XVI -Alícia
-Vamos, não é tão complicado! –Candace falou, sentando-se na grama. –Pare de pensar na festa de hoje a noite e concentre-se.
-Só pode estar brincando –ela resmungou em resposta.
-Sem pressão, Alícia, qual é? -Dave riu. –É só não causar nenhum ferimento grave nos três adolescentes mais importantes de Érestha.
Ela jogou uma das pedras em sua perna e falou alguma coisa sobre Missie que Dave provavelmente não ouviu pois estava ocupado rindo. Candace, a mulher que ensinava-a a aperfeiçoar seu legado de polarista, riu junto dele. Ela queria que Alícia acertasse três pedras em três alvos diferentes. O problema é que ela tinha posicionado Dave, Rick e Nicolle em pontos estratégicos para atrapalha-la, e ela não podia acerta-los. Alícia estava nervosa, e todos já haviam desistido de tentar acalma-la. Só queriam rir de suas expressões faciais dela. A menina sentia-se pressionada agora que dois garotinhos do primeiro ano também apresentavam o mesmo legado raro de Tâmara. Ela também não estava muito contente em dividir a atenção especial da princesa da terra.
Ela e o irmão haviam sido convidados para a festa de boas vindas de Argia no Castelo de Vidro, e Alícia havia passado a tarde inteira com a princesa em seu quarto. A única conversa que elas tiveram que não envolvia os dois garotos era sobre vestidos cor de rosa. A princesa havia encomendado um guarda roupas novo inteiro, digno da realeza de Érestha, para Argia. Alícia tinha a impressão de aquele não era o estilo de Nicolle, mas talvez ela não tivesse escolha. Os vestidos tinham tamanhos, cortes e tons diferentes. Rosa-choque com decote canoa, rosa claro com babados brancos, um vestido de renda salmão, um vestido justo na cor magenta, um robe de seda, um com saia rodada, um vestido de lã, e o favorito dela, que ela chamava de "vestido de princesa". Tinha o corpete rosa com padrões feitos de pérolas e a saia enorme que imitava pétalas de rosa que Tâmara amava. Alícia não sabia se preferia conversar sobre outros polaristas ou vestidos cor de rosa, mas estar ali já era bom o suficiente. Tâmara pediu que algumas moças ajudassem-na a se lavar e vestir e ela sentiu-se como uma princesa por alguns minutos. A princesa quis que ela usasse um vestido de seda verde com gola alta e mangas boca de sino. Talvez a peça tivesse sido a última escolha dela, mas ela sentia-se extremamente fabulosa, nunca queria ter que tirar a roupa. Tâmara sentou Alícia à sua penteadeira e arrumou o cabelo dela para o lado.
-Sinto falta de fazer isso. Minhas irmãs estão crescidas agora e não me restaram bonecas para brincar –Tâmara disse enquanto encaixava brincos de argola nas orelhas dela. Antes de prender o segundo brinco, ela beijou o lóbulo da orelha da menina e também seu pescoço, apertando os ombros dela com suas unhas enormes. Isso lhe causou arrepios e Alícia se afastou. Lembrava-a dos momentos angustiantes em Chelmno e do toque indesejado de Pedro Satomak. Tâmara olhou sua imagem refletida no espelho com um sorriso satisfeito. –Não se preocupe com os meninos polaristas na sua escola. Você é minha guerreira, Alícia, minha boneca. E já está pronta. Vá até seu irmão e a namorada. E peça que Vitória venha até mim.
-Sim senhora –ela disse, obediente, e retirou-se dos aposentos da princesa da terra.
Ela ainda não tinha muita certeza de por onde andar dentro daquelas paredes. Por sorte, Dave estava saindo do quarto de Thaila. Ele hesitou um passo ao encontra-la parada no corredor de um castelo vestida em um vestido caro.
-O que ela fez com você? –Dave sorriu, segurando sua mão para ela dar uma volta.
-Estava brincando de boneca –falou. Ele tinha tentado dar um nó na gravata, mas tinha falhado. De novo. –Pode me ajudara achar Riley?
-Claro. Ele deve estar na biblioteca com Lilian.
-É, eu não sei chegar até lá –ele comentou na sua falta de memória e guiu-a até a escada da torre redonda de vidro. Alícia queria saber o que Thaila havia dito sobre a visão do pior dia de Rick, e perguntou de uma vez. –O que ela disse?
-Não existem erros nessas visões –ele falou. –Disse que "vamos descobrir". Rick nunca disse que minha mãe seria morta. E deve ter confundido Bia com alguém.
-Tem razão –ela falou, segurando o ombro dele para descer escadas com seus saltos.
-Não precisa ser legal sobre isso, Alícia.
-Não me diga como te tratar, Dave.
Ele passou um de seus braços por cintura e o outro por baixo de seus joelhos. Começou a carrega-la escada abaixo antes dela conseguir gritar com ele. Alícia odiava ser carregada, principalemente daquela maneira. Ela bateu nele e continuou a gritar até passarem por uma porta de madeira.
-Por favor, Alícia, fique quieta. Isso é uma biblioteca.
-O que estão fazendo? –Riley perguntou, fechando um livro e aproximando-se dos dois.
-Estou irritando sua irmã, e você? –Dave respondeu, colocando Alícia no chão.
Lilian estava sentada à mesa junto com ele, e o príncipe Elias estava analisando alguns livros numa prateleira. A menina dos longos cabelos ruivos começou imediatamente a fazer comentários sobre o vestido de Alícia, e Riley ficou parado, olhando para a irmã como se fosse outra pessoa. Ele chacoalhou a cabeça algumas vezes antes de puxar os dois para o livro da rainha. Apontou para as primeiras palavras que formavam a primeira linha do livro. Osnedbjb ez szjoiz. Alícia começou a ficar tonta e olhou para o irmão.
-O príncipe Elias achou um manuscrito antigo de sua mãe e disse que essa primeira palavra significa 'profecia' –ele começou a explicar. –Tâmara já havia dito que essa terceira é 'rainha', e, assumindo que ez seja uma preposição, o livro começa com "Preofecia da rainha" –ele bateu as maos na mesa, satisfeito. Um arrepio incontrolável percorreu a espinha de Alícia. Ela não sabia se aguentava tanta emoção descendo por suas costas em menos de um mês. –É isso Dave. Isso deve falar sobre Argia, Tabata, Thaila, você e seu pai... Sobre tudo.
-Uma profecia? O Mago Roxo falou uma profecia para Thaila e eu uma vez. –ele falou, olhando o livro com fascínio. Fechou os olhospara se concentrar, pensar em alguma coisa. –Algo sobre um coração corrompido, uma parte sobre mim, alguma coisa sobre um traidor e...
-"E aquela que foi injustamente levada pelas garras da morte deverá retornar para que a guerra finalmente possa ter um fim" –Thaila completou para Dave. Ela vinha da mesma escada que Alícia descera, carregando botas roxas com corujas coloridas na mão. –Você é muito ruim de memória, Dave. E bom trabalho, meninos. Isso é fantástico.
-Obrigada, senhora –Riley resmungou sem tirar os olhos do livro.
-Alícia, minha irmã não queria falar com Vitória? –Thaila perguntou aproximando-se do livro. Alícia concordu e explicou para Lilian, que saiu imediatamente da biblioteca. –Riley, não quer ajuda-la?
Ele ficou confuso em responder aquilo, mas concordou. Fez menção em levar o livro junto, mas Thaila disse que tomariam conta dele. Observou o livro por alguns segundos, antes de piscar para afastar a tontura que a leitura causava.
-Irmão? –ela chamou Elias. O homem pegou um dos livros da prateleira e retirou-se, sem dizer nada. A rainha olhou para Alícia. –E então?
-Ela ainda não apareceu –Alícia respondeu. Havia levado alguns segundos para entender direito a pergunta, mas só havia um assunto recorrente entre as duas, e este era Isabelle.
-Assegure-se de transmitir todos os pontos principais, sim? –Thaila pediu, apontando para as palavras do livro. Dave começou um discurso sobre Thaila ter que ficar longe de Isabelle, e a rainha deixou que ele falasse tudo o que quisesse. Ela ajeitou a gravata do menino enquanto falava –Obrigada pela preocupação Dave, mas as intenções de Isabelle não incluem me machucar. E ela já me disse o que tinha que dizer. É toda de Alícia agora.
-E o que ela disse? –Dave perguntou, irritado.
-Você vai saber, Dave –respondeu, ajeitando a postura e começando a andar para a porta. Parou na metade do caminho e virou-se, mas encarou o chão, não os olhos deles. Era uma expressão sombria, pedindo desculpas. –Em breve.
Ela foi embora e deixou Alícia para cuidar de um Dave furioso, bufando e apertando as unhas nas palmas das mãos. Ele só se acalmou quando Rick apareceu para chama-los para a sala de jantar. Ele e o irmão estavam se dando muito bem desde o início das aulas. Rick pedia dicas de luta com espadas para Dave e ele ficava feliz em ajuda-lo. Dave perguntava coisas para o irmão sobre detalhes das aulas de história e ficava fascinado e incomodado ao mesmo tempo quando recebia respostas detalhadas. Era legal vê-los unidos, mas Alícia sentia-se mal. Perguntava-se se havia alguma chance dela aproximar-se de seus meio-irmãos. Havia se aproximado do pai, e agora todos os principes estavam se aproximando de Argia. Alícia não acharia tão ruim passar uma tarde com Rômulo e Mariana, ou Romena e suas amigas barulhentas, mas Ramona seria impossível. Ela vivia para vê-la derrotada, não valeria a pena tentar. Não agora, pelo menos.
Eles sentaram-se à mesa de mogno da rainha e brindaram a volta de Argia dezesseis vezes; uma para cada ano de vida fora de Érestha. Os pratos principais foram servidos e o clima àquela mesa tornou-se festivo. Elói não parava de cantar de boca cheia, acompanhado pela bela voz de Tâmara. Thaila ria adoravelmente de tudo, e Elias aplaudia os irmãos com um sorriso no rosto. Missie estava sentada ao lado de Alícia, e explicava coisas a todo momento. Qual garfo usar, como comer tal fruta, quantas vezes ela devia limpar a boca antes de tomar o vinho da taça de vidro... Alícia estava fascinada. Ela não gostava muito de vestidos, luxo ou... tudo aquilo. Mas estando ali, era diferente. Ela nunca queria que acabasse.
No meio da celebração, depois de Argia fazer um pequeno discurso de agradecimento cheio de lágrimas e sorrisos, os príncipes entregaram seus presentes para a princesinha. O trono que ela havia ajudado a desenhar estava pronto e havia sido posicionado no canto da sala de jantar. A estrutura era muito parecida com o trono antigo de Thaila e o atual de Tabata, mas com os braços e encosto curvados, tudo nas cores rosa claro, branco e dourado. Ela sentou-se ali, entusiasmada por recceber tanta atenção da família. Tâmara entrgou-lhe seu novo guarda-roupa cor de rosa, Tamires lhe deu um mar de jóias e Edgar uma coleção de mantos e casacos de pele. Marineva, que agora andava para todos os lados com o príncipe do sol e da lua, havia feito uma tapeçaria maravilhosa para colocar na sala dos tronos, atrás do novo trono dela. O representante de Elias puxou um carrinho de mão estufado com livros de capa grossa e deixou-o aos pés dela. O príncipe aproximou-se e estendeu um catavento rosa-choque que girava loucamente para ela.
-Ele nunca vai parar de girar –explicou, sorridente. –Contanto que a senhora continue feliz.
Argia pulou do trono para abraça-lo, mas voltou a sentar-se quando chegou a vez de Teresa, princesa dos mares, de se aproximar. Ela trazia um pote cheio de areia na mão, e deixou-o no chão, explicando que representava uma praia inteira que tinha reservado para ela. Disse que ali moravam cavalos marinhos coloridos, tartarugas e gaivotas. Elói lhe deu dois presentes: uma espada com rubis no cabo de ouro e uma caixa com vários furos por ela. Argia abriu-a com entusiasmo, e o fucinho de um cachorro deus as caras. Os pelos do animal eram negros como o cachorro-fera do diretor DiPrata, e os olhos eram tão intensamente azuis que era difícil olha-lo por muito tempo. Não tinha pulpilas, íris nem escleróticas, apenas um brilho azulado em suas órbitas. Dave e Alícia olharam para Riley imediatamente, esperando explicações que ele tivesse tirado de algum de seus livros.
-É um haunt fêmea –ele falou. –As fêmeas tem os olhos azuis e os machos vermelhos. São criaturas como cães de pelos negros que vivem em cavernas. A saliva deles é venenosa e podem expelir mais veneno pelas garras, se quiserem. São carnívors e potencialmente perigosos. Mas são adoráveis.
-Você acaba de descrever uma versão peluda de Sachabella, a côndefa venenosa de Tabata que atacou nossa escola no primeiro ano –Alícia comentou em voz baixa. Riley considerou a afirmação dela por alguns momentos e a menina apenas revirou os olhos. Voltou a observar Argia acariciando a cabeça do animal com fascínio.
-Por que você nunca me deu um desses? –Thaila perguntou, aproximando-se de Elói.
-Essas criaturinhas foram encontradas recentemente na montanha mais próxima de meu castelo. Estavam caçando galinhas –ele beijou a testa da rainha com um sorriso. –Vou te dar cinco deles, se quiser, minha rainha.
-Sim, eu quero –ela não sorriu, e Alícia entendeu como uma ordem. Ela aproximou-se de Argia e estendeu a mão para o lado. O menino Gabriel colocou uma tiara sobre a palma da mão dela, e Thaila encaixou-a nos cachos cor de caramelo da menina a sua frente. –Essa foi minha primeira tiara. Agora é sua. Irmã.
-Obrigada -Argia pulou da cadeira e abraçou o pescoço da rainha por algum tempo. Todos voltaram a se sentar para a sobremesa e Argia tinha uma pergunta. –Irmã, senhora, há alguns dias me disse que teria que escolher alguém como representante, como todos vocês. Minha resposta óbvia seria Nicolle, mas isso não me beneficiaria de maneira alguma. Contudo, confio nela mais do que em mim mesma, se isso faz sentido. Uma princesa pode eleger dois representantes para si?
Thaila demorou para responder. Ela olhou para os irmãos, em dúvida, e todos apenas deram de ombros. Dave comentou que não se lembrava de nenhuma lei que proibisse isso, mas também não haviam registros sobre o fato.
-Bom, então que haja agora –Thaila anunciou. –Pode ter quantos representantes quiser, só não deixe essa liberdade virar uma bagunça.
-Isso é ótimo –ela sorriu para Rick, que tentava cortar carne de uma perna de ganso com uma faca de pão. –Então temos mais um Fellows na corte conosco.
Rick parecia surpreso, embora ele fosse o único legado da princesa perdida. Thaila disse que cuidaria de contar para o povo em breve, e não houve nenhum tipo de oficialização. A rainha também disse que Dave ficaria resposável em ensina-lo o que fazer. Ele apenas revirou os olhos para aquela ordem. Quando todos já haviam terminado de comer, os brasileiros e Missie foram com Argia para seu novo quarto ajuda-la a organizar suas coisas. Ela estava entusiasmada demais para deixar que as criadas fizessem por ela. Seu haunt não estava muito a vontade e ficava cuspindo veneno em sua caixa de papelão. Missie ajudu-a a pendurar as roupas, Alícia organizou suas joias em caixas de madeira e os meninos ficaram tentando fazer o haunt derreter a gravata de Rick com a língua. Argia abriu espaço para Nicolle tomar conta do corpo por um tempo e o Fellows mais novo foi o primeiro a levar uma bronca.
-Rick, por favor, você acabou de ser nomeado representante! –ela falou. -Não é isso que seu irmão faz? Seja profissional, e deixe esse cachorro em paz.
-Não é um cachorro –Riley corrigiu.
-Vocês dois também. Só as meninas vão ajudar? –ela falou para os outros meninos. Dave estava vermelho por tentar segurar a risada. –O que foi, Dave?
-Acho que gosto mais de Argia –ele falou, rindo dos tapas que a amiga acertou em seu braço. –Vocês, meninas, são muito sem graça.
Foi esse comentário que fez Alícia acertar todos os alvos na primeira tentativa na aula com Candace. Os dois meninos mais novos que tinham o mesmo legado aplaudiram, impressionados, e Candace deu tapinhas em suas costas, contente. Ela ficou um pouco chateada de não acertar a cabeça de Dave, mas estava satisfeita consigo mesma. A professora liberou todos mais cedo pois era dia trinta e um de Outubro, e eles queriam se arrumar para a festa anual da Escola Preparatória da Província de Tâmara. Rick e Nicolle estavam animados, e Dave falava tanto sobre doces que Alícia estava quase ficando preocupada. Ela estaria atrasada para a festa naquele ano. Tinha que dormir antes, abraçada a uma espada albina. Isabelle já estivera tempo de mais longe da Traidora, e ela achava que Halloween era a data perfeita para encontrar a menina no pesadelo. Então, enquanto todos se reuniam na casinha azul para se trocar entre amigos, Alícia deitava em sua cama, torcendo para Isabelle ser rápida para não perder a festa inteira.
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