|29|♛|Vingança Incendiária|
Bem-vindos ao 2ª capítulo da att dupla! (Espero que não tenham pulado o 28.5 no final da página anterior 👀👄👀)
Não se esqueçam de ⭐VOTAR⭐ e de comentar suas reações, aaaaaa que nervoso
Boa Leitura e Feliz Natal!
♛|Vingança Incendiária|♛
Kim Seokjin ainda estava confuso quando precisou explicar toda a situação à enfermeira Jang Wei. Depois que se afastaram da vila carbonizada, ele disse a ela como havia chegado àquele lugar, como tinha sido sequestrado pela caravana e trazido até ali, e contou sobre a magia, sobre as transformações das pessoas em lobos, sobre os cheiros e sobre a xamã que faleceu durante o incêndio.
Ele perguntou à idosa sobre o que ela sabia, mas Jang Wei tinha tão poucos conhecimentos quanto o rapaz, ou até menos que ele.
ㅡ Foi como eu lhe disse antes, senhor Kim. Eu estava atendendo pacientes na UTI. Nada me aconteceu, nada de anormal ocorreu naquele momento... Apenas pisquei e me vi aqui ㅡ explicou ela, nervosa. Os olhos de Jang Wei piscavam rapidamente, encarando todos os lados como se estivesse assustada com alguma coisa. ㅡ Ma-mas agora eu me sinto estranha. Há algo de errado no meu corpo, tenho certeza.
ㅡ O que está sentido?
ㅡ E-eu sinto... o cheiro da areia. Areia tem cheiro? E o seu cheiro também parece forte, mas não é ruim, é apenas forte no meu nariz. E também o cheiro do fogo, da carne queimada, mesmo que tenhamos nos afastado bastante daquela vila.
Nessa hora, Seokjin se lembrou das palavras da anciã anterior sobre sentir odores. Jang Wei provavelmente estava sofrendo o mesmo que ele, tornando-se parte daquele mundo ao se transformar em alguma criatura estranha.
Se os cálculos do rapaz estivessem corretos, a enfermeira estava ali para tomar o lugar da idosa que havia morrido. Sendo assim, não só as roupas e símbolos espalhados pelo corpo seriam idênticos em ambas, como também os cheiros e as capacidades delas.
Jang Wei cheirava igual a sua antecessora, como previsto, mas poderia ter as habilidades dela? Seokjin quis testar.
ㅡ Senhora Jang, pode tentar interpretar as estrelas?
ㅡ Ah, rapaz, eu não sei dessas coisas. Nunca estudei astronomia, estudei apenas os caminhos do corpo humano.
ㅡ Mas poderia tentar? Eu tenho uma ideia...
ㅡ Está bem, mas não crie expectativas. ㅡ Ela olhou para o céu, que já estava escuro por causa da noite, e tentou captar alguma coisa. A decepção logo tomou seu semblante. ㅡ Viu? Não sei de nada. Não posso ser como a xamã que você conheceu, senhor Kim.
Seokjin suspirou, sem saber exatamente como se sentir diante daquilo. Decepção? Entendimento? Era tudo tão confuso...
Até que a enfermeira começou a murmurar alguma coisa ao seu lado:
ㅡ Devemos seguir a constelação dos lobos gêmeos. Ela indica o caminho para casa. ㅡ Jang Wei apontava para alguns pontos no céu negro. Suas pupilas estavam dilatadas e sua voz parecia diferente.
Seokjin arregalou os olhos.
ㅡ Como fez isso?
Jang piscou, voltando ao normal.
ㅡ Fiquei com pena de você porque parecia tão crente que eu iria conseguir, então coloquei na minha cabeça que talvez fosse possível encontrar alguma estrela conhecida e aí olhei para cima outra vez. De repente, foi como se minha cabeça soubesse de tudo sobre o céu.
Nessa hora, o rapaz viu que sua teoria estava correta e que seu raciocínio poderia levá-lo a algum lugar. Pela primeira vez desde que tinha chegado naquele mundo, Seokjin não se sentiu perdido.
ㅡ Vamos seguir sua orientação e descobrir aonde a constelação dos lobos gêmeos vai nos levar ㅡ disse ele, e começaram a andar pelo deserto.
Caminharam até suas pernas se cansarem e o sono chegar. A noite já estava acabando quando tochas acesas apareceram em seu campo de visão, e, em seguida, pessoas acompanhadas por lobos imensos. Traumatizado por ter sido sequestrado pela caravana, Seokjin bateu as caudas e fechou os punhos, mentalizando as chamas laranjas que havia invocado anteriormente. Esperava que elas funcionassem outra vez caso aqueles novos desconhecidos tentassem algo de ruim.
No entanto, uma mulher pequena com uma tocha encarou a enfermeira Jang e correu até ela, sorrindo e gritando.
ㅡ Velha xamã Li! Velha xamã Li! Pelos deuses, a senhora está bem!? ㅡ A mulher usava vestimentas tribais e pintura corporal parecidas com as de Jang Wei. Ela correu para abraçar a idosa e, mesmo depois de ver o rosto dela, continuou a agir como se a conhecesse. ㅡ Velha xamã Li, onde esteve!? A alcatéia de nossa tribo viajou todo o Deserto de Sal atrás da senhora. Quase invadimos o território do clã Wang antes do tempo para encontrá-la...
Depois que os outros do grupo de busca se aproximaram e agiram igual àquela mulher, Jang Wei e Seokjin trocaram olhares. O rapaz ficou abismado ao perceber que, de fato, a substituição da xamã havia acontecido, pois aqueles que a conheciam não notaram nenhuma diferença. Nenhuma. Até pareciam estar encenando uma peça onde o ator que viveria um personagem precisou ser substituído...
ㅡ Velha xamã Li, quem é esse? Que tipo de criatura é essa? Foi ela quem a levou para longe? ㅡ Questionou um homem da tribo ao encarar Seokjin e suas caudas. Os demais franziram o cenho para ele.
ㅡ Ah, não! E-ele... ㅡ Jang Wei decidiu que era melhor entrar no papel que lhe fora incubido. ㅡ Esse rapaz me ajudou escapar de sequestradores, certo?
A idosa buscou ajuda ao encará-lo.
Arqueando uma sobrancelha e achando tudo aquilo peculiar e engraçado, Seokjin exibiu um sorriso de canto e os cumprimentou:
ㅡ Boa noite, senhores. Fiz exatamente o que a xamã diz. Até o momento nós estávamos seguindo a constelação dos lobos gêmeos para chegar em "casa".
ㅡ Ah! ㅡ exclamou a mulher de antes. Ela sorria, aliviada. ㅡ É realmente o caminho para a nossa tribo. Somos muito gratos por ajudá-la, senhor raposa.
ㅡ Senhor raposa? ㅡ Seokjin riu baixinho.
ㅡ Agora que a encontramos, voltaremos para casa. O senhor nos acompanhará? Nosso chefe com certeza fará uma festa para agradecê-lo.
ㅡ Claro. Seria adorável. ㅡ Seokjin sorriu para a enfermeira.
Os dois se sentiam como cúmplices de uma grande e estranha mentira.
🌕🌖♛🌘🌑
Eles realmente foram recebidos na tribo com uma festa, e nenhuma alma questionou alguma mudança na xamã, todos a trataram como se ela sempre tivesse aquele rosto e aquela voz. Sendo assim, enquanto Jang Wei era levada para ser cuidada pelos ômegas daquele povo ㅡ como lhe foi informado quando a arrastaram para uma bela e rústica cabana decorada com flores do deserto ㅡ, Seokjin foi convidado a se lavar e a trocar de roupa numa das outras cabanas, e a se sentar na roda de pessoas em volta de uma fogueira e de um pequeno palco.
A cada dois minutos alguém lhe oferecia comida e bebida, e colares de flores com gemas coloridas. Em pouco tempo, suas vestimentas tribais ficaram repletas de acessórios e seu estômago se encheu, satisfeito. Música era entoada por tambores e cantores, e sobre o palco algumas pessoas dançavam coreografias peculiares para entreter todo mundo. Seokjin se permitiu apreciar aquilo, batendo palma com os demais ao ritmo da melodia.
Com o passar do tempo, os olhos dele se voltaram para alguns casais sentados ali perto. Dois homens se beijavam, duas mulheres se tocavam, um trisal dançava romanticamente... Ninguém estranhava esse tipo de coisa e ninguém se importava com as crianças que brincavam pelas proximidades. Não parecia imoral ou vulgar. Apenas ele não sabia como se portar diante daquilo.
ㅡ Está desejando alguém, Homem Raposa? ㅡ A pergunta foi feita pelo chefe da tribo, um homem alto e musculoso que provavelmente era mais velho do que sua beleza acobreada aparentava. Ele usava pulseiras, colares e anéis de metal reluzente, e roupas de couro amarronzadas com símbolos de seu povo bordados nos cantos. Tinha recebido Seokjin quando ele chegou com a idosa na tribo e parecia ser um homem racional.
ㅡ Estou apenas observando. ㅡ O rapaz desviou o olhar para o fogo. ㅡ Vocês parecem ser bem livres quanto a relacionamentos homossexuais.
ㅡ O que isso significa?
ㅡ Hm, relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo ou gênero.
ㅡ E por que isso seria um problema? ㅡ O chefe o analisou com curiosidade.
ㅡ De onde eu venho, é um problema enorme. Mas eu não sei dizer exatamente o porquê de ser um problema.
ㅡ Interessante. Que lugar estranho a sua terra natal, jamais ouvi falar de tal coisa.
ㅡ Não conhece nenhum lugar que seja assim?
ㅡ As terras deste continente são imensas e os povos, infinitos, mas, exceto se estivermos falando sobre união entre dois ômegas ou entre dois alfas, você provavelmente jamais encontrará alguém debatendo sobre isso ㅡ explicou o chefe, e logo depois ele tomou um gole da bebida que segurava.
ㅡ Alguém que conheço adoraria este lugar. ㅡ Seokjin exalou um suspiro pesado ao se lembrar de Kang Song e do que havia dito para o amigo antes de ele morrer.
O aperto no peito o fez pedir outro copo de álcool para beber.
ㅡ Por acaso você pretende reencontrar esse alguém? ㅡ O outro o encarou de soslaio. Os olhos claros dele refletiam as chamas da fogueira e o rosto de Seokjin. Eram atraentes, não como olhos femininos costumavam ser para ele, mas, ainda assim...
ㅡ Não. Ele... Nós nos separamos há um tempo. ㅡ Seokjin deixou a bebida de lado e se concentrou naquele olhar.
O chefe tocou-lhe a ponta do queixo com um polegar e um indicador, e murmurou em seu ouvido:
ㅡ Então, ...?
Seokjin aproximou o rosto e juntou os lábios com os dele. Com uma mão nas costas do pescoço alheio, ele passou a beijá-lo como sempre fazia quando encontrava alguém interessante numa festa. A diferença era que agora se tratava de beijar outro homem. Ele nunca pensou que fosse ter coragem de ultrapassar essa linha. As lembranças de seu pai o espancando vieram à tona, e, por um instante, o rapaz hesitou durante o beijo. Mas logo depois enterrou essas memórias no fundo de sua mente, pois não havia o que temer. Ele estava morto naquele outro mundo, então nada mais importava.
O chefe o convidou para sua cabana, e Seokjin aceitou o convite. Lá, se despiram os dois e deitaram na cama feita com pele e algodão. Voltaram a se beijar intensamente, tocando seus corpos e pressionando suas virilhas e membros eretos.
ㅡ Qual o seu nome, chefe? ㅡ murmurou, sem tirar a boca do outro. Queria saber dessa informação para gemer o nome certo.
ㅡ Yunxi. E o vosso?
ㅡ Concentre-se apenas em me foder. ㅡ Sem perceber, os olhos dele faiscaram num dourado sedutor. De alguma forma, isso afetou Yunxi, que, num gesto meio zonzo, buscou por óleos entre os vidros que colecionava ao lado da cama. Ele deitou Seokjin e passou a cobri-lo com um líquido que cheirava a lavanda, depois o masturbou com as duas mãos deslizantes, preparando-o para o que viria.
Seokjin arfou quando sentiu a penetração e passou a gemer o nome de Yunxi a cada estocada que recebia. Era um prazer diferente que, ao contrário das vezes em que se deitou com mulheres, o deixou enfraquecido e vulnerável em meio aos lençóis. Ele gostou disso, gostou de experimentar o que era proibido em seu mundo, e pela primeira vez viu alguma vantagem em estar naquela nova realidade. Quase se sentiu feliz...
Aí se lembrou que já tinha sonhado em se deitar daquele jeito com um homem. O homem era Kang Song, seu mais antigo e melhor amigo morto.
Seokjin fechou os olhos pesados e deixou que Yunxi terminasse aquilo por conta própria. Estava cansado, esgotado, arrasado e outros mil adjetivos ruins.
Quando acabaram, o rapaz andou pela cabana para obter uma distração através da decoração do lugar. Yunxi continuava na cama, recuperando-se de sua mais recente e satisfatória performance. Seokjin olhou vasos e pequenos totens de lobos. Observou por longos minutos o totem de um lobo com chifres que chamou sua atenção por algum motivo desconhecido. Em seguida, analisou um mapa pendurado na parede. Era desenhado à mão, mas isso não impedia de detalhar as coisas com primazia, destacando os nomes de cidades, de rotas pelo deserto, dos reinos vizinhos ao Deserto de Sal...
"Espere um segundo...", pensou o rapaz, piscando. Aquele mapa, aqueles nomes... tudo aquilo lhe era muito, mas muito familiar. Um déjà vu lhe atravessou a mente. Estaria maluco?
ㅡ A velha xamã Li foi quem desenhou esse mapa. ㅡ Yunxi se aproximou de Seokjin por trás, acariciando as caudas do rapaz. ㅡ Ele nos será muito útil nos próximos dias.
Seokjin afastou as caudas discretamente.
ㅡ Útil para o quê?
ㅡ Nosso povo irá liderar uma invasão nos Templos de Areia, que fica no território adamantino. Aquela região tem solo rico e água em abundância, mas é controlada pelo clã Wang, então não podemos simplesmente usá-la. Daremos um basta nisso.
ㅡ Hm...
Yunxi beijou as costas dele, voltou a tocar as nove caudas e murmurou:
ㅡ Volte para a cama, Homem Raposa.
Seokjin não queria tirar os olhos do mapa, sua mente estava imersa demais em pensamentos para desejar outra rodada de sexo. Além disso, os toques daquele homem começaram a ficar enjoativos, tornando a coisa toda irritante.
Com a língua afiada e embebida num poder que ele ainda não controlava muito bem, disse:
ㅡ Vá dormir e me deixe em paz pelo resto da noite.
E como se tivesse dado uma ordem à uma máquina, o chefe da tribo o obedeceu rápido e silenciosamente.
🌕🌖♛🌘🌑
Os dias se passaram na tribo.
De longe, enquanto era tratado como um novo membro daquele povo, Seokjin observou as preparações para a tal invasão no tal lugar chamado Templos de Areia. Ela ocorreria em pouco tempo e aparentemente iria mobilizar centenas de lupinos ㅡ eles gostavam muito de usar essa palavra para se referir às pessoas daquele mundo.
Por enquanto, as coisas seguiam calmas, e, nessa calmaria, o rapaz conseguiu experimentar um pouco o uso de seus poderes. ele já conseguia acender uma chama aqui e acolá, e apagá-la sob um comando, e sua voz também era capaz de controlar os atos simples de algumas pessoas. Seokjin queria evoluir pois acreditava que um dia tudo aquilo poderia ser muito útil, assim como foi quando precisou se livrar de seus captores do leilão.
Sua maior incentivadora era a senhora Jang Wei, que seguia agindo como a xamã da tribo sem ninguém desconfiar de nada. Ela era gentil do jeitinho que o rapaz se lembrava. Foi um alento tê-la mesmo que ainda se culpasse pela morte da antiga anciã.
ㅡ Vamos lá. Tente queimar aquela folha ㅡ disse a enfermeira, apontando para uma folha seca que fora arrastada até ali pelo vento.
Seokjin encarou aquilo e se concentrou. Seus olhos brilharam dourados e uma chama se acendeu, mas não na folha, e, sim, numa pedra próxima a ela.
ㅡ Você quase acertou. Isso é incrível!
ㅡ A senhora acha? ㅡ Seokjin desviou o olhar. Ele não costumava receber elogios de pessoas que não eram Kang Song, e nem sabia como reagir a eles.
ㅡ Claro! É magia, não é? Como nos filmes e nos livros... Eu gosto cada vez mais deste mundo, senhor Kim. ㅡ Ela deu uma risada contagiante.
ㅡ Não quer voltar ao nosso mundo? A senhora não morreu lá, talvez... talvez possa voltar.
ㅡ E quem gostaria de voltar para lá? Menino, eu vivia sozinha e cheia de contas para pagar. Em poucos anos eu seria colocada num asilo.
ㅡ Pensei que tivesse netos por causa do jeito que me trata...
Jang Wei o olhou com ternura.
ㅡ Ah, laços de sangue nós sempre temos por aí, mas, às vezes, eles não significam nada.
Seokjin sabia que ela não estava falando apenas de si mesma, mas também dele. Na época em que ia ao hospital onde Jang Wei trabalhava, ele devia ter tido duas ou três discussões pesadas e violentas com o pai na frente dela.
ㅡ Tem razão.
ㅡ Hm, e você por acaso quer criar outros laços neste lugar? ㅡ A enfermeira o cutucou, exibindo um sorriso malicioso e apontando com a cabeça na direção do chefe da tribo. Yunxi passava ali perto naquele momento, e lançava olhares para Seokjin.
O rapaz ignorou o flerte e encarou as próprias mãos.
Como iria dizer para ela que não sentia nada, que não queria nada e que poderia se comparar àquela folha seca sendo arrastada pelas dunas do deserto? A verdade é que, desde antes de despertar naquele mundo, o rapaz parecia quebrado de várias formas. Um vaso rachado que não segurava água.
Relacionamentos amorosos o faziam lembrar de Kang Song, e deitar-se com homens trazia de volta a dor dos socos do pai. No fim, Jang Wei era a única pessoa que provocava alguma coisa boa nele.
ㅡ Eu prefiro ficar sozinho, senhora Jang ㅡ sussurrou. Em seguida, voltou a encarar a folha seca e transferiu para ela um pouco do desconforto dentro de seu corpo. A folha explodiu num laranja incandescente.
No fim da manhã, a calmaria naquele lugar foi quebrada.
Seokjin e Jang Wei se dirigiam à uma cabana para almoçarem com os demais quando foram surpreendidos com correria e gritaria, e com uma luta intensa entre os lupinos da tribo e lupinos desconhecidos.
O rapaz ajudou a idosa a escapar do centro da batalha e a se esconder de soldados humanos que vestiam armaduras prateadas e que balançavam espadas afiadas. A maneira como se moviam e matavam era friamente calculada, feito tropas de um exército implacável. Apenas alguns membros da tribo ㅡ crianças, enfermos e idosos ㅡ eram poupados do fio de suas lâminas e garras. O resto, aos poucos, foi massacrado.
ㅡ Esconda suas caudas, senhor Kim! ㅡ exclamou Jang Wei, entregando a ele o manto de xamã que vestia. ㅡ Se as virem, eles podem atacá-lo. Finja-se de doente e se apoie em mim.
Seokjin se cobriu rapidamente e tentou diminuir o volume das nove caudas por baixo do manto ao envolvê-las em seu tronco, formando algo como uma camisa de pelos.
A dupla ficou ali, encolhida e quieta atrás de uma cabana, até a gritaria e os sons da batalha cessarem. Não tinha como fugir, pois os arredores da tribo estavam cercados por fileiras de soldados carregando estandartes com brasões enormes.
No final, quando a luta acabou, os sobreviventes foram capturados e amontoados num círculo no meio das cabanas destruídas. Enquanto eram levados até lá, Seokjin e Jang Wei viram corpos dos guerreiros da tribo. Yunxi estava entre os assassinados.
ㅡ Fiquem quietos e não ousem tentar fugir. Se forem ingratos à misericórdia da Grande Rainha, sofrerão os mesmos destinos que seus companheiros ㅡ disse um soldado. Dois grandes brasões decoravam a armadura cinzenta dele.
Seokjin se encolheu debaixo do manto. Se aquele homem reparasse nele, certamente viraria um alvo. O rapaz não queria arriscar ter que usar suas chamas ou a hipnose, ele ainda não podia controlar os poderes muito bem, então poderia machucar inocentes outra vez.
Poderia matar a senhora Jang assim como tinha feito com a anciã anterior.
ㅡ Obrigada, General Lee. Eu assumo a partir daqui. ㅡ De repente uma mulher apareceu no campo de visão dele e sua voz reverberou pelos ouvidos de todos, mesmo que não tivesse gritado.
Ela era fisicamente assustadora. Não por conta de alguma feiura, nada disso. Na verdade, Seokjin nunca tinha visto uma mulher tão bonita na vida, com cabelos castanhos cujas ondas moldavam o vento, olhos afiados que concentravam os verdes das florestas frias, pele da cor de mel que reluzia sob o Sol e uma face cheia de ângulos que mesclavam imponência e sensualidade. O corpo dela tinha curvas, mesmo escondido debaixo da armadura prateada e da malha de aço verde, mas não era delicado como corpos femininos costumavam ser. Ela tinha músculos e era alta. Uma máquina assassina extremamente bela.
Seokjin não precisou pensar muito para concluir que aquela devia ser a Grande Rainha citada pelo soldado de antes.
Curioso... Ele conhecia aquele termo. Ele sentia que tinha lido sobre ela em algum lugar...
ㅡ Vejam que tristeza ㅡ disse a mulher, passando os olhos pela multidão de sobreviventes. ㅡ É uma lástima que tenhamos acabado assim, mas os senhores sabem como chegamos aqui. É o que acontece quando se põe a mão numa colméia... E antes que comecem a pensar na possibilidade de haver algum espião no meio de vosso povo que poderia ter me informado plano de invasão aos Templos de Areia, saibam que foi a própria ingenuidade dos senhores que me fez perceber tudo a tempo de impedi-los. Seus movimentos pelo deserto deixaram as coisas muito óbvias para mim, que também sou filha das areias. ㅡ Os olhos dela faiscaram.
ㅡ Adaman monopoliza a água do deserto! Wang Nara, sua tirana! ㅡ disse um capturado. Ele cuspiu no pé dela.
O general Lee avançou na direção dele para matá-lo, mas a rainha o impediu calmamente.
ㅡ Adaman mantém a ordem nos Templos de Areia para impedir que tribos como a sua se apropriem do maior leito aquífero do Deserto de Sal e monopolizem aquele território. Vocês são livres para beber daquela água, eu jamais os impedi. ㅡ Nara se agachou e deu tapinhas no rosto dele com as luvas de batalha. ㅡ Diariamente milhares de viajantes, nômades, povos e comerciantes passam pelos Templos de Areia para obter alimento e beber água. É uma rota livre, mesmo sendo minha e de meu clã. E continuará sendo, pois esta é a minha política.
Ela se reergueu e pôs as mãos nas costas, e então olhou para além do círculo de sobreviventes.
ㅡ Compreende agora a finalidade de minhas ações, príncipe Jeon Jungkook?
Todos se viraram para ver a pessoa à qual Wang Nara se dirigia. Seokjin também girou a cabeça e fez sua busca visual.
Quando viu o adolescente de cabelos e olhos pretíssimos trajado com roupas escuras decoradas por brasões e fios de prata, e reconheceu a face dele, que agora parecia bem mais jovial e inocente que a versão adulta conhecida por Kim Seokjin, o rapaz sentiu a própria alma sair do corpo ㅡ se é que ele ainda tinha uma.
Aquele garoto era assustadoramente idêntico a Jeon Jungkook, o colega de sala de Kang Song. O olhar, os sinais pelo rosto, a pele branca corada pelo Sol, o jeito como ele contraía a mandíbula... Tudo igual.
Vários pensamentos atravessaram a mente de Seokjin nesse momento, entre eles a ideia de que Jungkook havia sido trazido para aquele mundo assim como a enfermeira Jang Wei. Mas ele estava tão mais jovem que sua versão original, então como...?
A confusão de Seokjin se intensificou quando ele percebeu um detalhe: A Grande Rainha havia chamado o menino de Jeon Jungkook, especificamente.
Jeon Jungkook, não outro nome, não um nome que o marcaria como o substituto de alguém, como a tribo fazia ao chamar Jang Wei de Velha Xamã Li.
Foi nessa hora que a mente do rapaz teve uma epifania. Ele se lembrou do mapa na cabana do chefe Yunxi, dos nomes familiares contido naquilo e das informações que tinha recebido sobre lupinos alfas, betas e ômegas. Seokjin olhou para a Grande Rainha e pensou no nome dela, Wang Nara, e depois refletiu sobre como ela havia se referido a Jeon Jungkook como Príncipe Jeon.
Príncipe Jeon. Rei Jeon. Rei de Adaman.
Adaman, o reino do livro escrito por Kang Song.
Aquele mundo, aquele maldito mundo era a porra de um livro.
"Não, não. Isso é loucura. É completamente absurdo", pensou, e logo depois a consciência dele murmurou: "Mas todo esse mundo já não é absurdo?"
Então Kim Seokjin decidiu que precisava testar a hipótese. Numa fração de segundo ele analisou aquela situação, observando os soldados, a interação entre as pessoas, as características delas... Se sua teoria estivesse correta, uma cena muito importante iria acontecer em seguida.
Sendo assim, como um espectador que reprimia um colapso mental, o rapaz assistiu ao desenrolar dela.
ㅡ Sim, mãe. Eu compreendo ㅡ disse Jeon Jungkook, numa solenidade que resignava sua tristeza pelos mortos.
O príncipe passou ao lado do círculo de sobreviventes para se aproximar da rainha. Quando chegou perto o bastante, Wang Nara tocou o seu ombro e o contemplou com certo orgulho.
ㅡ Mortes desnecessárias devem ser evitadas, mas mortes necessárias devem ser realizadas. Aprenda isso. ㅡ Ela voltou os olhos afiados para a multidão.
As mãos do príncipe tremeram levemente.
ㅡ O que fará com essas pessoas? ㅡ ele perguntou.
ㅡ Ainda estou decidindo.
ㅡ Não passam de inválidos, mãe.
ㅡ Sim, mas. às vezes, demonstrações de plena misericórdia resultam no oposto do objetivo.
ㅡ Que seria?
ㅡ Mostrar às demais tribos e aos povos estrangeiros o que acontece com quem tenta enfrentar nosso reino. ㅡ Ela tirou a mão do ombro dele e a apoiou no coldre que segurava suas duas espadas. O vento passou por ali e arrastou a capa verde presa à armadura dela.
ㅡ Mas... mortes desnecessárias devem ser evitadas. Foi o que a senhora acabou de dizer.
ㅡ Sim, e é por isso que ainda estou decidindo.
Nesse momento, Kim Seokjin se lembrou de uma narração do livro de Kang Song na qual revelava os pensamentos daquela rainha. Wang Nara, com sua mentalidade estratégica e fria, estava levando bastante em consideração o fato de que aquela tribo seria a responsável por liderar a invasão, então poupar uma mínima parte dela não lhe traria bons frutos. Sendo assim, a qualquer momento a mulher iria ordenar aos seus soldados que finalizassem o massacre.
No livro, a única coisa que a impediu de seguir adiante com suas pretensões foi a fala de um personagem específico.
ㅡ Senhora Jang, a senhora tem que ler o futuro do filho dessa mulher ㅡ murmurou Seokjin no tom de voz mais baixo que conseguiu. Ele tremia e seu coração batia forte no peito. A adrenalina viajava pelo seu corpo.
ㅡ Le-ler o futuro? Como? E-euㅡ
ㅡ Repita exatamente o que eu disser. ㅡ Os olhos dele chamuscaram por baixo do capuz, e o seu poder atravessou a mente da enfermeira, estabelecendo seu domínio e controlando as próximas ações dela.
De repente, Jang Wei se levantou, guiada pelo controle do Homem Raposa. Todos os soldados de Wang Nara ficaram em posições defensivas, e a própria rainha e seu filho tiveram suas atenções capturadas.
ㅡ Príncipe Jeon, criança incompleta e esquecida pela graça de teu sangue alfa, os deuses não o abandonaram. ㅡ Os olhos da enfermeira estavam revirados e sua voz sussurrava etérea pela brisa, encenando perfeitamente uma invocação espiritual. ㅡ Em alguns anos, no fim da tua juventude, o Ômega de Prata será o milagre que te trará o lobo.
Depois disso, ela desmaiou e foi acudida pelos demais sobreviventes da tribo. Todos eles entoaram rezas ao redor da idosa, acreditando que aquilo de fato tinha sido uma previsão dela.
Com a boca seca depois de murmurar a fala que tinha lido no livro e transmiti-la para Jang Wei através de seu controle hipnótico não lapidado, Seokjin esperou pelo que viria a seguir. A conclusão daquele momento iria decidir a autenticidade de sua teoria.
ㅡ Quem é essa ômega? ㅡ Nara questionou, apontando para a idosa desmaiada.
ㅡ É nossa xamã. Às vezes, ela se conecta com os espíritos e nos revela a sabedoria deles ㅡ disse um velho homem da tribo. ㅡ A xamã acabou de proferir uma profecia ao vosso filho.
Nara piscou, arqueando uma sobrancelha, e depois encarou Jeon Jungkook. O adolescente observava Jang Wei com um semblante de perplexidade e ingênua esperança. Ele parecia quase radiante.
A rainha então suspirou fundo e cedeu.
ㅡ General Lee, reúna as tropas para retornarmos ao nosso acampamento. Farei vista grossa no dia de hoje.
ㅡ Sim, Majestade.
Ela se virou e foi embora, levando consigo seus soldados e o príncipe cuja face havia provocado um turbilhão na mente de Kim Seokjin.
Depois que a tribo foi deixada em paz, os sobreviventes fizeram um funeral para seus mortos. Eles reuniram os cadáveres numa grande fogueira e entoaram cânticos. Enquanto isso, Seokjin observava as chamas daquele fogo imenso e pensava em tudo o que tinha acontecido desde que despertara naquele estranho mundo. Sua cabeça parecia explodir numa profusão de epifania, raiva e confusão.
É um livro.
É um livro.
É um livro.
É o livro de Kang Song.
Ele olhou para aquelas pessoas que oravam aos mortos, aos mortos que nunca existiram de verdade, e que citavam deuses inventados por um jovem de vinte e poucos anos numa realidade paralela, e começou a rir como um maníaco.
ㅡ Por que está rindo? Não tem respeito pelo nosso luto!? ㅡ questionou uma mulher emagrecida pela doença que tinha. Seus companheiros também olharam feio para ele.
ㅡ Luto? ㅡ A voz de Seokjin tremeu numa outra risada.
ㅡ Senhor Kim, o que há com você? ㅡ perguntou Jang Wei, que a essa altura já tinha despertado de seu desmaio.
Ele segurou o pulso dela e a puxou.
ㅡ Não é real. Essas pessoas... Yunxi, os sequestradores, aquela rainha, aquele maldito príncipe... ㅡ Seokjin arfou. ㅡ Estamos numa historinha, senhora Jang. É um livrinho de romance!
ㅡ Não estou entendendo, meu jovem. Você perdeu a cabeça depois do ataque?
ㅡ Sim! Eu perdi completamente a cabeça. ㅡ Ele a largou e se virou para os demais, gargalhando. ㅡ Sabem? Vocês foram criados por um garoto! Suas mortes foram estabelecidas por UM GAROTO. Os deuses para os quais estão orando FORAM INVENTADOS. Que grande piada!
ㅡ Cale-se, seu herege insano ㅡ cuspiu outro dos sobreviventes. Essa pessoa o agarrou pelo manto e colocou uma faca no pescoço dele. Seus olhos brilhavam com lágrimas. ㅡ Meus parentes o acolheram na nossa tribo e é assim que demonstra seu respeito por eles!?
Seokjin exibiu um largo sorriso.
ㅡ Senhor Kim, pare com isso! Está me assustando! ㅡ gritou a enfermeira.
ㅡ Sabiam que você são figurantes? Que este lugar foi criado para ter alguma importância uma única vez em toda a história de um livro? E que todas essas mortes aconteceram apenas para que a infância do protagonista fosse introduzida? ㅡ Ele passou a língua pelos lábios, encarando de maneira provocativa aquele que mantinha a faca em seu pescoço.
Quando Seokjin sentiu a lâmina afundar em sua pele, ele a empurrou.
ㅡ TUDO AQUI É APENAS UMA GRANDE BRINCADEIRA. UMA ENCENAÇÃO. ㅡ Ele olhou para Jang Wei. ㅡ Senhora Jang, sabia que eu fui estuprado dentro do mundo criado pelo meu melhor amigo? Ele me amaldiçoou... ele me transformou nesta coisa. Eu nem tenho um papel aqui dentro! Não havia um personagem com o meu nome, não havia sequer uma menção.
Seokjin caiu de joelhos no chão e colocou as mãos na cabeça. Sua mente latejava.
ㅡ Eu já estava morto. Por que não me deixou morto, an? ㅡ A mágoa ardeu em suas entranhas. ㅡ DIZ PRA MIM, KANG SONG!
Seu grito fez a ardência eclodir num descontrole destrutivo. A influência de seus poderes alcançaram as chamas que queimavam os corpos e as transformaram numa tempestade incendiária alaranjada quase tão forte quanto aquela que havia destruído a vila do leilão. Os sobreviventes ao ataque de Wang Nara que estavam mais próximos da fogueira não tiveram chance de correr, pois foram carbonizados no primeiro segundo. Os demais tentaram escapar e se refugiar atrás das cabanas, mas aquelas construções de madeira não seriam páreas para a violência do incêndio.
Quando ele parou de soluçar e reabriu os olhos, cinzas e pontos de fogo flutuavam ao seu redor e a destruição imperava. O cheiro da carne assando se transformou num odor rançoso de queimado, denunciando a intensidade das chamas.
Seokjin piscou, atordoado e imerso num estado de loucura pós-trauma, e saiu procurando a única pessoa que acreditava ser real naquele mundo.
ㅡ Enfermeira Jang! E-enfermeira Jang Wei! ㅡ Ele trotou atrás dela, tropeçando nos próprios calcanhares e se apoiando em vigas carbonizadas. ㅡ Senhora Jang Wei...
O rapaz a encontrou atrás de uma cabana que ainda pegava fogo. Quando viu Jang Wei sentada e respirando, sentiu uma pontada de alívio, mas, assim que se aproximou dela, viu que o fogo tinha queimado toda a pele por baixo da roupa de xamã.
ㅡ Senhor Kim, está doendo. ㅡ Ela falava com ele, mas seus olhos não o buscavam, pois estavam queimados.
Seokjin caiu ao lado dela sem falar nada. Suas lágrimas eram silenciosas.
ㅡ Rapaz, eu sei que está aí... ㅡ A voz dela falhou. Seu corpo perdia forças. ㅡ Acho que vou sumir deste mundo a qualquer momento. Então, escute... Existe um lugar em que ponho altares fúnebres para os amigos queridos que fiz durante o meu trabalho no hospital. Amigos que viviam sozinhos e solitários antes de morrer... E-eu sempre os visito com flores. É uma ca-casa, casa 15 da rua Kyonggidae-ro que fica no bairro Seodaemun-gu, em Seoul. Você é de Seoul, e-então não se importaria se eu colocasse um pequeno... um pequeno altar em seu nome para que eu possa orar pela sua alma, querido?
Seokjin abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu dela. Ele se sentia completamente vazio.
A idosa continuou a falar mesmo sem obter respostas.
ㅡ Você não negou, então eu irei colocar, está bem? Espero conseguir voltar... para o nosso mundo...
A sombra da morte a cobriu nesse momento, deixando Seokjin com a quietude funesta e com um turbilhão mental.
Ele ficou parado naquele lugar durante longas horas, esperando o corpo de Jang Wei desaparecer assim como havia acontecido com a sua antecessora. Mas isso não aconteceu. Mesmo depois de ter se passado mais da metade do dia, ela ainda continuava ali, atormentando-o em silêncio.
No final da tarde, Seokjin desistiu de esperar e aceitou que o que aconteceu antes não iria se repetir. Ele ainda não entendia qual a lógica por trás daquilo, e essa confusão apenas intensificou sua raiva, seu ódio e sua angústia.
ㅡ Ei, Kang Song... Você deve ser tipo Deus neste mundo, certo? Já que escreveu tudo aqui, ha... ㅡ O rapaz soltou uma gargalhada miserável. ㅡ Você acha esses acontecimentos interessantes?
As caudas em suas costas se agitaram, serpenteando. Os olhos dele voltaram a brilhar, incandescentes, e encararam o céu.
ㅡ Que tal eu mexer em algumas coisinhas? Olha só, já li essa história antes e ela é chata e feliz ㅡ feliz apenas para alguns, é claro ㅡ, enfim, ela é a sua cara! Vou torná-la mais a minha cara. Já que tecnicamente eu não existo neste mundo, farei com que eu passe a existir.
O sorriso dele se afiou e, pela primeira vez, ganhou caninos pontiagudos de raposa.
ㅡ Mas prometo que manterei a teatralidade da coisa toda.
E foi assim que iniciou sua jornada pelo continente, descobrindo cada vez mais sobre as capacidades de seus poderes e sobre as peculiaridades daquele mundo.
Ele fez planos e aguardou o tempo certo para iniciá-los. Sua única motivação era uma vingança amargurada e a mágoa amarga dentro do peito.
Quando chegou o dia da primeira Lua de Sangue, ele seguiu os rastros de uma de suas mais esperadas vítimas: o Ômega de Prata.
E atacou.
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|29.5|♛|Decisões da Alma|
Kang Song puxou Park Jimin para fora do lago, tirando-o da imersão de lembranças.
Ao pisar na margem, Jimin notou que suas roupas continuavam secas, como se não tivesse mergulhado no olho d'água. Talvez essa fosse mais uma das milhares de peculiaridades daquele mundo mágico.
ㅡ Só descobri o que tinha acontecido com o Jin depois de vir para cá. Tentei me comunicar com ele de todas as formas, mas não consegui. ㅡ Kang Song murmurou ao seu lado. Seu semblante apático agora era completamente compreensível. ㅡ Às vezes eu consigo passar informações através do que as pessoas de Adaman chamam de espíritos. Mas os espíritos nunca foram escutados por ele, e nem ele quis dar atenção àqueles que são capazes de ouví-los. Acho que isso também é culpa minha.
ㅡ Por quê?
ㅡ Porque, assim como o Jin falou, eu não permiti a existência dele neste mundo. Há um tipo de barreira entre nós dois que me impede de acessá-lo, de impedi-lo...
Eles ficaram em silêncio por um tempo, até que Jimin se lembrou de algo e murmurou:
ㅡ Kang Song, então era você quem falava comigo quando eu escutava aquelas vozes miúdas na minha cabeça?
ㅡ Sim. Eu te assustei bastante, não é? ㅡ Song coçou a nuca, constrangido.
ㅡ Sim. Assustou pra caramba. Mas 'tá tudo bem, depois elas foram bem úteis pra mim. ㅡ Jimin deu de ombros. ㅡ Também era você quando aquele espírito de lobo com chifres aparecia? Por exemplo, quando o Jungkook lutou contra o monstro pela primeira vez e foi gravemente ferido, mas depois foi salvo pelo espírito. E quando eu me tornei oficialmente o Ômega de Prata...
ㅡ Ah, aquilo... Não exatamente. ㅡ Song franziu o cenho. ㅡ Na maioria das vezes eu só estava observando tudo pelo reflexo do lago. Acontece que, por mais que eu tenha sido o Ômega de Prata original, as coisas que o envolvem não têm tanta relação comigo. Eu não estava lá quando Jungkook precisou ser salvo pela primeira vez, e nem era eu quando você se transformou por completo. Essas situações têm muito mais a ver com suas ações naquele mundo do que comigo.
ㅡ Como assim? ㅡ Jimin se virou na direção dele.
ㅡ Veja bem, quando você apareceu em Adaman, seu corpo não fazia parte do personagem que deveria ser. Você não era um ômega e nem tinha poderes. Isso só começou a mudar depois de algumas circunstâncias, depois que você agiu ao lado de Jeon Jungkook.
Depois disso, Kang Song apontou para além deles. Esse gesto fez surgir a miragem da árvore que existia debaixo do castelo de Adwan, aquela toda de marfim e folhas rubras na qual tábulas jaziam esculpidas. Rever aquilo e falar sobre os seus primeiros momentos em Adaman, ao lado de Jungkook, quando tudo era apenas confuso e engraçado, fez o peito de Jimin se apertar.
ㅡ Lembra-se da profecia sobre o Ômega de Prata? ㅡ perguntou Kang Song.
ㅡ Sim, mais ou menos. ㅡ Jimin pigarreou para que a voz não falhasse.
ㅡ Então, esse trecho: Ele virá para proteger, fortalecer, guiar e se unir ao alfa soberano. ㅡ Song recitou as palavras escritas nas tábulas. ㅡ Quando veio a este mundo, você era alguém com predisposição a se tornar o Ômega de Prata. Então, cada vez que agia de acordo com o que a profecia indicava, mesmo que inconscientemente, as mudanças em seu corpo vinham à tona. Você protegeu, fortaleceu e guiou Jeon Jungkook várias vezes, e a sincronia entre os dois foi muito melhor do que jamais esperei escrever em algum romance... No final das contas, você quis fazer parte daquele mundo, e também quis ser o que se tornou depois. Aquele espírito de lobo que apareceu e te transformou não fui eu, mas, sim, algo que está um pouco além da minha compreensão, assim como a maioria das coisas que envolvem aquele lugar. Não sou Deus nem lá e nem aqui, neste bonito e deserto purgatório. Mas, nas atuais condições e leis daquela realidade fantástica, você, Jimin, é um deus. Um deus extremamente poderoso.
Park Jimin arfou, sentindo um arrepio na espinha. Porém, logo em seguida, ele chacoalhou a cabeça e comprimiu os lábios carnudos. Seus olhos ficaram pesados.
ㅡ Você se enganou, Song. Não viu o que aconteceu antes de eu vir pra cá? ㅡ O garoto fungou e tremeu, tentando reprimir o nó pungente da garganta. ㅡ Antes, tudo o que eu conseguia fazer era invocar alguns pássaros com uma cantoria sem noção e sair plantando flores e árvores por aí. E, puta que pariu, você me assistiu quando eu dei uma de jardineiro...
ㅡ É, eu vi um pouquinho. ㅡ Song enrubesceu. Os dois enrubesceram.
ㅡ ENFIM. ㅡ Jimin piscou, olhando para cima com o intuito de afastar as memórias constrangedoras e as lágrimas que lutavam para cair. ㅡ Depois eu só regredi, sabe? Os poderes que ganhei enfraqueceram de um jeito que, em determinado momento, invocar uma planta pequena e fraca era tudo o que eu conseguia fazer. E foi por eu estar tão inútil, tão fraco, que aquele cara me mandou pra longe... e morreu sozinho.
Sua luta contra as lágrimas foi perdida. Park Jimin se encolheu, em luto, e soluçou alto.
ㅡ Eu deveria ter sido capaz de ajudar ele. ㅡ Outro soluço, outro aperto no peito. ㅡ Que merda de divindade eu virei?
ㅡ Park Jimin, você o ajudou. ㅡ Song colocou as mãos nos ombros dele e o encarou profundamente.
ㅡ Não, não. ㅡ Jimin continuou chacoalhando a cabeça. ㅡ E-eu senti quando o coração dele parou. Eu senti tanta dor que, quando lembro daquele maluco do Kim Seokjin falando que as coisas daquele mundo são falsas, só penso em quebrar a cara dele mil vezes, mesmo que ele seja só um coitado com sérios problemas mentais e precisando de terapia.
Kang Song suspirou fundo e segurou o rosto do garoto.
ㅡ Park Jimin, você salvou Jeon Jungkook. Você o ajudou e nem percebeu ㅡ disse. Em seus lábios, um sorriso gentil se formou.
ㅡ O-o quê? ㅡ A face do outro garoto estava inchada pelas lágrimas.
ㅡ Jeon Jungkook perdeu o coração naquela luta, mas os seus poderes deram a ele a capacidade de viver outra vez. ㅡ Kang Song soltou Jimin, que agora o encarava com perplexidade, e respirou fundo. ㅡ Sua força está aí, ela nunca desapareceu ou diminuiu, e também nunca foi totalmente revelada. E não só ela como também a força de Jeon Jungkook. A profecia fala sobre proteção, fortalecimento e orientação, mas, acima de tudo, também fala sobre união. E união não se trata apenas de vínculo ou de sentimentos fortes, mas de parceria, companhia e confiança nas capacidades do outro. É agir em conjunto como se fossem um só.
Ainda imerso num estado de profunda perplexidade, Park Jimin encarou as próprias mãos trêmulas e vocalizou um pensamento:
ㅡ Ele sempre esteve me afastando porque acreditava que era o melhor pra minha segurança, e eu sempre acreditei que ele estivesse correto, então apenas deixei... ㅡ O garoto curvou os lábios num pequeno sorriso. ㅡ Jungkook, nós dois fomos muito idiotas, eu principalmente por não mostrar a você que o garoto que assustou um exército com meia tonelada de explosivo e um celular ainda existe firme e forte.
ㅡ Era isso o que eu queria ouvir de você quando o trouxe para cá ㅡ sussurrou Kang Song. Ele parecia muito feliz agora. ㅡ Você e ele só precisam ter mais confiança sobre o que podem fazer. E não me refiro necessariamente às questões da profecia, mas também ao que os dois são. Eu posso ter criado o Rei de Adaman e o Ômega de Prata, mas as almas de Jeon Jungkook e de Park Jimin nunca estiveram em meus domínios.
Jimin piscou, arfando.
ㅡ E-ele realmente está vivo, Kang Song?
Song acenou com a cabeça.
O coração do garoto se acelerou.
ㅡ Posso voltar para lá? Eu quero ㅡ comprimiu os lábios trêmulos ㅡ quero voltar.
ㅡ Claro que pode. Eu só peguei a sua consciência emprestada temporariamente.
Song aproximou a mão dos olhos de Jimin e, de repente, uma luz branca e cegante surgiu ao redor dele. Antes que pudesse tocá-lo, o garoto deu um passo para trás, pois ainda tinha uma pergunta para fazer.
ㅡ Kang Song, se eu voltar para Adaman, vou poder ficar lá para sempre?
ㅡ Infelizmente não sou capaz de lhe dar essa resposta.
ㅡ Mas e sobre voltar para o nosso mundo? Ainda é possível?
ㅡ Sim. Quanto a isso, não se preocupe. Quando chegar a hora de partir, você e seu amigo, Taehyung, irão retornar para onde pertencem. Todos os vivos que vieram para cá retornarão.
ㅡ E eu vou me lembrar de tudo o que vivenciei!? ㅡ A luz estava ficando mais forte, tirando a visão de Jimin.
ㅡ Claro que vai. Desde quando nos esquecemos de histórias que modificam totalmente as nossas vidas? ㅡ A risada de Kang Song ecoou pelo horizonte luminoso e se misturou a sussurros etéreos.
Um pouco antes de sentir a mão dele sobre sua face, Jimin murmurou:
ㅡ Vou consertar o mundo que você criou e trazer de volta o seu amigo. Eu juro.
Se houve uma resposta para sua fala, o rapaz não escutou, pois ao seu redor os sussurros se mesclaram a uma ventania alta que o ensurdeceu. Aquele barulho aumentou e aumentou até que se transformou numa vibração silenciosa nos ouvidos de Jimin.
Um instante depois, o grito familiar de alguém quebrou a estática.
Jimin tentou seguir aquele som, mas tinha a sensação de que alguma coisa o prendia. Então lutou contra aquilo e continuou usando a voz familiar como guia até que ela estivesse bem alta, bem próxima.
ㅡ Jimin! Ah, Jimin!
O garoto sentiu o calor do toque de uma mão que fazia carícias na lateral de sua face e o aroma que sempre conseguia atordoar-lhe os sentidos e provocar o lobo no interior de seu âmago. Ele também percebeu a ternura e o tremor, o tom embargado e profundo, e o hálito quente e fresco...
Mesmo que se passassem mil anos em mil realidades diferentes, Park Jimin ainda identificaria os detalhes daquela pessoa.
Aos poucos, ele ergueu as pálpebras e piscou para acomodar a visão do rosto em sua frente. Primeiro, avistou os dois olhos negros que o encaravam com uma profusão de expectativa, felicidade, incredulidade e emoção; em seguida, reparou na cicatriz que agora fazia parte de um dos lados daquela face perfeita e contraída num sorriso trêmulo. Os cabelos dele tinham crescido e as mechas escuras caíam por sobre a gola felpuda do manto preto.
Uma lágrima daquela pessoa pingou na bochecha de Jimin, despertando-o completamente.
ㅡ Jungkook? ㅡ balbuciou. Um nó já tinha se formado em sua garganta. ㅡ Vo-você realmente não morreu...
ㅡ Não, não. ㅡ Jungkook beijou toda a extensão do rosto de Jimin. ㅡ Estou aqui, estou aqui. Estou vivo por sua causa. Por você. Por eles. ㅡ Ele mostrou o bebê que tinha nos braços e a criança que estava ao lado dele, e depois voltou a se concentrar em Jimin, pois temia que o ômega desaparecesse depois que tirasse os olhos dele por mais de um segundo. ㅡ Estou vivo, e-então continue aqui, continue fazendo o seu coração bater... por favor, meu amor.
Jimin tocou a face dele, que estava molhada pelas lágrimas, depois acariciou as faces das crianças e também começou a chorar.
ㅡ Eu estava literalmente morrendo de saudades de você. ㅡ Lançou um meio sorriso.
Os dois encostaram as testas e inspiraram fundo, absorvendo seus cheiros e acalmando seus corações com esse ato.
ㅡ Prenda-me e declare-me como um louco se um dia eu voltar a afastá-lo de mim, Vossa Magnificência, pois só com a mente insana eu me atreverei a cometer tal atrocidade ㅡ disse Jungkook, segurando o rosto do garoto com uma mão terna. ㅡ Não. Na verdade, nem a versão mais louca de mim poderia cometer esse erro novamente.
Com o coração acelerado no peito, Jimin se acomodou nos braços dele e afundou as mãos em suas mechas negras, trazendo-o para si.
ㅡ Nunca mais separar. É a nossa promessa.
ㅡ Sim. ㅡ Jungkook respirou fundo e começou a recitar os votos que os dois tinham feito em luas passadas jamais esquecidas: ㅡ Você é meu...
ㅡ E eu sou seu... ㅡ Jimin o acompanhou com um sorriso.
ㅡ Somos um só para sempre.
ㅡ Para sempre.
E então eles se entregaram num beijo tão ardente que podiam sentir o interior de seus corpos queimando. E queimavam de amor, de felicidade e de saudade, num turbilhão ascendente que nem um milhão de toques poderiam arrefecer.
Seus respectivos lobos uivavam, reconhecendo-se, e suas almas vinculadas refletiam as sensações de cada corpo, multiplicando-as infinitas vezes até entorpece-los.
Quando enfim pausaram o beijo ㅡ com a promessa de que logo voltariam a apreciar o toque dos lábios ㅡ, eles sorriram e envolveram as duas crianças num grande abraço, o que gerou novas lágrimas e soluços.
Estavam tão imersos nessa bolha de felicidade que não repararam nas mudanças dos ventos, no calor morno que passou a pairar por ali com uma brisa de primavera, nos sons dos pássaros que haviam sumido por conta do inverno prolongado e que agora retornavam ao lar como bem deveriam, e na Lua de Sangue que se erguia no céu acima de Adaman, adornando o palco das estrelas feito um rubi numa coroa de prata.
~♛🌕🌖♛🌘🌑♛~
#LoboDePrata
Não me abandona antes de ⭐VOTAR⭐, por favorzinho
Agora posso respirar e dizer que OS JIKOOK VOLTARAM E AGORA É PRA SEMPRE (ou até onde o sempre deles pode existir). Ai, gente, eu estava e ainda estou muito insegura com estes últimos capítulos porque sei que vocês estão esperando respostas para os seus questionamentos há muito tempo. Estive guardando as explicações desde o início de Era uma Vez um Ômega, sempre me controlando para não abrir o meu bocão cada vez que alguém fazia uma pergunta específica demais ou uma teoria extremamente boa... MINHA NOSSA, QUE NERVOSISMO HAHA!
Mas e aí? Deu pra sacar tudo direitinho? Faltou algo que eu não vi? Os sentimentos de vocês em relação ao Seokjin mudaram? Estão felizes com o reencontro dos Jikook? E vocês sacaram esse finalzinho da Lua de Sangue? Por favor, comentem! Digam-me, estou extremamente curiosa ahahahaha. Não se esqueçam de me marcar ou de usar a tag #LoboDePrata nas redes sociais vizinhas quando forem falar sobre EUVUO, tá bom?
Agora preciso ir... Falei no mural do Wattpad que tentaria trazer o capítulo 30 até o Ano Novo. Saibam que essa meta ainda está de pé, mas não é certeza!
Beijões, Feliz Natal, amo vocês💜
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