2. A Festa do Solstício
O solstício de verão era um evento grandioso no Reino de Calthea. Enquanto a vila das Bruxas Brancas celebrava em silêncio com rituais e meditações, o castelo humano se enchia de luz, música e risadas. Para Rina, era uma oportunidade irresistível de espiar o mundo que tanto a intrigava.
Sentada no chão de seu pequeno quarto, ela folheava um velho grimório com dedos nervosos.
- Vamos lá, tem que haver algo aqui... - murmurou, empurrando os cabelos ruivos para trás enquanto analisava as páginas.
O livro tinha sido "emprestado" de Lysara e estava cheio de feitiços proibidos, mas Rina estava determinada. Depois de seu encontro inesperado no mercado, a ideia de ver o jovem misterioso novamente - e descobrir quem ele era - não saía de sua mente.
Finalmente, encontrou o que procurava: um feitiço de disfarce.
- Perfeito! Agora, só espero que funcione.
Naquela noite, Rina colocou em prática seu plano. Com o grimório aberto no chão, ela acendeu velas ao redor, criando um círculo mágico improvisado.
- Aeternus lumen, celare verum! - recitou, com a voz um pouco trêmula.
Uma nuvem dourada começou a envolvê-la. Rina olhou para suas mãos e viu sua pele adquirir um brilho sutil, enquanto seu cabelo assumia uma tonalidade castanho claro. Era como se estivesse usando uma máscara mágica.
- Funcionou! - exclamou, antes de tropeçar no círculo e apagar uma vela, quase derrubando o grimório no processo.
Ela vestiu uma capa leve e partiu, pronta para a aventura.
O castelo era ainda mais grandioso do que ela imaginava. Paredes de pedra iluminadas por tochas, grandes candelabros de cristal pendendo do teto, e uma escadaria imensa que parecia levá-la a outro mundo.
Rina respirou fundo enquanto entrava no salão principal.
- Sem confusão. Sem chamar atenção. Você é só uma garota normal curtindo a festa, - sussurrou para si mesma, tentando acalmar os nervos.
A música preenchia o ar, e o salão estava cheio de pessoas elegantemente vestidas, dançando ou conversando com taças de vinho na mão. Rina passou por entre os convidados, tentando parecer casual enquanto admirava a grandiosidade do lugar.
E foi então que o viu.
O jovem que havia consertado a pipa no mercado estava ali, no centro da atenção, conversando com um grupo de nobres. Ele estava impecável em um traje real, com detalhes dourados que destacavam seus ombros largos.
- Ele é o príncipe? - Rina sussurrou, chocada.
O choque logo foi substituído por um nervosismo crescente. Ela sabia que estar ali já era um risco, mas se aproximar dele seria praticamente brincar com fogo. Ainda assim, algo a empurrava em sua direção.
Eamon estava entediado. Como sempre, as festas no castelo eram cheias de sorrisos falsos e conversas desinteressantes. Ele sabia que sua presença era esperada, mas, naquele momento, tudo o que queria era escapar para os estábulos e alimentar os cavalos.
Então, algo chamou sua atenção.
Uma jovem desconhecida caminhava pelo salão, com um olhar curioso e encantado, como se estivesse vendo aquele mundo pela primeira vez. Havia algo nela que parecia... fora do lugar.
Decidido a sair da monotonia, Eamon cruzou o salão e se aproximou dela.
- Boa noite, senhorita. Não me lembro de tê-la visto por aqui antes.
Rina se virou, quase derrubando uma bandeja de doces de um garçom que passava.
- Ah... eu... boa noite! - disse, tentando soar confiante, mas falhando miseravelmente.
Ele sorriu, claramente se divertindo com o nervosismo dela.
- Permita-me apresentar-me. Sou Eamon.
- Eamon... - ela repetiu, como se estivesse testando o nome. - Um prazer conhecê-lo.
- E você é...?
Rina congelou. Ela não havia pensado em um nome falso!
- Eu sou... Alina! - improvisou, pegando o primeiro nome que veio à mente.
Eamon arqueou uma sobrancelha, mas não questionou.
- Alina, então. Você dança?
- Dançar? - ela repetiu, surpresa.
Antes que pudesse protestar, ele segurou sua mão e a guiou até o centro do salão.
Dançar com Eamon era, ao mesmo tempo, um sonho e um pesadelo. Ele era gracioso, conduzindo-a com facilidade pela pista, mas Rina era tudo menos coordenada.
- Está tudo bem? - ele perguntou, quando ela pisou em seu pé pela terceira vez.
- Eu... não sou muito boa nisso.
- Não se preocupe. Eu também não era, no começo.
O sorriso dele era tão genuíno que Rina sentiu o coração acelerar. Por um momento, esqueceu-se de onde estava, deixando-se levar pela música e pela proximidade dele.
Mas, como sempre, o universo parecia conspirar contra ela.
No meio de um giro, Rina sentiu algo estranho. Sua capa mágica começou a desvanecer. Primeiro, pequenos fios dourados desapareceram, seguidos pelo tecido que cobria seus ombros.
- Não... não agora! - murmurou, tentando segurar a magia com as mãos, como se isso fosse possível.
Eamon notou sua inquietação.
- Está tudo bem?
Antes que ela pudesse responder, a capa desapareceu completamente, revelando suas roupas simples por baixo.
Os murmúrios começaram imediatamente.
- Quem é essa garota? - alguém sussurrou.
- Por que está vestida assim?
Rina sentiu o rosto queimar. Ela queria fugir, mas Eamon segurou sua mão com firmeza.
- Alina, você está linda. Não deixe que digam o contrário.
As palavras dele a pegaram de surpresa. Apesar de todo o caos, ele parecia genuinamente encantado por ela.
Eamon se virou para os outros convidados, sua expressão tornando-se séria.
- Acredito que todos estamos aqui para celebrar, não para julgar.
Os murmúrios cessaram, e o salão voltou à normalidade, mas Rina sabia que não poderia ficar ali por muito mais tempo.
- Eu... preciso ir - disse, recuando.
- Espere!
Antes que ele pudesse detê-la, Rina correu pelo salão, saindo pela grande porta que levava aos jardins.
Rina se escondeu em uma parte mais isolada do jardim, tentando recuperar o fôlego.
- Que desastre! - murmurou para si mesma.
Mas, apesar de tudo, não conseguia parar de sorrir. Algo naquela noite, algo sobre ele, parecia ter mudado tudo.
Enquanto olhava para o céu estrelado, ouviu passos se aproximando.
- Achei que poderia estar aqui.
Era Eamon.
- Por que me seguiu?
- Porque você é a pessoa mais interessante que conheci em muito tempo, Alina... ou seja lá qual for seu nome verdadeiro.
Ela olhou para ele, surpresa.
- Você sabia?
- Não sou cego. Mas não importa. Quem você é, ou de onde vem... isso é o que menos importa para mim.
Rina não sabia o que dizer. Pela primeira vez em muito tempo, alguém olhava para ela de forma genuína, sem julgamentos.
- Você deveria voltar para a festa - disse ela, tentando esconder a emoção na voz.
- Talvez. Mas, honestamente, prefiro ficar aqui.
E, juntos, eles ficaram em silêncio, sob as estrelas, enquanto um novo tipo de magia nascia entre eles.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro