XI -Alícia
-Onde você está, Alícia?
Mesmo com uma mão em volta de seu pescoço, as costas encostadas numa árvore e uma espada branca em vista, Alícia não respondeu. Ela não pensou e nem falou; ficou em completo silêncio. Isso frustrou Isabelle. Ela grunhiu e depois gritou e fincou A Traidora em sua árvore imaginária.
-ONDE VOCÊ ESTÁ? –gritou, usando a própria boca e a própria voz
A menina não cedeu. Ela piscou com muita calma e continuou a respirar normalmente. Não precisava pensar em nada e nem se concentrar muito. Ela não conseguiria falar nem se quisesse, mas Isabelle não precisava saber disso. Vê-la irritada era muito satisfatório.
-Eu preciso saber, tola –ela afastou-se. Alícia sorriu com o canto do lábio e Isabelle encostou sua lâmina no queixo dela. Continuava tranquila por saber que os golpes dela eram como aquele lugar em si: apenas um pesadelo. Quando acordasse, não teria nenhhuma marca em sua pele. Isto é, se ela um dia voltasse a acordar. –Onde estão Dave Fellows e a rainha?
-Eu não sei –ela respondia toda vez que a outra perguntava.
O tempo no pesadelo de Isabelle passava diferente do tempo na vida real. Para Alícia, de acordo com as marcas que ela fizera na madeira, já haviam se passado mais de seis meses. No mundo real, ela podia estar parada entre uma batida do coração e a outra. Por sorte, ela não sentia fome e nenhuma outra necessidade básica, mas conseguia dormir. Isabelle havia ficado três meses inteiros sem aparecer por ali, e tudo o que a menina podia fazer era sonhar. Talvez DiPrta visse o que ela via, e isso seria ótimo. Ela sonhava com tudo o que podia tortura-la: Dave Fellows, Gary DiPrata e silêncio.
-Será que você não entende o quão importante isso é? Agnes está morta e agora Dave Fellows está perdido.
-Eu não sei quem é essa tal Agnes de quem fala, já lhe disse –Alícia respondeu calmamente. –E que Dave Fellows esteja morto, por que eu me importaria? Pergunte à Thaila.
Tanto ela quanto Isabelle sabiam que aquelas palavras haviam sido ditas da boca para fora. Ela se importava com Dave Fellows e a rainha. Isabelle não aprofundou-se no assunto como mais uma de suas punições.
-Fui eu quem lhe disse para correr naquela noite. –ela grunhiu. –Fui eu quem chamei Alfos e eu quem vi o perigo que Reycaryn oferecia. É assim que me agradece?
-É assim que me mantenho segura. Posso acordar agora?
Ela respirou fundo, afastou-se alguns passos e piscou.
-Encontrar o fim dessa guerra nunca foi inteiramente de seu interesse, não é mesmo, Alícia Weis? –ela falou. –Você só quer obedecer e voltar para casa no fim do dia para poder assistir televisão.
-Minhas prioridades variam. Primeiro eu queria te desmascarar, na escola. Depois provar-me para Tâmara, salvar o rei e princesa Thaila, ajudar Argia, informar-te de tudo o que vinha acontecendo... O que acha, Isabelle? –os olhos azuis tempestuosos da menina eram difíceis de se encarar. Transmitiam mensagens muito confusas de superioridade, interesse e desespero. -Eu nem queria ter vindo para Érestha, se quer saber. Se tem alguém que gostaria de um pouco de paz e mais televisão, essa com certeza sou eu. Posso acordar?
-Não vejo mais Dave Fellows, não vejo mais o guarda do vale e não vejo mais o elfo. Sua posição é algo chave para que os caminhos se revelem –ela continuou. –Estão bagunçados, turvos... E não é tão fácil chegar em Thaila, menina tola. Eu preciso saber o que aconteceu se quiser que continue interferindo por vocês. É a minha vez de jogar, e eu perdi todas as minhas peças de vista.
-Eu não sei onde ninguém está. Só sei que estou longe –era o que ela respondia sempre que Isabelle se irritava.
-Você mostrou-se mais inútil do que os piolhos nos cabelos de Pedro, Alícia Weis. Acorde de uma vez e continue a sê-lo por lá –Alícia sorriu, triunfante, aliviada. Mas Isabelle sorriu o mesmo sorriso. –Para situar-te melhor, você esteve dormindo por sete dias desde que deitou-se pela primeira vez. Acordará na manhã do oitavo.
Ela não teve tempo de protestar. Isabelle arranhou sua lâmina albina no ombro da menina, por raiva, e deixou que ela abrisse seus olhos. Ainda tonta pelo pesadelo e sentindo a dor no corte, Alícia tentou sentar-se, tomando ar com exageiro, num susto. Sua visão ficou turva, mas ela pôs-se em pé do mesmo jeito. Andou alguns passos para frente sem enxergar nada, cambaleando e contando as facas em seu cinto. Duas mãos seguraram seus ombros e balancearam-na. Ela teria pego uma faca se não tivesse ouvido a voz da princesa.
-Você dormiu muito.
Pontos pretos em sua visão foram desaparecendo conforme seus olhos se adaptavam e a dor no ombro extinguia-se. A princesa tinha lagartixas coloridas no cabelo e um sorriso assustador. Alícia obrigou-se a dar um passo para trás. Nunca havia visto os lábios perfeitos de Tâmara cravados em um sorriso tão bondoso como aquele. A princesa acariciou seu rosto e beijou sua testa. Alícia ainda arfava e, confusa, deu outro passo para trás.
Alfos também estava ali com as duas, destruíndo uma coxa de ovelha com seus dentes afiados. As asas do dragão estavam molhadas e sujas de neve, mas as árvores em volta deles estavam belas como numa primavera e o clima era morno e acolchegante. Tâmara carregava junto de si uma cesta com frutas, joaninhas agitadas e madeira.
-Eu fiz um Oasis para nós no meio dessas montanhas de gelo. Não goso do inverno tanto quanto da primavera. –explicou Tâmara. –Tivemos que fugir de Reycaryn duas vezes, e conseguimos não graças a você, mas a seu dragão. Proteja-me, protetora.
Ela virou-se de costas e andou até um círculo de pedras, conde começou a dispor madeira para uma fogueira. Alfos cuspiu fogo para ajuda-la a acende-la e as joaninhas voaram para longe, assustadas. Alícia reconhecia a neve fora do Oasis, e reconhecia a brancura perfeita da lã da ovelha que Alfos mastigava. Elas haviam fugido para as montanhas de Argia, mas pareciam estar lobge do castelo. Não havia cristal nem o barulho do mar próximo a elas. Sentiu-se como Riley ao fazer tais observações.
-O que aconteceu enquanto eu dormia? –ela perguntou.
-Não tem como eu saber. Estamos refugiadas, longe de todos. Não cheguei a ver nem mesmo uma equipe de busca –ela separou algumas frutas, caquis, e apoiou-as na grama. –Ou somos muito boas em esconde-esconde, ou ninguém se importa.
-Não. Acho que há algo de errado com Dave e com a rainha –Alícia falou, aproximando-se do fogo.
-E quem não sabe disso? –riu Tâmara. –Fale comigo quando encontrar algo que dê certo entre os dois.
-Não, eu queo dizer que eles podem estar em perigo.
-E quando foi a última vez em que estiveram salvos? –Tâmara furou os caquis com pedaços de madeira molhados e estendeu um para Alícia. A menina copiou seus movimentos e colocou-os sob o fogo. –Não se preocupe com minha irmã, preocupe-se comigo. O que mais viu em seus sonhos?
-Crise –ela respondeu. –Crise e desespero.
-Então tudo parece estar certo.
Tâmara colocou os caquis junto da carne de ovelha já cozida e serviu para Alícia num prato feito com capim. Elas comeram usando as próprias mãos e limparam-se na lã que Alfos não queria mastigar. A princesa estava acostumada a ter tudo feito para ela, e Alícia não pode deixar de pensar em como ela havia se virado na última semana. A menina coletou neve em um balde para derrete-la e esquenta-la para que a princesa pudesse lavar-se. Ajudou-a a pentear seus cabelos verdes e a limpar seu vestido. Tâmara explicou que alfos a havia libertado das correntes no primeiro dia, e que as havia deixado para trás. Ela ensinou a menina a construir camas de capim, grama fresca e pétalas de rosas para elas acomodarem-se durante a noite. A neve e o vento frio não chegavam até elas dentro do pequeno Oasis. Em compensação, não seria nada difícil encontrar-las num meio de neve branca e fofinha. Alícia não sentia-se segura.
-Tem mais uma coisa que eu não contei –Tâmara falou, sentando-se em sua cama improvisada –Alfos trouxe até nós uma garotinha de cristal, a meu pedido. Ela ajudou-me a cozinhar e tomar banho. Eu confio nela. O nome dela é Nina Umbria. Conheci-a quando visitei o Castelo de Cristal pela primeira vez.
-Não foi uma boa ideia -Alícia sentia falta de Nina. Era uma menina muito boa. Mas não estava confortável em deixar que oura pessoa soubesse de sua localização. –Conheço a garota, mas...
-Nina é uma criança, ela mal sabe o que está acontecendo conosco. Além disso, prometeu manter segredo. Não é culpa minha se eu precisei de ajuda enquanto você dormia, Weis. Alfos –ela chamou. O dragão levantou sua cabeça da comilança incessante para prestar atenção em sua princesa. –Pode ir, se quiser. Agora eu tenho Alícia.
O animal gritou e levantou voo imediatamente. Parecia estar com pressa. Tâmara deitou-se na cama e convidou Alícia a fazer o mesmo. A menina sentou-se; não estava cansada.
-Se Reycaryn aparecer...
-Faça o que bem entender, Alícia Weis –sorriu a princesa. As lagartixas em seus cabelos correram para escalar as árvores. –E da próxima vez que resolver sonhar por uma semana, que sejam sonhos sobre minha província. Eu não confio em Gary e Ana Vitória.
-Pensei que Vitória fosse "a mulher mais sensata que já conhecera", em suas próprias palavras, e que Gary DiPrata fosse "muito mais do que um guerreiro".
-Eu confio meus segredos à Vitória e a vida de meus súditos a Gary –ela respondeu, fechando os olhos para apreciar a escuridão. –Mas não confio meu castelo a ninguém. Ele é feito de marfim e ouro maciço, Alícia.
Ela riu. Alícia ainda vestia o vestido da festa de casamento do príncipe Edgar. Isso a incomodava. Pensou em trocar de roupa com a princesa, mas duvidava que seu corpo podia ajusar-se ao dela. O Oasis não permitia a visão do céu estrelado que Alícia queria ter. Pelo contrário: tapava o azul enevoado. A noite fora muito entediante. Tâmara dormiu e a fogueira apagou-se. Até as lagartixas coloridas preferiram descançar e deixaram Alícia sozinha. Ela não tivera tempo de pensar em seu irmão gêmeo e em como ele deveria estar preocupado e decepcionado. A marca de protetora em seu braço era uma grande traição à promessa de sempre lhe dizer tudo e manter-se em segurança. Ela poderia ao mesnos ter dito alguma coisa. Ela sentou-se perto do fogo morto para pensar melhor em Riely.
-Não deixe o fogo morrer, Alícia –Tâmara resmungou em seu sono. –Algo deve aquecer esse Oasis.
GENTE OLHA O DAN REYNOLDS COM UM ÓCULOS DE ABACAXI
blz vlw podem seguir com suas vidas. Até o próximo capítulo.
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