27. Desentendimento
— Onde esteve o dia todo? — perguntou Ben enquanto eu passava pela porta da sala.
— Longa historia...
— Resuma. — Ele sorriu estranhamente. Olhei torto.
— Conheci uma garota; passei a tarde com ela.
Ele ergueu as sobrancelhas.
— Não é o que esta pensando.
— Não estou pensando nada. — disse rindo.
— Mas e sua tarde, como foi? — perguntei, mudando de assunto.
— Não tão boa quanto a sua. Fiquei o dia todo nesta casa sem fazer nada; Robert me encarregou de ficar de olho em Roy, mas hoje ele tá um pé no saco.
— Robert saiu?
— Foi à uma reunião, mas já deve estar voltando.
— E Liz, onde está?
— Não sei. Ela não conversa mais comigo... Agora nossas conversas não duram mais do que cinco minutos.
— Ela saiu sem avisar?
— Sim. Liz tá estranha... Mas deve ser só comigo.
— Dá tempo ao tempo, Ben. Não vai ser assim pra sempre.
— Tomara.
— Estão conversando sobre o que? — perguntou Roy, despreocupado, ao descer as escadas.
— Amor... Sofrimento... — brincou Ben.
— Falando nisso; como está indo o seu plano infalível, James?
Eu conhecia aquele sarcasmo de Roy; era de quando algo o incomodava.
— Que plano, Roy? — perguntei, indiferente.
— Aquele de esquecer o grande amor da sua vida.
— Estou trabalhando nisso.
— Sei... — Ele reprimiu um riso, propositalmente.
— Qual o problema, Roy?
— Problema? Não há problema.
— Estou te incomodando? Por que se estiver, pode dizer.
— Está estressado, James? Não posso mais tocar no nome dela.
— Se não tocar eu agradeço. É meio difícil esquecer com alguém falando dela o tempo todo.
— Você não vai esquecer, admita que vai ser só mais uma tentativa que vai falhar.
— Não tenha tanta certeza disso.
— Tanto que veio pedir pra eu apagar as lembranças — rebateu.
Ben olhou torto pra mim.
— Já mudei de ideia.
Roy riu consigo mesmo. Isso me irritou.
— Qual é o seu problema, Roy?
— Eu é que perguntou! Escutei por tantas vezes você falando da garota, me fez ficar com a irmã dela, pra isso? Pra desistir nessa altura do campeonato?
— Até onde eu sei, você gostou de ficar com Veronika, e se eu decidi não ficar aqui me iludindo, isso é problema meu!
— Calma, gente! Não precisam discutir — manifestou-se Ben.
— Te achava mais forte que isso — provocou ele.
— Que seja fraqueza! Você não é o primeiro a pensar isso.
— Nem o último!
— Vai pro inferno, Roy.
Sai da sala enfurecido, em direção a porta da cozinha. Esse não era o Roy que eu conhecia; mas conseguiu me irritar. No caminho, trombei com Liz.
— Ei, ei! Aonde você vai assim tão bravo?
Foi a primeira vez que discuti com Roy, e isso me irritou tanto que ignorei a preocupação de Liz; continuei a andar.
— O que aconteceu aqui? — ouvi ela perguntar a eles, na sala.
Eu não tinha ideia de onde ir; só queria sair de lá. Não estava afim de escutar Ben e Liz dizendo pra eu ter paciência com Roy, pois ele estava passando por uma fase difícil e estava intolerante por que estava em abstinência; já havia escutado o discurso de Robert umas dez vezes, e já estava de saco cheio com isso. É claro que eu estava preocupado com Roy, que eu queria que ele ficasse bem e se livrasse do vicio, mas estava cada vez mais difícil ficar perto dele. E esse era só o começo.
Fui caminhando até o Centro; já tinha me esquecido de como era bom andar pra espairecer. Cheguei ate uma praça e lá fiquei por horas.
Sentado no banco da praça, fiquei observando as pessoas passando; algumas sozinhas, outras acompanhadas... Enquanto lembrava da ultima vez que estive naquela praça, há alguns anos atrás, quando ainda não tinha controle da minha sede, e foi inevitável soltar um suspiro de tranquilidade por poder ficar num lugar público, sem querer que aquelas pessoas virassem minhas refeições.
Por costume, coloquei as mãos no bolso da blusa, e tirei um papel que estava nele; tinha até me esquecido, era um papel com o numero do telefone de Jennifer, que coloquei no bolso da blusa que estava no Jaguar quando voltei pra casa.
Franzi o cenho, pensando: ligo ou não ligo?
Eu estava sozinho ali, sem fazer nada, e a casa dela era bem próxima. Ok, vou ligar.
Peguei o meu celular e disquei.
— Alô — disse ela sobre o telefone.
— Jennifer? Oi, é o James.
— Oi, James! Não pensei que ligaria tão cedo — brincou.
— Pois é. Estava pensando... Podíamos jogar mais conversa fora, se não estiver ocupada... Estou perto de sua casa.
— Onde você está?
— Na praça principal.
— Estou indo ai! — Desligou.
Em menos de 5 minutos, ela chegou. Devia estar entediada como eu.
— O que faz aqui sozinho? — perguntou, se aproximando e sentando ao meu lado no banco.
— Esvaziando a cabeça. — Sorri pra ela. — Desculpe por te tirar da sua casa.
— Nem esquente; eu já estava querendo sair mesmo... Mas não conheço muitos lugares aqui e também não tenho muitos amigos. — Ela sorriu sem graça.
— Quando precisar de uma companhia... Pode contar comigo.
Eu sabia bem o que era não ter muitos amigos; em 5 anos morando naquela cidade, eu só tinha Dakota como amiga, exceto pelos meus irmãos. Já Jennifer nem irmãos tinha, devia sentir muita falta de conversar.
Passamos a noite conversando naquela pequena praça, sentados naquele banco. A noite estava clara; apenas com a luz da lua-cheia e alguns postes nos iluminando fazendo-nos esquecer que as horas passavam.
— Não quero ser chato, mas já está ficando tarde e seus pais já devem me odiar por roubar você por tanto tempo assim.
Ela riu.
— Posso te levar pra casa?
— Não precisa, posso ir sozinha...
— Eu insisto.
Estendi a mão para puxá-la.
Caminhamos até lá, e quando chegamos, eu gelei; havia um homem carrancudo parado na porta, provavelmente a esperando. Imaginei que fosse seu pai, pelo modo como ela havia o descrevido.
— Seu pai? — perguntei baixinho.
— Sim... Não repare, ele é um pouco "protetor demais" — se enrolou nas palavras.
— Devo me preocupar?
Ela riu baixinho. Olhei por sobre o ombro dela e o homem ainda nos observava, sem sinal algum de bom humor.
Caminhamos até ele e estendi a mão para cumprimentá-lo. Ele olhou pra minha mão e depois para o meu rosto; eu esperava, com a mão suspensa no ar, então a apertou com firmeza, talvez querendo mostrar quem é que manda.
— Você é quem mesmo? — perguntou, ainda sério. Pigarreei.
— Desculpe... James Linton.
— Posso saber aonde estavam a essas horas? — Ele ainda segurava com força a minha mão, sem tirar os olhos de meu rosto. Tive uma leve impressão de que ele queria me machucar.
Foi a vez de Jennifer pigarrear. Ele olhou pra ela e levantou uma sobrancelha.
— Acho que já vou entrando, James... Está começando a ficar frio e você já deve estar querendo ir pra casa também, né? Vamos pai — ela disse, o puxando. Estava mesmo querendo findar a conversa.
— Vamos marcar um jantar, James — disse ele. — Gosto de conhecer os amigos de minha filha.
Ela revirou os olhos. Já devia ter passado por aquela mesma situação diversas vezes.
— Claro, senhor. Quando quiser.
— Harold; pode me chamar de Harold. Amanhã às 19hrs — disse, sem perder tempo.
— Pai, por favor! — Jennifer, o repreendeu, envergonhada.
— Amanhã está ótimo. — Sorri.
— Combinado então — disse, e soltou minha mão. Dobrei e estiquei os dedos algumas vezes, afim de me livrar daquela sensação de desconforto. — Até amanhã!
— Até...
Eles entraram pra dentro, Jennifer o encarava enquanto entravam e ele parecia nem ligar.
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