XXXIII -Alícia
Ninguém.
Ela estava sozinha.
Nada.
Não existia nada além do banco e da árvore.
Tudo.
Isso era pior do que tudo, do que qualquer coisa.
Tivera medo de dormir no começo, mas acabou acordando sem gritar, sem ter uma cobra de medo subindo-lhe o corpo. O irmão ao seu lado, sorrindo em seu sonho. Não estava mais tão escuro. Alguns raios do sol já penetravam na barraca. Ela pegou seu cinto e saiu para o ar frio da manhã. Dave estava jogando palha seca na fogueira. Seus cabelos estavam cheios de gelo. O fogo estava se apagando. Os cavalos ainda dormiam. Ela andou até ele e acertou sua nuca com um tapa.
-Por que não me acordou, idiota –ela perguntou, acertando outro tapa nele. –Não vê que está congelando e morrendo de sono? Qual o seu problema?
-Tenho vários problemas. Muitos deles eu divido com você –eles se encararm por um instante. Alícia sentou na terra congelada colocou mais fogo na palha com um fósforo que tinha. –Achei que tinha que dormir mais, só isso. Geralmente desmaia após visitá-la. Saíremos em breve, ok?
-Eu estou muito afim de testar uma dessas facas no seu rosto, sabia? Não é seu trabalho se preocupar comigo.
-Ótimo. Então da próxima vez eu te acordo e deixo você congelar, sozinha com seus pesadelos.
Alícia chutou a coxa dele e Dave caiu no chão. Resmungou e ajustou-se de frente para a fogueira. Divididos por uma pedra. Ela queria chutar a cabeça dele desta vez. Ela sabia se cuidar, não precisava dele. E pior: já era de mais ter pedido que ele a acompanhasse numa luta contra um dragão. Ele não tinha que deixar ela dormir e congelar com uma fogueira quase morta. Ficou quieta, observando-o. Acariciava a pedra vermelha de sua espada como se acariciasse os cabelos de sua mãe. Alícia tocou sua corrente. O pingente com a foto de seu pai. Os mesmos olhos brincalhões de Riley, o sorriso que via no espelho algumas vezes. O rosto que conversava assustado em seu pesadelo com a versão mais nova de Pedro Satomak.
Braços fortes, risadas, uma carícia em seus cabelos. Paz. Era o que sentia sempre que ouvia o nome do assassino. Isso está errado. Está muito errado. O último sonho, a última visão do trono de pedra fora torturante. Vira o corpo do sujeito. O corpo todo, menos seu rosto. Sentia a mesma coisa ao estar lá. Paz. Não havia dúvidas de que era Pedro. O que ele estava fazendo em seus sonhos, naquele orfanato com seu pai? Onde estava Isabelle?
-Certo, me desculpe –ela falou.
Sabia que Dave queria mais saber como estava sua Belle do que obter informações sobre Tabata ou ajudá-la. Não o culpava. Não podia fazer nada se ele era idiota a esse ponto. Tantas esperanças depositadas num sonho. Poderiam ter sido usadas para coisas com mais utilidade. Deixe que ele desperdisse seus sentimentos nela. Estarei lá para dizer que avisei quando as esperanças se perderem. Idiota. Ela fcou brava quando ele não respondeu nada.
-Lo que los dos están haciendo aquí? –Bia apreceu bocejando. Alícia chacoalhou a cabeça. Espanhol? Sempre se esquecia de que precisava do alcaçuuz. Amaldiçoou Dave por ele ser brasileiro como ela e depois agradeceu. Ele estendeu um pedaço de alcaçuz para ela. Não era o que ela queria como a primeira refeição do dia, mas foi preciso. Bia revirou os olhos. –Não, não quero saber. Vocês dois passam tempo de mais juntos, sabiam disso?
-Ótimo –Dave levantou-se e começou a caminhar pela estrada de terra. –Ela é toda sua então.
Por um momento, Alícia pensou que Bia ia atirar-se em cima de Dave e atear fogo nele. Parte de si queria que ela fizesse. Não iria impedir. A outra parte ficou com medo. Ainda assim não iria impedir. A representante de Elói andou na direção oposta, até os cavalos, e acariciou as crinas deles com delicadeza. Parecia ter um amor especial por esses animais. Ficou preocupada quando o terceiro cavalo não apareceu dos escombros da casa de Fifi e Alícia podia jurar que vira uma lágrima nos olhos dela, embora pensasse ser impossível. Ela respirou bem fundo a fumaça da fogueira em processo de morte e o ar gelado. Tudo de uma vez, misturando-se em seus pulmões, alimentando suas células, expelindo a fumaça de volta para a fogueira.
As vezes ela parava para pensar se deixaria tudo para trás se tivesse a chance. Se pudesse voltar um ano e meio atrás, escolheria ficar no Rio, sem o irmão, com a casa praticamente só para ela, longe de Isabelle, longe de Pedro Satomak, longe dos novos amigos que nunca viria a conhecer. Logo após os sonhos ruins, a resposta era sempre sim. Após respirar bem fundo, congelar e queimar os pulmões ao mesmo tempo, a resposta era não. Preciso de Érestha. Érestha precisa de mim.
Acordaram os outros dois, desmontaram a barraca e tomaram café da manhã sem Dave. Alícia quase sentiu-se plagiada. Era ela quem sempre desaparecia quando estava chateada. Bia garantiu que ele estava bem. Alimentou Jonus e o outro com maçãs e um pouco de alcaçuz. Precisavam que Riley conversasse com ele. Bia chacoalhou a cabeça ao dizer isso. "Tão bizarro", comentou. Riley disse que Jonus garantia que estavam perto do rio de sereias. Disse que lá havia um lugar para alugar bacos.
-Não sabe se está fechado ou falido, mas ainda havia barcos lá da última vez que o cocheiro os levou até lá –Riley montou no cavalo.
-Oba –Bia sorriu, montando no outro cavalo e ajeitando o aroco, mochila e aljava em suas costas. –Vamos roubar um barco!
Alícia sentou-se com seu irmão antes que Missie pudesse escolher once ficar. Ela queria abraçá-lo e foi que que fez. Jonus cavalgou rapidamente, com as energias renovadas. Parecia alegre em carregá-los até o fim de sua jornada. Como ele voltaria depois, Alícia não sabia mas tinha curiosidade. Fez Riley perguntar e tudo o que o cavalo respondeu foi "não se preocupe com isso".
-Sinto falta da macarronada de mamãe –ele comentou de repente.
Alícia deu risada. Ela sentia também. Sempre que tinha macarronada, tinha visita. E sempre que tinha visita, tinha festa. "Rainha Ruby!" os amigos a chamavam. Ficavam todos na laje de Alícia, comendo, bebendo e festejando o dia. A macarronada era deliciosa, nunca sobrava nada. Toda a vez que comia macarrão, Riley ensinava um novo truque no skate para Alícia. Ela nunca entendeu o por que, mas era divertido, engraçado e uma memória muito boa.
-Gosto tembém da pizza dela –Alícia comentou.
-Sim! Ah, meu Deus, a pizza. E as noites do cheese burger barato?
-Adorava essas noites! -Alícia caiu na risada. Os dias bons de sua vida ficavam mascarados por debaixo dos dias tristes. Era tão bom revivê-los. –Posso quase sentir o cheiro do queijo derretido.
-Sim, eu também –Riley lambeu os beiços.
-Olha, eu não sei que truque é esse, mas eu sinto cheiro de cheese burguer também –Bia falou do cavalo ao lado.
A primeira reação de Alícia foi sorrir. A segunda, ponderar. A terceira foi entrar em desespero. Eles ainda estavam na estrada de terra, mas agora o que os cercava era mata. Uma floresta, e não fazendas. Cavalgavam por quase uma hora e nenhum sinal de Dave. Bia garantia que ele estava bem, mas Alíca ficou preocupada.
-Riley –ela cutucou o irmão –O ar cheira a cheese burgers.
-Eu sei –ele havia entendido. –Olhe ali em frente.
No meio da floresta, na beira da estrada. "O mestre dos cheese burgers." Dneva. Antes que Riley pudesse pular do cavalo e empunhar sua espada, antes que Missie fizesse uma indagação, e antes que Alícia gritasse para todos correrem, Bia caiu do cavalo. Ela agarrou o braço direito, coçou sua marca e gritou como louca. Gritou por Dave. Quando parou de surtar, montou novamente no cavalo e chutou-o com o sapato. Ele saiu em disparada, desviando da barraca falsa de cheese burgers.
-Droga –Alícia não sabia o que fazer.
Riley também parecia preocuado e pediu que ela se agarrasse nele.
-Corra Jonus. Siga-os.
Jonus desparou pela floresta. Agora, Alícia queria testar suas facas em seu própria testa. Primeiro, uma louca numa casa de tinta. Agora, Dneva mais uma vez. Por que tinha deixado eles virem com ela, por que? Não deveriam estar em perigo por sua causa. A marca de Bia e Dave brilhava tão intensamente no braço da menina que Jonus só precisava seguir o brilho. Riley parecia preocupado também. Ele era a testemunha do pacto. Alícia não fazia ideia do que isso queria dizer, mas ficou preocupada.
-O que houve? –ela gritou. Abaixou-se para um galho não acertar seu rosto.
-Ele disse longicórnio –Riley gritou. Ele provavelmente sentiu a expressão de confusão em Alícia e continuou a explicar. –É a palavra de proteção deles. Se Dave estiver em perigo é o que ele deve dizer, e ele disse. Concequentemente...
-Dave está em perigo –ela completou o raciocínio.
Mas que droga Dave. Estou brava com você, não quero te salvar. E não quero enfrentar aquela louca novamnte. O cavalo de Bia e Missie tropeçou e caiu relinchando assustado. Antes que Jonus pudesse parar, ele caiu também. Alícia teve o rosto enterrado por lama e quando o levantou, dois velhos conhecidos latiam para ela. Osso e Pâncreas estavam prontos para revistá-los.
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