LIV -Dave
A habilidade de Terlúria não dependia apenas dela mesma, mas das pessoas ao seu redor. Ela encontrava pessoas nas mentes dos outros e as cores em seu corpo transformavam-se. Dave via apenas Terlúria, mas os outros pareciam muito preocupados ou ofendidos. Bia tinha os punhos cerrados, por exemplo, e a pequena Nina Umbria parecia muio assustada. A princesa de ilusões roubou a cena. O Fellows carregava o caixão de prata e andava com a cabeça erguida, com a resposta de todos os problemas de Érestha em mãos. Tudo o que os outros viam era Terlúria, boquiabertos. E seu ombro estava queimando pelo sacrifício. Ao menos estava satisfeito por ver que estavam todos ali, alertas.
Nicolle e seu irmãos tinham um molho de chaves com eles, e estavam assustados. Ellie, a elfa colorida, tinha uma mochila e dois coolers cheios das coisas que os elfos vinham preparando nos últimos meses. Riley, como sempre, carregava o Livro da Rainha. E Imani, com sua eterna expressão de desinteresse, vestia branco e tinha os braços cruzados.
-Você cresceu tanto, sobrinha –Thaila comentou, dando um passo à frente na grama de seu próprio castelo. Aproximou-se o suficiente para acariciar os cabelos dela.
Dave era o único que não parecia surpreso pelo fato da rainha não ser afetada por Terlúria. Os outros deram um passo para trás quando as cores na pele da mulher rearranjaram-se e ela revelou-se.
-Dave me disse que eu posso ficar quando tudo acabar –falou a princesa de ilusões. Thaila concordou com um aceno de cabeça. –É muito hipócrita de sua parte, majestade, oferecer liberdade quando precisa de mim. Soas exatamente como a tua mãe. Mas, obrigada, eu gosto da minha ilha. Se pudermos acabar logo com toda essa história, eu agradeceria.
A rainha de Érestha respirou fundo e afastou-se, concordando em silêncio.
-Ouçam a menina –falou Imani, revirando os olhos. –Vamos acabar logo com isso. Abram o caixão e deixem-me ver o estado da bebê.
Dave passou na frente de Terlúria e apoiou o caixão no chão. Nicolle aproximou-se e ajoelhou-se ao lado dele. Os amigos ajoelharam-se e respiraram fundo antes de começar.
-Esperar, -Dave falou, citando o Livro da Rainha. Eles usaram a chave prateada, a que abria o Limbo. A tranca emitiu um som de 'click' e a fechadura redonda abriu-se, revelando um outro buraco para a segunda chave; -Para Sempre –ele continuou, inserindo a segunda chave. Esta era a mais bela, dourada e parecia nova. Ele sentiu a tranca se abrindo mas tudo aconteceu em silêncio. Nicolle colocou seus cachos cor de caramelo atrás da orelha com as mãos trmendo de ansiedade. Estendeu para Dave a última chave. Aquela era velha, enferrujada e mal cuidada. Apenas pela textura sentia-se que o metal havia desistido há muito tempo e deixado oxidar-se. Ele encaixou o objeto no último feixo. –E sofrer.
O caixão de prata se abriu. Todos ao redor dos dois amigos ajoelhados prenderam a respiração, mas eles não se mexeram. Dave não sabia o que esperar e não tinha vontade de ser o primeiro a descobrir o que a rainha Thaís havia escondido por tano tempo. Foi Rick quem aproximou-se para puxar a tampa, curioso como sempre fora. Thaila suspirou aliviada, permitindo que todos se acalmassem. O corpo da traída estava perfeitamente conservado em forma de bebê; enrolado em um cobertor cor de rosa e ainda cheirava a talco. A rainha de Érestha agaixou-se e pegou-a no colo com um sorriso.
-Vai ser mais fácil do que eu esperava –disse Imani, dando de ombros e analisando a bebê Argia nos braços da rainha. –Agora, vamos. Todos nós.
A cozinheira branca ajoelhou-se e desenhou formas geométricas com seu giz branco na grama verde do Castelo de Cristal. Riley foi o único que não pareceu muito surpreso quando ela pisou no centro de seus desenhos e desapareceu. Foi o primeiro a segui-la. Incerto com a utilidade do caixão vazio, ele deixou o objeto no chão e foi atrás de seu amigo e da cozinheira. Em um piscar de olhos ele encontrou-se numa cidade morta, onde o chão era seco e repleto de ossos e árvores mortas. Ele já havia sido um prisioneiro no subterrâneo daquele lugar. Estavam bem próximos à floresta, nos confins do território da Cidade dos Cavaleiros Mortos. Uma criança vestida de branco estava sorrindo para Imani enquanto colocava galhos secos em uma pilha. Os outros chegaram ao lugar, curiosos, e ninguém disse uma plavra.
Imani pegou os frascos e potes de Ellie e distribuiu-os pelo chão. A menina, que Dave reconheceu com o filha da cozinheira de uma visão que um dia roubara dela, acendeu a fogueira. A elfa ajudou Imani a separar as coisas das quais precisava e afastou-se quando a mulher e a menina começaram a murmurar canções e a desenhar com giz no chão. Estava claramente desconfortável naquele meio. As duas praticantes de magia branca desenharam em um círculo e os outros presentes entenderam que deveriam ficar fora dele. Todos os símbolos e formas geométricas emitiram um brilho azulado quando elas repentinamente pararam de cantar.
Em uma cumbuca de argila mal esculpida, Imani começou a juntar todos os ingredientes, com uma canção murmurada diferente para cada um. Ela tinha calda de frutas, sopas de carne, folhas verdes, temperos, pedras e pós brilhantes. Também colocou um pedaço de seu próprio giz ali, antes de estender o braço para as chamas e deixar tudo esquentar, incluindo sua própria pele. Ela lutou contra o calor das chamas aos berros, e quando trouxe a cumbuca de volta para si ela tinha uma pasta cinza brilhante na argila.
-A lágrima –ela disse, estendendo o braço na direção de Nicolle.
O brilho no chão diminuiu de intensidade e Nicolle entrou no círculo para entregar o frasco. A cozinheira adicionou-o à sua pasta. Chamou pela carne e desta vez Thaila prendeu a respiração. Segurava o bebê gelado com tanto cuidado que parecia ter uma boneca de porcelana em mãos. Nicolle estendeu um roupão branco na terra vermelha e afastou-se, balançando a cabeça em positivo para a rainha. Ela abraçou o bebê uma vez antes de calmamente coloca-la em cima do roupão. Arrumou os braços dela na direção das mangas e cobriu-a com o resto do pano. Então, Imani pediu por sangue.
Dave não quis olhar na direção da rainha quando ela tirou de seu bolso a maldita adaga que carregava desde a morte de sua irmã gêmea. Mas Terlúria interveniu.
-É o meu do meu sangue que ela precisa –disse a princesa de ilusões. –De sangue bastardo.
-Do ludíbrio necrópole –Riley completou.
A rainha ia protestar, deferente dos outros que pareciam concordar com ela. Terlúria pegou a adaga da mão de sua tia e fez um corte em sua própria mão e estendeu a adaga para Imani. A mulher desenhou no corpo da menina e respirou fundo enquanto deixava sangue pingar na sua mistura.
-Isso vai ser bizarro –Bia comentou.
Os presents deixaram o comentário morrer e ser levado pelo vento. Dave via o nervosismo no rosto do irmão e de Nicolle. Thaila parecia aterrorizada e Imani ainda estava hipinotizada por seu ritual. Ellie não esperou que ninguém dissesse que era a hora, e adiantou-se para o pequeno corpo de Argia no chão e forçou sua poção pela garganta dela. Nicolle respirou fundo, trocou um olhar com Rick e agaixou-se próxima à Nina, para usar seu legado. Dave deu um passo para trás, e tudo o que podia fazer era observer o processo acontecendo. Imani e sua filha começaram a fazer desenhos na terra vermelha e Bia acendeu a fogueira. Os símbolos brilharam, os Litos Alvos aumentaram o volume de seu cântigo e todos prenderam as repirações. Bia buscou pela mão de Dave, e os dois ficaram em pé, quietos, esperando que algo acontecesse. A primeira coisa que o fez saltar foi Nina Umbria, que abriu seus olhos e pareceu bastante assustada. Riley puxou-a para longe do fogo e abraçou-a como se fosse uma versão mais nova de Alícia, protetor. O próximo acontecimento fez todos afastarem-se da dança branca e o fogo. As chamas tornaram-se brancas quando Imani segurou o animal em suas mãos e furou seu estômago, deixando sangue caír sob o rosto do bebê Argia. Rick e Thaila estavam completamente aterrorizados, querendo claramente que aquilo tudo acabase para poderem ter a princesa em carne.
Imani e Ellie haviam explicado como seria o processo, e falado que a essência de Argia faria o corpo adaptar-se para a idade que ela deveria realmente ter. Dave achou que estava pronto para aquilo, depois de tudo o que tinha vivido até ali. Mas ele não estava. Quando Nicolle abriu os olhos e levantous-e, olhando para o bebê coberto de sangue e pelos de animal, ela abriu os olhos. Os belos olhos verde-folha de Argia Felicity Bermonth Markova finalmente abriram-se em seu próprio corpo. Então ela começou a chorar. Thaila quis adiantar-se para embala-la, mas Ellie parou-a.
-Não acabou ainda –a elfa explicou. –não podemos interromper.
Finalmente então, começou. O canto ficou ainda mais alto, mais frenético. Os símbolos no chão brilharam ainda mais e o fogo ficou mais alto. O corpo de Argia começou a crescer dentro do roupão, e parecia extremamente doloroso. Sua voz de bebê foi logo substituída por um choro desesperado de uma criança, que amadureceu para uma adolescente até poder chegar aos seus dezoito anos, ainda chorando e gritando desesperadamente, coberta pelo roupão sujo de terra e sangue. Imani e seus filhos terminaram o processo ajoelhando-se e apagando todos os símbolos e fazendo o fogo voltar a ser amarelo e laranja, como deveria ser. Ellie ainda segurou os outros atrás de si até ver a cozinheira branca anuindo. A rainha, Rick e Nicolle correram para acudir Argia, que ainda gritava desesperadamente.
Os cabelos dela eram castanhos e bem lisos, como eram os de Átila. Seu nariz tinha uma curva como o de sua mãe tivera, e seus belos olhos verde-folha estavam inundados de lágrimas. Rick olhava para ela sem saber bem o que fazer, e a pobre princesa buscou conforto nele. Rick segurou-a como conseguiu e levantou-a do chão.
-Vamos embora daqui –ele implorou com o olhar para Dave. O menino só percebera então que estava apertando a mão de Bia com força e fazendo seus dedos estalarem. Ela não estava nem ai, e faria o mesmo com ele se fosse mais forte. –Por favor.
Ele conseguiu identificar o barulho de cascos de cavalo aproximando-se por cima do choro descontrolado de Argia. Imani demonstrou-se preocupada, e apressou-se em desenhar mais coisas no chão.
-Leve-nos para o Castelo de Cristal –Thaila pediu. A mulher de branco ficou confusa com a ordem, e parou o que estava fazendo. –Eu não me importo com cavaleiro nenhum, que eles nos siam. Não temos tempo para nos preocupar, eu tenho que chamar meus irmãos. Tire-nos daqui.
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