T3:C9 - Aprecie o Fim de Tudo
A queda do zumbi no fim do corredor das prateleiras, assustou Rulek que recolhia os enlatados. O morto deu seu último grunhido antes de ter a cabeça perfurada pela lâmina na ponta de uma MP5 - sustentada por cinco camadas de esparadrapo.
Harry surgiu da escuridão limpando a sola do tênis sujo de sangue, pegou uma corrente ao lado do falecido e deu um sorriso fechado para o anão à sua frente. O sol que entrava nas janelas por trás de Rulek, sentilavam a figura caolha de bandagem imunda na região.
- Não me assuste assim de novo, moleque.
- O que conseguiu? - se aproximou, tirou uma mecha de cabelo a frente do único olho e baixou a cabeça.
- Conservas. E você?
- Creme dental e um rolo de papel.
- Precisamos de escova pra isso.
Um zumbi bateu contra a vidraça da porta, permaneceu ali arranhando o vidro até que ele fosse derrubado por Marian com o pé de cabra que atravessara sua boca.
- Vamos. - disse ao entrar. - Devemos voltar para o grupo. Neiva e Léo já devem ter saído.
- Vamos encontrá-los no caminho, madame. - Rulek fica de pé. - Por que não continuamos com a busca? Eles não vão sair do lugar, ao menos que nos avisem.
Harry concorda com a cabeça e olha para a moça.
- Tá certo. Eu e a Carly vamos checar o posto mais à frente. Vão ficar bem?
- Uhum. Eu cuido do moleque.
Marian sorriu ao comparar o tamanho do menino para o do homenzinho, concordou e saiu rindo.
- O que eu disse?
- Nada. - Harry segurou o riso, voltando para trás da loja.
***
Os cascalhos na estrada voaram com o automóvel veloz que passara. Léo assumia o volante, Thomas na navegação, atrás estavam Neiva, Newt e Axel; na caçamba se encontrava Erich.
- Fica próximo a Atlanta? - Neiva indaga após olhar o exterior familiar.
- Quilômetros depois. Mas sim. - Thomas confirma. - Passamos pela comunidade de vocês.
O casal presente trocou olhares. Newt se pronunciou:
- Nossa comunidade?
- Foi lá em que encontramos a foto do Léo. Bem, deduzo que moravam por lá. Era de uma polaroid.
- Tony. - Newt concluiu. - Era dele. - olhou para os amigos.
Neiva coça a testa seguido de um suspiro, puxa o walkie-talkie.
- Passamos da milha 23. Alguém na escuta?
A estática predominou o canal.
- Fora de alcance. - Thomas disse, fazendo ela olhá-lo pelo retrovisor. - Tive o mesmo problema com meu pessoal. Tem uma torre de sinal a uns quilômetros. Usamos ela para que o rádio a longa distância funcione.
- Certo. - Neiva guardou o rádio.
- Espero que ele esteja vivo. - Léo comentou.
- Ele está. - garantiu Thomas. - Stopiwch é segura. Vão aceitá-los, com certeza.
- "Stopiwch"? - Neiva indagou.
- É. Quer dizer "parada", em galês. Acharam uma boa, devido ao número de pessoas que vinham e saiam depois.
- Parece bom. - ela comenta.
O carro foi desacelerando. O motorista havia avistado um caminhão capotado na beira da ponte.
- Fiquem atentos. - Axel bateu na lataria para chamar atenção do besteiro.
Erich pulou da caçamba, ergueu o arco mirando pelas direções. Todos fitavam suas ações dentro do carro. Ele se agachou para visualizar o interior da capota. Não havia ninguém ali, apenas vários periféricos de filmagens quebrados. O para brisa estava em cacos e o reboque repleto de furos de balas.
Erich sinalizou para o motorista. A caminhonete voltou a andar com a velocidade baixa. Ele parou ao lado da janela.
- Tem algo a mais que um caminhão. - indicou com a cabeça para a janela de Thomas.
Havia um Cirrus SR22 sob o rio abaixo da ponte, apenas com a asa direita para fora, destacando-se na água corrente.
- Sabe algo sobre isto? - Axel perguntou.
- Não, não sei. - Thomas encarava a asa. - Vamos logo. Falta pouco.
Axel encostou as costas no banco, pegou sua pistola e destravou-a. O som fez Neiva olhar para a arma e depois para o marido. Ele indicou para Thomas e voltou a observar a janela.
(...)
- Só tem que virar na primeira curva.
- É um caminho diferente do mapa. - Newt nota.
- Passamos por essa rota do mapa antes de encontrar a comunidade de vocês. Não foi muito legal.
- O que houve lá? - Léo perguntou.
- Fumaça, famintos e destroços.
- Para aí, Léo. - Axel mandou.
- Por quê?
- Vai logo.
O garoto encostou a lataria. Os tripulantes saíram, deixando uma incógnita em Thomas que saiu em seguida.
- Que quê foi?
- Só um minuto, mexicano. Erich, Newt, tomem conta do perímetro. Querida.
Neiva assentiu antes que ele pudesse falar.
- Tudo bem. - ela deu um tapinha no ombro de Thomas.
- Léo, chega mais.
O jovem acompanhou o militar. Axel tomou uma distância boa do guia, começando a falar depois de garantir a privacidade:
- Tá dando muita brecha pra esse cara.
- Eu tô sendo cuidadoso.
- Estamos indo direto para onde ele quer. Entendo que é o seu pai, que quer revê-lo...
- Axel, eu saquei. - o militar levantou uma sobrancelha. - Confiou em alguém antes e um de nós acabou com um machado na cara e uma criança sem olho. Mas do que vai adiantar quando isso for verdade? Quero dizer, vai matar alguém que está realmente disposto a nos ajudar?
- Ele sabe demais.
- Isso é um ponto.
- Ele esteve na Central.
- E acha que ele pesquisou minha vida lá?
- Bem...
- Sabe que o que tá supondo é improvável?
- Vimos demais, garotão. Não quero perder mais ninguém. Foi demais para todo mundo. A Katrina... Podia ter sido diferente se tivéssemos abrido o olho.
- Podia, sim. - ergueu seu olhar. - Podemos ir andando a partir daqui.
- Tá.
Thomas desencostou da lataria, foi até a caçamba onde se encontrava Neiva organizando os pertences.
- Eu sei que já disse, mas ficaria bem mais simples se eu chamasse eles pelo rádio. Estamos quase próximos da torre de sinal.
- Não vai rolar. - fechou a mochila.
- Tá legal. Eu entendo. Confiança nunca é demais, só que temos uma missão. O que acham que sou? Um agente secreto?
- Passamos por muito pra saber o ponto que as pessoas chegam pra terem o que querem, hoje em dia.
- Tá. O menino caolho, eu vi. - respirou fundo. - Sinto muito. Só tô tentando ajudar.
- E vai, se chegarmos lá. - Axel o surpreendeu com sua fala repentina. - Chegamos à um entendimento.
- Prepare as botas, mexicano. - Léo falou. - Pois vamos andando.
***
Com um punhado de arame, foi levantado um cerco ao redor de caminhão de bebidas abandonado no pasto da estrada. Sobre o caminhão estava Nelson e Vanessa. Vez ou outra, ela checava o perímetro com o binóculos. Dali de cima via-se o acampamento provisório ao redor, onde todos contribuíam nas tarefas.
- Pega aí. - Nelson sacudiu os salgadinhos.
- Como tá o olho?
- Melhor do que não estar vendo nada. - mastigou. - Desculpa, não foi intenção. - se recordou do menino.
- Tudo bem. Como aconteceu? Não precisa contar, se quiser.
- É por causa da Sally? - a olhou de canto. Vanessa concordou. - Eu não sei. Só tentei ajudar. Quando vi que não podia fazer mais nada, eu corri. - suspirou pesado. - Os desgraçados nos levaram pra uma tenda. Tavam esperando lá. Graças a Deus, não me lembro de muita coisa depois disso.
- Sinto muito.
Nelson assentiu, calado. Vanessa fitou o horizonte e então começou:
- Eu só achei que ela seria feliz com a criança. Que aquilo mudaria ela de vez. Aquele bebê era a única lembrança que ela tinha do Zack e agora... - respirou fundo, negando. - Esse mundo está podre.
- Podemos melhorá-lo. Afinal, por que ainda estamos aqui, não?
Vanessa desviou seu foco para o homem de boné que consertava o cercado, pesando no que Nelson acabara de dizer.
- Me dá um minuto? - levanta.
- Vai lá. - pega o rifle.
A moça desceu pela parte da frente do caminhão, já no chão, ela seguiu até Han.
- Ei.
- Oi. - sorriu. - Um tempo na vigília? - olhou para Nelson.
- Quase isso. Cê tá bem?
- Uhum. - voltou o foco a cerca.
- Te conheço bem pra saber quando tá mentindo.
O coreano baixou o martelo e virou-se para a moça.
- Don, Angela, Steve, Katrina, Tony... A Sally. Realmente não estávamos preparados para isso.
- Também tem sido difícil pra mim. Pra todos, aliás.
- Pensei que ficaríamos bem lá. Que talvez pudéssemos começar algo.
- O grupo?
- Também.
Vanessa baixou a cabeça.
- O que te impe...
- Tudo. Talvez seja melhor assim do que gostarmos um do outro e um de nós morrer no fim.
- Han, é melhor agora do que nunca.
Ele parou o que estava fazendo para olhá-la.
- Que se dane. - ela estendeu a mão à ele.
Han soltou o martelo e entrelaçou seus únicos dedos nos dela. Vanessa olhou nos fundos dos seus olhos e abriu um sorriso. Juntaram seus lábios. Um beijo duradouro que acabou com o afastar do coreano. Vanessa ergueu uma sobrancelha.
- E se eu te contar que derrubei o martelo no meu pé?
A moça riu, encostando sua testa na dele, apanhou o martelo sobre o pé do mesmo.
- Mais cuidado. - se aproximou novamente.
Um grunhido quebrou o clima. O zumbi ficou contra a cerca à 10 metros deles. Jack saiu de dentro do reboque e enterrou a faca no cérebro da coisa. Jack deu uma última olhada neles, limpando sua faca e voltando ao reboque.
- Army para Terra Plana. Na escuta? - a voz de Neiva soou.
Nelson pegou o rádio entre as cadeiras sobre o caminhão e pressionou o botão.
- Na escuta. Algum problema?
- Provavelmente ficaremos sem gasolina para voltar. Podem trazer o grupo até nós?
- Claro, podemos. Encontraram alguma coisa?
***
- Ainda no caminho. - respondeu. Era a última na fileira liderado por Thomas. Ela olhou para cima, avistando a torre de sinal.
- Tudo bem. Só dêem a localização.
- Vanessa sabe.
- Entendido. Câmbio.
Prendeu o walkie-talkie no cinto.
- Ali. - Thomas apontou para uma estrutura.
- Onde? - Léo apertou o passo, parando ao lado do mexicano.
- Bem... - baixou o braço. - Hijos de puta. - correu para a estrada.
- Thomas! - Axel esbarrou em Léo.
O mexicano seguiu disparado até a entrada. O portão da esquerda estava de pé, o outro no chão. Newt passou por ele e cessou sua correria ao colocar a mão a frente do mesmo.
- Espera! Espera!
Thomas para com advertência do ruivo.
- Preciso saber se estão lá.
- Faremos isso, mas com cuidado.
Um zumbi deu as caras, esbarrando no portão ainda de pé e cambaleando na direção deles. Erich se aproximou da dupla e o conteve com uma flechada do arco.
- Preciso saber. - disse Thomas.
Léo passou por eles sem pestanejar, ganhando atenção do grupo. Erich tentou alcançá-lo. Léo parou dentro da comunidade, percorrendo seu olhar abismado por toda parte.
Os foco de incêndio tinham a fumaça clara e a maioria dos mortos estavam caídos e torrados.
- Léo, segura as pontas! - Neiva para atrás dele, ofegante.
O restante do grupo se aproxima. O mexicano esboçava a mesma reação do garoto.
- Onde? Onde ele tá?! - Léo se exaltou com Thomas.
- Eu não sei. Não sei.
- Mentiroso! - dá um soco que faz o nariz do mexicano sangrar, mira a Glock 18 para o mesmo no chão.
- Léo! - Neiva segura seu braço. - Ele não sabia. Nenhum de nós.
O jovem treme o braço e logo baixa a arma, marejando os olhos.
- Pai?!
- Léo, - Newt fica a sua frente. - mantenha a calma. Vamos procurar e ver o que encontramos, tá legal? Se seu pai esteve por aí todo esse tempo, ele ainda está vivo.
Léo concorda com a cabeça, fechando os olhos subitamente.
- A fumaça tá clara. - Erich diz. - Talvez tenha acontecido há uma semana.
- Léo, vamos procurar seu pai. - Axel enfim fala.
- A biblioteca. - Thomas fica de pé. - Preciso ir até lá.
Ele vai em passos rápidos, pressionando o nariz ensanguentado, adentra o lugar e corre para o segundo andar. Puxa sua faca para conter o zumbi na recepção, debruça a falecida no balcão e enterra a faca. Nota-se a falta do rádio transmissor ali.
- Merda. - ouviu os passos atrás de si. - Levaram. Levaram tudo. - retira a faca da morta. O corpo desliza sobre o balcão e cai brusco no piso.
Thomas olha para Léo assim que o mesmo chega, parando na escada.
- Sinto muito. - lamenta.
(...)
Sentado no meio fio, Thomas continha o sangue com um lenço dado por Neiva. Analisava toda a desgraça ocorrida no lugar, suspirando pesado.
- Onde vocês estão? - indaga para si.
Erich cessa o caminhar do lado dele e senta-se, apoiando o queixo no arco.
- Os mesmos caras que fuderam com a gente. Foi isso. Sinto muito.
- Sinto pela sua casa.
- Valeu.
Newt veio com um pacote em mãos cheio de aspirinas, sacudiu para que vissem.
- Foi tudo que encontrei.
- Não tá ruim. - o besteira fala.
O restante se junta a eles, com exceção de Léo que mantém distância analisando cada um dos corpos - e matando os ainda vivos.
- Me desculpem. - Thomas se lamenta. - Eu...
- Não precisa. - Neiva antecipou.
- Podíamos usar este lugar. - Newt deu ideia. - Reconstruir.
- Disse que eles voltaram, né? Para a central, - Axel recordou-se. - por isso te pegaram.
- Foi. - Thomas confirmou.
- Pois bem, Newt. Talvez voltem aqui também. E mesmo que eu queira reencontrar aquele desgraçado e amassar a cara dele, ainda estarão em maior número.
O ruivo abaixa a cabeça concordando, coça a testa e olha em volta.
- E agora?
- Voltamos.
- Fim? Não vamos atrás do pai dele? - Erich indagou.
- Não há pistas, Erich. Mal sabemos por onde começar. - Neiva se curvou para cochichar. - Talvez ele seja um desses corpos.
- Ela tá certa. - Thomas concorda, tira o lenço da região. - Não tem mais o que fazer. Eu não sei o que fazer.
- Você vai ficar com a gente, agora.
Thomas retribui com um sorriso lateral.
- Obrigado.
- Obrigado à você. - Axel surpreende o pessoal com sua fala. - Por tentar e ser diferente dos imbecis que topamos.
Erich se levanta com um suspiro pesado e olha na direção do amigo inconformado.
- E como a gente convence ele? - Newt perguntou, fitando o jovem.
- Posso fazer isso. - Neiva diz, confiante.
- Ou talvez eu consiga. - Erich passa por eles. - Se aprontem.
Léo desvia sua atenção para Erich quando ouve o assobio, crava a lâmina no zumbi tostado.
- Não é ele.
- Como sabe? - parou dois metros de Léo.
- Só sei. - levantou e foi para o próximo corpo.
Erich o segue, coçando a cabeça.
- Fala logo. - revista o corpo.
- Como?
- O que vai dizer pra tentar me convencer?
- Não vou.
Léo para o que está fazendo e dá atenção ao besteiro, sem se virar.
- Aquilo que cê disse na fazenda, tinha razão. Você não se encaixa. Mas aí que tá a pura e desgraçada verdade, porque ninguém compreende ninguém aqui. É isso que nos une, cara.
- Onde quer chegar?
- As coisas nunca saem como planejado. Falo isso por experiência própria, meu irmão morreu seguindo um plano. Entendo que vai continuar mesmo com ele estando morto, porque precisa compensar o tempo que ficou sem procurá-lo. Eu não vou te segurar. - recua. - Mas saiba que, infelizmente, vai tá sozinho nessa.
Léo vira-se para Erich.
- Sinto muito pelo seu pai.
Erich se afasta, voltando para o grupo que o esperava a frente da biblioteca. Ele nega com a cabeça e o todos entendem.
- Bem... - Axel fica sem o que dizer.
- Vamos. - Neiva dá uma última olhada em Léo. - É escolha dele. Thomas? - o vê ajoelhado ao lado de um corpo.
Thomas finaliza a faminta de cabelos negros com sua faca, limpa-a na calça.
- Ela se chamava Mindy. Era guarda do portão.
- Podemos enterrá-la. - Newt diz.
- Valeu. Ele vem? - ergue o olhar.
- Não. - se curva e pega os braços da morta.
Thomas pega as pernas.
- Sinto muito. - levanta o corpo.
(...)
A cova é finalizada com uma cruz de madeira com nome e data da falecida. Thomas se afasta para visualizar o feito e limpa o suor na testa.
- Se pudesse, enterria todos.
Newt dá um tapinha em seu ombro e retira-se. Thomas vai em seguida com a trupe que o espera na estrada fora da comunidade, ele dá uma última olhada por cima do ombro.
Antes que a caminhada até a caminhonete inicie, Léo chama por eles. Erich para e volta com um sorriso crescendo. Léo se aproxima e fica dois metros distante do grupo.
- Quando eu e o Brian afastamos os mortos, fiz algo pra acreditar que fiz. Você sabe. - Léo lembrou.
- Uhum. - Erich concorda.
- Posso continuar fazendo.
- E vai. - Neiva diz atrás, com um sorriso.
Léo sorri e junta-se a eles novamente. A caminhada começa.
- Sabia que viria. - Erich diz, sorrindo. - Disse aquilo pra dar um apoio mental.
- Moral?
- É, isso.
- Acredito.
Caminhando ao lado deles, Léo faz o mesmo que Thomas, uma última olhada. O jovem respira fundo, tomando agora foco para a frente.
***
- Peguei tudo. - Carly sai de trás do balcão.
Marian está estática na vitrine, observando um faminto preso no poste que caira sobre o mesmo. Com o braço esticado e grunhidos ferozes, o zumbi lutava para alcançar a presa atrás do vidro.
- Não é um dos melhores quadros, admito. - Carly fala, alterna o olhar para o vidro e a mulher. - Tudo bem? - deixa a mochila no chão, encosta a mão no vidro.
- Sim.... Não. O luto é uma droga.
- Com certeza.
- Como conseguiu? Perdeu seu namorado.
- Perdi. Cada um tem seu jeito de lidar com as coisas. Eu não tive tempo, só isso. Talvez tenha sido melhor pra mim. - levou uma mecha de cabelo para trás da orelha. - O que quer fazer?
- Socar, matar e... Só descontar toda essa raiva.
- Você pode. - agarrou a cortina e deu um puxão que a arrebentou. Com a cadeira, ela subiu e retirou a barra de ferro que a sustentava e entregou à Marian, que aceitou com o cenho franzido. - Vamos fazer isso. - pegou um pé de cabra da mochila.
Ela sai da parada de caminhões, Marian a segue. A mulher de cabelo curto para ao lado de um sedan azulado com o capô sem as peças, delibera um golpe na janela, partindo-a, sorri e olha para Marian.
- Vai lá, tenta. - quebra o retrovisor com outro golpe.
Marian atinge o farol e deixa escapar uma risada que soa como ronco. Ambas riem. A mulher acerta o para-brisa.
Carly vai para o outro lado e juntas atingem o vidro, empurrando-o para dentro. A mais empolgada sobe no veículo, rendendo risadas a Carly. Marian golpeia os vidros da lataria e pula no teto da mesma. Enquanto isso, Carly quebra os faróis de trás.
- Essa é a segunda melhor coisa deste fim de mundo. - Carly diz, rindo.
- E qual seria a primeira? - amassa o teto com o impacto do pulo.
- Simples. - fura os pneus dianteiros, fazendo o veículo afundar e Marian por cima, cair. Carly ri nervosa. - Cê tá bem?
- Muito. - gargalha.
- Como dizia. - se curva, levantando-a. - Essa é a segunda melhor coisa do que esmagar cabeças. Eles são como baratas, a diferença é que querem te comer. - ri.
- Nunca pensei por esse lado. - respira fundo. - Há uma terceira. E é pessoal. - Marian comenta.
- Qual?
Marian agarrou a nuca da moça e juntou seus lábios com o dela.
Carly arregalou os olhos. Com a canhota desocupada, separou-se dela com um empurrão leve. Carly a encarou, ainda surpresa.
- Desculpa. - Marian recuou. - Foi tão ruim?
- Não, é que... Nossa.
- Jesus. - as moças olham na direção da voz: Rulek. Harry estava acompanhado dele. - Pelo jeito, perdemos uma festinha.
- Você nem imagina. - Carly olha tímida para Marian após dizer. - Prontos?
- Esperando vocês.
- Recebemos uma mensagem. - Harry sacudiu o walkie-talkie. - Estão de saída. Talvez encontremos com eles.
- Certo. - Marian, enfim, se pronunciou. - Vamos. - dá um toque repentino no ombro de Carly e caminha até os meninos.
***
Já era noite e a estática no rádio diferenciava-se dos grilos no matagal, que cerca a estrada escura.
- Neiva, na escuta? Estamos no ponto. Cadê você? - Nelson soltou o botão.
- Se demorarem mais, vamos atrás. - Duane diz, encostado no capô do Jeep.
- Já devíamos ter ido. - Vanessa olha para à frente da estrada, de braços cruzados.
Han percebeu o barulho atrás do grupo focado à frente, ele puxou a faca e antes que fizesse algo, Jack foi revelado se afastando com uma mochila nas costas. Han aperta o passo.
- Onde tá indo?
- Brian.
- Sabe que é suicídio? - caminha ao seu lado.
- Posso tentar.
- Ei. - o parou. - Léo teve uma chance e talvez tenha conseguido. Pode ter também se deixarmos te ajudar.
- Eles nem respondem, Han. E eu já dei essa chance há tempo demais.
- Para com isso.
- Não tô te incomodando, nem nada. Só me deixa ir. Deixaram que o Brian fosse.
Han umedeceu os lábios, negando.
- Vai ter que me bater pra sair daqui.
- Qual é. - tentou ir, mas Han persistiu.
- Eu sei que é demais. Você perdeu seus amigos, uma casa e uma mulher que gostava. Não posso dizer a dor que cê tá sentindo, mas tenho uma fração dela e em cada um aqui também, de um modo diferente.
- Ela tava grávida. - Jack lembra. - Ele não sabia. Eles se foram e se o mesmo aconteceu com o Brian, eu quero ter certeza. Eu quero. Não pode tirar isso de mim, Han.
- Não posso, tem razão. Mas posso te garantir, infelizmente. Olha, tudo que rolou com a gente, juntos, acredito que tenha sido pior pra alguém que tá sozinho e machucado lá fora. Sinto muito, Jack. Eu não quero que acabe como ele, mesmo que não saibamos. Não quero você morto perambulando até que alguém enfie uma faca na sua cabeça. - olhou para Vanessa distante. - Ela me mostrou que o melhor é o agora. Do que adianta saber, se você vai continuar aqui?
Jack baixou a cabeça, fungou, conteve seus lágrimas fechando os olhos e concordou.
- Tá certo. - disse, baixo.
- Ótimo. Tira esta mochila. Tava levando metade das nossas coisas?
- Quase isso. - sorri, esfregando os olhos.
O farol da caminhonete predomina a estrada junto com o som do motor alto, que logo cessou. Axel sai da lataria ajeitando o cinto folgado.
- Temos muito o que conversar, minha gente!
— 3.09 —
"Aprecie o Fim de Tudo"
Voltamos com um capítulo ameno.
O grupo chegou a Stopiwch, mas acabaram por ter um presente amargo no fim das contas. Sem pistas, sem nada, Léo agora só pode viver acreditando que seu pai esteja bem. A vida é injusta mesmo, meus amigos. Agora, Thomas seguirá com o bonde até onde der.
Marian liberou a raiva do jeito que todos aqui já queriam ou fizeram na vida. (ainda tenho que pagar o vaso da minha mãe, por sinal) E no fim, ela acabou saindo do armário. Digo, empolgando-se com a tremenda excitação do momento. Acontece.
Enfim Vanessa e Han deixaram de cu doce e se assumiram. Já tava na hora, pôra. E pensar que a Vanessa que tomou iniciativa por meio de um comentário do Nelson. Comentário esse que, meu amigo... Vanessa já tem segundas intenções.
Mas e agora, clã? Para onde vai o grupo nesse mundão a fora? Com tantas viagens, caminhos podem ser cruzados. Enfim, aguardem.
Obrigado pelo seu voto. Comente o que achou. Nos vemos em breve.
Abraços,
Dalaxiz.
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