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Chamas

O som do veículo passou veloz na escuridão da floresta, chamando atenção do morto que se alimentava de uma lontra, perto do rio. Cambaleou até onde ouvira o barulho das folhas secas sendo sopradas pelo vento. A frente o veículo, coberto pela escuridão apenas com seu farol vermelho como destaque, se distanciava. Correu atrás do carro, seguindo o farol brilhoso, mesmo na escuridão pôde indentificar a comida lá dentro.

A perseguição chamou atenção de outro, sentado no tronco da árvore como se estivesse dormindo. Depois outro, e mais outro, até que se tornasse um grupo composto por três dúzias de mortos que seguiam em frente, mesmo depois que o veículo sumiu de suas vistas. Amanheceu, o grupo aumentou, agora andando tranquilamente ainda seguindo linha reta. Anoiteceu, os grunhidos se misturaram, parecia um inchame de abelhas.

Os primeiros da fila pararam e ergueram a cabeça ao ouvirem um som no céu. Um helicóptero passou a toda velocidade, cortando as nuvens cinzentas e azuladas, se destacando das estrelas que cintilavam no céu escuro. A manada se deslocou para a mesma direção que o aéreo. A quantidade era tanta que algumas fileiras ficavam fora da estrada, entrando no matagal. Não ligando para os obstáculos a frente um após o outro. Esbarram em uma placa indicando:

Comunidade Compartilhada do Estado, n°69

Uma fumaça avermelhada brilhou no céu, a manada mudara sua direção novamente. Em seguida uma luz alaranjada e estrondosa agitou a manada, que agora seguia para seu destino desejado.

O areão deu meio volta e seguiu o caminho já feito para chegar ali, o que chamou atenção de uma parte pequena da manada.

(...)

- Puta que pariu! - Axel tossiu sob o fumaceiro. Caira em cima de Han - Ei - sacudiu ele - Han! - o coreano despertou, tossindo - Puta merda. Cê tá bem?

- Acho que sim - tossiu - Você caiu em cima de mim - pressionou as costas que já não estavam muito bem.

- Minha filha... - levantou e em seguida ajudou Han. As casas por perto da que fora atingida estavam em chamas. Pessoas corriam com fogo em seu corpo, tentado apagar de alguma forma - Não! - foi mancando até sua casa.

Pressionando as costas, Han tentou seguir Axel. A fumaça se espalhou pela rua chegando até ele, dificultando a visão. Era agoniante estar no meio de toda aquela fumaça e ouvir os gritos sem direções. Ele perdeu Axel de vista, apenas ouvia sua voz distante chamando pela mulher e filha.

- Axel! - tropeçou e caiu em algo molhado e pegajoso - Deus! - se arrastou para longe ao ver tripas e sangue sobre o pavimento. Havia tropeçando no tronco de uma pessoa e caído no que sobrara de seu quadril para baixo. Seu estômago embrulhou e não segurou a ânsia, expelindo o jantar no gramado.

- Me ajudem! - um homem rolava no chão tentando apagar o fogo em seu corpo.

Han pigarreou. Tossiu em seco e passou o pulso na boca, se levantando. Apertou o passo até o incendiado.

- Se acalma - tirou a blusa e bateu no corpo que ainda rolava.

A chuva começou em meio a tantos trovões e relâmpagos. O homem rolou no asfalto molhado na esperança do fogo apagar, Han continuava a bater sua blusa contra ele.

- HAN! - Sally saiu da fumaça com a mão na boca. Atrás dela vinha outros moradores com baldes de água e apenas um com extintor. O morador usou o extintor no homem ao chão. A espuma fez ele sumir por um instante, o mesmo parou de se sacudir - Tá ferido? - perguntou para Han.

- Não. - a espuma a baixou revelando o corpo do homem todo queimado, sua perna estava em carne viva - Meu Deus - desviou o olhar. As pessoas o pegaram.

- Tem mais gente por aí - Sally olhou ao redor ainda ouvindo os gritos.

- A chuva vai nos ajudar - falou o morador com extintor.

- Se dividam. Vê se encontram mais pessoas precisando de ajuda. Don - apontou para o homem com extintor. Alto, musculoso, cabelos castanhos e barbudo. -, vem com a gente. Han, tá disposto?

- Eu consigo - falou com as mãos no joelho e com a cabeça baixa.

- Ok - bateu em suas costas - Vamos.

***

O relâmpago iluminou por um instante a rua em chamas. Brian estava agachado, espreitando pela janela da varanda.

- Que merda tá acontecendo? - Zack se arrastou até ele.

- Algum filho do diabo que estava naquele helicóptero jogou uma bomba em nossas cabeças.

- O que faremos?

- Ajudar - abriu a porta.

- O quê?

- As pessoas lá fora precisam de ajuda. Vai chamar o Jack - saiu as pressas.

Brian desceu da varanda e correu em direção a fumaça, tampando sua boca em seguida. Ouviu os gritos de todas as direções. Girou em 360° em busca do som mais próximo. Com a mão a frente, ele seguiu a sua esquerda, passando por pedaços queimados de madeira. Pulou evitando pisar em um corpo partido e parou ao ouvir um gemido.

- Socorro! - olhou para trás, vendo o homem com as pernas pela metade.

- Tudo bem - espremeu os olhos e respirou fundo, inalando um pouco da fumaça. Tossiu por consequência. Foi até ele - Estou aqui, relaxa - pegou seus braços.

- Não me deixe morrer.

- Eu não vou - o arrastou - A enfermaria não deve estar longe.

- Espera. Espera. Espera. - suplicou.

O homem gritou entredentes, vendo a trilha de líquido viscoso no pavimento molhado.

- Ok - Brian ajoelhou e tirou o cinto, sua calça ficou folgada. Fez um torniquete em sua coxa. A outra ainda estava sem algo para estancar.

- Brian! - Zack gritou.

- Aqui! Eu tô aqui! - sacudiu os braços. Zack e Jack saíram do meio da fumaça. Ambos carregavam bandagens e remédios que acharam úteis - Me dê isto - pegou a bandagem das mãos de Zack.

- Que merda - viu o estado do homem.

- Jack, vá até a casa e pegue algo pra levá-lo - Jack foi correndo até casa, sumindo no meio da fumaça que já se desmanchavam no ar frio da chuva - Me ajuda aqui, Zack.

Eles o pegaram pelo braço e colocaram cada um em seus ombros. O peso do tronco ainda era significativo, mas nem tanto. Seguiram caminho até a casa.

Pararam no meio da rua ao verem a silhueta de Jack se aproximar com algo que parecia uma tábua.

- Aqui - colocou uma tábua de passar roupa no chão - Foi o que encontrei.

- Tá bom - colocaram o homem sobre. - Vamos - Brian segurava a traseira e Zack a frente.

Correram, equilibrando-o pela tábua em meio a chuva. Seus pisões fortes faziam jorrar água das poças. A escuridão da noite, mais a fumaça, dificultava muito a visão deles que corriam, praticamente, às cegas. Tomando a linha de frente, Jack estendera o braço para evitar que trombasem em algo ou alguém.

Desviaram de destroços e pedaços de madeiras, agora molhadas. Perceberam movimentação a frente, Léo estava ajudando uma senhora e levando o gato na outra mão. A casa atrás deles estava em chamas.

- Léo, pode nos ajudar a chegar a enfermaria? - Jack se aproximou.

- Me acompanhem.

O seguiram até lá. No caminho o homem gemia de dor, pressionando sua coxa. Léo virou para a esquerda, eles deram de cara com uma rua cheia de gente a frente da enfermaria que tinha a parte de trás queimada. Newt e Don usavam os extintores para evitar que o fogo se espalhasse pelo resto do lugar.

- Sai da frente, cambada! - gritou Brian carregando a tábua.

- Licença - pediu Léo afastando os que estavam a frente.

Todos entraram na enfermaria. Brian e Zack colocaram o homem na cama. Yuki examinava uma mulher com a testa cortada e o pé queimado

- Pega - Léo entregou o gato para Sally, na porta.

- Não vou dar conta disso tudo - Yuki olhou ao redor.

- Tem que ter mais algum experiente aqui - disse Brian - Não pode ser só você.

- O único que tinha além de mim foi mordida logo no início. Foi o único que morreu e pretendo que isso permaneça assim. Só preciso de assistência.

- Tô aqui pra isso - falou Sally.

- Muito mais que isso.

- A gente dá um jeito - Jack saiu.

Todos reunidos em um único local, alguns sentados na varanda da enfermaria, outros na calçada. Alguns tremiam, em choque, outros gemiam e pediam por ajuda.

Ao fundo, viu Neiva e Lydia se aproximando. Neiva mancava, sua filha a auxiliava.

- Estão bem? - correu até elas.

- Minha mãe torceu o tornozelo. Droga - percebeu o local cheio.

- Já tive piores, filha - sentou no meio fio - Viu o seu pai? - olhou ao redor.

- Não - fez o mesmo.

(...)

- Brian! - Newt o chamou do outro lado - Venha. - ele o seguiu. Pararam em frente a casa que fora atingida pela bomba - Ajuda!

Axel tentava levantar uma parte do telhado que caíra na perna esquerda de Price. Ele gritava se tentado puxá-lo para tirar a perna de baixo da madeira.

- Foi o melhor que conseguiu, magrelo - fez força na madeira quente.

- Você me pediu ajuda - Newt se agachou para pegar uma parte

- Beleza. No três. - disse Axel.

Brian ficou em posição. Axel estava entre eles.

- Um. Dois. Três! - ergueram a madeira com toda força.

Os dentes trincaram e os braços tremeram.

Price ficou aliviado ao sentir todo aquele peso saindo de cima da sua perna. Ele se arrastou, se afastando. Os três soltaram a madeira.

- Merda - Brian soprou suas mãos.

- Cê tá legal? - Axel chegou em Price.

- Olha pra mim, porra! Acha que eu tô legal?

- Tá resmungando - sorriu. Pegou seu braço o colocou por cima do ombro - Ajudem, um de vocês.

Newt abriu caminho para Axel e Brian passarem com Price. Ao entrarem viram Yuki de um lado pro outro, atendendo todos quando necessário.

Sally fazia de tudo para ajudá-la, sendo seu conhecimento mínimo em medicina, a mesma não era tão relevante. Apenas seguia as ordens que outrora perguntava como se fazer.

Yuki não deixou de respirar fundo ao vê-los entrando com Price.

- Sei que vai precisar da maior ajuda possível, Yuki - Newt se aproximou - Conta comigo - ela assentiu.

- Pegue os equipamentos nos fundos. Alguns de vocês terão de trazer mais camas, não tem o suficiente aqui.

Todos agiram.

***

- Anda com isso, maninho - pragueja Daniel.

Eles correm para o portão. A balestra no ombro de Daniel balançava conforme corria.

No caminho a fumaça cegava qualquer um que ali passasse. Erich parou, mas Daniel seguiu correndo. Ele percebeu o irmão distante.

- O que foi?

- Tá ouvindo? - olhou ao redor. Um grito soava, pedindo por ajuda - Temos que ir.

- Nem fudendo - entrou na sua frente - Ao menos conhecemos essas pessoas.

- É uma mulher, cara. Ela precisa de ajuda.

- Se quiser ir, boa sorte.

- Tô indo - Erich foi para a direção de onde parecia vir.

- Desgraçado - resmungou - Tudo bem. Me dê suas armas, vamos escondê-las para que não nos tirem de novo.

Daniel deixou a mochila embaixo da pequena ponte do bosque. Ambos seguiram caminho. Encontraram Sandra deitada sobre o gramado, a sua frente uma casa se desmoronava em chamas. Com um pedaço da calça rasgada, pôde se ver o inchaço em sua perna.

Ela olhou torto ao ver seus salva vidas.

- Feliz em nos ver? - perguntou Daniel. A levantou com cuidado.

- Nem imagi... Ahh! - ficou de pé.

- Consegue acompanhar? - perguntou Erich.

- Dá pra mim. A enfermaria fica a um quarteirão.

- A gente consegue.

Por ali a fumaça já esvaía. A chuva parou, facilitando a ida deles. Uma figura alta saia correndo do meio das chamas, com um cobertor na cabeça. Sandra tropeçou ao fazer força na perna.

- Aí! - Daniel gritou para a pessoa a frente. O fugitivo se virou para eles, ficou parado ali por um instante e agiu - Ajuda aqui, chefia.

Carter tirou o cobertor.

- Carter... Graças a Deus - ela esboçou um sorriso ao perceber quem era.

- Vamos. Você - apontou para Erich - abre caminho, eu te falo até onde temos que ir.

Os gemidos vinham de todos os lados do cômodo e até lá fora. Sally e outros auxiliavam colocando bandagens e dando remédios, mas Yuki ficava com o serviço sujo.

Ela saiu com uma maleta para examinar as pessoas lá fora mesmo, pois não havia mais espaço na enfermaria.

A luz do sol, desfocada pela fumaça que subia, foi de encontro ao rosto dela. Respirou fundo, fechou os olhos.

- Yuki - Vanessa tocou em seu ombro - A gente tá com você. Só diz o que temos que fazer.


***

Hoje teve churrasco na Central. Os zumbis estão vindo para melhorar a situação. Harry cagou no pau.

O que acharam? Espero que estejam gostando.

Até o próximo capítulo.

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