39 O Julgamento
Caminhei devagar entre os vasos de plantas da minha mãe, respirando fundo o ar que soprava naquela manhã.
Havia procurado o canto mais sossegado e tranquilo que houvesse por ali, para que eu pudesse refletir um pouco e o jardim da minha mãe foi o mais próximo disso que consegui encontrar, já que havia certo alvoroço dentro da casa.
Sem pensar, arranquei uma pétala de uma flor vermelha, distraída com meus pensamentos.
Eu deveria ir? Será que eu realmente precisava ver aquilo?
Quanto de mim teria a necessidade de estar presente naquele tribunal??
Por outro lado, se eu não fosse, não sentiria a paz de saber que finalmente, depois de tudo, a justiça havia sido feita.
Steve apareceu, se abaixando perto de mim.
-E aí? Já se decidiu??
Eu olhei para ele e segurei sua mão, para que levantássemos juntos.
-Sim.
Ele ergueu as sobrancelhas, em expectativa ao que eu diria.
-Eu vou.- Completei.
Steve assentiu e disse:
-Então vamos. Está na hora.
Estava decidido. Eu iria ao julgamento de Kristen.
~❤~
Dois meses haviam se passado até a data daquele julgamento, onde a sentença final de Kristen seria decretada.
Mesmo sendo de nacionalidade americana, Kristen foi julgada segundo as leis brasileiras. O que poderia não ser muito bom, já que tanto se fala da falha da justiça brasileira.
Mas de qualquer forma, lá estava ela, no banco dos réus, algemada.
Senti um tremor involuntário ao olhar para ela. Seu lindo cabelo loiro preso de qualquer jeito com mechas que lhe caíam pelo rosto branco deixava-a com um aspecto de desencanto, um desleixo causado pela prisão.
Pela primeira vez, vi-a sem o batom vermelho. Seu rosto estava pálido e apagado.
Mas seus olhos... estes estavam vivíssimos. Se suas mãos estavam presas, seus olhos eram livres para destilar o veneno que corria por suas veias.
Se os olhos de Kristen fossem flechas, cada pessoa naquele tribunal seria um alvo.
E eu seria o principal deles.
~❤~
O julgamento teve início.
O juiz era Augusto Gastal, um senhor de meia idade, que me pareceu muito austero e com cara de poucos amigos.
-Isso é bom para nós. O Carlos disse que ele é inflexível em casos de tentativa de homicídio...- Cochichou Steve, ao meu lado.
O promotor de acusação era amigo de Carlos, indicado por ele, para recorrer em nosso favor no processo.
À medida que o julgamento ocorria, percebi aliviada, que o homem era bom no que fazia.
Mesmo o advogado designado pelo Estado para defender Kristen tendo sido enfático ao tentar defendê-la, seus argumentos não pareciam páreos para as contestações do promotor.
Eu via, pela expressão no rosto de cada um dos jurados, que Kristen e seu advogado perdiam minuto após minuto qualquer chance de remissão.
Quando chegou a vez de Kristen ser interrogada, o promotor foi perspicaz em suas perguntas e na acusação. Tiveram a ajuda de um intérprete para ouvi-la e para falarem com ela.
O fogo nos olhos de Kristen sumiu quando ela estava sendo interrogada. Em seu lugar, apenas gelo. Ela tornou-se fria e indiferente, como se não fizesse questão de ser absolvida.
Quando perguntada diretamente porque jogou o carro contra mim, ela simplesmente disse, sem expressão alguma:
-I wanted her to die.
(Eu queria que ela morresse)
Segurei instintivamente a mão de Steve e pensei em minha filha.
Procurei não deixar que aquilo me afetasse, por mais difícil que fosse.
Houve um burburinho de conversas no meio do júri, depois da fala de Kristen ter sido traduzida pelo intérprete e o juiz pediu silêncio.
Ele olhou para cada um seriamente e disse:
-Depois de ouvirmos cada uma das testemunhas e a própria ré, acredito que cada um dos presentes aqui, tanto o advogado de defesa, promotor, populares e os senhores jurados, já devem ter tirado as suas próprias conclusões. Portanto, esta sessão está encerrada. O júri está liberado para deliberar. Voltaremos depois do recesso.
E bateu o martelo.
~❤~
Aproveitamos o recesso para ligar para casa. Meggie havia ficado com a minha mãe.
Ela não quis ir ao julgamento alegando que preferia ficar com a neta do que ter que olhar durante horas "para a cara de uma louca que tentou matar sua filha". Estas foram as palavras dela.
Sendo assim, Carlos foi quem nos acompanhou, além de Henrique.
Nos reunimos na lanchonete da esquina, pois estávamos todos esfomeados depois de todo aquele processo.
-Condenada ela já está. Não tem como se livrar de uma acusação dessas. Nos resta saber apenas qual a pena que o juiz vai decretar- disse Henrique, depois de tomar um gole do seu suco.
-O caso é grave. Mas vão tratá-la como ré primária. Ela nunca foi presa antes- disse Carlos.
-Mas você disse que o juiz Augusto é irredutível quando se trata de homicídio...- Steve falou.
-Sim, Steve- Carlos o interrompeu.- Mas ele também está sujeito às leis. Não pode dar uma pena à Kristen que ela não mereça, mediante a lei. E lembre-se... foi uma 'tentativa' de homicídio.
Steve suspirou pesadamente.
Eu fiquei quieta, tomando o meu suco.
Às vezes, quando eu parava para pensar, ainda achava tudo aquilo muito surreal.
O atropelamento, minha filha ter nascido sem que eu tivesse visto, o coma, o despertar...
E agora, ainda tinha que lidar com o destino de Kristen.
Perecia um pouco demais pra minha cabeça.
~❤~
Quando a sessão foi aberta novamente, eu estava trêmula.
Não conseguia evitar.
Nunca, em meus quase vinte anos de vida imaginei que estaria em um tribunal, vendo a mulher que tentou tirar a minha vida, sendo julgada e condenada.
Eu não sabia nem exatamente o que pensar.
-Todos de pé para receber o juiz Augusto Gastal!- disse o oficial de justiça.
Depois do rápido procedimento e de ter pedido que todos se sentassem, o juiz virou-se para o júri.
-Então, senhores... chegaram a alguma conclusão?
Apertei a mão de Steve. Apertei tanto que os nós dos meus dedos ficaram brancos. Ele, tão nervoso quanto eu, pareceu nem se dar conta.
Senti a mão de Henrique em meu ombro, numa tentativa de me acalmar.
Um dos jurados se levantou. Era um homem simples, porém de postura firme.
-Sim, Meritíssimo- disse ele.
-E qual foi?- Perguntou o juiz.
Olhei de relance para Kristen. Ela fitava o homem indiscretamente, como se finalmente estivesse se importando com o que aconteceria.
O homem olhou para os outros jurados.
-Bom Meritíssimo, depois de deliberarmos, eu e meus estimados colegas do júri chegamos a conclusão de que a ré...
Prendi a respiração.
-... é culpada do crime de tentativa de homicídio e deve ser condenada.
Soltei um suspiro, com o coração acelerado.
Eu já estava suando.
Steve e Henrique se entreolharam com um meio sorriso e houve outro burburinho.
Kristen permaneceu estática.
-Silêncio no tribunal!- Gritou o juiz, começando a escrever algo em sua prancheta furiosamente.
Pouco mais de um minuto depois, ele voltou a falar.
-Bem senhores, dada a deliberação do júri, somada ao fato de que a ré não nega ter cometido o crime, eu declaro que Kristen Clark é culpada pelo crime de tentativa de homicídio e lesão corporal grave contra Amber Fernandes de Moraes, com o agravante de que a vítima estava gestante. Portanto, senhorita Kristen, cumprirá a pena de 16 anos de reclusão, podendo recorrer da liberdade condicional depois de ter cumprido um terço da pena.
Kristen sequer olhou para o juiz.
-Como o advogado de defesa já havia me dito antes, sua família, senhorita Kristen, requereu sua volta a seu país de origem, para que cumpra sua pena lá. Portanto, será deportada para os Estados Unidos, onde vai cumprir a pena decretada.
-Nada mal, nada mal...- disse Carlos nos olhando, sorridente.
-A sessão está encerrada- disse o juiz, batendo o martelo.
-Vamos.- Steve me segurou pela mão.
Eu me levantei, mas meus olhos foram parar em Kristen, que estava algemada, sendo levada pelo guarda.
Andei rapidamente até ela, mas não consegui continuar.
No entanto, ela passou perto de mim.
-Vamos.- O guarda disse, percebendo que ela havia parado de andar.
-Amber, vamos!
Eu não escutei Steve.
Apenas olhava para Kristen, com todo tipo de sentimento e pensamento passando dentro de mim.
Ela me encarava de volta, sem piscar.
-É isso, Kristen. Aproveita a vida na prisão- falei, sem me conter.
-Ainda não acabou.- Ela disse baixinho.
Tão baixo, que acredito que nem o guarda tenha ouvido.
Mas eu ouvi.
Steve veio e me puxou pela mão.
-O que você tem? Por que tinha que falar com ela??- Ele disse, meio zangado, meio preocupado.
-Eu...
-O que ela disse?
-Ela disse que ainda não acabou.
Steve parou.
-Olha para ela- ele disse.
Eu olhei.
Kristen estava sendo empurrada pelo guarda, dada a sua relutância em andar. Suas mãos, algemadas para trás. O cabelo desgrenhado, uma figura acabada.
-Está vendo? Ela é uma condenada. Acabou, sim. Acabou.
Assenti com a cabeça e segui com ele para fora da sala do tribunal.
Saí dali com aquele pensamento fixo em minha mente.
Acabou.
▪▪▪
Kristen, mesmo condenada, ainda quer sair por cima. Vai entender essa doida.
Gente, ufaaa! Nem acredito que este já é o penúltimo capítulo de Envolvidos.
Me dá uma coisinha bem lá no fundo do coração, só de pensar que está prestes a acabar, de vez.
Ainda temos o próximo capítulo, que será o último e depois, o Epílogo.
Mas, de qualquer forma, estamos chegando ao fim.😔
⏩Eu queria propor uma coisa a vocês.⏪
Quando escrevi essa história, criei um questionário para as minhas amigas responderem, sobre a história, lógico.
Não é nada demais, apenas perguntinhas básicas, onde elas tiveram mais que dar a opinião delas, na verdade.
Se vocês quiserem, logo após o Epílogo, eu posso postar este Questionário aqui, pra vocês responderem, também. Como uma última despedida... talvez? E só por que eu quero muito saber a opinião de vocês a respeito de algumas coisas.
Fiquem à vontade para decidir isso.
Se quiserem, eu postarei o Questionário.
Postarei cada pergunta como se fosse um parágrafo de um capítulo e vocês poderão responder normalmente, nos comentários, não tem segredo nenhum.
Comentem aqui se querem ou não que eu poste.
De qualquer forma, já fico muito feliz por vocês estarem acompanhando a história até aqui.
Amo vocês demais e.... Só vem último capítulo!
Preparem os coraçõezinhos de vocês, meus amores!
Beijoooos e até breve!!!!❤❤❤
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