Capítulo 3: O começo do fim
O som dos passos de Daniel ecoa pela sala enquanto ele entra pela porta da frente com sua habitual pose de "homem de negócios". Está de terno, com a gravata já frouxa, e carrega a maleta como se estivesse carregando o peso do mundo.
Aproveito a deixa, porque provocar é minha especialidade.
— Olha só a hora que chega... Estava corneando a Laninha? — disparo, com meu tom mais sarcástico possível.
Ele para no meio do corredor, me lançando aquele olhar cansado e irritado que eu conheço tão bem.
— Ana, pelo amor de Deus, você não cansa?
Cruzo os braços, arqueando as sobrancelhas. — Eu? Nunca. Você sabe como é, Daniel: alguém precisa ser o entretenimento dessa família, e eu faço o serviço de graça.
Ele respira fundo, tenta ignorar e continua andando, mas eu não consigo parar.
— Ah, tá. Vai tomar um banho para disfarçar o perfume? Aposto que Lana nem desconfia. Ou será que desconfia e só finge que não vê?
— Chega, Ana! — ele se vira, a voz agora num tom firme, mas não grita. Nunca grita. Porque Daniel é assim: resolve tudo no controle. Ou tenta, pelo menos. — Você precisa de limites, menina.
Reviro os olhos. — Limites? Tá bom, pai postiço. Vai me colocar de castigo? Ou vai chamar a Lana pra me dar um sermão sobre "família e amor eterno"?
Ele me encara por um momento antes de desistir e subir as escadas. Eu sorrio. Mais um ponto pra mim.
O dia passa até que percebo algo que me chama atenção: a porta do escritório está fechada. Lana e Daniel estão lá dentro, falando baixo, mas minha curiosidade é maior. Me aproximo e encosto o ouvido na porta.
— Amor, essa menina está impossível. Temos que colocar limites. Vamos colocá-la em um internato. — A voz de Daniel é firme, mas controlada, como sempre.
Meu coração aperta, e meus olhos se enchem de lágrimas. Claro, eu sempre fingi que não me importava. Sempre digo: "Vão, seus putos, me coloquem lá mesmo. Será ótimo não ver a cara de vocês." Mas, na realidade, a ideia de ser mandada embora me destrói.
— Mas, Dani, eu não posso fazer isso de novo com ela... Ela é sangue do meu sangue. — Lana soa hesitante, e isso me dá uma ponta de esperança.
— Amor, olha tudo o que ela faz. Um dia desses, empurrou a Nina no chão. No outro, deu comida quente pro Gael que acabou com a boca queimada. Fora o dia que trocou a senha do meu celular e notebook e o dia que escreveu no capô do carro de papai... — ele lista mais milhões de coisas que eu ja fiz.
Culpada, penso, enquanto tento conter o choro.
— Mas meu amor, eu vou conversar com ela, e vai melhorar.
— Não vai, e você sabe disso.
A discussão continua, mas já é demais para mim. Subo para meu quarto, sentindo um peso no peito. Me jogo na cama e fico olhando pras paredes, sem reação, tentando entender o que está prestes a acontecer.
Pego o celular e ligo pra Maike. Ele atende com aquela voz arrastada de quem não faz nada o dia inteiro.
— Fala, Ana.
— Preciso de um favor. Traz aquela erva pra mim?
— O que rolou agora?
— Só traz, Maike.
Em menos de uma hora, ele aparece com Luna e Fred, meus colegas da pista de skate, junto com o que pedi. Eles entram sorrateiramente, e ficamos no meu quarto, fumando e conversando.
— Acho que vou ser jogada no internato. — Solto, depois de algumas tragadas.
Fred me olha com um sorriso de canto. — O que aprontou dessa vez?
Dou de ombros. — Nada. É sempre a mesma coisa. Esses vermes só não me querem aqui.
— Já falei para você roubar o dinheiro deles e picar o pé. — Luna ri, como se fosse a solução mais simples do mundo.
— Ah, sim, claro. Aí eles me acham em dois segundos, Daniel estala os dedos e a polícia está atrás de mim. Ótima ideia, Luna.
— Complicado. — Eles dizem em uníssono, e rimos juntos.
— Eu preferia quando éramos só eu e Lana. Apesar de não termos dinheiro, eu era feliz. Agora, todo esse luxo não vale de nada.
— Vale sim. Você banca a nossa erva. — Maike ri, e eu balanço a cabeça, meio indignada.
O cheiro de forte invade o corredor, e em questão de minutos, Daniel entra no quarto com a fúria de um furacão.
— O que está acontecendo aqui?!
Maike e Luna saem correndo, deixando pra trás risadas nervosas, mas Fred fica, tentando me defender.
— Foi mal, senhor Navarro, a culpa foi nossa...
Eu, completamente alheia, estendo o cigarro pra Daniel, provocativa:
— Quer dar um trago?
Ele dá um tapa no cigarro, derrubando-o no chão.
— CHEGA! — Ele explode, começando a pegar minhas roupas e jogá-las na mala. — Hoje você sai dessa casa. Vai pro internato!
Fred tenta intervir, mas Daniel só grita:
— E você, moleque, cai fora daqui!
Lana aparece, tentando entender o que está acontecendo, mas, dessa vez, nem ela me defende. É o fim da linha.
No caminho pro internato, o silêncio no carro é insuportável. Tento puxar assunto, porque, bem, é isso que eu faço:
— Mas eu vou sair nos fins de semana?
— Você vem me visitar?
— Será que a Lilian ainda é a diretora?
— É a segunda vez que você me abandona, Lana.
Ela não responde. Só chora, enquanto Daniel me manda calar a boca.
— Onde foi que eu errei com você Ana? — ouço Lana dizer, entre soluços.
Me viro para ela, cheia de raiva. — Você errou quando trouxe essezinho aí pra nossas vidas.
Daniel freia bruscamente, mas não diz nada.
Chegamos ao internato. Não é Lilian quem me recebe, mas uma nova diretora, rígida e com um sorriso falso de quem acha que vai conseguir me domar. Sou levada ao quarto, onde conheço minha colega.
— Oi, meu nome é Ester.
Sorrio de canto. — Ana. E pode anotar: eu sou a garota que vai transformar esse lugar num inferno.
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