Capítulo 28 - Acertos e consertos
"29 de novembro de 2013
O dia de conhecer a melhor amiga virtual a gente nunca esquece. A prova que Letícia que não é um malfeitor que quer me sequestrar, na real, já sinto que ela é da família!"
Enquanto ando até a mesa do computador para pegar mais um pregador preto balanço a fotografia para a tinta da caneta secar mais rápido. Depois vou até o varal e prego a foto num dos pontos altos e observo.
É de ontem, assim que passamos por aqui eu me lembrei que devia registrar de forma típica o momento para adicionar ao meu varal. Sentamos eu e Letícia na rede da varanda, meio abraçadas e rindo, e Luís tirou a foto. Como se estivesse ouvindo meu pensamento, meu melhor amigo aparece na porta do meu quarto, junto com o André, que comenta:
- É estranho, mas de alguma forma vocês se parecem. - Olho-o confusa e ele aponta para a foto recém-pregada. - Tirando que os olhos dela são verdes, o formato é bem parecido com os seus e o nariz também. Ela só é mais clara, igual a família da sua mãe.
- Desde quando você conhece de formato de rosto? - caçoo e largo a imagem, indo guardar a caneta e o post it. - Não acho a Lety parecida comigo.
Luís já está jogado na minha cama com os fones gigantes de ouvido que ganhou do irmão de aniversário. Não sei quem ficou mais feliz com o presente: André por encontrar algo que distraia Luís, ou meu próprio amigo, por ganhar algo ligado a tecnologia e algo que não vivemos sem - música.
- Desde que eu comecei a desenhar rostos. - André dá de ombros e seus olhos se desviam para outra foto. - Caramba, nem dá pra acreditar que essa foto já tem um ano!
É do aniversário de 13 anos do Luís, nós estamos no jardim da minha casa, com spray de espuma. Na foto, eu tinha acabado de fazer um montinho no cabelo do Luís e André espirou espuma na minha bochecha depois de levar espuma na nuca. Meu irmão tirou essa foto, e ela ficou marcada com uma das minhas preferidas. Sorrio para André, deito-me ao lado de Luís e retiro seus fones, fazendo assim ele olhar para mim.
- O que espera do seu 14° ano de vida? - indago.
- Sexo, drogas e Rock'n Roll - ele responde e eu reviro os olhos. Luís suspira dramaticamente e arrisca: - Me livrar do ensino fundamental?
- Você é tão sem graça! - digo e jogo uma almofada nem enquanto me sento.
- O que espera que eu diga? - pergunta retoricamente e aprimora a resposta: - "Bom, Sabrina, já planejo pagar boletos, conseguir um emprego, me casar com uma escritora e ter sete filhos, um com cada nome dos personagens principais do livro dela"?
- Sim! - respondo, mas ele já está novamente com aqueles fones gigantes na orelha. Bufo. - Ter um holograma ou um robô seria melhor.
- Eu ouvi - Luís diz, de olhos fechados. - Meu aniversário e minha melhor amiga me tratando assim. Tsc. Tsc. Tsc.
A pessoa vai ficando mais velha e o drama só aumenta. Parece você, Sabrina. Consciência...
- Ele prometeu para minha mãe que vai tentar o CEFET¹ - André comenta me fazendo arregalar os olhos.
- Cara, isso é demais! - comemoro me virando para Luís. Ele mexe a cabeça para cima e para baixo, não sei se assentindo para mim ou no ritmo da música. É então que me lembro de uma coisa. - Peraí! Você vai me abandonar no ensino médio? Eu sei que a gente já vai ficar um ano separado porque vou para uma estadual ano que vem, mas...
- Lembra o que a gente prometeu quando sua mãe ameaçou tirar você da escola por causa das notas baixas em ciências? - Luís pergunta, tira os fones e senta do meu lado.
- Que até quando não estudarmos mais junto iríamos fazer de tudo para permanecer com a amizade intacta e não deixar tudo se desfazer - concordo, completamos e trocamos um olhar. - Que não ia acontecer como tantos outros.
- E vamos fazer isso - ele diz, dá de ombros e sorri. - E se precisar eu te arrasto para o CEFET comigo.
📷📱📌
À tarde, começa a festa do Luís - que está mais para uma tarde de jogos na sala com direito a docinhos, salgados e bolo de aniversário. Alguns amigos e amigas de jogatina dele aparecem e a Letícia também, então não tive que ficar no meio daqueles viciados.
Eles estão jogando FIFA agora, Luís e Arthur num time e duas garotas em outro. Meu irmão, que curte todo tipo de jogo, observa o pessoal jogando. Ao contrário do futebol real, o jogo virtual de futebol não me atrai. Quando Luís me convence a jogar, sei que ao menos uma goleada vou levar, nem que seja jogando PES. Por isso nem arrisco jogar com esse pessoal que já está acostumado. Prefiro jogos de passar fase ou de simulação - ainda que The Sims no computador seja infinitamente melhor que o do PlayStation 2.
Juliana passa pela sala com uma garrafa de refrigerante e Luís pausa o jogo para encher os copos. Deixo meu celular no colo e encho meu também. Pelo olhar da minha tia, vejo o quanto ela está feliz por Luís estar gostando de tudo. Tia Juliana deu seu máximo nessa festinha, como dá em todas as outras, por mais simples que seja.
Depois de deixar mais uma bandeja de salgadinhos no centro da mesa, ela retorna para a sala de jantar, onde estava antes, conversando com a mãe de um amigo do meu melhor amigo. Deixo de fita-la e volto minha atenção para meu celular.
Erik: Nunca fiz nada muito especial nos meus aniversários, minha mãe também não é lá muito ligada a festas então eu tive festa de verdade só de um e cinco anos
Erik: Aliás, o que deu aniversário ao Luís?
Eu e Erik estamos há uns cinco minutos falando sobre nossos aniversários passados. É tanta história para duas pessoas que viveram menos de 15 anos que nem dá para acreditar.
Sasá: Minha família até gosta, eu só entro no embalo, haha.
Sasá: Dei minha amizade como sempre 😌
Sasá: Brincadeira, montei um quadro e coloquei nossas principais fotos.
Entre elas a foto que tirei antes das férias, quando tudo começou a mudar de certa forma na minha vida.
Erik: Criativo.
Erik: Vai ter a tão sonhada festa de debutante?
Sasá: Acho q não, meus pais nunca chegaram em mim para falar disso. Não vou ligar se não tiver, esse trem não é pra mim, não gosto de ser o centro das atenções
Sasá: Fora que ano que vem tudo vai ser mais caro, provavelmente vou estudar numa escola do centro e a passagem até lá é mais cara, fora material, uniforme. O restante das parcelas do meu curso. Essas festas custam mó caro.
Erik: Eu entendo, se tivesse essas coisas para garoto também não iria fazer questão, mas cobrei algo especial da minha mãe este ano.
Aniversário do Erik é dia 27 do mês que vem, uma quarta-feira. O que ele poderia ter pedido com um mês de antecedência?
Sasá: O que pediu? 👀
Desvio mais uma vez os olhos do celular quando vejo André, do outro lado da sala, se levantando e indo em direção à cozinha. Letícia, do meu lado, parece perceber o mesmo porque o segue. Esses dois...
Antes de voltar ao meu celular, Consciência diz, com uma certeza descomunal:
Eu aposto um dia no comando que o Erik não vai contar o que é.
Penso um pouco. O celular vibra, podendo indicar uma resposta dele. Se ele não contar, eu insisto, isso não está fora das regras.
Fechado, Consciência.
Erik: Não posso contar ainda
Merda!
Sasá: Oxê, por que não? O que uma pessoa a quase 1500 quilômetros de distância interferiria num trem especial do seu aniversário?
Erik: Não quero dar esperanças de algo ainda incerto. E pode interferir muito, pode crê
Erik: Mas posso dizer que não tem trem nenhum na jogada, no literal da palavra 'kkkkk
Eu detesto escritores ou aspirantes a escritores desde que conheço o Erik. Ele sabe exatamente como usar as palavras para que eu não consiga nem pensar numa forma de refutar. Consegui até mesmo passar a acreditar fielmente que iremos nos encontrar em um futuro próximo desde que ele passou a dizer isso várias vezes a parti do dia que nos declaramos. Se ele não quisesse cursar música, tenho certeza que daria um ótimo advogado.
Sasá: Não acredito que você não vai me contar!
Sasá: Tô só vendo esse preconceito linguístico com minhas gírias, que aliás, você até usa às vezes...
Ainda vou escolher o dia, ok, Sabrina? Nunca foi tão bom ganhar uma aposta.
Balanço a cabeça para mim mesma. Eu mereço.
Erik: Meses de convivência com uma mineirinha linda e a tal da genética, não é? Mãe mineira e essas paradas
Eu sorrio, abaixando a cabeça, e sinto minhas bochechas queimarem.
Erik: Só esperar mais um pouco que te conto...
Sasá: "Vem depressa pra mim, que eu não sei esperar²"
Erik: Não canta Legião, senão eu me apaixono
Erik: De novo, no caso
Sasá: 💜
- Ow, Leta - Luís me chama com um minúsculo sorriso sínico no rosto. Ele não tira os olhos da tela da TV, mas sei que deve ter visto que eu estava concentrada no celular; desde que conversou com o Erik, sempre que me vê no celular, faz questão de me chamar de "Leta" só para provocar. - Busca, por favor, aquele suco que minha mãe comprou de manhã pro Rafael, tá na geladeira.
- Dez reais - cobro, sorrindo, e me levanto.
Sigo para a cozinha e encontro uma cena já esperada. Eu só não esperava ser plateia disso. Letícia está entre a bancada próxima ao fogão e o corpo de André, eles estão de fato muito perto, beijando-se, mas felizmente não como dois desentupidores de pia. Não que eu fosse ligar se tivessem - só ia ficar constrangida, como qualquer outra pessoa atrapalhando um momento mais íntimo. Quer dizer, eu nunca beijei ninguém, na boca claro, e ainda que não superestime o primeiro beijo, ainda acredito que o ato de beijar seja algo especial.
Não acredito que você está filosofando enquanto observa o irmão do seu melhor amigo e sua melhor amigo virtual se pegando!
Acordo para realidade e tento alcançar a geladeira sem fazer muito barulho. Puxo a porta devagar e logo vejo o suco de caixa na prateleira embaixo, só que assim que vou tirar o rosto de dentro da geladeira ouço umas risadinhas baixas e acabo batendo com a cabeça.
Missão não chamar atenção fail.
Com uma mão na cabeça e segurando a caixa de suco com a outra, dou de cara com Letícia e André segurando o riso.
- Isso doeu - digo estridente e fecho a geladeira com o pé.
- A gente te viu quando você entrou - André confessa e dá de ombros. - Só que tava bom demais da conta pra parar.
Não precisávamos saber disso, André!
- André! - Letícia ralha dando um soco fraco no peito dele, e recebe um selinho de resposta, o que a faz sorrir. Então ela se volta para mim. - Não precisava ficar constrangida, era só falar: "vão procurar um quarto, seus pervertidos", que a gente iria mesmo - ela conclui, enfim gargalhando, provavelmente da cara que eu devo ter feito.
Sério, eu queria ter a segurança que a Lety tem. Nem sequer corou sendo pega no flagra, fora que ficou com o André um dia após ter o conhecido definitivamente. Quem sou eu para definir o tempo certo de um casal para ficar junto, aliás, já torcia pelos dois antes mesmo de Letícia vir para cá, então, que mal tem?
- Só... - Ergo as sobrancelhas e balanço a cabeça -, finjam que eu nunca passei por aqui, ok?
- Sem problemas - eles respondem juntos e sorriem. Antes de sair dali, pego um copo descartável.
Não gosto de casais. Definitivamente. Se isso fosse um livro, e eu a escritora, acabaria com todos os shippers.
Odiaria eu ficar com o Erik?, indago a ela, enquanto volto para sala com o suco e o copo.
Nosso caso é diferente, existe eu, seríamos um poliamor maravilhoso.
Acho que vou aproveitar que minha mãe entra de férias na próxima semana e vou pedir consultas particulares.
Assim que entrego a caixa de suco para o garoto alto e de cabelo black power, alguém bate na porta. Com os anfitriões ocupados com os convidados, ou com a boca deles, eu mesma vou atender.
- Dani! Que bom que veio! - exclamo enquanto abraço Danielle.
Não conversamos desde aquele dia no auditório, no máximo nos esbarramos nos corredores da escola, mas nada a mais que isso. Eu senti muita falta dela, assim que nos tornamos amigas, por causa daquele trabalho de geografia, eu me apeguei. Ela é única garota da minha idade com quem eu conversava frequentemente.
- Meus pais liberaram meu celular hoje e eu vi o convite do Luís, aproveitei que eles estavam mais flexíveis e pedi para vir - conta entrando na casa, e eu fecho a porta. - Só não consegui arrumar algum presente para... Art!
Então Danielle já não tem mais olhos para mais nada, nem mais ninguém. E a rápida perda de concentração faz com que o time de Luís e Arthur tome um gol das meninas, que comemoram a virada. Não posso dizer que os entendo, mas dá para imaginar como eles devem estar se sentindo podendo conversar depois de dias sem trocar poucas palavras. Ficar um dia sem mandar e receber um "bom dia" do Erik já soa estranho e deixa meu dia um tanto incompleto.
Tão logo, Arthur passa o joystick³ para o tal Rafael e vem até Danielle. Ela dá os parabéns rapidamente para Luís, e logo segue em direção à varanda com Arthur. E eu só observei a cena, como uma narradora observadora. Só espero que tudo se resolva entre eles.
Depois de encarar Luís com um olhar que diz: "só a gente que não se resolve". E ele me devolver um provocativo: "ainda estou a procura da escritora com sete filhos", que me faz rir. Eu volto ao lugar onde estava sentada antes da aparição de casais.
Se nós tivéssemos nos apaixonado pelo Luís e ele não fosse esse arromântico inegável poderíamos estar dando uns beijos agora...
Beijar o Luís? Céus! Não!
Mas seria tudo mais simples.
Só que nem sempre o mais simples é a melhor solução, Consciência. Qual seria a graça de tudo se fosse assim?
Quando você disse que queria que sua vida se transformasse em livro você não estava de brincadeira...
Pense o que quiser. Dou de ombros e sorrio quando sinto meu celular vibrar e vejo ser uma nova mensagem de Erik.
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¹ CEFET-MG: Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais
² Música: Sete Cidades - Legião Urbana
³ Joystick: manete, controle
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Twitter: @eoreovlivro
Instagram: Tehbook_costa
Facebook: Entre o Real e o Virtual
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O
lá, pessoas! Depois de algumas semanas lutando com esse capítulo, entre apagar e reescrever, reorganizar e tudo mais me impediram de postar mais cedo. Esse capítulo é um famoso capítulo de transição, os próximos vão ser bem movimentados hahaha.
Um aviso: Provavelmente, na próxima semana, eu vou mandar fazer os marcadores de Entre o Real e o Virtual. Fotinha de prévia aí embaixo.
Para quem acompanha a página do Facebook, viu que já fiz de um dos meus contos - Estigma -, mas foram em um menor número, então enviei apenas para amigos mais próximos e os restantes também vão para outros amigos. Enfim, para EoReoV, quero um número maior, para presentear quem faz essa história crescer. Vocês, os leitores. Os que mais comentam e interagem podem ter certeza que tem um nome anotadinho para receber.
Aos demais, vão rolar alguns sorteios na página, mas ajudaria muito vocês interagirem aqui no livro mesmo (além de aumentar as chances <3)
Até o próximo capítulo!
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