Capítulo 04. O convite
Maria Joana e Alan não sabiam como conseguiram chegar àquele lugar, mas chegaram. Após se despedirem brevemente de Euclides, eles já estavam tirando a bagagem do carro e realizando o check-in em uma singela pensão, situada perto da FDUSP, onde optaram por se hospedar.
Feito todo esse processo, subiram ao quarto que lhes foi designado e que ficava no primeiro andar. O ambiente era pequeno. Contava com uma cama de casal, algumas mobílias e um banheiro em anexo, o qual arrancou suspiros de alívio de Joana, afinal, privacidade era algo que prezava.
No entanto, nem a simplicidade e aconchego do local, nem a presença de seu companheiro a acalmavam. Assim que botaram os pés no quarto e colocaram as suas malas no chão, Alan já foi dizendo:
— Acho que não foi mesmo uma boa ideia termos vindo para São Paulo. A bronca que tomamos do Euclides da delegacia até aqui só reforça isso.
O rapaz não queria soar pretensioso. A verdade era que, desde que partiram de Campinas, os dois engataram algo que raramente lhes ocorria: uma discussão bem acalorada. Maria Joana havia botado porque havia botado na cabeça que eles deveriam ir para São Paulo, ao passo que Alan discordava dessa ideia. Ela fazendo um pouco de charminho e ele ao ponto de ceder à vontade dela resultou na viagem do casal para a capital paulista.
Mas foi só a realidade vir com força, com destaque para quem havia conhecido há poucos minutos, que Joana percebeu onde havia, de fato, se metido. E pior: levado o seu namorado junto.
Contudo, ela não era conhecida por ser a pessoa que dava o braço a torcer. Por isso, deu a sua resposta:
— Bobagem! Estou só nervosa e cansada por conta da viagem. Só isso.
Alan apenas deu uma risadinha anasalada, tomou a namorada em seus braços, agarrando-a por trás, e deu um beijo em seu rosto. Afirmou:
— Eu te conheço, Maria Joana Camargo Andrade! Sei que está assustada com o que aconteceu e só agora a ficha está caindo para você.
Maldito e bonito cara com quem resolveu ter um relacionamento! Estavam há tanto tempo juntos que era capaz de ele até saber no que ela pensaria nos próximos minutos. Sem saída, Joana fez a sua constrangida confissão:
— Tudo bem... Estou assustada.
Alan esboçou um sorriso fechado. Não estava debochando da companheira, nem nada – ele também tinha dimensão da gravidade da situação. Suas seguintes palavras foram francas:
— Eu também estou assustado, meu amor. Aliás, mais assustado por estarmos em perigo, por você estar em perigo principalmente, do que pelo que aconteceu e pelo que pode acontecer...
Ela se virou e o fitou emocionada. Ele, sem hesitar, finalmente tomou seus lábios em um beijo cálido. O gesto representou que, mesmo com as brigas nas últimas horas, tudo estava bem. Se fosse preciso pedir algum perdão, ali estava ele na forma daquele gesto tão simbólico.
Tomado pelo instante romântico, assim que cessou o ósculo, Alan levou seus lábios ao ouvido de Joana. Em um tom sedutor, falou:
— No fundo, te admiro por ter nos levado para cá. Seu jeito corajoso chegar a ser... sexy!
— O que...?
Não houve tempo para uma réplica, não quando o homem apaixonado estava, de novo, saboreando da boca de sua amada. Dessa vez, o beijo não era mais tão casto assim...
Embora estivesse igualmente desejosa, havia um lado racional em Maria Joana, que, em certo momento, se desvencilhou de Alan. Proferiu:
— Aqui não! Um assassino está solto lá fora...
— E tem coisa mais excitante do que estarmos praticamente caçando um homicida? — ele respondeu, mantendo ainda a mesma entonação sensual a qual Joana estava custando a resistir. — Além disso, digamos que eu esteja... "marcando meu território"...
— Marcando seu território? — ela indagou com confusão.
— Aquele delegado é um bonitão. — Alan fez uma voz esganiçada, em uma tentativa cômica de imitar o que a sua companheira tinha dito quando ainda estavam na delegacia.
Como reação, Maria Joana soltou uma gargalhada contagiante. Já que estava sendo provocada, em todos os sentidos possíveis, disse como quem não queria nada com nada:
— Aquele professor que vimos, apesar de ser um suspeito em potencial, também não é de se jogar fora...
Mal isso foi proferido e, ainda estando grudada em Alan, Joana sentiu o aperto dele ficar mais forte em seu corpo. Sabia que o amado não era do tipo loucamente ciumento, mas, ao mesmo tempo, ele não era de ferro. Ela também não, que, depois de um estalo em sua mente, emendou:
— E não pense você que não notei aquelas duas menininhas te secando também, principalmente aquela de óculos!
Sua mente, como sempre traiçoeira, fê-la se recordar também de Maria Carolina. Todavia, ignorou isso ao ouvir:
— Quem precisa daquelas garotinhas quando se tem um tesão de namorada como eu tenho?
E sem que houvesse oportunidade para Joana, lá estava Alan lhe beijando tão ou mais ardentemente do que antes. A mão boba dele pousou em seu ombro e foi deslizando para baixo... A partir daí, a moça sabia o que ocorreria dali para frente. Logo, teve que interromper o momento novamente:
— É melhor... tomarmos um banho.
Só restou a Alan bufar e assentir. Desde o começo do namoro, ele jamais forçara Joana no que se referia às suas intimidades. Tudo entre eles acontecia de forma natural e almejada por ambos. Não seria ali que bancaria o escroto.
Ela foi se afastando, de modo a se direcionar ao banheiro, o qual logo adentrou. Apesar de ter impedido o que iria rolar, não dava para negar que um certo fogo dominava algumas partes de si... Com isso, conforme ia se despindo e aquela sensação ia ficando mais intensa a cada peça de roupa retirada, teve uma ideia. Abriu a porta e verbalizou:
— Não escutou, querido? Eu disse que era melhor tomarmos um banho. Não que, necessariamente, um iria de cada vez...
Em segundos, um sedento Alan apareceu diante de si. A feição abobada e a olhada penetrante dele em seu belo corpo nu a fizeram sorrir.
Ele nem precisou raciocinar e foi a beijando e agarrando até o chuveiro, não demorando em também se livrar de suas vestimentas enxeridas.
Seria um longo banho...
Enquanto isso, Maria Carolina e Valéria ainda aguardavam naquele posto policial. O delegado Davi anunciara que ouviria primeiro o professor Gustavo.
Até aí, tudo bem.
O problema era que aquele depoimento, o qual na concepção das duas deveria ser curto, estava sendo demasiadamente moroso. Não raro, durante aquela espera, as amigas se entreolhavam, um tanto sem graça, um tanto... desconfiadas.
Finalmente, chegou a vez de uma delas e, pouco depois, da outra. Incrivelmente, quando depuseram, o tempo gasto por ambas não chegou nem perto do que foi com o docente. De fato, elas tinham um álibi muito sólido: tinham uma rotina em comum, portanto, estavam juntas na hora em que o crime deve ter ocorrido. Ainda assim era estranha aquela disparidade quanto à demora dos relatos.
Ao darem por si, estavam saindo do posto policial. Quase tiveram uma síncope ao olharem a hora: era quase uma da tarde! O que denotava que elas perderam o resto da manhã, logo, as demais aulas daquele dia letivo.
— Parece até que o professor Gustavo quis nos punir ao ter demorado daquele jeito — comentou Valéria.
— Isso se não foi algo a mais... — sibilou uma sugestiva Maria Carolina, o que fez a sua acompanhante esboçar um sorriso amarelo.
Andando pelas ruas, as universitárias conversavam acerca do que fariam daquela tarde em diante. Acabaram combinando de retornarem para a faculdade e tentarem ver com algum colega da turma o conteúdo que perderam.
Entretanto, o plano de uma delas mudaria assim que chegaram à FDUSP.
A dupla já estava na porta do campus. O local contava com uma fachada elegante e bem ao estilo daquelas construções antigas, com direito às típicas colunas presentes na entrada e que remetiam à arquitetura grega. Um trio de grandes portas, contendo arcos redondos em sua porção superior, permitia o movimento de pessoas para dentro e para fora do prédio. Várias janelas se distribuíam pelo térreo e pelos três andares. Em seu cume, um detalhe bem desenhado comportava um relógio, cujos números, os quais marcavam as horas e os minutos, eram romanos, assim como o letreiro, que mostrava um simples dizer – FACVLDADE DE DIREITO.
Além disso, alguns coqueiros davam um ar natural em torno da referida edificação. Três mastros, com a bandeiras do Estado de São Paulo, do Brasil e da própria USP, reforçavam a importância da instituição em questão.
Que a entrada do campus era linda, isso era inegável. Todavia, nenhum dos elementos citados chamou a atenção de uma daquelas meninas.
De súbito, Valéria cessou o passo. Seu rosto começou a fitar algo que, em um primeiro instante, Carolina não havia identificado, fazendo-a indagar:
— O que foi?
— Tive uma ideia! — Valéria sorriu, dessa vez, mais abertamente, como se tivesse descoberto o fogo na Pré-história.
E antes que sua colega viesse com mais questionamentos, ela contou o que acabara de passar pela sua cabeça. Só foi nesse exato momento que Carolina compreendeu o porquê de sua amiga estar olhando tanto aquilo...
Aquilo era nada mais e nada menos que... o busto de Álvares de Azevedo, antigo estudante de Direito da USP, posicionado em uma das laterais do prédio e parecendo que as encarava de volta.
— Não é uma má ideia — a loira respondeu —, mas como você vai fazer para...
— Pensei em uma coisinha. Te conto no caminho.
— No caminho?
Foi aí que Valéria explicou o que tinha planejado. Porém, a reação de sua colega não foi o que ela esperava:
— Bom... Acho que isso pode dar certo, só que...
— Só que? — A garota de óculos a encarou com expectativa.
— Só que é melhor que pelo menos uma de nós fique aqui e pegue a matéria perdida de hoje, não acha?
Valéria iria abrir a boca para elaborar uma réplica. A outra moça, contudo, continuou:
— Lembre-se daquele puxãozinho de orelha que o professor Gustavo deu em nós duas. — Novamente, ela parou e, em um tom mais baixo, declarou: — E falando nele, acho bom eu ficar por aqui... Sabe: a faculdade é mais movimentada e, se bobear, mais segura que o lugar onde moramos.
Não muito convencida ainda, a moça de cabelos castanhos tentou, pela última vez, argumentar, mas sua colega ainda se manifestava:
— Eu te passo o conteúdo em casa, pode ser? E não se esqueça: qualquer coisa, é só me enviar uma mensagem, OK?
Só restou a Valéria anuir. Segundos depois, ela havia perdido de vista a amiga, que estava dentro do campus.
Assim, seguiu com o que estava confabulando e fez o seu retorno para aquela mesma delegacia de antes.
Dado o seu jeito espevitado, era possível dizer que ela simplesmente só foi ali adentrando e praticamente invadindo a sala pertencente a Davi.
Mas qual não foi a sua surpresa ao ver que o delegado não estava sozinho? E como assim: Gustavo ainda estava ali? E para coroar a excentricidade daquilo tudo, era impressão dela ou... aquela possível conversa entre eles não parecia ser um novo depoimento? A maneira como estavam próximos, mesmo que uma mesa estivesse os separando, denotava que algo a mais acontecia...
A garota ficou tão perdida em seus pensamentos que não notou quando estava sendo chamada.
— Pois não, minha jovem? — Era Davi, que já tinha saído de seu assento e se dirigido até ela.
Sua primeira reação foi dar uma ligeira olhada em seu professor, que permanecia sentado e estampava uma expressão inegavelmente assustada. Com mais um pouco de atenção, era também possível verificar os olhos dele... levemente avermelhados?
No entanto, Valéria não teve mais tempo de ficar alimentando suas suposições diante do que estava vendo. Tanto Gustavo quanto Davi a encaravam fixamente. A mensagem de ambos era mais do que evidente: ela deveria falar logo o que queria ali. A universitária respirou fundo. Com o oxigênio circulando pelo seu cérebro, investiu em uma primeira estratégia:
— Delegado, gostaria de conversar com o senhor... a sós.
— É algo que a senhorita queira acrescentar em seu depoimento?
Ela negou com a cabeça, o que fez o policial questionar:
— E então?
Mais um suspiro foi efetuado pela estudante, que, acuada, confessou:
— Preciso de sua ajuda para um, digamos, assunto acadêmico.
— Assunto acadêmico? De que tipo?
A pergunta não saiu de Davi, e sim de Gustavo, que, incrivelmente, parecia outro. Não era mais aquela pessoa visivelmente abatida, mas alguém com mais cara de profissional, mais cara de professor. Nesse momento, Valéria se martirizou por conta de sua voz tão estridente: apesar de ter tentado cochichar, o homem sentado naquela cadeira conseguiu escutá-la.
Pela segunda vez, ela ficou sem saída. O jeito foi relatar para os dois o que havia pensado. A resposta de cada um foi ímpar. Davi ficou com a expressão neutra, quase fechada, sendo impossível saber o que havia se passado pela sua cabeça. Gustavo, em contrapartida, aprovou a ideia, declarando:
— Isso é ótimo! Apesar do que estamos vivendo, é uma boa aproveitarmos essa oportunidade!
— Só tem um pequeno problema: não sabemos onde eles estão... — observou o jovem delegado.
— Eles não estavam em companhia daquele outro policial, o qual havia os ajudado antes? — indagou a moça.
— Estavam... — Davi respondeu para, com isso, se recordar de algo: — Espera! Eu tenho como contatá-lo!
— Essa é minha aluna! Melhor representante de sala não poderíamos ter!
Em uma situação diferente, aquele elogio feito por Gustavo teria deixado Valéria suspirando. Contudo, a dúvida, diante do que presenciara, ainda pairava em seu íntimo.
A partir daí, os eventos se sucederam de modo relativamente rápido. Bastou Davi telefonar para aquele número deixado previamente e Euclides estar, minutos depois, em sua sala novamente. Claro que veio uma reclamação da parte do homem mais velho:
— Cheguei há poucas horas de viagem. Queria descansar e já estou sendo chamado de novo...
Isso foi ignorado por geral. Em seguida, a situação foi explicada. Obviamente, o delegado de Pedras Azuis se mostrou contra:
— Não é por nada, mas, conhecendo aquelas peças, e não é de hoje, posso apostar que eles querem privacidade. Arrisco em dizer que, inclusive, devem estar suspeitando de todos vocês aqui.
O que Euclides não contava era com a lábia de Valéria. Gustavo não tinha mentido ao ter afirmado que ela seria uma grande advogada. Com a sua retórica, a graduanda conseguiu convencer o policial a não só participar daquele seu esqueminha de última hora, como também em conduzi-los.
Mais uma ligação foi efetuada, uma mentirinha contada, porém bem intencionada e lá estava um trio inusitado vagando pelas ruas do largo São Francisco.
Cada um tinha seus motivos. Valéria era a improvável mentora de tudo aquilo. Gustavo representava uma autoridade acadêmica. E Euclides... Ah! Euclides! Era um pobre coitado apenas...
Bem que eles tentaram arrastar Davi consigo, ao que ele próprio negou, dizendo preferir ficar na delegacia e se dedicar à coleta dos depoimentos no decorrer daquela tarde. Limitou-se a um mero desejo de:
— Boa sorte a vocês!
E um olhar relativamente significativo lançado aos demais, o qual demorou alguns segundos a mais em... Gustavo.
Não demorou para os três que saíram da delegacia chegarem ao local requerido. Por intermédio de Euclides, foram atendidos quase que prontamente.
Foi assim que, diante de sua presença, apareceram eles...
Maria Joana e Alan.
Quem poderia dizer que o encontro dos velhos e novos personagens dessa trama se daria na porta de uma singela pensão situada em plena São Paulo?
Era lógico que a reação de Maria Joana e Alan não seria a mais receptiva, pois a suspeita ainda vigorava em suas mentes. Por outro lado, o que o casal havia aprontado há poucos minutos ajudou a relaxar a tensão. Os cabelos molhados de ambos, inclusive, chamaram a atenção dos demais, que, por motivos de respeito ou de falta de intimidade, não falaram qualquer coisa.
— O que querem aqui? — perguntou Joana.
O questionamento foi a deixa para que Valéria desse um passo à frente e assumisse o controle daquela situação, respondendo:
— Vim, como representante da minha turma, fazer uma proposta.
— Não se esqueça de mim também, por favor! — pronunciou-se Euclides.
Os dois namorados o fitaram incrédulos. Seria possível que aquele homem, que se dizia tão amigo deles, estava participando daquilo?
Sem que tivesse pensado muito, Joana pediu para aqueles que não lhe eram conhecidos:
— Podem nos dar uma licença?
E sem aguardar resposta, já saiu quase arrastando o pobre Euclides para um canto ligeiramente mais afastado, tendo Alan em sua companhia.
— O que te deu na cabeça ter trazido toda essa gente para cá? — ela começou, um tanto alterada, se referindo diretamente ao delegado.
— Eu...
— Poxa! Nós dois estamos em risco e você nos traz suspeitos? — Joana continuava.
E ela ainda falava. A cada palavra, sua postura ficava mais intimidadora, de modo que isso chegou a causar medo nos dois homens. Entretanto, julgando uma grande injustiça estar ouvindo aquilo tudo, Euclides, em dado instante, estufou o peito. Com um gesto cômico, conseguiu o que parecia ser impossível: Joana ficar calada. Desse modo, foi a vez de ele se manifestar:
— Em primeiro lugar, você, mocinha, e seu namorado que quiseram vir para cá, quando eu tinha alertado para não virem!
A moça iria protestar, porém, mais um sinal engraçado partiu de Euclides, que prosseguiu:
— Em segundo lugar, não achei que tinha nada demais trazê-los aqui, principalmente aquela garota ali. — Indicou na direção de Valéria, que, percebendo que a encaravam, sorriu e deu um aceno frenético. Parecia uma fã sendo notada pelos seus ídolos.
— Justamente a Taís dois ponto zero — comentou Joana com desdém —, que, olha só, está com o Victor Hugo dois ponto zero... — Discretamente, maneou com o olhar para Gustavo.
— Justamente uma menina muito interessada e... — O rosto de Euclides corou. — ... boa na argumentação.
Maria Joana e Alan se entreolharam, captando o que deveria ter acontecido. Não se sentindo vencida, a mulher seguiu provocando:
— Inacreditável uma menininha, que mal deve ter saído das fraldas, ter te dobrado...
O policial deu um sorriso fechado e sua cartada final:
— Assim como, há cinco anos, uma universitária – que, até onde se sabe, tinha a mesma idade que essa tal menininha – procurou um delegado bonitão e foi crucial na investigação de uma série de assassinatos que chocaram uma cidade interiorana.
Rendida, Joana engatou uma risadinha. Admitiu que havia sido áspera com Euclides, que sempre fora tão bom e gentil consigo. Ela se aproximou dele, deu um beijo em seu rosto e pediu:
— Desculpa!
Tocado pelo gesto afetuoso da jovem, Euclides não conseguiu dizer nada. Para quebrar o clima, Alan, até então mudo, fez uma brincadeira:
— Euclides, lembre-se que essa aqui é minha, viu?
O riso foi geral. Houve ainda uma devolutiva da parte do mais velho:
— Prefiro minha esposa: ela é mais calma.
— Seu bobo. — Joana estapeou de leve o ombro do delegado.
Estando mais leves após aquela discussão, os três retornaram para perto dos outros. Coube a Euclides retomar o assunto:
— Então... — Pigarreou. — ..., Valéria aqui tem algo a tratar.
De novo, a estudante mencionada se adiantou, explicando:
— Como estudo na USP, soube que você... — Apontou para Alan. — ... deu uma palestra esses dias lá no campus de Letras, procede? — O rapaz assentiu. — Pois bem. Minha proposta é que você agora palestre, dê uma aulinha, bata um papo, enfim, como desejar, na minha turma, que tal? — terminou com um sorriso.
— Ah! É isso? — o rapaz perguntou.
— Eu, como professor do curso, não vejo problema — complementou Gustavo. — Será bom, diante do que aconteceu, para os alunos uma espécie de aula dada por você. Entende? É para dar uma segurança e evitarmos um pânico generalizado no corpo discente. A propósito, você também é professor, não é? Sabe do que estou falando.
— E do que irei tratar com os alunos? — Alan tornou a questionar. — Sou de Letras, não de Direito.
— O que quiser — afirmou Valéria. — Você pode... contar sobre a sua experiência nos assassinatos ocorridos em Pedras Azuis.
O casal de namorados se encarou de maneira nervosa. Percebendo o que a frase dita por sua aluna causou, Gustavo tentou algo para consertar aquele possível estrago feito:
— O senhor pode também dar dicas de escrita e de oratória, algo que é importante para quem está na nossa área.
— E qualquer coisa — Euclides tornou a falar —, estarei por perto.
Não era necessário que se pronunciasse mais uma palavra. O olhar que o delegado tinha lançado para Alan e Joana era significativo. Eles sabiam do perigo que estavam inseridos. E o que o homem mais velho expôs fechou aquela linha de raciocínio:
— É melhor vocês ficarem circulando por aqui do que enfurnados em um canto.
Novamente, não era preciso que se dissesse mais nada. Aquilo representava que, estáticos em um lugar só, eles estariam muito mais facilmente à mercê do provável assassino. Por isso, Alan aceitou aquele convite.
Todavia, Maria Joana não.
Ela já estava prestes a abrir a boca e negar. Era verdade que estava em bons termos com o seu amigo Euclides. Sem embargo, isso não significava que ela acataria àquilo, tampouco que confiaria naquelas pessoas, as quais sua intuição ainda julgava como suspeitas.
— Você também está convidada, Maria Joana — declarou Valéria, parecendo ler os pensamentos da outra mulher. — Será uma honra a sua presença entre nós.
— Obrigada, mas irei recusar. — A resposta enfim veio.
Todos a fitaram com surpresa. Ela ainda emendou:
— Peço desculpas. Hoje não estou me sentindo muito bem. É bom eu voltar para o quarto.
Em uma fração de segundos, estava a moça entrando e subindo pelas escadas daquela pensão. Alan, como o bom e velho namorado, intencionou ir em seu encalço. Então, ele se despediu e reforçou o convite aceito. Uma eufórica Valéria ainda disse:
— A sua aula pode ser daqui a três dias, na sexta-feira. Sabemos que você e a Maria Joana estão só de passagem, então não queremos tomar muito o seu tempo. Podemos reservar um dos auditórios da faculdade, que tal?
Um aceno apressado do rapaz selou aquele combinado. Finalmente, ele também sumiu do campo de visão de quem estava do lado de fora daquela pensão.
Os que ficaram por ali tentavam, por razões que se diferiam entre si, assimilar o que havia se passado há pouquíssimos instantes. Tentando extrair algum humor daquilo, a única menina daquele grupo soltou:
— Bom... Ao menos conseguiremos trazer o Alan para a FDUSP.
— E pensar que você me convenceu a entrar nisso só porque me disse que eu teria alguns momentos de fala nessa aulinha... Agora só resta saber o que raios Alan irá preparar para eu, como quase sempre, improvisar — falou Euclides, arrancando risos da estudante e do professor.
Em seguida, o policial foi verificar se estava tudo bem com seus amigos de longa data. Restou aos outros tomarem os seus devidos rumos.
No caminho para a casa, Valéria não conseguia esconder o sorriso radiante e vitorioso. Estava tão em êxtase que até se esqueceu de suas desconfianças de antes. Considerava o que havia bolado e conseguido como um de seus melhores feitos, sendo apenas uma mera graduanda. Quando Maria Carolina souber...
Entretanto, poderia se dizer que... algo que ela não esperava estava para acontecer...
Fica a questão: a vida é justa?
Notas do autor:
Hehehe As coisas estão ficando mais intensas por aqui. O capítulo aqui mostrou mais acerca da intimidade de Joana e Alan, ao passo que também enfatizou um possível primeiro suspeito... E o que será que aconteceu com Valéria? Já no próximo, a trama dá uma guinada, tal como acontece u em Entre Letras e Sangue. Até mais então! o/
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