Capítulo 6: Namorado de Mentira
O começo da semana chega com uma rotina monótona que, estranhamente, não parece tão sufocante. Desde o momento em que abro os olhos na manhã de segunda-feira, Theo invade meus pensamentos. Me pego sorrindo ao lembrar da noite de sábado, da maneira como ele ficou sem reação diante do meu chilique e... bom, do fato de ele ser um gostosão.
Assim que tenho a chance, durante a aula de artes, conto tudo para Ester. Ela é a única pessoa aqui que escuta minhas loucuras sem me julgar, mesmo que às vezes pareça mais interessada em me provocar do que em entender.
— Então você pulou o muro e quase foi atropelada? — ela ri, jogando a cabeça para trás. — Isso já é muito pra mim. Agora, dizer que ele é um "gostosão"? Nunca te vi tão empolgada com alguém assim!
Dou de ombros, mas meu sorriso entrega tudo.
— Você precisava ver, Ester. Ele tem um cabelo perfeito, uns olhos castanhos de filme... e aquele corpo? Deus, se ele fosse modelo, eu comprava todas as revistas só pra colecionar as fotos.
— Ihhh, está apaixonada!
— Claro que não! — respondo rápido, mas minha voz sai um pouco alta demais, atraindo alguns olhares. Baixo o tom, constrangida. — É só que ele é... sei lá, diferente.
Ester dá de ombros, como se não acreditasse muito, mas não insiste.
Quando o intervalo chega, minha mente já está tomada por uma ideia que, mesmo maluca, não consigo tirar da cabeça. Espero o corredor esvaziar, aproveitando o momento para entrar na sala da diretora. É claro que a velha Dalva vive trancando tudo, mas hoje, por sorte, a gaveta do canto está destrancada.
Vasculho papéis e mais papéis até encontrar o que procuro.
— Bingo — murmuro, segurando um envelope com o endereço de Theo. Anoto rapidamente num pedaço de papel e saio antes que alguém me veja.
À noite, já em minha missão secreta, escalo o muro do internato mais uma vez. Dessa vez, o objetivo não é a pista de skate, mas sim a casa de Theo. Meu coração martela no peito enquanto caminho até o endereço. E então, lá estou, de frente para a porta dele. Respiro fundo e toco a campainha.
A porta se abre, e lá está ele, com aquela expressão de quem não sabe se está sonhando ou tendo um pesadelo.
— Ana? Como você me achou? E o que tá fazendo aqui?
Dou um sorriso, tentando parecer mais confiante do que realmente estou.
— Não vai me convidar para entrar?
Ele hesita, me encarando de cima a baixo. É óbvio que o uniforme cinza e sem graça do internato não faz jus a mim. Ainda assim, ele suspira e dá espaço para que eu entre.
Enquanto ele atende um telefonema, começo a explorar a casa, mas o tom tenso da conversa atrai minha atenção.
— Oi, mãe... Não, depois de amanhã? — A voz dele fica mais nervosa a cada palavra. — Tudo bem, certo...
Quando ele desliga, volto para o sofá, fingindo casualidade.
— E aí, tranquilo? — pergunto, tentando parecer casual, mas reparando na expressão frustrada dele.
— Sabe a minha ex-namorada? Aquela que eu te falei que terminou comigo? — Ele suspira, passando a mão pelos cabelos num gesto que grita tensão.
— Sei. O que tem ela?
— Então... eu tinha dito pra minha mãe que ia apresentar ela... — Ele pausa, como se estivesse escolhendo as palavras. — E aí, pra se exibir pras amigas, ela marcou um jantar super importante pra depois de amanhã, em um restaurante caríssimo. Fez até reserva especial e tudo.
Cruzo os braços, tentando não demonstrar irritação.
— E? — pergunto, sem esconder a falta de entusiasmo.
Ele me olha, como se esperasse que eu entendesse algo que ainda não foi dito.
— E... — Ele solta o ar de forma pesada. — Minha mãe está empolgada, acha ainda estamos juntos. E agora eu estou numa encrenca, porque ela quer que eu vá, mas...
— Mas você não tem quem levar? — corto, arqueando a sobrancelha.
Ele hesita, o desconforto evidente.
— Não é só isso. Minha mãe comentou que os filhos dessas amigas vão levar suas namoradas para o jantar. É tipo uma competição velada de quem tem a vida mais perfeita, entende? E eu estou no meio disso.
A frustração dele é quase cômica. Tento segurar a risada, mas falho miseravelmente. Ele me olha com uma mistura de confusão e irritação, mas não consigo evitar. É tudo tão absurdo que só rir parece uma resposta válida.
Sorrio, quase maquiavélica.
— Então está resolvido. Eu posso ser sua namorada de mentirinha.
Ele me encara como se eu tivesse acabado de dizer que sou uma alienígena.
— O quê?!
— É isso mesmo que você ouviu. Eu finjo ser sua namorada. Todo mundo sai ganhando.
— Você está maluca? — Ele passa a mão pelo cabelo, claramente confuso.
— Totalmente. — Dou de ombros, ainda sorrindo. — Mas pensa comigo. Eu finjo ser sua namorada, você impressiona sua mãe, e, de quebra, eu deixo a diretora Dalva de cabelo em pé. É ou não é um plano genial?
— Isso é sério?
— Mais sério que prova de matemática, Theo.
Ele parece perdido por alguns segundos, então balança a cabeça, suspirando.
— Ana, isso é loucura.
— Não se preocupa. Não é como se eu fosse apaixonada por você ou algo assim. É só fingimento. Além disso, você não terá o privilégio desse corpitcho aqui de graça — brinco, girando em meu eixo e apontando para mim mesma.
Ele engasga. Literalmente engasga. Fica pálido, depois corado, e parece não saber como reagir.
— Meu Deus, você é impossível.
— É por isso que sou perfeita pra missão. E aí, vai encarar?
Ele hesita por alguns segundos, os olhos presos nos meus como se estivesse tentando decifrar se eu realmente falo sério. Finalmente, suspira, derrotado.
— Tudo bem, namorada de mentirinha. Mas só até o jantar acabar — ele diz, exalando o ar como se estivesse prestes a se arrepender.
— Isso nós veremos. — Um sorriso travesso se espalha pelo meu rosto enquanto aproveito o momento.
Antes que ele possa reagir ou questionar, me inclino e dou um selinho rápido nele.
— O que foi isso?! — Ele dá um passo para trás, os olhos arregalados, como se tivesse levado um choque.
Dou de ombros, fingindo a maior inocência do mundo.
— Só selando o acordo, seu babaca. — Aponto para ele com uma piscadinha e um sorriso sarcástico. — Ah, e só pra constar, não vá se apaixonar, hein?
Ele fica parado ali, me encarando, completamente atônito. Suas sobrancelhas se erguem, e parece que ele tenta dizer algo, mas desiste, optando por cruzar os braços e balançar a cabeça, rindo de leve.
— Você é completamente maluca, sabia?
— Sempre ouvi dizer que os gênios têm um pouco de loucura — digo, esticando os braços em um exagerado gesto teatral. — E eu sou, sem dúvida, uma gênia.
— Isso vai ser um desastre — ele murmura, ainda com um sorriso no canto da boca.
— Ou vai ser a coisa mais divertida que já fizemos — retruco, dando de ombros.
Theo finalmente suspira, derrotado, mas não sem um toque de divertimento em seus olhos.
— Só não se mete em confusão demais, tá bom?
Dou uma risadinha, pegando minha mochila e me afastando de costas, enquanto ainda o encaro.
— Confusão é o meu segundo nome, Theo. Aguenta firme, vai ser uma aventura e tanto!
Ele balança a cabeça, rindo, enquanto me observa ir embora. Mal sabe ele que, quando se trata de mim, as aventuras só estão começando.
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