida.
-Ela se entregou... –Bia falou. Seu tom de voz parecia quase inconsciente. –Alícia está tentando ajudar, ela... Acha que pode parar o que quer que está para acontecer.
Adnei olhou para o filho com a testa franzida. Alfos soltou fumaça pela boca e fez um barulho agudo e irritante.
-Onde... onde está minha filha?
-Pedro Satomak está com ela –Riley disse. Adnei andou alguns passos para trás, balançando a cabeça em negativa. Blabuciava algumas palavras cheias de medo e raiva. Colocou as mãos no cabelo e Alfos protestou, abrindo as asas e batendo elas no ar, com os dentes pontudos a mostra. Ele continuou, embora tivesse receio de que o pai fosse dizer para não fazer besteira, para ficar e esperar. Ele não faria isso de um jeito ou de outro. –Estamos indo atrás dela.
-Ótimo –ele disse. Tirou Alfos de seu ombro com dificuldades e estendeu-o para Riley como se fosse um bebê. Ele agitou-se e bufou mais fumaça. Riley estendeu a mão. Ele era pesado, e acomodou-se sozinho em seus ombros. Suas garras eram afiadas e furarm sua pele. Adnei colocou a mão no bolso e tirou um pequeno objeto retângular feito de cristal com a figura de um homem e um dragão feitos à lazer dentro dele. –Eu tenho o comunicador correspondente aqui comigo. Qualquer coisa, novidades de qualquer tipo, notícias, que seja, me chame. É uma ordem.
-Sim, claro –Riley falou, guardando o objeto no bolso do casaco e fechando-o com o zíper. Alfos fez um barulho com a garganta e Adnei sorriu para a criatura. Riely estava pronto para andar sem rumo mais uma vez quando algo lhe ocorreu. –Para onde estava indo?
Adnei ficou nervoso e ajustou o chachecol no pescoço antes de falar.
-Ver sua mãe –ele puxou a manga do braço direito e mostrou a marca do pacto que tinha feito tantos anos antes com Ruby. Riley a conhecia bem. Um ramo de flores com espinhos; uma marca fraca, apagada com o tempo de inutilização e ignorada. Brilhava muito fracamente no braço dele. –Está na hora de eu cumprir com meu pacto e atender a seu chamado.
Riley teria protestado, mas não tinha tempo para nada disso. Rick estava lá e, por algum motivo, confiava no menino para tomar conta da mãe. E Maria era uma ótima pessoa. O que quer que acontecesse quando o pai a visse, eles conseguiriam lidar. Riley balançou a cabeça, confirmando.
-Vou tomar conta de Alfos –o dragão cuspiu sua língua bifurcada para lamber o rosto de Riley. –E vou mandar notícias. Deixe minha mãe informada, por favor.
Os dois se abraçaram e Dave explicou para Adnei como chegar em seu apartamento. Assim que o homem foi embora, os quatro voltaram a andar, desta vez seguindo Dave. O menino os guiou rapidamente até a província do rei e Bia bateu na porta de alguém para pedir o carro emprestado. Ela dirigiu desrespeitando todos os faróis vermelhos e as placas de 'pare'. Riley não conseguia colocar os pensamentos em ordem, e Missie estava fazendo muitas perguntas. Queria ter alguma ideia de onde ela poderia estar. Ele não queria pensar nisso, queria a irmã. Só queria seu abraço, seu cheiro, os cabelos castanhos macios e os olhos felizes. Queria contar uma piada idiota que a faria empurrar seu ombro e depois rir por alguns segundos mágicos, onde suas feições ficavam ainda mais bonitas. Ele só queria ve-la, e bater com toda a sua força no nariz de Pedro Satomak.
-Riley –Bia perguntou, do banco da frente do Chevrolet Orlando. Às vezes Riley se perguntava quem seria o responsável por vender produtos do continente para o reino, mas sempre se esquecia de perguntar. –Por que seu pai disse... Irmão, quando você mencionou Pedro?
-Eu ainda não te contei isso? –Ele ajustou-se no assento. Alfos estava ao seu lado, inquieto. –Eles foram adotados do mesmo orfanato pela mesma mulher. Sou sobrinho adotivo do maior assassino de Tabata.
Missie arregalou os olhos e sua expressão era uma mistura assustadora de choque e medo. Dave apenas mexeu as sobrancelhas e virou-se para frente bem a tempo de avisar Bia que tinha um buraco na pista. Ele tirou seu próprio comunicador de vidro do bolso e segurou-o na mão. Chamou pelo nome de Thaila e aguardou. Eles estavam se aproximando dos portões de ferro do Castelo de Vidro, e Bia não parecia pronta para frear. Uma luz azulada surgiu do objeto e uma imagem holográfica da futura rainha apreceu na altura dos olhos de Dave. Ela estava sentada em um trono roxo e dourado e tinha uma expressão de pura confusão em suas belas feições de adolescente.
-Dave, o que foi? –ela perguntou.
-Preciso que abra os portões do castelo. Rápido.
Ela franziu a testa e sinalizou para alguém próximo de si. Riley reconheceu a voz de Lawrence, o velho da prancheta, que disse que já havia escutado e estava a caminho. Thaila não fez nenhuma pergunta sobre o pedido de Dave, e Riley impressionou-se. A confiança dela era muito grande.
-Vou esperar você à porta –ela disse, mexendo-e para tentar enxergar o que havia atrás de Dave. –Isso aí com vocês é um dragão?
Como resposta, Alfos cuspiu um pouco de fogo no teto do carro. A princesa apenas franziu o cenho e levantou-se. Dave agradeceu e desligou o comunicador de vidro. Bia pisou no acelerador com raiva e avançou num canteiro para fazer uma curva. Continuou a correr e entrou na grama que iniciava-se antes do portão. Haviam duas mulheres puxando o ferro pesado para abrir o portão. Bia não parecia querer esperar que elas terminassem, e quando perceberam, pularam para longe do ferro. Riley segurou-se como pode e a motorista bateu a frente do carro, mas continuou. Tinha que agradecer Missie por te-los obrigado a colocar os cintos de segurança. Ela não parou até chegar perto o suficiente das portas de vidro e iluminar o rosto confuso de Thaila com os faróis fortes do carro emprestado. Dave pulou para fora e Riley foi o próximo. Deixou a porta aberta para Alfos sair, mas ele parecia confortável de mais para se mexer.
-O que está acontecendo, Dave? –Thaila perguntou.
-É Alícia –foi Riley quem respondeu. Não estava nem aí para cortesias, reverências ou formalidades. Só queria a irmã, e queria rápido. –Pedro Satomak está com ela, provavelmente em algum lugar na província da morte.
-Por que? –Thaila estava chocada. –O que minha irmã quer com ela?
-Não sei –Bia falou. –Mas ela já vem elaborando esse plano ha um tempo, pelo que sei.
Bia contou para a princesa a história das cartas, Ember e Pedro. Riley falou sobre a carta que ela deixara para ele e Bia apresentou sua teoria sobre ela estar se sacrificando para tentar impedir algo ruim de acontecer. Thaila pediu que eles entrassem e todos sentaram-se em um dos sofás vermelhos do rei.
-Tabata está planejando alguma coisa –Dave falou. –Talvez Alícia saiba o que é. Temos que procurar por ela.
-Wow, como é? –Riley levantou-se, ofendido. –Eu não sei você, mas vou procurar minha irmã, quer ela saiba de alguma coisa ou não.
-Não foi o que eu quis dizer...
-Não importa –Thaila disse, cortando a discussão e interrompendo a raiva de Riley. –Não ia deixar que minha irmã capturasse uma garota, ainda mais Alícia. Ela é guerreira de minha irmã. Mas não acho que seja prudente mandar vocês. São crianças.
-Eu não vou ficar sentado, esperando, enquanto Pedro... –sua voz falhou, e ele percebeu que estava chorando. Levantou-se e virou o rosto. Missie andou até ele e acariciou seu braço. Ele respirou fundo e virou-se para os outros novamente, balançando a cabeça. –Não vou.
-Não espero que fique, Riley Weis –Thaila falou, aproximando-se dele. –Mas seria imprudente deixar que fossem sozinhos. Alguma ideia de onde ela possa estar?
-Um lugar sujo –Dave falou, levantando-se também. Todos ignoravam as almofadas macias do salão principal do rei. –Com ossos no chão e urubus no céu. Há uma pedra grande e 'tudo.. silêncioso. Da pra ver o Castelo de Pedra dali.
-Dave... –Bia falou, andando vagarozamente para trás. –Você acabou de descrever Chelmno. O campo de tortura de Tabata. Como pode ter certeza?
Ele olhou para Riley e falou diretamente para ele que explicava depois. Sabia do que se tratava: os pesadelos de Alícia. Uma dor de cabeça fortíssima atingiu o menino de pele morena e suas pernas fraquejaram mais uma vez. Missie segurou-o e acomodou-o no sofá novamene. Alfos entrou no castelo, arrastando sua cauda pelo chão, e voou até Riley. Thaila pareceu ter uma ideia. Antes que pudesse falar qualquer coisa, o rei aparceu de uma sala à direita e caminhou até eles em silêncio. Não fez perguntas e ninguém pareceu interessado em lhe explicar nada. Apenas pôs as mãos nos ombros da filha e acenou com a cabeça para a porta. Alguns segundos depois, Tâmara apareceu ali, com um roupão de seda verde fino que não escondia a lingerie provocante que usava por baixo. Estava preocupada e com sono. E também carregava uma carta. Riley imaginou quanto tempo Alícia deveria ter levado para planejar e executar tudo aquilo. Eles não perderam tempo e explicaram resumidamente toda a história para ela. Em sua carta, Alícia confirmava com todas as palavras a teoria de Bia. "Estou sacrificando-me por minha senhora, pelo reino e por minha família. É importante que não me procurem."
-Eu não posso me dar ao luxo de perder alguém como Alícia Weis –ela reclamou e jogou-se no sofá.
-Não vai perde-la –Riley falou por entre os dentes e Alfos concordou com um grito.
-Vou conversar com alguns de meus soldados imediatamente –Thaila falou. -Vou manda-los para Chelmno e outros pontos específicos. Ninguém pode acessar as passagens daquela província, então vou deixar vocês com alguém em quem confio. Ela vai ajuda-los a chegar até Chelmno, ou onde desejarem.
-Vai mandar quatro crianças atrás de minha guerreira? –Tâmara parecia ofendida. –Que ótimo plano.
-Eu concordo com Thaila –o rei falou com um tom estranhamente melancólico. Ótimo, então nos deixe ir. Riley estava nervoso. Alfos também não parecia muito feliz. Apertou as garras em Riley agitou as asas. –Se as crianças realmente desejam ir, que seja. Sugiro que as senhoritas falem com seus príncipes antes. E mande quem quiser, Thaila. Salve a menina.
-Mas deixe alguns guardas aqui –Dave falou, apontando para Thaila com autoridade. –Não só os guardas normais, mas os de sua guarda pessoal. Quanto mais, melhor. Não vou deixar vocês dois aqui sem a proteção devida. E Lawrence, avise aos outros príncipes a ficarem alertos também. Pelo bem deles.
-Sim, o farei –o velho da prancheta anotou algumas coisas com uma caneta de fonte muito rápida.
Bia e Missie afastaram-se para comunicar-se com seus príncipes, e Éres agradeceu Dave por sua liderança. Riley estava apenas parado ali, pronto para correr e pegar o carro que Bia emprestara. Mas ele não fazia ideia de como chegar à Tabata, a não ser pelas fronteiras diretas, mas isso era muito longe. Sua melhor opção era não socar nada e esperar a carona da princesa. Ele não estava apenas preocupado, estava com raiva. A irmã não confiava nele o suficiente para pedir ajuda ou contar seus segredos? Ele deveria ter lido as cartas, deveria ter insistido nos pesadelos. E o mais importante: deveria ter ficado com ela em Paris. A culpa era dele. Era sua irmãzinha, sua Lice. Alfos gritou mais uma vez, transmitindo os sentimentos de Riley.
-Ficar se culpando não vai ajudar –Tâmara falou. Estava em pé, bem na frente de Riley. Perto de mais. Ela acariciou a cabeça de Alfos e o animal remexeu-se animado. Cuspiu sua língua para a princesa. Seus cabelos estavam presos em um coque no topo da cabeça. Era perfeito, mas ainda assim parecia ter sido feito as pressas. Seus olhos estavam cansados, mas brilhavam do mesmo jeito. E aquela seda verde escura era uma piada de mal gosto. Devia estavar se preparando para dormir quando veio para o Castelo De Vidro. Sua lingerie era renda branca e nada mais. Vestia-se com roupas quase transparentes. Existiria alguma situação onde aquela princesa não estivesse linda? Ela sorriu, maliciosa, quando Riley percebeu que encarava seu corpo. Colocou suas unhas pontudas no rosto do menino e encostou sua testa na dele. A atitude lembrou-lhe vagamente Castrp, seu tigre branco que adorava se esfregar nos legados da princesa da terra. Seu hálito era fresco quando ela falou. –Boa sorte, Riley Weis. Não morra.
-Obrigada –ele falou em voz baixa. A princesa afastou-se, ainda sorrindo, e voltou a se sentar no sofá com a carta na mão.
-Podemos ir –Thaila voltou para a sala com um casaco de peles. Dave seguia-a, com Mata-Touro em suas mãos e a pedra vermelha que dividia com Maria iluminando o salão. –Os outros logo estarão prontos para começar as buscas.
-Certo -Riley afastou-se dos sofás e continuou a andar. Parecia a única coisa que ele conseguia fazer. Ele não ia morrer. Não antes de encontrar Alícia.
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