Magia em ebulição
Susan ficou imóvel por alguns segundos após a saída de Adriel, o som da porta se fechando ecoando pelo quarto como um lembrete de sua solidão repentina. Ela encostou as costas na parede e deslizou até o chão, abraçando os joelhos enquanto tentava recuperar o fôlego e a clareza mental.
"Que droga foi essa?" pensou, a cabeça fervilhando com uma mistura de raiva, vergonha e algo que ela não queria nomear. O calor de seus lábios ainda parecia presente nos dela, e cada vez que ela fechava os olhos, revivia o momento com uma intensidade que a fazia odiá-lo e, pior ainda, odiar a si mesma.
Ela passou as mãos pelo rosto, como se pudesse apagar as lembranças e, junto com elas, os sentimentos conflitantes que a consumiam: raiva, paixão e insanidade.
— Estou perdendo a cabeça... — murmurou, olhando para o teto como se esperasse que alguma resposta divina viesse em seu socorro.
Susan tinha sonhado tantas vezes com o primeiro beijo, idealizado cenas românticas em sua mente, com alguém gentil, que a trataria com carinho, e não um vampiro que queria arrancar seu coração — literalmente. Ainda assim, aquele beijo, por mais brutal e inesperado que fosse, parecia ter sido desenhado para eles. Não fazia sentido, mas, de alguma forma, encaixava.
"Nós nos odiámos, isso não devia jamais ter acontecido", relembrou-se, apertando os joelhos contra o peito. Mas havia algo na intensidade de Adriel que mexia com ela, e isso a assustava mais do que tudo.
Ele era perigoso em tantos níveis, não apenas pela força física e pelo desejo de matá-la, mas porque começava a penetrar em um lugar em que ninguém mais havia chegado: seu coração.
Susan balançou a cabeça, tentando afastar esses pensamentos. Ela precisava se focar, lembrar do porquê estava ali. O beijo, por mais arrebatador que fosse, não mudava o fato de que Adriel era um assassino, alguém que queria usá-la para seus próprios fins.
Mas... E se ele estivesse falando a verdade sobre não ter matado seus pais? Aquela dúvida, junto com a lembrança de seu toque e de sua presença, a corroía por dentro.
Ela se levantou com esforço, andando de um lado para o outro no quarto, como se o movimento pudesse ajudá-la a organizar as ideias. Mas a verdade era que, desde que Adriel entrou em sua vida, nada mais fazia sentido.
Entretanto, pensando mais a fundo, Susan percebeu que ter uma conexão física com Adriel poderia a ajudar a conseguir mais informações sobre a morte de seus pais, talvez, pudesse pedir sua ajuda... Caso ele não quisesse a matar.
Mas se ele não ajudasse, ela poderia muito bem caçá-los sozinhos... Ou não, se sentia tão inexperiente que começara a ficar com medo de virar refém de outro vampiro sem juízo.
Apesar de ser ridículo, Adriel não estava a torturando, só psicologicamente mesmo.
Susan balançou a cabeça para se livrar de seus pensamentos e a porta do quarto foi aberta, aparecendo uma mulher loira que aparenta ser jovem.
— Olá, bruxa. Adriel me mandou trazer isso para você. — A mulher revirou os olhos para Susan e a garota não gostou nada do desdém utilizado por ela.
Mas, conseguiu ignorar a má educação da mulher, pois ela carregava uma bandeja cheia de comida, e Susan estava faminta.
Cristina colocou a bandeja em cima da mesa de canto feita de madeira refinada e o estômago de Susan roncou imediatamente. Sem se despedir, a mulher começou a sair do quarto, parando ao chegar na porta.
— Saiba de uma coisa garota. Ele é meu, e não é uma bruxinha que será morta daqui uns dias que vai roubá-lo de mim.
Ela fechou a porta com força, deixando Susan com uma ruga na testa, sem entender nada. Ela definitivamente não estava disputando com ninguém o amor de Adriel, se é que ele seria capaz de amar alguém.
Suspirou e se aproximou da comida, saboreando tudo que tinha ali: frutas, bolos, pães. Sentiu que sua energia estava finalmente voltando depois de dois longos dias. Ainda bem que já estava anoitecendo e ela poderia dormir novamente.
Após se deleitar, Susan se deitou na cama, morrendo de tédio enquanto Adriel não voltava. Ela se questionava sobre a quantidade de tempo que viveria em cárcere privado, sem ver a cor do sol.
Já começava até mesmo a sentir saudades de ir para as aulas, de brigar com Miguel... Aliás, será que a uma hora dessas ele já teria percebido a ausência de Susan?
Adriel estava ainda um pouco desconsertado quando encontrou Sierra no meio da sua sala, olhando para a porta quebrada.
— Parece que não é só a porta que está fora do lugar aqui. — Comentou a bruxa, dando um sorrisinho de lado ao ver o estado confuso de seu estranho amigo.
— As coisas têm fugido um pouco do meu controle recentemente. — Se sentou no sofá e chamou Sierra para fazer o mesmo.
— E você detesta isso, não é? São tantos anos tendo tudo nas mãos.
— Ah, Sierra. Não venha me dar lições de moral a essas horas. — Bufou Adriel, desejando apagar tudo que o atrapalhava de sua mente. Queria voltar naquele quarto e continuar beijando a garota até que ela deixasse de ser tão irritante, mas estava sendo atrapalhado, como sempre.
— E existe alguma hora ideal para dar sermão em um amigo mandão e prepotente? — Arqueou as sobrancelhas, sentando-se no sofá de frente para Adriel.
— Definitivamente não. Eu adoro ser assim. — Deixou seu corpo cair no sofá, sentindo-se exausto, mais do que jamais se sentira.
— Você não me parece bem. — Reparou Sierra.
Ao contrário de Adriel que esbanjava vigor e beleza, Sierra estava envelhecendo, seus cabelos castanhos tinham algumas mechas brancas aparecendo, algumas rugas já eram visíveis em seu rosto.
— Não me sinto bem também. Depois de sequestrar aquela bruxa parece que estou enlouquecendo. — Abriu o jogo com a amiga e passou a mão no próprio rosto.
Sierra deu um belo sorriso, adorando ver a forma como a mulher que ainda não conhecia estava maltratando seu amigo. Aquele homem definitivamente precisava de um pouco de juízo.
— E mesmo te irritando você ainda não a matou?
— Não sou assim tão ruim, Sierra... — Fez careta.
— Am... É sim, Adriel.
— Tudo bem. Talvez eu seja. — Deu de ombros. — Mas eu te chamei aqui por outro motivo... Além de desabafar minha vida pessoal.
— Diga.
Adriel abriu a boca para falar algo, mas foi interrompido por um grito agudo vindo do quarto onde Susan estava. Ele soltou um suspiro profundo antes de se levantar, mas o grito foi seguido por um som abafado, como algo caindo ao chão, e ele imediatamente apressou os passos.
Sierra seguiu o som, curiosa e alerta, enquanto Adriel empurrava a porta aberta com força.
A cena diante deles era caótica: Cristina estava caída no chão, segurando o braço esquerdo com uma expressão de dor e ódio, enquanto Susan permanecia encostada na parede, os olhos arregalados e as mãos tremendo. No chão ao lado de Cristina, o tapete apresentava marcas chamuscadas, e o cheiro de carne queimada era inconfundível.
— O que aconteceu aqui? — A voz de Adriel ecoou no quarto, firme e autoritária, enquanto seus olhos se alternavam entre Susan e Cristina.
Cristina, ainda segurando o braço onde a pele estava queimada, indicava para Susan com um dedo trêmulo.
— Essa... essa bruxa me queimou! Eu só estava tentando... — Sua voz falhou enquanto ela enfrentava Adriel, procurando por apoio.
— Tentando o quê, Cristina? — Adriel deu um passo à frente, e seu tom gélido fez até Sierra estremecer.
Ela não imaginava que o instinto de cuidado de Adriel pela garota estava evoluindo nessa velocidade.
— Ela tentou me morder! — Susan disparou, uma voz repleta de uma mistura de raiva e sofrimento. — Disse que ia me matar e que eu nunca deveria ter vindo para cá! Eu só... eu não sei o que aconteceu... — Ela olhou para suas próprias mãos, uma respiração acelerada.
Adriel congelou e voltou seu olhar para Cristina, que agora parecia hesitante em justificar suas ações. Sua vontade era de matá-la, porém, respirou fundo.
— É verdade? — Ele disse, sua paciência claramente esgotada.
Cristina hesitou por um momento antes de erguer o queixo, tentando recuperar a compostura.
— Ela não pertence a este lugar, Adriel. Você sabe disso tanto quanto eu! Essa bruxa vai nos trazer mais problemas do que vale. Você já viu o que são capazes de fazer para tê-la. — Referiu-se ao ataque de Kristoff durante a tarde.
Adriel não respondeu imediatamente. Seus olhos escuros fixaram-se nela com uma intensidade que fez Cristina recuar levemente.
— Não é você quem decide isso. — Ele se mudou, e sua voz caiu para uma sugestão ameaçadora. — Se eu souber que você tentou algo assim novamente, a queimadura será o menor dos seus problemas. Você está entendendo?
Cristina não ousou responder; apenas assentiu rapidamente e deixou o quarto, ainda segurando o braço queimado.
Adriel voltou para Susan, que ainda parecia em choque. Ele cruzou os braços e aspirou por alguns segundos antes de finalmente falar:
— Você queimou a pele dela? Como? Nesses últimos dias você só fazia magia quando se estressava, parecia fraca.
Susan engoliu em seco, tentando encontrar as palavras.
— Eu... eu não sei. Ela me encurralou, e tentou me atacar, e eu só... senti algo... — Ela gesticulou desajeitadamente para as mãos. — E aconteceu. Eu não precisei falar uma palavra sequer.
Susan estava tão impressionada com o que tinha feito, mesmo sem saber se conseguiria reproduzir aquilo novamente. Finalmente parecia que seu poder estava se estendendo.
Adriel trocou um olhar com Sierra, que observou tudo com atenção.
— Parece que sua magia está começando a ficar mais forte, bruxinha. — Ele falou com um tom irônico, mas seus olhos mostraram algo mais: uma preocupação real que ele não poderia esconder.
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